Acessibilidade / Reportar erro

Deformidade dos ossos pélvicos e sua correlação com o ângulo centro-borda acetabular* * Trabalho feito no Grupo de Quadril do Hospital Ortopédico de Passo Fundo, Faculdade de Medicina da Universidade de Passo Fundo, Passo Fundo, RS, Brasil.

Resumo

Objetivos

O objetivo do presente trabalho é avaliar a deformidade dos ossos pélvicos e sua correlação com ângulo centro-borda acetabular (CE).

Métodos

Foi realizado um estudo prospectivo caso-controle, entre agosto de 2014 e abril de 2015. Os critérios de inclusão foram pacientes consecutivos com idades entre 20 e 60 anos. Os critérios de exclusão foram: doença metabólica, cirurgia prévia de quadril ou coluna, radiografia evidenciando artrose de quadril ≥ Tönnis 2, displasia do desenvolvimento do quadril (DDQ) severa, sobrecobertura acetabular global, sinal do cruzamento das linhas acetabulares, deformidades decorrentes de epifisiólise ou Legg-Perthes-Calveé, e radiografia sem qualidade adequada. Foram avaliados na radiografia anteroposterior (AP) de pelve: o ângulo CE, índice acetabular (IA), sinal do cruzamento das linhas acetabulares, mensuração do eixo horizontal e vertical da hemipelve superior e inferior (H1: Linha Horizontal 1, hemipelve superior; H2: Linha Horizontal 2, hemipelve superior; V1: Linha Vertical, hemipelve superior; HR: Linha Horizontal, hemipelve inferior; VR: Linha Vertical, hemipelve inferior). As mensurações H1, H2, V1, HR e VR foram consideradas assimétricas quando, na comparação de uma hemipelve em relação ao lado contralateral, evidenciou-se uma diferença > 5 mm. Os pacientes foram separados em dois grupos: controle e grupo 1.

Resultados

O total de pacientes avaliados no período foi de 228 (456 quadris). De acordo com os critérios estabelecidos, foram incluídos neste estudo 93 pacientes. A idade média foi de 39,9 anos (20 a 60 anos, desvio padrão [DP] = 10,5), e o ângulo CE médio do quadril direito foi de 31,5º (20º a 40º) e do esquerdo de 32,3º (20º a 40º). Um total de 38 pacientes foi incluído no grupo controle, sendo que com relação à H1, foi constatada aferição assimétrica em 4 casos (10,5%), H2 em 5 (13,1%), V1 em 7 (18,4%), HR em 5 (13,1%), e VR em 1 caso (2,63%). No grupo 1, foram incluídos 55 pacientes, sendo que com relação à H1, foi constatada aferição assimétrica em 24 casos (43,6%), H2 em 50 (90,9%), V1 em 28 (50,9%), HR em 16 (29,09%), e VR em 8 casos (14,5%). Na comparação entre o grupo controle e o grupo 1, observou-se diferença estatisticamente significativa para a assimetria das mensurações H1, H2 e V1 (p < 0,001).

Conclusão

No presente trabalho, evidenciou-se correlação entre variação do ângulo CE acetabular e assimetria da hemipelve superior. Os presentes autores acreditam que o melhor entendimento das alterações morfológicas pélvicas permite uma maior facilidade no diagnóstico das deformidades articulares do quadril.

Palavras-chave
luxação do quadril; acetábulo; cabeça do fêmur

Abstract

Objective

The purpose of the present study was to evaluate the pelvic bone deformities and its correlation with the acetabular center-edge (CE) angle.

Methods

Between August 2014 and April 2015, we prospectively evaluated patients aged between 20 and 60 years old. The exclusion criteria were: metabolic disease, previous hip or spine surgery, radiograph showing hip arthrosis ≥ Tönnis two, severe hip dysplasia, global acetabular overcoverage, acetabular crossover sign, hip deformities from slipped capital femoral epiphysis (SCFE) or Leg-Perthes-Calveé, and bad quality radiographs. At anteroposterior (AP) pelvic radiographs, we have evaluated: the CE angle, the acetabular index (IA), the acetabular crossover sign, the vertical and horizontal superior and inferior pelvic axis (H1: Horizontal line 1, superior pelvic axis; H2: Horizontal line 2, superior pelvic axis; V1: Vertical line, superior pelvic axis; HR: Horizontal line, inferior pelvic axis; VR: Vertical line, inferior pelvic axis). The superior and inferior pelvic axis were considered asymmetric when there was a difference ≥ 5 mm between both sides. Patients were divided into two groups: control and group 1.

