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Avaliação dos resultados clínicos do tratamento artroscópico de lesões do manguito rotador pela técnica de suture bridge modificada* * Study developed at the Department of Orthopedics and Traumatology, Hospital Alemão Oswaldo Cruz, São Paulo, SP, Brazil.

Resumo

Objetivo

Avaliar os resultados clínicos pós-operatórios do reparo artroscópico de lesões do manguito rotador com uma configuração de sutura desenvolvida por nós a partir de modificação do Suture Bridge (Arthrex, Naples, FL, Estados Unidos).

Métodos

Estudo retrospectivo de 28 pacientes do gênero masculino (41,2%) e 40 do gênero feminino (58,8%), com média de idade de 60 anos. Todos foram submetidos a reparo do manguito rotador com a técnica Suture Bridge modificada e acompanhados por um período mínimo de 18 meses. Os pacientes foram avaliados clinicamente através da Escala de Ombro da University of California, Los Angeles (UCLA).

Resultados

A amplitude de movimento média no pós-operatório foi elevação de 134 ° (variação: 110° a 140°), rotação lateral de 58° (variação: 40° a 70°), e rotação medial de T10 (variação: L4 a T7). O aumento médio de elevação foi de 15°, o de rotação lateral, de 14°, e o de rotação medial, de 2 níveis vertebrais. Os resultados foram considerados excelentes em 61 casos (83,6%) e bons, em 8 (10,9%). Em 4 casos (5,5%), o resultado foi regular.

Conclusão

Os resultados clínicos pós-operatórios do reparo artroscópico de lesões do manguito rotador, pela técnica Suture Bridge modificada, foram excelentes e bons na maioria dos casos (69; 94,5%).

Palavras-chave
cicatrização; isquemia; lesões do manguito rotador; recidiva; técnicas de sutura

Abstract

Objective

To evaluate the postoperative clinical outcomes of the arthroscopic repair of rotator cuff injuries using a suture configuration we have developed based on a modification of the Suture Bridge (Arthrex, Naples, FL, United States).

Methods

A retrospective study with 28 male (41.2%) and 40 female (58.8%) subjects with a mean age of 60 years. All patients underwent rotator cuff repair with the modified Suture Bridge technique and follow-up for a minimum period of 18 months. The clinical assessment was performed using the University of California, Los Angeles (UCLA) Shoulder Score.

Results

The mean postoperative range of motion was of 134° (range: 110° to 140°) for elevation, 58° (range: 40° to 70°) for lateral rotation, and T10 (range: L4 to T7) for medial rotation. The mean increase was of 15° for elevation, 14° for lateral rotation, and 2 vertebral levels for medial rotation. The outcomes were excellent in 61 (83.6%) cases, good in 8 (10.9%), and regular in 4 cases (5.5%).

Conclusion

The modified Suture Bridge technique for the arthroscopic repair of rotator cuff injuries led to excellent or good postoperative clinical outcomes in most cases (69; 94.5%).

Keywords
wound healing; ischemia; rotator cuff injuries; recurrence; suture techniques

Introdução

O conhecimento da anatomia do manguito rotador é acompanhado pela evolução das técnicas de reparo das lesões que nele ocorrem.11 Park MC, Cadet ER, Levine WN, Bigliani LU, Ahmad CS. Tendon-to-bone pressure distributions at a repaired rotator cuff footprint using transosseous suture and suture anchor fixation techniques. Am J Sports Med 2005;33(08):1154-115933 Park MC, Peterson A, Patton J, McGarry MH, Park CJ, Lee TQ. Biomechanical effects of a 2 suture-pass medial inter-implant mattress on transosseous-equivalent rotator cuff repair and considerations for a “technical efficiency ratio”. J Shoulder Elbow Surg 2014;23(03):361-368 Tais técnicas almejam: promover melhor estabilidade biomecânica do reparo, maximizar o contato entre o tendão e o leito ósseo, e permitir uma distribuição uniforme de tensão, o que proporciona um ambiente favorável à cicatrização.44 Park MC, Tibone JE, ElAttrache NS, et al. Part II: Biomechanical assessment for a footprint-restoring transosseous-equivalent rotator cuff repair technique compared with a double-row repair technique. J Shoulder Elbow Surg 2007;16(04):469-47655 Busfield BT, Glousman RE, McGarry MH, Tibone JE, Lee TQ. A Biomechanical Comparison of 2 Technical Variations of Double-Row Rotator Cuff Fixation: The Importance of Medial Row Knots. Am J Sports Med 2008;36(05):901-906

