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Efeitos da sinvastatina associada ao exercício físico na resistência mecânica de músculos e ossos de ratos Trabalho desenvolvido na Universidade do Vale do Sapucaí, Pouso Alegre, MG, Brasil.

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a influência da sinvastatina nas propriedades mecânicas de ossos e músculos de ratos hipercolesterolêmicos submetidos a exercício físico.

Métodos:

Foram usados dez ratos machos da raça Wistar, submetidos a dieta hiperlipídica rica em colesterol por 90 dias. Os animais foram então distribuídos em dois grupos: submetidos a tratamento com exercício físico (GE) e submetidos a tratamento com exercício físico e sinvastatina (GE+S). Foi aplicado um protocolo de exercício físico na água e administração de sinvastatina por oito semanas. Após esse período, os animais foram eutanasiados e dissecados a tíbia esquerda e o músculo gastrocnêmio direito de cada animal para análise mecânica e a tíbia direita para densitometria. Para análise dos dados foi aplicado o teste t de Student, considerou-se nível de significância de 5%.

Resultados:

A comparação da força máxima e rigidez não revelou diferença significativa entre os grupos tanto para a tíbia (p = 0,851 e p = 0,259) quanto para o músculo gastrocnêmio (p = 0,911 e p = 0,083). A DMO das tíbias também não apresentou diferença significativa entre os grupos (p = 0,803).

Conclusão:

A sinvastatina não teve efeitos deletérios nas propriedades mecânicas da tíbia e do músculo gastrocnêmio de ratos hipercolesterolêmicos submetidos a exercício físico aeróbio.

Palavras-chave:
Hipercolesterolemia; Sinvastatina; Exercício; Tíbia; Gastrocnêmio

ABSTRACT

Objective:

The aim of the present study was to evaluate the influence of simvastatin on mechanical properties of muscle and bone in hypercholesterolemic rats submitted to physical exercise.

Methods:

Ten male Wistar rats were submitted to a high-fat diet rich in cholesterol for 90 days. The animals were then divided into two groups: animals treated with physical exercise (EG) and animals treated with physical exercise and simvastatin (ESG). Protocols for physical exercise in water and simvastatin administration were performed for eight weeks. After this period, the animals were euthanized; the left tibia and right gastrocnemius muscle were dissected for mechanical analysis, and the right tibia for densitometry. The data were analyzed using Student's t-test, considering a level of significance of 5%.

Results:

The comparison of maximum load and stiffness revealed no significant differences between the groups for both the tibia (p = 0.851 and p = 0.259) and the gastrocnemius (p = 0.911 and p = 0.083). The tibia BMD also showed no significant difference between the groups (p = 0.803).

Conclusion:

Simvastatin had no negative effects on mechanical properties in tibia and gastrocnemius of hypercholesterolemic rats submitted to physical exercise.

Keywords:
Hypercholesterolemia; Simvastatin; Exercise; Tibia; Gastrocnemius

Introdução

A hipercolesterolemia é caracterizada por elevação anormal dos níveis de colesterol no sangue e é considerada um significante fator de risco para doenças cardiovasculares. O tratamento da hipercolesterolemia e a prevenção de doenças cardiovasculares envolvem terapia nutricional, prática de exercício físico e terapia medicamentosa.11 Sposito AC, Caramelli B, Fonseca FAH, Bertolami MC. Sociedade Brasileira de Cardiologia. IV Diretriz brasileira sobre dislipidemias e prevenção de aterosclerose da sociedade brasileira de cardiologia. Arq Bras Cardiol. 2007;88(1):2-19.

A sinvastatina é um fármaco usado no tratamento e na prevenção da hipercolesterolemia. Atua como inibidor da enzima 3-hidroxi-3-metil-glutaril-coenzima A (HMG-CoA) redutase, enzima fundamental no caminho biossintético do colesterol no fígado, coíbe a síntese de colesterol.22 Laniesse D, Beaufrere H. Therapeutic review: statins. J Exot Pet Med. 2014;23(2):206-10. Outras aplicabilidades das estatinas têm sido estudadas devido seus efeitos pleiotrópicos. Existem relatos de efeitos adversos do uso de estatinas no tecido muscular, inclusive dor, miopatia e, em casos mais graves, rabdomiólise.33 Dirks AJ, Jones KM. Statin-induced apoptosis and skeletal myopathy. Am J Physiol Cell Physiol. 2006;291(6):1208-12. Também há evidências de que as estatinas podem ter efeitos no tecido ósseo,44 Silva RM, Pinheiro Neto FC, Bertoncello D. Efeitos da sinvastatina sobre propriedades biomecânicas de ossos de ratas ovariectomizadas. Rev Med Minas Gerais. 2008;18(1):31-6. porém existem muitas controvérsias.