Results

A total of 228 patients (456 hips) were evaluated in the period. According to the established criteria, 93 patients were included. The mean age was 39.9 years old (20 to 60 years old, standard deviation [SD] = 10,5), and the mean CE angle in the right hip was 31.5º (20 o to 40º), and in the left 32.3º (20 o to 40º). The control group had 38 patients, with asymmetric H1 in 4 cases (10.5%), H2 in 5 (13.1%), V1 in 7 (18.4%), HR in 5 (13.1%) and VR in 1 (2.63%). Group 1 had 55 patients, with asymmetric H1 in 24 cases (43.6%), H2 in 50 (90.9%), V1 in 28 (50.9%), HR in 16 (29.09%) and VR in 8 (14.5%). Comparing both groups, there was statistical significance for H1, H2 and V1 asymmetry (p < 0.001).

Conclusion

In the present paper, we observed the correlation between variation in the acetabular CE angle and asymmetry of the superior hemipelvis. The present authors believe that a better understanding of the pelvic morphologic alterations allows a greater facility in the diagnosis of hip articular deformities.

Keywords
hip dislocation; acetabulum; femur head

Introdução

Existe evidência crescente na literatura da associação de alterações na morfologia óssea da região do quadril e o desenvolvimento de sintomas, além da possibilidade de evolução para degeneração condral articular. Estas alterações podem estar relacionadas ao fêmur, ao acetábulo ou a ambos.11 Gosvig KK, Jacobsen S, Sonne-Holm S, Palm H, Troelsen A. Prevalence of malformations of the hip joint and their relationship to sex, groin pain, and risk of osteoarthritis: a population-based survey. J Bone Joint Surg Am 2010;92(05):1162-1169 No lado acetabular, como alterações morfológicas frequentes pode-se encontrar a sobrecobertura (impacto femoroacetabular [IFA} tipo Pincer) e a deficiência de cobertura (displasia do desenvolvimento do quadril [DDQ]).22 Agricola R, Heijboer MP, Roze RH, et al. Pincer deformity does not lead to osteoarthritis of the hip whereas acetabular dysplasia does: acetabular coverage and development of osteoarthritis in a nationwide prospective cohort study (CHECK). Osteoarthritis Cartilage 2013;21(10):1514-1521,33 Reynolds D, Lucas J, Klaue K. Retroversion of the acetabulum. A cause of hip pain. J Bone Joint Surg Br 1999;81(02):281-288

A sobrecobertura acetabular pode ser global ou focal. Sobrecobertura global é definida na radiografia anteroposterior (AP) de pelve por ângulo centro-borda (CE)44 Cooperman D. What is the evidence to support acetabular dysplasia as a cause of osteoarthritis? J Pediatr Orthop 2013;33(Suppl 1):S2-S7 > 40º associado a excesso de cobertura da cabeça femoral pela parede anterior e posterior do acetábulo.55 Tannast M, Siebenrock KA, Anderson SE. Femoroacetabular impingement: radiographic diagnosis-what the radiologist should know. AJR Am J Roentgenol 2007;188(06):1540-1552 Sobrecobertura focal é definida pela presença de retroversão acetabular, que é uma alteração morfológica na qual há desvio estrutural do acetábulo no plano sagital em direção posterolateral. Radiograficamente, a retroversão acetabular é representada pela presença do sinal do cruzamento das linhas acetabulares.33 Reynolds D, Lucas J, Klaue K. Retroversion of the acetabulum. A cause of hip pain. J Bone Joint Surg Br 1999;81(02):281-288,66 Dora C, Leunig M, Beck M, Simovitch R, Ganz R. Acetabular dome retroversion: radiological appearance, incidence and relevance. Hip Int 2006;16(03):215-222,77 Jamali AA, Mladenov K, Meyer DC, et al. Anteroposterior pelvic radiographs to assess acetabular retroversion: high validity of the "cross-over-sign". J Orthop Res 2007;25(06):758-765 Ambas as alterações têm sido associadas ao impacto dinâmico entre o rebordo acetabular e a transição cabeça-colo femoral, podendo resultar em lesões acetabulares da cartilagem posteroinferior e do lábio, além de dor.88 Murphy RJ, Subhawong TK, Chhabra A, Carrino JA, Armand M, Hungerford M. A quantitative method to assess focal acetabular overcoverage resulting from pincer deformity using CT data. Clin Orthop Relat Res 2011;469(10):2846-2854