Uma das configurações consagradas de sutura da lesão do manguito rotador (LMR) é a fileira dupla, em que uma ou mais âncoras são colocadas adjacentes à cartilagem articular e as outras, lateralmente. Esta configuração, descrita inicialmente por Lo e Burkhart,66 Lo IK, Burkhart SS. Double-row arthroscopic rotator cuff repair: Re-establishing the footprint of the rotator cuff. Arthroscopy 2003;19(09):1035-1042 não interliga a fileira medial à lateral; consequentemente, não há compressão do tendão contra o leito ósseo,77 Mazzocca AD, Millett PJ, Guanche CA, Santangelo SA, Arciero RA. Arthroscopic single-row versus double-row suture anchor rotator cuff repair. Am J Sports Med 2005;33(12):1861-186888 Hein J, Reilly JM, Chae J, Maerz T, Anderson K. Retear rates after arthroscopic single-row, double-row, and Suture Bridge rotator cuff repair at minimum of one year of imaging follow-up: a systematic review. Arthroscopy 2015;31(11):2274-2281 e isso pode comprometer a cicatrização.22 Quigley RJ, Gupta A, Oh JH, et al. Biomechanical Comparison of Single-Row, Double-Row, and Transosseous-Equivalent Repair Techniques after Healing in na Animal Rotator Cuff Tear Model. J Orthop Res 2013;31(08):1254-126033 Park MC, Peterson A, Patton J, McGarry MH, Park CJ, Lee TQ. Biomechanical effects of a 2 suture-pass medial inter-implant mattress on transosseous-equivalent rotator cuff repair and considerations for a “technical efficiency ratio”. J Shoulder Elbow Surg 2014;23(03):361-36888 Hein J, Reilly JM, Chae J, Maerz T, Anderson K. Retear rates after arthroscopic single-row, double-row, and Suture Bridge rotator cuff repair at minimum of one year of imaging follow-up: a systematic review. Arthroscopy 2015;31(11):2274-228199 Park MC, El Attrache NS, Tibone JE, et al. Part I: Footprint contact characteristics for a transosseous-equivalent rotator cuff repair technique compared with a double-row repair technique. J Shoulder Elbow Surg 2007;16(04):461-468

Diversas modificações dessa técnica foram desenvolvidas com o objetivo de pressionar toda a área mobilizada do tendão à sua zona de inserção.11 Park MC, Cadet ER, Levine WN, Bigliani LU, Ahmad CS. Tendon-to-bone pressure distributions at a repaired rotator cuff footprint using transosseous suture and suture anchor fixation techniques. Am J Sports Med 2005;33(08):1154-115922 Quigley RJ, Gupta A, Oh JH, et al. Biomechanical Comparison of Single-Row, Double-Row, and Transosseous-Equivalent Repair Techniques after Healing in na Animal Rotator Cuff Tear Model. J Orthop Res 2013;31(08):1254-126055 Busfield BT, Glousman RE, McGarry MH, Tibone JE, Lee TQ. A Biomechanical Comparison of 2 Technical Variations of Double-Row Rotator Cuff Fixation: The Importance of Medial Row Knots. Am J Sports Med 2008;36(05):901-906 Essas alterações foram chamadas de sutura “transóssea equivalente”, pois os fios de sutura das âncoras da fileira medial são posicionados sobre a superfície bursal do tendão e, em seguida são tensionados, aproximando-os ao osso, e, então, interligados às âncoras da fileira lateral.