O exercício físico também atua no sistema musculoesquelético e pode ser indicado como terapia complementar ao uso de sinvastatinas para redução dos níveis de colesterol. As alterações morfológicas nos ossos e músculos derivadas dessas terapias têm sido estudadas. No entanto, comparar a relação da sinvastatina com a prática de exercício é necessário para que seja possível evidenciar o comportamento dessas duas modalidades terapêuticas na resistência mecânica do tecido ósseo e muscular. Portanto, o objetivo deste estudo foi avaliar a influência da sinvastatina nas propriedades mecânicas de ossos e músculos de ratos hipercolesterolêmicos submetidos a exercício físico.

Material e métodos

Este estudo se caracterizou como piloto experimental em modelo animal, seguiu as normas do Colégio Brasileiro de Experimentação Animal e do International Guiding Principles for Biomedical Research Involving Animals. Foi previamente aprovado pela Comissão de Ética no Uso de Animais da Universidade do Vale do Sapucaí (Univás), sob protocolo 202/13.

Foram usados 10 ratos machos Wistar, com massa corporal entre 270 e 290 g. Os animais foram adquiridos através do Biotério da Univás, permaneceram sob condições controladas de ambiente com temperatura de 21 ± 2 °C, umidade de 55-60% e ciclo 12 horas claro/escuro, sem restrição de água e ração.

Os animais foram divididos ao acaso em dois grupos (n = 5) de acordo com os tratamentos propostos: Grupo Exercício (GE) – Os animais foram tratados com exercício físico; e Grupo Sinvastatina + Exercício (GS+E) – Os animais foram tratados simultaneamente com exercício físico e sinvastatina.

Indução da hipercolesterolemia

Os animais receberam dieta hipercolesterolêmica baseada na AIN-93 (American Institute of Nutrition) composta por 18% de lipídios por kg (1,25% de colesterol) para indução da hipercolesterolemia, durante 90 dias.55 Accioly MF, Camargo Filho JC, Padulla SAT, Lima AL, Bonfim MR, Carmo EM, et al. Efeito do exercício físico e estatinas na função muscular em animais com dislipidemia. Rev Bras Med Esporte. 2012;18(3):198-202. Após os 90 dias foi feita coleta de sangue, por meio de punção cardíaca, e exame laboratorial para confirmar a elevação do nível de colesterol dos animais.

Administração da sinvastatina

A sinvastatina foi administrada na dosagem de 20 mg/kg. O medicamento em pó foi misturado com água grau I purificada em sistema Milli-Q e a suspensão foi ofertada por meio do processo de gavagem. Devido ao crescimento e à modificação do peso corporal dos animais, a dose do medicamento foi recalculada diariamente. O medicamento foi administrado por oito semanas.

Protocolo de exercício físico

O protocolo de exercício foi de treinamento na água com duração de 60 minutos, cinco vezes por semana, durante oito semanas, em um sistema de natação adaptado para ratos.66 Vieira R, Haebisch H, Kokubun E, Hell NS, Curi R. Sistema de natação para exercício físico de ratos. Arq Biol Tecnol. 1988;31(3):387-94. Foi usado um tanque de natação com formato retangular e superfície lisa, media 120 cm de comprimento, por 60 cm de largura, por 60 cm de altura.77 Marangon L, Gobatto C, Mello M, Kokubun E. Utilization of an hiperbolic model for the determination of the critical load in swimming rats. Med Sci Sports Exerc. 2002;34(5):S134-49. A água foi mantida em profundidade de 40 cm, com a temperatura de 31±1 °C.88 Harri M, Kuusela P. Is swimming exercise or cold exposure for rats?. Acta Physiol Scand. 1986;126(2):189-97. Antes do início dos experimentos, todos os animais foram adaptados ao meio líquido no mesmo tanque descrito previamente e sob as mesmas condições. A adaptação se deu durante cinco dias, nos quais os animais foram colocados na água durante tempo crescente de 5, 15, 25, 35 e 45 minutos com o propósito de evitar o estresse do animal sem promover adaptações fisiológicas nesse período. Os animais foram supervisionados durante todo o tempo de exercício para que não ficassem boiando ou apoiados.