Na deficiência de cobertura acetabular, uma área de contato reduzida entre a cabeça femoral e o acetábulo gera força de cisalhamento excessiva na junção condrolabral acetabular, podendo levar ao surgimento de sintomas e degeneração condral em longo prazo. Esta deficiência mais comumente é anterossuperior no acetábulo, e o diagnóstico de DDQ é realizado quando o ângulo CE44 Cooperman D. What is the evidence to support acetabular dysplasia as a cause of osteoarthritis? J Pediatr Orthop 2013;33(Suppl 1):S2-S7 for < 25º em radiografia AP de pelve.44 Cooperman D. What is the evidence to support acetabular dysplasia as a cause of osteoarthritis? J Pediatr Orthop 2013;33(Suppl 1):S2-S7,99 Jacobsen S, Sonne-Holm S. Hip dysplasia: a significant risk fator for the development of hip osteoarthritis. A cross-sectional survey. Rheumatology (Oxford) 2005;44(02):211-218

Alguns autores têm proposto que os distúrbios do desenvolvimento do quadril não afetam somente o fêmur proximal e o acetábulo, como é evidenciado em patologias como IFA e DDQ, mas sim em toda a pelve.11 Gosvig KK, Jacobsen S, Sonne-Holm S, Palm H, Troelsen A. Prevalence of malformations of the hip joint and their relationship to sex, groin pain, and risk of osteoarthritis: a population-based survey. J Bone Joint Surg Am 2010;92(05):1162-1169,1010 Albiñana J, Morcuende JA, Delgado E, Weinstein SL. Radiologic pelvic asymmetry in unilateral late-diagnosed developmental dysplasia of the hip. J Pediatr Orthop 1995;15(06):753-762 Porém, não há consenso sobre quais deformidades ósseas pélvicas correlacionam-se com as alterações morfológicas acetabulares. Os presentes autores acreditam que as alterações estruturais ósseas da pelve e anormalidades acetabulares não são achados isolados, e fazem parte de um continuum de alterações estruturais do desenvolvimento da pelve.

O objetivo do presente trabalho é avaliar a deformidade dos ossos pélvicos e sua correlação com o ângulo CE.

Materiais e Métodos

Foi realizado um estudo prospectivo caso-controle entre agosto de 2014 e abril de 2015. O trabalho obteve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa, e todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento.

Os participantes foram convidados ao estudo voluntariamente. Os critérios de inclusão foram pacientes consecutivos com idade entre 20 e 60 anos. Os critérios de exclusão foram: doença metabólica, cirurgia prévia de quadril ou coluna, radiografia evidenciando artrose de quadril ≥ Tönnis 2, DDQ severa (ângulo CE < 20º),44 Cooperman D. What is the evidence to support acetabular dysplasia as a cause of osteoarthritis? J Pediatr Orthop 2013;33(Suppl 1):S2-S7,99 Jacobsen S, Sonne-Holm S. Hip dysplasia: a significant risk fator for the development of hip osteoarthritis. A cross-sectional survey. Rheumatology (Oxford) 2005;44(02):211-218 sobrecobertura acetabular global (ângulo CE > 40º e/ou índice acetabular < 0º),55 Tannast M, Siebenrock KA, Anderson SE. Femoroacetabular impingement: radiographic diagnosis-what the radiologist should know. AJR Am J Roentgenol 2007;188(06):1540-1552 sinal do cruzamento das linhas acetabulares (sugerindo retroversão acetabular), assimetria de ângulo CE < 5º, deformidades decorrentes de epifisiólise ou Legg-Perthes-Calveé, e radiografia sem qualidade adequada.1111 Clohisy JC, Carlisle JC, Beaulé PE, et al. A systematic approach to the plain radiographic evaluation of the young adult hip. J Bone Joint Surg Am 2008;90(Suppl 4):47-66