Concomitantemente a essa evolução, tem se teorizado sobre a importância do suprimento sanguíneo para o manguito rotador após o seu reparo.1010 Christoforetti JJ, Krupp RJ, Singleton SB, Kissenberth MJ, Cook C, Hawkins RJ. Arthroscopic suture bridge transosseus equivalent fixation of rotator cuff tendon preserves intratendinous blood flow at the time of initial fixation. J Shoulder Elbow Surg 2012;21(04):523-530 Com o auxílio de angiograma e fluxometria por Doppler-laser, compreendem-se cada vez mais a sua vascularização e fluxo sanguíneo. Apesar da rica rede de anastomose arterial na região muscular, a região tendínea mostra-se mais delicada e predisposta a lesão e hipofluxo, havendo até corredores avasculares.1010 Christoforetti JJ, Krupp RJ, Singleton SB, Kissenberth MJ, Cook C, Hawkins RJ. Arthroscopic suture bridge transosseus equivalent fixation of rotator cuff tendon preserves intratendinous blood flow at the time of initial fixation. J Shoulder Elbow Surg 2012;21(04):523-5301111 Ikemoto RY, Murachovsky J, Nascimento LGP, Bueno RS, Ueno FH, Akita J Junior. Microvascular evaluation of the supraspinatus tendon borders in rotator cuff lesions. Rev Bras Ortop 2007;42(11/12):382-386 A partir destas observações, podemos inferir que uma sutura como a Suture Bridge (SB; Arthrex, Naples, FL, Estados Unidos),1212 Park MC, ElAttrache NS, Ahmad CS, Tibone JE. “Transosseousequivalent” rotator cuff repair technique. Arthroscopy 2006;22 (12):1360.e1-5 na qual os fios que interligam as fileiras se cruzam, pode comprometer a vascularização do tendão e sua cicatrização.

Buscando aprimorar o arsenal terapêutico, o objetivo deste trabalho é avaliar os resultados clínicos pós-operatórios do reparo artroscópico das LMRs, utilizando uma configuração de sutura desenvolvida por nós e a partir de uma modificação da SB. Detalharemos neste artigo tal modificação, denominada Suture Bridge modificada (SBM).

Casuística e Métodos

Realizamos a cirurgia em posição de “cadeira de praia”, sob anestesia geral associada a bloqueio anestésico interescalênico. A primeira etapa é a inspeção artroscópica da articulação, seguida da abordagem do espaço subacromial. Após exploração da lesão, são feitas as mobilizações dos tendões e a cruentização do leito ósseo no tubérculo maior, e, então, repara-se a lesão.

A técnica consiste no uso de pelo menos um ponto de fixação medial, com uma âncora carregada com dois fios na margem articular associada à fixação lateral com uma única âncora de interferência.

Em caso de lesões pequenas e em algumas médias com acometimento apenas do tendão supraespinal, utiliza-se apenas uma âncora medial convencional carregada com dois fios, o que totaliza quatro pontas de fio. Todas as pontas transfixam o tendão no sentido da face articular para a bursal, e, então, são dispostas paralelamente às fibras do tendão e entre si. As pontas centrais são suturadas e formam um ponto de colchoeiro central, o que resulta na aproximação da face articular do tendão ao osso subjacente, ao passo que as pontas periféricas são deixadas livres. Em seguida, as quatro pontas de fio são tracionadas e fixadas na face lateral do tubérculo maior por meio de uma âncora sem fio (de interferência), o que gera um ponto de fixação lateral (Figura 1).

Fig. 1
Suture Bridge modificada (SBM) com uma âncora medial. Exemplo ilustrativo da configuração da técnica de SBM para lesões pequenas e médias.