Morfometria

Os animais foram pesados semanalmente para avaliação da massa corporal. Após o período de tratamento os animais foram submetidos a eutanásia com dose excessiva de anestésico (xilazina e ketamina). Foram dissecadas as tíbias direita e esquerda e o gastrocnêmio direito de cada animal.

As tíbias foram pesadas em uma balança de precisão com divisão de 0,01 g (AC-2000, Marte®). O comprimento das tíbias foi mensurado com um paquímetro digital com 0,01 mm de precisão (Mitutoyo®).

Densitometria

As tíbias direitas foram submetidas a densitometria em um densitômetro de dupla emissão de raios X (DPX-Alpha, Lunar®, USA), pertencente ao Laboratório de Bioengenharia da FMRP/USP. As aquisições das imagens foram feitas com as tíbias na mesma posição, imersas sob profundidade de 2 cm de solução fisiológica estéril em um recipiente plástico. Com o uso do DPX software (versão 4.7 E, Lunar®, USA) os ossos foram demarcados manualmente em uma região de interesse de 9 mm2 logo abaixo do disco epifisário, colheu-se a informação da densidade mineral óssea (DMO).

Análise mecânica

Para analisar as propriedades mecânicas, a tíbia esquerda dos animais foi submetida a ensaio de flexão de três pontos, com uma Máquina Universal de Ensaios (DL10.000, EMIC®, Brasil), pertencente ao Laboratório de Bioengenharia da FMRP/USP. Os ossos foram posicionados sobre dois pontos de apoio distantes em 25 mm. Foi usada uma célula de carga de 500N e a aplicação da força ocorreu em uma velocidade de 1 mm/min, até a ruptura da amostra. As propriedades analisadas foram a força máxima e a rigidez relativa.

O músculo gastrocnêmio direito foi submetido ao ensaio de tração com uma Máquina Universal de Ensaios (DL10.000, EMIC®, Brasil) acoplada a uma célula de carga de 500 N, para mensurar as propriedades mecânicas de força máxima e rigidez relativa das fibras musculares. Foram usados os seguintes parâmetros: velocidade de 10 mm/min, pré-carga de 5 N e tempo de acomodação de 30 segundos.

Análise estatística

Para comparação dos grupos foi usado o teste estatístico t de Student. As análises estatísticas foram feitas com o programa SPSS (Versão 20.0) e foi adotado nível de significância de 5%.

Resultados

Massa corporal e consumo de ração

A massa corporal dos animais foi semelhante no início do experimento (p = 0,183). Os grupos mantiveram massa corporal semelhante após a indução da hipercolesterolemia (p = 0,132) e no fim do experimento (p = 0,210). O ganho de massa foi crescente até a 8 ª semana, correspondente ao fim da dieta hipercolesterolêmica (p < 0,001), a partir da 8 ª semana, com o início do tratamento, a perda de peso foi gradativa, os animais perderam peso significativamente no fim do experimento (p = 0,033).

Foi mensurada a média do consumo de ração diário até o fim da indução da hipercolesterolemia, não houve diferença entre os grupos nesse período (p = 0,120). Após, a média do consumo diário de ração durante o período de tratamento também foi mensurada e não houve diferença significativa entre os grupos (p = 0,784). O consumo de ração antes e após o treinamento físico também não foi diferente (p = 0,281). A figura 1 representa graficamente os valores de massa corporal e consumo de ração nos grupos.

Figura 1
A, comparação entre os grupos Exercício (GE) e Exercício e Sinvastatina (GE+S) em três diferentes tempos. Ambos os grupos ganharam peso até o fim da dieta e tiveram perda de peso com o tratamento, sem diferença significativa entre os grupos em nenhum dos tempos. * diferença significativa em relação ao Início. + diferença significativa em relação ao pós-tratamento; B, o consumo de ração não teve alteração antes e após o tratamento e também não diferiu entre os grupos.