Os pacientes selecionados realizaram radiografia de pelve na incidência AP com os pés em 15º de rotação interna, com o tubo a 120 cm de distância do filme e com o raio direcionado ao ponto central entre a borda superior da sínfise púbica e uma linha horizontal conectando ambas as espinhas ilíacas anterossuperiores. A distância entre o cóccix e a sínfise púbica, além do seu alinhamento, foram fatores considerados para avaliar a qualidade das radiografias.1111 Clohisy JC, Carlisle JC, Beaulé PE, et al. A systematic approach to the plain radiographic evaluation of the young adult hip. J Bone Joint Surg Am 2008;90(Suppl 4):47-66

Foram avaliados no estudo radiográfico em ambas as hemipelves: o ângulo CE, índice acetabular (IA), sinal do cruzamento das linhas acetabulares, mensuração do eixo horizontal e vertical da hemipelve superior (asas do ilíaco - H1, H2 e V1), mensuração do eixo horizontal e vertical da hemipelve inferior (ramos ísquio e ílio púbicos - HR e VR). A definição do método para aferição dos eixos pélvicos está exemplificada na Figura 1.

Fig. 1
Exemplificação do método de aferição dos eixos pélvicos bilateralmente. Todas as linhas (H1, H2, V1, HR e VR) têm como referência a linha entre as gotas de lágrima. a) H1 e H2 correspondem à aferição do eixo horizontal da hemipelve superior. Inicialmente é definida uma linha ligando os pontos mais superiores dos tetos acetabulares (linha supra-acetabular). H1 localiza-se 2 cm acima desta; H2 localiza-se 7 cm acima desta. b) V1 corresponde à aferição do eixo vertical da hemipelve superior. É a medida do ponto mais superior do osso ilíaco até a linha supra-acetabular. c) HR corresponde à aferição do eixo horizontal da hemipelve inferior, tendo como referência um ponto médio da articulação da sínfise púbica. d) VR corresponde à aferição do eixo vertical da hemipelve inferior, tendo como referência um ponto médio da aferição HR.

As mensurações do eixo das hemipelves (H1, H2, V1, HR e VR) foram consideradas assimétricas quando, na comparação de uma hemipelve em relação ao lado contralateral, evidenciou-se uma diferença > 5 mm.

Os pacientes selecionados foram separados em dois grupos: controle e grupo 1.

No grupo controle foram incluídos pacientes cujos quadris apresentavam ângulo CE com diferença < 5º, sem sinal do cruzamento das linhas acetabulares. No grupo 1, foram incluídos pacientes com assimetria do ângulo CE ≥ 5º, na comparação de um quadril em relação ao lado contralateral, sem sinal do cruzamento das linhas acetabulares.

O objetivo do presente estudo é avaliar a correlação entre a variação do ângulo CE e a deformidade dos ossos pélvicos (assimetria de H1, H2, V1, HR e/ou VR), comparando-se ambos os grupos.

A hipótese é de que a presença de variação do ângulo CE correlaciona-se com assimetria da hemipelve superior (sugerindo alteração rotacional da hemipelve superior).

Para avaliar a homogeneidade entre os grupos, foi aplicado o teste de qui-quadrado para idade, gênero, ângulo CE e IA. O teste exato de Fisher foi empregado para análise das variáveis qualitativas intergrupos (H1, H2, V1, HR e VR). No presente estudo, as diferenças foram consideradas estatisticamente significantes quando p < 0,05. Foi utilizado o software PASW Statistics for Windows, Version 18.0 (SPSS Inc. Chicago, IL, EUA) na análise estatística. Um total de 50 radiografias foi selecionado randomicamente para aferição do coeficiente κ. Dois autores, Roos B. D. e Lima E. M. U., avaliaram as radiografias em tempos distintos com concordância interobservador de 0,72.

Resultados

O total de pacientes avaliados no período foi de 228 (456 quadris). De acordo com os critérios estabelecidos, foram incluídos no presente estudo 93 pacientes, sendo 49 do sexo masculino e 44 do sexo feminino. Os pacientes excluídos estão representados na Tabela 1. A idade média foi de 39,9 anos (variando de 20 a 60 anos, desvio padrão [DP] = 10,52), e o ângulo CE médio do quadril direito foi de 31,5º (variando de 20º a 40º, DP = 5,30) e do esquerdo foi de 32,3º (variando de 20º a 40º, DP = 5,11). O IA médio foi de 5,14 (variando de 0 a 10, DP = 2,97) no quadril direito e 5,17 (variando de 0 a 10, DP = 3,09) no quadril esquerdo.