Nas lesões médias e grandes com acometimento de mais de um tendão, emprega-se técnica similar, e se repetem duas vezes a mesma configuração, com duas âncoras mediais convencionais carregadas com dois fios cada uma, que totalizam dois grupos com quatro pontas de fio cada. Há apenas uma modificação a ser feita: após a realização dos pontos de colchoeiro centrais, uma das pontas é desprezada, de tal modo que as seis pontas de fio remanescentes (três de cada grupo) serão tracionadas até o ponto de fixação lateral. As pontas desprezadas são cortadas, pois na âncora de interferência lateral só há espaço para seis pontas de fio (Figura 2).

Fig. 2
Suture Bridge modificada (SBM) com duas âncoras mediais. Exemplo ilustrativo da configuração da técnica de Suture Bridge modificada para lesões médias e grandes.

Todos os pacientes seguiram regimes de reabilitação similares. Os ombros foram imobilizados com tipoia funcional por quatro a seis semanas, e, então, manteve-se apenas o acompanhamento fisioterapêutico até que se completassem seis meses de reabilitação.

Entre janeiro de 2016 e fevereiro de 2019, foram operados 71 pacientes, 5 com ombros bilaterais, num total de 76 ombros, os quais foram submetidos a tratamento cirúrgico artroscópico por SBM, executada pelos autores.

Desses, foram incluídos os pacientes com LMRs completas pequenas, médias e grandes, segundo a classificação de DeOrio e Cofield,1313 DeOrio JK, Cofield RH. Results of a second attempt at surgical repair of a failed initial rotator-cuff repair. J Bone Joint Surg Am 1984;66(04):563-567 com acometimento do tendão do supra e/ou infraespinal, com ou sem lesão associada do cabo longo do bíceps, submetidos à cirurgia exclusivamente primária por SBM, e com seguimento mínimo de um ano e meio. Os critérios de exclusão foram: acometimento dos demais tendões do manguito rotador e cirurgia prévia no ombro avaliado. Foram excluídos 3 pacientes devido à presença de lesão do tendão do músculo subescapular, e a amostra final totalizou 68 pacientes (73 ombros).

Deste total, 28 eram do gênero masculino (41,2%) e 40, do feminino (58,8%). A média de idade foi de 60 anos, com variação de 44 a 81 anos. Antes dos procedimentos cirúrgicos, os pacientes apresentavam média de movimento de elevação de 119° (variação: 30° a 140° ), 44° (variação: 10° a 60° ) de rotação lateral, e T12 (variação: trocânter a T7) de rotação medial (Tabela 1).

Tabela 1
Comparação entre funções pré e pós-operatórias, estratificadas por ombro, por tipo de movimento, por quantidade de tendões acometidos, por quantidade de âncoras, e pela pontuação na Escala de Ombro da UCLA

No pós-operatório 13 ombros (17,8%) apresentavam pseudoparesia do manguito rotador,1414 Tokish JM, Alexander TC, Kissenberth MJ, Hawkins RJ. Pseudoparalysis: a systematic review of term definition, treatment approaches, and outcomes of management techniques. J Shoulder Elbow Surg 2017;26(06):e177-e187 com média de 72° (variação: 30° a 80°) de elevação, 43° (variação: 10° a 60°) de rotação lateral, e L5 (variação: trocânter a T10) de rotação medial (Tabela 2).

Tabela 2
Amplitude de movimento ativa dos pacientes com pseudoparesia

Em 48 casos (65,8%), utilizamos 2 âncoras (1 medial e 1 lateral), conforme a Figura 1, e, em 25 casos (34,2%), 3 âncoras (2 mediais e 1lateral) (Figura 2).