Avaliação da tíbia

As medidas morfométricas não revelaram diferença significativa para o comprimento (p = 0,834) e para o peso das tíbias (p = 0,302) entre os grupos.

A comparação da força máxima (p = 0,851) e da rigidez relativa (p = 0,259) da tíbia esquerda não revelou diferença significativa entre os grupos. Também não foi observada diferença significativa na DMO na comparação dos dois grupos (p = 0,803). Os resultados estão apresentados na tabela 1.

Tabela 1
Resultados do comprimento, peso e densidade mineral óssea (DMO) das tíbias direitas e da força máxima e rigidez das tíbias esquerdas nos grupos Exercício (GE) e Exercício e Sinvastatina (GE+S)

Avaliação do gastrocnêmio

A resistência do músculo gastrocnêmio não foi afetada pela associação da sinvastatina ao exercício. A comparação da força máxima entre os grupos não revelou diferença significativa (p = 0,911). A rigidez do gastrocnêmio no teste de tração também não apresentou diferença significativa (p = 0,083). Os resultados estão apresentados na figura 2.

Figura 2
A, os grupos Exercício (GE) e Exercício e Sinvastatina (GE+S) apresentaram similar força máxima ao ensaio mecânico do gastrocnêmio; B, a rigidez foi similar entre os grupos.

Discussão

O presente estudo avaliou o uso de sinvastatina associado ao exercício físico na tíbia e no gastrocnêmio de ratos hipercolesterolêmicos, visto que ambos são modalidades terapêuticas hipolipemiantes e têm efeitos no sistema musculoesquelético. Os resultados do presente estudo não demonstraram influência do exercício físico nas propriedades morfométricas, mecânicas e DMO das tíbias de ratos usuários de sinvastatina ou não. A sinvastatina também não afetou a resistência mecânica do músculo gastrocnêmio quando associado ao exercício físico.

O exercício, mesmo de baixo impacto, como a natação, estimula a formação óssea. A ação muscular envolvida na atividade promove estímulo mecânico para os ossos, que, devido a sua propriedade piezoelétrica, respondem positivamente a esse estímulo.99 Frajacomo FTT, Falcai MJ, Fernandes CR, Shimano AC, Garcia SB. Biomechanical adaptations of mice cortical bone submitted to three different exercise modalities. Acta Ortop Bras. 2013;21(6):328-32. A sinvastatina, por sua vez, não afetou a estimulação óssea, ambos os grupos apresentaram valores similares de DMO e propriedades mecânicas. O exercício físico, como um forte fator de influência no tecido ósseo, pode ter suprimido a resposta da sinvastatina no presente estudo.

Estudos relatam que as estatinas têm ação na estimulação do tecido ósseo.44 Silva RM, Pinheiro Neto FC, Bertoncello D. Efeitos da sinvastatina sobre propriedades biomecânicas de ossos de ratas ovariectomizadas. Rev Med Minas Gerais. 2008;18(1):31-6.,1010 Tai IC, Fu YC, Wang CK, Chang JK, Ho ML. Local delivery of controlled-release simvastatin/PLGA/HAp microspheres enhances bone repair. Int J Nanomedicine. 2013;8:3895-904. Essa ação ocorre devido à estimulação da proteína morfogênica óssea (BMP-2), que causa proliferação e diferenciação osteoblástica, resulta em maior e melhor formação do tecido ósseo. De acordo com Anbinder et al.,1111 Anbinder AL, Quirino MRS, Rocha RF. As estatinas e o tecido ósseo: revisão da literatura. Rev Odontol UNESP. 2006;35(4):239-46. todas as estatinas, exceto a pravastatina, estimulam a BMP-2. As estatinas foram ainda relacionadas a uma diminuição da atividade osteoclástica e consequente redução da absorção óssea observados pelo aumento expressão de osteoprotegerina (OPG) e diminuição da expressão de fator nuclear kappa-B ligante (RANKL).1212 Luckman SP, Hughes DE, Coxon FP, Graham R, Russell G, Rogers MJ. Nitrogen-containing bisphosphonates inhibit the mevalonate pathway and prevent post-translational prenylation of GTP-binding proteins, including Ras. J Bone Miner Res. 1998;13(4):581-89. Assim, o possível emprego das estatinas para potencializar o tratamento de deficiências ósseas tem sido investigado. Oxlund e Andreassen1313 Oxlund H, Andreassen TT. Simvastatin treatment partially prevents ovariectomy-induced bone loss while increasing cortical bone formation. Bone. 2004;34(4):609-18. avaliaram os efeitos da sinvastatina em tíbia e vértebra de ratas ovariectomizadas e observaram uma redução da perda do osso trabecular. Skoglund et al.1414 Skoglund B, Forslund C, Aspenberg P. Simvastatin improves fracture healing in mice. J Bone Miner Res. 2002;17(11):2004-8. ainda relataram que ratos submetidos à fratura de fêmur, tratados com 120 mg/kg de sinvastatina, apresentaram melhor resistência do que aqueles não tratados com sinvastatina.