Tabela 1
Descrição dos pacientes excluídos no estudo

Um total de 38 pacientes foi incluído no grupo controle, com média das mensurações dos eixos H1, H2, V1, HR e VR representadas na Tabela 2. Com relação à H1, foi constatada aferição assimétrica em 4 casos (10,5%), à H2 em 5 (13,1%), à V1 em 7 (18,4%), à HR em 5 (13,1%), e à VR em 1 caso (2,63%).

Tabela 2
Descrição do valor das aferições H1, H2, V1, HR e VR no grupo controle

No grupo 1, foram incluídos 55 pacientes. A média das mensurações dos eixos H1, H2, V1, HR e VR estão representadas na Tabela 3. Com relação à H1, foi constatada aferição assimétrica em 24 casos (43,6%), à H2 em 50 (90,9%), à V1 em 28 (50,9%), à HR em 16 (29,09%), e à VR em 8 casos (14,5%) (Figura 2).

Tabela 3
Descrição das aferições H1, H2, V1, HR e VR no grupo 1

Fig. 2
Exemplificação de caso do grupo 1. a) Evidencia-se assimetria das aferições do eixo horizontal da hemipelve superior (H1 e H2). b) Evidencia-se assimetria da aferição do eixo vertical da hemipelve superior (V1). c) Evidencia-se simetria das aferições dos eixos horizontal e vertical da hemipelve inferior (HR e VR).

Os grupos foram considerados homogêneos, por não apresentarem diferença com relação a gênero, idade, ângulo CE e IA (p = 0,086). Na comparação entre o grupo controle e o grupo 1 (Tabela 4), observou-se diferença estatisticamente significativa para a assimetria das mensurações H1 (p < 0,001), H2 (p < 0,001) e V1 (p = 0,005). Para as medidas HR e VR, não observou-se diferença estatisticamente significativa (p = 0,082; p = 0,077).

Tabela 4
Descrição dos resultados da comparação das aferições simétricas e assimétricas de H1, H2, V1, HR e VR, nos grupo controle versus grupo 1

Discussão

Existe evidência crescente na literatura da associação de alterações morfológicas ósseas na região do quadril e o desenvolvimento de sintomas, além da possibilidade de evolução para degeneração condral articular. Estas alterações podem estar relacionadas ao fêmur, ao acetábulo ou a ambos.11 Gosvig KK, Jacobsen S, Sonne-Holm S, Palm H, Troelsen A. Prevalence of malformations of the hip joint and their relationship to sex, groin pain, and risk of osteoarthritis: a population-based survey. J Bone Joint Surg Am 2010;92(05):1162-1169 No lado acetabular, como alterações morfológicas frequentes pode-se encontrar a sobrecobertura (IFA) e a deficiência de cobertura (DDQ).22 Agricola R, Heijboer MP, Roze RH, et al. Pincer deformity does not lead to osteoarthritis of the hip whereas acetabular dysplasia does: acetabular coverage and development of osteoarthritis in a nationwide prospective cohort study (CHECK). Osteoarthritis Cartilage 2013;21(10):1514-1521,33 Reynolds D, Lucas J, Klaue K. Retroversion of the acetabulum. A cause of hip pain. J Bone Joint Surg Br 1999;81(02):281-288

Alguns autores têm proposto que os distúrbios do desenvolvimento do quadril não afetam somente o fêmur proximal e o acetábulo, como é evidenciado em patologias como IFA e DDQ, mas sim em toda a pelve.11 Gosvig KK, Jacobsen S, Sonne-Holm S, Palm H, Troelsen A. Prevalence of malformations of the hip joint and their relationship to sex, groin pain, and risk of osteoarthritis: a population-based survey. J Bone Joint Surg Am 2010;92(05):1162-1169,1010 Albiñana J, Morcuende JA, Delgado E, Weinstein SL. Radiologic pelvic asymmetry in unilateral late-diagnosed developmental dysplasia of the hip. J Pediatr Orthop 1995;15(06):753-762 Porém, não há consenso sobre quais deformidades ósseas pélvicas correlacionam-se com alterações morfológicas acetabulares. Os presentes autores acreditam que o melhor entendimento destes dismorfismos pode levar à maior facilidade no diagnóstico das patologias articulares do quadril.