Os pacientes foram divididos em dois grupos conforme a etiologia da LMR; o grupo I consistiu dos pacientes de etiologia traumática, e o grupo II, degenerativa; eles foram reavaliados segundo a Escala de Ombro da University of California, Los Angeles (UCLA), modificada1515 Ellman H, Hanker G, Bayer M. Repair of rotator cuff. Factors influencing reconstruction. J Bone Joint Surg Am 1986;68(08): 1136-1144 (Figura 3). As amplitudes de movimento (ADMs) ativas foram registradas no pré-operatório e comparadas aos valores registrados no pós-operatório, de acordo os parâmetros da American Academy of Orthopaedic Surgeons (AAOS). No grupo I, houve 4 lesões pequenas, 10 médias, e 6 grandes; já no grupo II, foram observadas 6 lesões pequenas, 30 médias, e 17 grandes.

Fig. 3
Estratificação dos pacientes e casos segundo grupo etiológico e gênero.

Para análise estatística, todos os dados foram avaliados por meio do programa Minitab (Minitab, LLC, State College, PA, Estados Unidos), versão 19. As informações obtidas foram comparadas por meio do teste exato de Fisher e do teste do qui-quadrado (p< 0,05).

Este estudo foi aprovado pela Comissão de Ensino e Pesquisa do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (CAAE: 26308719.0.0000.0070).

Resultados

A ADM média no pós-operatório foi: elevação de 134° (variação: 110° a 140°), rotação lateral de 58° (variação: 40° a 70°) e rotação medial de T10 (variação: L4 a T7). Houve ganho de movimento em todas as direções na maioria dos ombros operados (Tabela 1). O aumento médio de elevação foi de 15°, o de rotação lateral, de 14°, e o de rotação medial, de 2 níveis vertebrais.

Em relação aos grupos, no de etiologia traumática (grupo I), um paciente foi submetido a cirurgia em vigência de capsulite adesiva. Na avaliação final, esse grupo apresentou aumento médio da elevação ativa de 21°, ganho médio de rotação lateral de 10,5°, e ganho médio de rotação medial de 2 níveis vertebrais. A média na Escala de ombro da UCLA foi de 32,4 pontos (variação: 27 a 35 pontos). No grupo II, de etiologia degenerativa, um paciente foi submetido a cirurgia em vigência de capsulite adesiva, assim como outros dois, que a desenvolveram depois. Esse grupo teve aumento médio da elevação ativa de 13,4°, ganho médio de rotação lateral de 13,1°, e ganho médio de rotação medial de 2 níveis vertebrais. A média na Escala de Ombro da UCLA foi de 34,7 pontos (variação: 27 a 35 pontos). Comparando-os, não houve diferença estatística entre os grupos com relação ao gênero (p= 0,101), à idade (p= 0,450), ou ao tamanho da lesão (p= 0,300). Além disso, tampouco houve correlação entre a etiologia e os ganhos nos diferentes movimentos: elevação (p= 0,363), rotação lateral (p= 0,324), e rotação medial (p= 0,134), conforme a Tabela 3.

Tabela 3
Ganho na amplitude de movimento e UCLA por grupo etiológico

Não houve correlação estatisticamente significativa entre a pontuação final na Escala de Ombro da UCLA e as seguintes variáveis: tamanho da lesão (p= 0,452), gênero (p= 0,256), número de âncoras utilizadas (p= 0,163), etiologia (p= 0,839), e faixa etária no momento da cirurgia (p= 1). Tampouco houve correlação estatística entre a faixa etária e o tamanho da lesão (p= 0,941).

Houve correlação estatística significativa entre o tamanho da lesão e a quantidade de âncoras utilizadas (p< 0,005). Nas 23 lesões grandes, foram utilizadas 3 âncoras; nas 10 pequenas, 2 âncoras; já em relação às 40 médias, 2 casos (2,7%) foram tratados com 3 âncoras, ao passo que as 38 restantes (52,1%), com 2 âncoras.

