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Dedo em gatilho ou tenossinovite de De Quervain após tratamento cirúrgico da síndrome do túnel do carpo* * Trabalho desenvolvido no Departamento de Ortopedia e Anestesiologia, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo (HC-FMRP-USP), Ribeirão Preto, SP, Brasil

Resumo

Objetivo

Avaliar o tratamento cirúrgico aberto da síndrome do túnel do carpo como fator de risco para o desenvolvimento das tenossinovites estenosantes formadoras do dedo em gatilho e da doença de De Quervain.

Materiais e Métodos

Estudo retrospectivo com análise dos prontuários de pacientes submetidos a liberação cirúrgica aberta da síndrome do túnel do carpo entre 2010 e 2021 em hospital de níveis secundário e terciário. Os seguintes dados foram coletados: histórico patológico, tempo de acompanhamento após o tratamento cirúrgico da síndrome do túnel do carpo, desenvolvimento de dedo em gatilho ou tenossinovite de De Quervain, dedos acometidos, e tempo decorrido entre o fim da cirurgia e o aparecimento dos sintomas.

Resultados

Foram avaliados 802 pacientes de ambos os sexos com média de idade de 50,1 (±12,6) anos. O tempo médio de seguimento foi de 13 (±16,4) meses. O tempo médio de desenvolvimento de dedo em gatilho foi de 61,4 meses, e o da doença de De Quervain, de 73,7 meses. A incidência de desenvolvimento da doença de De Quervain foi de 4,12% e a de dedo em gatilho, de 10,2%. Os dedos mais acometidos foram o polegar (47,6%), o médio (24,4%) e o anular (8,54%). A idade foi único fator que demonstrou associação com o risco de desenvolvimento de dedo em gatilho, com aumento de 2% a cada ano a mais de idade.

Conclusão

As taxas de incidência de desenvolvimento de doença de De Quervain (4,12%) e de dedo em gatilho (10,2%) após tratamento cirúrgico da síndrome do túnel do carpo foram semelhantes às descritas na literatura. Apenas a idade se apresentou como fator influenciador no desenvolvimento de dedo em gatilho.

Palavras-chave
síndrome do túnel do carpo; dedo em gatilho; doença de De Quervain

Abstract

Objective

To evaluate the open surgical treatment for carpal tunnel syndrome as a risk factor for the development of stenosing tenosynovitis that results in trigger finger and De Quervain disease.

Materials and Methods

A retrospective study analyzing the medical records of patients submitted to open surgical release of carpal tunnel syndrome between 2010 and 2021 in a secondary- and tertiary-level hospital. The following data were collected: pathological history, duration of the follow-up after the surgical treatment for carpal tunnel syndrome, development of trigger finger or De Quervain tenosynovitis, affected fingers, and the interval between the end of surgery and symptom onset.

Results

We evaluated 802 patients of both genders and with a mean age of 50.1 (±12.6) years. The mean follow-up was of 13 (±16.4) months. The mean time until the development of trigger finger was of 61.4 months, and of 73.7 months for De Quervain disease. The incidence of development of De Quervain disease was of 4.12%, and for trigger finger it was of 10.2%. The most affected digits were the thumb (47.6%), the middle (24.4%), and the ring finger (8.54%). Age was the only factor that showed an association with the risk of developing trigger finger, with an increase of 2% for each increase in age of 1 year.

Conclusion

The incidence rates for the development of De Quervain disease (4.12%) and trigger finger (10.2%) after the surgical treatment for carpal tunnel syndrome were like those described in the literature. Only age was a factor that influenced the development of trigger finger.

Keywords
carpal tunnel syndrome; trigger finger; De Quervain disease

Introdução

A síndrome do túnel do carpo (STC) é a patologia de compressão de nervo periférico mais comum, com uma prevalência de 3,8%.11 Atroshi I, Gummesson C, Johnsson R, Ornstein E, Ranstam J, Rosén I. Prevalence of carpal tunnel syndrome in a general population. JAMA 1999;282(02):153–158 A compressão do nervo mediano ocorre no nível do punho devido ao aumento de pressão no túnel osteofibroso.22 Lin FY, Wu CI, Cheng HT. Coincidence or complication? A systematic review of trigger digit after carpal tunnel release. J Plast Surg Hand Surg 2018;52(02):67–73 O procedimento para descompressão do túnel do carpo é comum na especialidade de cirurgia da mão, e envolve abertura do ligamento transverso do carpo, o que aumenta o espaço do túnel.33 Verdugo RJ, Salinas RA, Castillo JL, Cea JG. Surgical versus non-surgical treatment for carpal tunnel syndrome. Cochrane Database Syst Rev 2008;2008(04):CD001552

Por sua vez, o dedo em gatilho é caracterizado por dor e nódulo palpável no nível da polia A1, que clinicamente se apresenta como um travamento dos tendões flexores na tentativa de movimentar o dedo.44 Ryzewicz M, Wolf JM. Trigger digits: principles, management, and complications. J Hand Surg Am 2006;31(01):135–146 A doença de De Quervain é uma tenossinovite estenosante do primeiro compartimento extensor, que contém os tendões do abdutor longo e extensor curto do polegar. Clinicamente, se apresenta com dor no lado radial do punho associada a edema e desconforto à palpação do primeiro compartimento dorsal.55 Ippolito JA, Hauser S, Patel J, Vosbikian M, Ahmed I. Nonsurgical Treatment of De Quervain Tenosynovitis: A Prospective Randomized Trial. Hand (N Y) 2020;15(02):215–219