Fujii et al,1313 Fujii M, Nakashima Y, Sato T, Akiyama M, Iwamoto Y. Pelvic deformity influences acetabular version and coverage in hip dysplasia. Clin Orthop Relat Res 2011;469(06):1735-1742 realizaram um trabalho avaliando o alinhamento rotacional no plano axial do osso ilíaco em tomografias computadorizadas (TCs) de pacientes portadores de DDQ, e questionaram: se a deformidade rotacional estava presente na DDQ; se os ângulos de rotação correlacionavam-se com a versão e inclinação acetabulares; e se os ângulos de rotação correlacionavam-se com a região de deficiência do acetábulo. Os resultados evidenciaram que a rotação interna (RI) do terço superior da hemipelve (osso ilíaco cranialmente à espinha iliaca ântero-inferior [EIAI]) correlaciona-se com o diagnóstico de DDQ.1212 Kumeta H, Funayama K, Miyagi S, et al. Inward wing iliumof adult hip dysplasia, a characteristic cross sectional pelvic anatomy visualized by CT. Rinsho Seikeigeka. 1986;21(01):67-75 A RI do osso ilíaco em pacientes portadores de DDQ também foi observada por autores como Kumeta et al1313 Fujii M, Nakashima Y, Sato T, Akiyama M, Iwamoto Y. Pelvic deformity influences acetabular version and coverage in hip dysplasia. Clin Orthop Relat Res 2011;469(06):1735-1742 e Suzuki,1414 Suzuki S. Deformity of the pelvis in developmental dysplasia of the hip: three-dimensional evaluation by means of magnetic resonance image. J Pediatr Orthop 1995;15(06):812-816 e acredita-se que com esta deformidade o acetábulo tende a rodar anterossuperiormente, resultando em diminuição da cobertura anterossuperior e aumento da cobertura posterior.

Também, Fujii et al1212 Kumeta H, Funayama K, Miyagi S, et al. Inward wing iliumof adult hip dysplasia, a characteristic cross sectional pelvic anatomy visualized by CT. Rinsho Seikeigeka. 1986;21(01):67-75 correlacionaram a rotação externa do terço inferior da hemipelve (entre o osso ilíaco e o ramo ísquiopúbico) com retroversão acetabular em pacientes portadores de DDQ. Este achado é corroborado por Kalberer et al,1515 Kalberer F, Sierra RJ, Madan SS, Ganz R, Leunig M. Ischial spine projection into the pelvis : a new sign for acetabular retroversion. Clin Orthop Relat Res 2008;466(03):677-683 que observaram a proeminência da espinha isquiática em pacientes com retroversão do acetábulo.

Estas observações sugerem que alterações estruturais ósseas da pelve e anormalidades acetabulares não são achados isolados, e fazem parte de um continuum de alterações estruturais do desenvolvimento.

No presente trabalho, evidenciou-se correlação entre a variação do ângulo CE e assimetria da hemipelve superior. Assim como Fujii et al,1212 Kumeta H, Funayama K, Miyagi S, et al. Inward wing iliumof adult hip dysplasia, a characteristic cross sectional pelvic anatomy visualized by CT. Rinsho Seikeigeka. 1986;21(01):67-75 podemos constatar que os dismorfismos da hemipelve superior, decorrentes de distúrbios do desenvolvimento ósseo, podem influenciar na morfologia acetabular. Porém, buscamos analisar estes achados em um grupo de pacientes sem DDQ severa (ÂCE < 20º).

Segundo nosso conhecimento, este é o primeiro estudo que busca estabelecer correlações entre dismorfismos pélvicos e variação do ângulo CE, no percentil 90 para ângulo CE da população geral (20–40º).1616 Jacobsen S, Sonne-Holm S, Søballe K, Gebuhr P, Lund B. Hip dysplasia and osteoarthrosis: a survey of 4151 subjects from the Osteoarthrosis Substudy of the Copenhagen City Heart Study. Acta Orthop 2005;76(02):149-158

Conclusão

No presente trabalho, evidenciou-se correlação entre a variação do ângulo CE e assimetria da hemipelve superior. Estes achados sugerem que os dismorfismos da hemipelve superior, decorrentes de distúrbios do desenvolvimento ósseo, podem influenciar na morfologia acetabular.