Discussão

A técnica de SB é um reparo que propicia resistência suficiente para a manutenção da sutura e da cicatrização tendínea.11 Park MC, Cadet ER, Levine WN, Bigliani LU, Ahmad CS. Tendon-to-bone pressure distributions at a repaired rotator cuff footprint using transosseous suture and suture anchor fixation techniques. Am J Sports Med 2005;33(08):1154-115933 Park MC, Peterson A, Patton J, McGarry MH, Park CJ, Lee TQ. Biomechanical effects of a 2 suture-pass medial inter-implant mattress on transosseous-equivalent rotator cuff repair and considerations for a “technical efficiency ratio”. J Shoulder Elbow Surg 2014;23(03):361-36855 Busfield BT, Glousman RE, McGarry MH, Tibone JE, Lee TQ. A Biomechanical Comparison of 2 Technical Variations of Double-Row Rotator Cuff Fixation: The Importance of Medial Row Knots. Am J Sports Med 2008;36(05):901-90688 Hein J, Reilly JM, Chae J, Maerz T, Anderson K. Retear rates after arthroscopic single-row, double-row, and Suture Bridge rotator cuff repair at minimum of one year of imaging follow-up: a systematic review. Arthroscopy 2015;31(11):2274-228199 Park MC, El Attrache NS, Tibone JE, et al. Part I: Footprint contact characteristics for a transosseous-equivalent rotator cuff repair technique compared with a double-row repair technique. J Shoulder Elbow Surg 2007;16(04):461-468 Todavia, tal sutura pode predispor à redução do fluxo sanguíneo do tendão, uma vez que os fios não sejam dispostos em paralelo às suas fibras, desrespeitando a microvascularização.22 Quigley RJ, Gupta A, Oh JH, et al. Biomechanical Comparison of Single-Row, Double-Row, and Transosseous-Equivalent Repair Techniques after Healing in na Animal Rotator Cuff Tear Model. J Orthop Res 2013;31(08):1254-126033 Park MC, Peterson A, Patton J, McGarry MH, Park CJ, Lee TQ. Biomechanical effects of a 2 suture-pass medial inter-implant mattress on transosseous-equivalent rotator cuff repair and considerations for a “technical efficiency ratio”. J Shoulder Elbow Surg 2014;23(03):361-3681010 Christoforetti JJ, Krupp RJ, Singleton SB, Kissenberth MJ, Cook C, Hawkins RJ. Arthroscopic suture bridge transosseus equivalent fixation of rotator cuff tendon preserves intratendinous blood flow at the time of initial fixation. J Shoulder Elbow Surg 2012;21(04):523-5301111 Ikemoto RY, Murachovsky J, Nascimento LGP, Bueno RS, Ueno FH, Akita J Junior. Microvascular evaluation of the supraspinatus tendon borders in rotator cuff lesions. Rev Bras Ortop 2007;42(11/12):382-386 Com o intuito de preservar a biologia do tendão e acreditando-se que a cicatrização esteja diretamente relacionada à vascularização do manguito rotador, modificamos a SB de modo a obter a resistência fornecida por este tipo de reparo, sem criar áreas de isquemia em regiões com perfusão já fragilizada. Desse modo, nossa sutura visa manter corredores vasculares que preservam o fluxo sanguíneo, que progride de medial para lateral1616 Dukan R, Ledinot P, Donadio J, Boyer P. Arthroscopic Rotator Cuff Repair With a Knotless Suture Bridge Technique: Functional and Radiological Outcomes After a Minimum Follow-Up of 5 Years. Arthroscopy 2019;35(07):2003-2011 (Figura 4).

Fig. 4
Fluxo sanguíneo após o reparo tendíneo. Imagem esquemática que mostra (A) manguito rotador reparado com técnica de Suture Bridge (linhas azuis) e regiões de isquemia delimitadas pelas áreas em vermelho; (B) manguito rotador reparado com técnica SBM (linhas azuis) com corredores vasculares e fluxo sanguíneo preservados (setas vermelhas).