No entanto, outros estudos demonstraram que não houve estimulação óssea após tratamento com sinvastatina em ratas.1515 Von Stechow D, Fish S, Yahalom D, Bab I, Chorev M, Müller R, et al. Does simvastatin stimulate bone formation in vivo?. BMC Musculoskelet Disord. 2003;4(1):1-10.,1616 Maritz FJ, Conradie MM, Hulley PA, Gopal R, Hough S. Effect of statins on bone mineral density and bone histomorphometry in rodents. Arterioscler Thromb Vasc Biol. 2001;21(10):1636-41. Maritz et al.1616 Maritz FJ, Conradie MM, Hulley PA, Gopal R, Hough S. Effect of statins on bone mineral density and bone histomorphometry in rodents. Arterioscler Thromb Vasc Biol. 2001;21(10):1636-41. ainda afirmaram que altas doses de sinvastatina aumentam a formação óssea, enquanto baixas doses de sinvastatina podem diminuir a formação óssea. Doses, tempos e modos de administração diferentes podem gerar os resultados controversos. Para evitar efeitos colaterais derivados de altas doses de sinvastatina a administração local nos ossos parece ser uma atrativa solução para a aplicação de sinvastatina na terapia óssea.1717 Kheirallah M, Almeshaly H. Simvastatin, dosage and delivery system for supporting bone regeneration, an update review. J Oral Maxillofac Surg Med Pathol. 2016;28(3):205-9.

A sinvastatina também é associada a danos morfológicos e estruturais no músculo esquelético.1818 Tomazoni SS [dissertação] Efeito da sinvastatina na lesão muscular induzida por estiramento passivo em ratos. São Paulo: Universidade de São Paulo; 2011. A sinvastatina não atua exclusivamente no caminho biossintético do colesterol, inibe também a síntese da coenzima Q10, o que afeta a capacidade de fosforilação oxidativa mitocondrial e pode levar à apoptose das fibras musculares.1919 Larsen S, Stride N, Hey-Mogensen M, Hansen CN, Bang LE, Bundgaard H, et al. Simvastatin effects on skeletal muscle: relation to decreased mitochondrial function and glucose intolerance. J Am Coll Cardiol. 2013;61(1):44-53. Ratos que fazem o uso da sinvastatina apresentam alterações morfológicas e estruturais, que podem ser agravadas quando o uso de sinvastatina é associado ao exercício.55 Accioly MF, Camargo Filho JC, Padulla SAT, Lima AL, Bonfim MR, Carmo EM, et al. Efeito do exercício físico e estatinas na função muscular em animais com dislipidemia. Rev Bras Med Esporte. 2012;18(3):198-202.,2020 Mohaupt MG, Karas RH, Babiychuk EB, Sanchez-Freire V, Monastyrskaya K, Iyer L, et al. Association between statin-associated myopathy and skeletal muscle damage. Can Med Assoc. 2009;181(1–2):11-8. Bonfim et al.2121 Bonfim MR, Camargo Filho JCS, Vanderlei LCM, Padulla SA, Accioly MF, Souza DRS, et al. Muscle response to the association of statin and physical exercise in rats. Int J Morphol. 2009;27(4):1155-61. afirmaram que a associação de sinvastatina com o exercício físico em esteira conduziu a um aumento da lesão muscular em ratos. Não foram observadas no presente estudo diferenças significativas nas propriedades mecânicas de animais usuários ou não de sinvastatina. O estudo de Padulla et al.2222 Padulla SA, Azoubel R, Bonfim MR, Accioly MF, Camargo Filho JC, Padovani JA, et al. Effects of statin and aerobic physical exercise association in the cardiomyocytes of the rat. Morphometric study. Int J Morphol. 2009;27(1):83-8. afirmou que a musculatura cardíaca de ratos treinados sofreu adaptações benéficas em resposta ao exercício, tornou-a mais resistente aos efeitos apoptóticos das estatinas. O exercício físico é um poderoso estimulador da biogênese mitocondrial. Dessa forma, embora existam estudos que descrevam que o exercício provoca microlesões que podem agravar a miopatia advinda do uso de estatinas, ele promove fortalecimento muscular que pode ter evitado o dano musculoesquelético relacionado à sua resistência biomecânica.