  • *
    Trabalho feito no Grupo de Quadril do Hospital Ortopédico de Passo Fundo, Faculdade de Medicina da Universidade de Passo Fundo, Passo Fundo, RS, Brasil.

References

  • 1
    Gosvig KK, Jacobsen S, Sonne-Holm S, Palm H, Troelsen A. Prevalence of malformations of the hip joint and their relationship to sex, groin pain, and risk of osteoarthritis: a population-based survey. J Bone Joint Surg Am 2010;92(05):1162-1169
  • 2
    Agricola R, Heijboer MP, Roze RH, et al. Pincer deformity does not lead to osteoarthritis of the hip whereas acetabular dysplasia does: acetabular coverage and development of osteoarthritis in a nationwide prospective cohort study (CHECK). Osteoarthritis Cartilage 2013;21(10):1514-1521
  • 3
    Reynolds D, Lucas J, Klaue K. Retroversion of the acetabulum. A cause of hip pain. J Bone Joint Surg Br 1999;81(02):281-288
  • 4
    Cooperman D. What is the evidence to support acetabular dysplasia as a cause of osteoarthritis? J Pediatr Orthop 2013;33(Suppl 1):S2-S7
  • 5
    Tannast M, Siebenrock KA, Anderson SE. Femoroacetabular impingement: radiographic diagnosis-what the radiologist should know. AJR Am J Roentgenol 2007;188(06):1540-1552
  • 6
    Dora C, Leunig M, Beck M, Simovitch R, Ganz R. Acetabular dome retroversion: radiological appearance, incidence and relevance. Hip Int 2006;16(03):215-222
  • 7
    Jamali AA, Mladenov K, Meyer DC, et al. Anteroposterior pelvic radiographs to assess acetabular retroversion: high validity of the "cross-over-sign". J Orthop Res 2007;25(06):758-765
  • 8
    Murphy RJ, Subhawong TK, Chhabra A, Carrino JA, Armand M, Hungerford M. A quantitative method to assess focal acetabular overcoverage resulting from pincer deformity using CT data. Clin Orthop Relat Res 2011;469(10):2846-2854
  • 9
    Jacobsen S, Sonne-Holm S. Hip dysplasia: a significant risk fator for the development of hip osteoarthritis. A cross-sectional survey. Rheumatology (Oxford) 2005;44(02):211-218
  • 10
    Albiñana J, Morcuende JA, Delgado E, Weinstein SL. Radiologic pelvic asymmetry in unilateral late-diagnosed developmental dysplasia of the hip. J Pediatr Orthop 1995;15(06):753-762
  • 11
    Clohisy JC, Carlisle JC, Beaulé PE, et al. A systematic approach to the plain radiographic evaluation of the young adult hip. J Bone Joint Surg Am 2008;90(Suppl 4):47-66
  • 12
    Kumeta H, Funayama K, Miyagi S, et al. Inward wing iliumof adult hip dysplasia, a characteristic cross sectional pelvic anatomy visualized by CT. Rinsho Seikeigeka. 1986;21(01):67-75
  • 13
    Fujii M, Nakashima Y, Sato T, Akiyama M, Iwamoto Y. Pelvic deformity influences acetabular version and coverage in hip dysplasia. Clin Orthop Relat Res 2011;469(06):1735-1742
  • 14
    Suzuki S. Deformity of the pelvis in developmental dysplasia of the hip: three-dimensional evaluation by means of magnetic resonance image. J Pediatr Orthop 1995;15(06):812-816
  • 15
    Kalberer F, Sierra RJ, Madan SS, Ganz R, Leunig M. Ischial spine projection into the pelvis : a new sign for acetabular retroversion. Clin Orthop Relat Res 2008;466(03):677-683
  • 16
    Jacobsen S, Sonne-Holm S, Søballe K, Gebuhr P, Lund B. Hip dysplasia and osteoarthrosis: a survey of 4151 subjects from the Osteoarthrosis Substudy of the Copenhagen City Heart Study. Acta Orthop 2005;76(02):149-158

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Maio 2020
  • Data do Fascículo
    Mar-Apr 2020

Histórico

  • Recebido
    30 Nov 2018
  • Aceito
    22 Jan 2019
Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia Al. Lorena, 427 14º andar, 01424-000 São Paulo - SP - Brasil, Tel.: 55 11 2137-5400 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbo@sbot.org.br