Em uma revisão sistemática, Hein et al.88 Hein J, Reilly JM, Chae J, Maerz T, Anderson K. Retear rates after arthroscopic single-row, double-row, and Suture Bridge rotator cuff repair at minimum of one year of imaging follow-up: a systematic review. Arthroscopy 2015;31(11):2274-2281 avaliaram as taxas de rerrotura comparando 3 técnicas, e encontraram um total de 26% de falhas para fileira simples, 21% para fileira dupla, e 21% para SB. Esse estudo88 Hein J, Reilly JM, Chae J, Maerz T, Anderson K. Retear rates after arthroscopic single-row, double-row, and Suture Bridge rotator cuff repair at minimum of one year of imaging follow-up: a systematic review. Arthroscopy 2015;31(11):2274-2281 incluiu 2.048 ombros, e os autores mostraram que, em números absolutos, a fileira dupla apresentou menos casos de complicação do que a SB nas lesões pequenas, médias e grandes. No entanto, as taxas de rerrotura foram menores na SB apenas nas lesões extensas. Segundo Bedeir et al.1717 Bedeir YH, Jimenez AE, Grawe B. Recurrent tears of the rotator cuff: Effect of repair technique and management options. Orthop Rev (Pavia) 2018;10(02):7593, caso não haja mobilidade tendínea adequada nas lesões extensas, a lesão não é reduzida anatomicamente à sua zona de inserção, mesmo submetendo o coto tendíneo a tração exagerada. Por outro lado, nas lesões menores, o reparo é possível mesmo com a soltura inadequada, mantendo-se o tecido tensionado a cargas suprafisiológicas e reinserindo-o no osso, o que predispõe a uma construção pouco biológica e pode causar maior isquemia.22 Quigley RJ, Gupta A, Oh JH, et al. Biomechanical Comparison of Single-Row, Double-Row, and Transosseous-Equivalent Repair Techniques after Healing in na Animal Rotator Cuff Tear Model. J Orthop Res 2013;31(08):1254-12601717 Bedeir YH, Jimenez AE, Grawe B. Recurrent tears of the rotator cuff: Effect of repair technique and management options. Orthop Rev (Pavia) 2018;10(02):7593 Já do ponto de vista clínico, numa meta-análise, Ren et al.1818 Ren YM, Zhang HB, Duan YH, Sun YB, Yang T, Tian MQ. Comparison of arthroscopic suture-bridge technique and double-row technique for treating rotator cuff tears: A PRISMA meta-analysis. Medicine (Baltimore) 2019;98(20):e15640 demonstraram superioridade na pontuação da Escala de Ombro da UCLA nos pacientes submetidos ao reparo com SB em comparação aos reparados com fileira dupla.

Assim como os ótimos resultados funcionais encontrados na literatura em relação à SB,1818 Ren YM, Zhang HB, Duan YH, Sun YB, Yang T, Tian MQ. Comparison of arthroscopic suture-bridge technique and double-row technique for treating rotator cuff tears: A PRISMA meta-analysis. Medicine (Baltimore) 2019;98(20):e156402121 Kim KC, Shin HD, Lee WY, Yeon KW, Han SC. Clinical outcomes and repair integrity of arthroscopic rotator cuff repair using suturebridge technique with or without medial tying: prospective comparative study. J Orthop Surg Res 2018;13(01):212 os pacientes incluídos neste trabalho apresentaram excelente evolução no aspecto clínico (Escala de Ombro da UCLA = 34 pontos), com ganho de ADM em comparação ao pré-operatório, tanto em lesões traumáticas quanto degenerativas. Tal resultado também é descrito na literatura para outros tipos de reparo. Abechain et al.2222 Abechain JJK, Godinho GG, Matsunaga FT, Netto NA, Daou JP, Tamaoki MJS. Functional outcomes of traumatic and non-traumatic rotator cuff tears after arthroscopic repair. World J Orthop 2017;8(08):631-637 compararam os resultados clínicos após reparo artroscópico entre dois grupos, de lesões traumáticas e não traumáticas, avaliaram pacientes com idades similares às dos nossos (grupo traumático: média de idade 59 anos; grupo não traumático: média de 59,5 anos), e obtiveram resultados semelhantes em ambos os grupos, independentemente de sua etiologia, assim como observado neste estudo.