Os animais foram alimentados com dieta hipercolesterolêmica, a fim de causar hipercolesterolemia e melhor mimetizar os efeitos do tratamento.55 Accioly MF, Camargo Filho JC, Padulla SAT, Lima AL, Bonfim MR, Carmo EM, et al. Efeito do exercício físico e estatinas na função muscular em animais com dislipidemia. Rev Bras Med Esporte. 2012;18(3):198-202. Os animais adquiriram peso crescente ao longo do experimento durante a alimentação hipercolesterolêmica. Esse aumento crescente de peso pode ser explicado pelo crescimento natural dos animais somado a uma dieta rica em lipídios. A partir então do término da dieta e do início da prática de atividade física, os animais vieram a perder peso. Embora tenha ocorrido perda de peso com o tratamento, foi possível notar que o consumo de ração não teve alteração. Esse fato pode ser explicado pelo aumento do gasto energético devido à prática de exercício físico, ao mesmo tempo em que mimetiza a reeducação alimentar e física envolvida em um tratamento conservador para controle colesterolêmico e que, devido aos novos hábitos, agrega perda de peso.

A natação foi escolhida pois o exercício físico aeróbico de caráter contínuo se configura como exercício de escolha para pacientes com hipercolesterolemia. O exercício de baixo impacto não diminuiu a resistência muscular associado ao uso de sinvastatina e pode até promover fortalecimento muscular e evitar esse dano. O tecido ósseo também não foi afetado com o uso de sinvastatina. Embora a sinvastatina possa ser considerada estimuladora da formação óssea, não potencializou mas também não suprimiu os efeitos do exercício físico. Além do mais, o uso sinvastatina com exercício físico atua como regulador de distúrbios metabólicos que podem ser prejudiciais para o sistema musculoesquelético.2323 Jiang J, Boyle LJ, Mikus CR, Oberlin DJ, Fletcher JA, Thyfault JP, et al. The effects of improved metabolic risk factors on bone turnover markers after 12 weeks of simvastatin treatment with or without exercise. Metabolism. 2014;63(11):1398-408. Portanto, a prática de exercício físico de baixa intensidade é indicada como tratamento auxiliar no controle das dislipidemias não apenas por seu efeito hipolipemiante, mas também por agregar benefícios musculoesqueléticos que evitam danos agregados ao uso de medicamentos.

É importante conhecer a resposta biomecânica dos ossos e músculos frente à terapia da hipercolesterolemia. O presente estudo complementa os estudos que avaliam os efeitos morfológicos e estruturais do exercício e da sinvastatina no sistema musculoesquelético. No entanto, foram usadas amostras pequenas que talvez possam não extrapolar os resultados em um grupo maior. Incentivam-se então novos estudos com amostras maiores. Os achados nos levam a concluir que a sinvastatina não teve efeitos deletérios nas propriedades mecânicas da tíbia e do músculo gastrocnêmio de ratos submetidos a exercício físico aeróbio.

  • Trabalho desenvolvido na Universidade do Vale do Sapucaí, Pouso Alegre, MG, Brasil.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2018

Histórico

  • Recebido
    7 Abr 2017
  • Aceito
    2 Maio 2017
  • Publicado
    05 Abr 2018
Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia Al. Lorena, 427 14º andar, 01424-000 São Paulo - SP - Brasil, Tel.: 55 11 2137-5400 - São Paulo - SP - Brazil
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