Também verificamos resultados satisfatórios nos pacientes que apresentavam pseudoparesia previamente à abordagem cirúrgica, com reversão em todos os casos. Com resultado similar em um estudo prévio, Miyazaki et al.1919 Miyazaki AN, Santos PD, Sella GD, Checchia CS, Salata TR, Checchia SL. Evaluation of the functional results after rotator cuff arthroscopic repair with the suture bridge technique. Rev Bras Ortop 2017;52(02):164-168 avaliaram a evolução de pacientes com LMRs grandes e extensas, associadas a pseudoparesia, submetidos a reparo artroscópico. Foi observada melhora funcional na quase totalidade dos pacientes operados (37 de 38 pacientes). Desse modo, podemos inferir que a SBM também é uma sutura estável e resistente, que proporciona resultados similares aos de outros reparos já descritos.1919 Miyazaki AN, Santos PD, Sella GD, Checchia CS, Salata TR, Checchia SL. Evaluation of the functional results after rotator cuff arthroscopic repair with the suture bridge technique. Rev Bras Ortop 2017;52(02):164-168

Podemos dizer que, como evolução desfavorável, houve 4 pacientes com resultado funcional regular (Escala de Ombro da UCLA = 27 pontos). Dois destes pacientes foram submetidos a cirurgia em vigência de capsulite adesiva, e outros dois desenvolveram-na após o procedimento. Todos apresentavam lesões médias, e foram submetidos a reparo com duas âncoras (Figura 1). Os casos operados em vigência de capsulite adesiva foram submetidos a capsulotomias anterior e inferior, e, assim como os demais casos que desenvolveram a doença no decorrer da evolução após a cirurgia, foram submetidos a bloqueio anestésico do nervo supraescapular a cada 14 dias subsequentemente, no decorrer de 5 meses a 1 ano (média de 7,75 meses). Apesar da pontuação de 27 na Escala de Ombro da UCLA, ao final da série de bloqueios anestésicos, todos apresentaram pontuação de 35. A capsulite adesiva foi apenas uma intercorrência do tratamento, que felizmente não interferiu negativamente nem na função final dos pacientes, nem na sutura em si.

Não faz parte da nossa rotina ambulatorial pós-operatória solicitar exames de imagem, como a ressonância magnética. No entanto, com o intuito de saber se houve ou não adesão do tendão à sua zona de inserção, solicitamos de forma aleatória esse método de imagem em seis casos, e verificamos em todos eles a ocorrência da cicatrização e integração tendínea no osso, assim como da manutenção da SBM (Figura 5).

Fig. 5
Cicatrização do tendão no osso. Imagens de ressonância magnética do ombro direito do paciente número 51; (A) imagem pré-operatória em coronal ponderada em T2, que mostra lesão tendinosa (seta vermelha); (B) imagem em coronal ponderada em T2, 18 meses após a cirurgia, que mostra cicatrização da lesão (seta vermelha).

Apesar dos resultados promissores com baixo número de complicações, ausência de rerroturas e melhora funcional da quase totalidade dos pacientes, temos que ponderar os seguintes fatores como falhas em nosso trabalho: casuística pequena, seguimento curto, e ausência de grupo de controle.

Conclusão

Os resultados clínicos pós-operatórios do reparo artroscópico de LMRs pela técnica de SBM foram excelentes e bons na maioria (94,5%) dos casos, quando avaliados pela Escala de Ombro da UCLA após 1 ano e meio de acompanhamento.

  • Suporte Financeiro
    O presente trabalho foi realizado com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior — Brasil (CAPES) — Código de Financiamento 001.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Jan 2023
  • Data do Fascículo
    Nov-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    24 Abr 2021
  • Aceito
    18 Fev 2022
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