A presença de dedo em gatilho associado a STC sugere a possibilidade de um processo patológico em comum.66 Kumar P, Chakrabarti I. Idiopathic carpal tunnel syndrome and trigger finger: is there an association? J Hand Surg Eur Vol 2009; 34(01):58–59 Entretanto, a associação entre descompressão do túnel do carpo e desenvolvimento de dedo em gatilho ainda não está bem estabelecida.77 Hombal JW, Owen R. Carpal tunnel decompression and trigger digits. Hand 1970;2(02):192–196

Diante disso, um número considerável de trabalhos77 Hombal JW, Owen R. Carpal tunnel decompression and trigger digits. Hand 1970;2(02):192–1961010 Kim JH, Gong HS, Lee HJ, Lee YH, Rhee SH, Baek GH. Pre- and postoperative comorbidities in idiopathic carpal tunnel syndrome: cervical arthritis, basal joint arthritis of the thumb, and trigger digit. J Hand Surg Eur Vol 2013;38(01):50–56 conseguiu identificar a incidência das estenoses da primeira polia, bem como o tempo médio de aparecimento dos sintomas em pacientes submetidos a descompressão cirúrgica do nervo mediano no punho, com valores que oscilam entre 5,2% e 31,7% e 4 a 6 meses, respectivamente.

Já no âmbito do surgimento de tenossinovite estenosante do primeiro compartimento extensor, números bem inferiores foram encontrados, com incidência aproximada de 0,5% após liberação cirúrgica do ligamento transverso do carpo.1111 Stahl S, Kanter Y, Karnielli E. Outcome of trigger finger treatment in diabetes. J Diabetes Complications 1997;11(05):287–290

Este estudo avaliou o tratamento cirúrgico aberto de STC como fator de risco para o desenvolvimento das tenossinovites estenosantes formadoras do dedo em gatilho e da doença de De Quervain.

Métodos

Este trabalho foi aprovado pelo comitê de ética da nossa instituição (CAAE- 45203921.0.0000.5440).

Realizou-se um estudo transversal retrospectivo dos pacientes submetidos a tratamento cirúrgico do tipo aberto para STC em um hospital de nível secundário e terciário.

Todos os pacientes selecionados foram operados entre janeiro de 2010 e dezembro de 2020, à exceção dos tratados previamente para dedo em gatilho ou doença de De Quervain, ou daqueles com diagnóstico concomitante à cirurgia para a STC, sendo esses os únicos critérios de exclusão.

A partir da análise dos prontuários dos pacientes, foram coletadas informações sociodemográficas, como idade, sexo, histórico patológico, tempo de acompanhamento após o tratamento cirúrgico da STC, desenvolvimento de dedo em gatilho ou tenossinovite de De Quervain após a liberação aberta do ligamento transverso do carpo, dedos acometidos, e tempo decorrido entre o fim da cirurgia e o aparecimento dos sintomas.

Análise Estatística

Realizou-se uma análise exploratória por medidas de resumo de dados (frequência, porcentagem, média, desvio padrão, mínimo, mediana e máximo). Os fatores associados ao tempo até o desenvolvimento das doenças após o tratamento cirúrgico da STC foram analisados por meio da regressão de Cox.

A análise de sobrevivência foi utilizada para estudar o tempo até o desenvolvimento do dedo em gatilho e tenossinovite de De Quervain após tratamento cruento de compressão do nervo mediano no punho, porém alguns pacientes não desenvolveram nenhuma das doenças, e foram censurados.

A regressão de Cox ou modelo de riscos proporcionais modela a taxa de falha entre as covariáveis, e a interpretação dos coeficientes dá-se pelo risco relativo (RR). No caso deste estudo, o objetivo foi modelar a taxa de desenvolvimento da doença em relação à idade e às patologias isoladas.

O nível de significância adotado foi de 5%.

Resultados

No total, foram coletados os dados de 873 pacientes, sendo excluídos 71 deles (8,13%) por terem diagnóstico de dedo em gatilho e/ou tenossinovite de De Quervain concomitante à STC.

Desta forma, foram selecionados 802 pacientes de ambos os sexos com idades entre 5 e 89 anos. A Tabela 1 apresenta a idade em anos, o tempo de acompanhamento, e o tempo até o desenvolvimento das patologias após a liberação cirúrgica do ligamento transverso do carpo, sendo os dois últimos em meses. A média de idade encontrada foi de 50,1 anos; o tempo de acompanhamento médio foi de 13 meses, e o tempo médio até o aparecimento da doença de De Quervain e do dedo em gatilho foi de 11,6 meses.

Tabela 1
Médias, medianas e desvios padrão de idade, tempo de acompanhamento ambulatorial e surgimento das patologias após tratamento cirúrgico de síndrome do tunel do carpo

A Tabela 2 demonstra as variáveis de sexo e lado acometido. Houve predominância do sexo feminino na população inicial submetida ao tratamento cirúrgico (87%), e o lado mais acometido foi o direito (55,2%).

Tabela 2
Distribuição do sexo e lado acometido em termos de frequência e porcentagem

Em relação ao histórico patológico no momento da cirurgia, houve maior prevalência de hipertensão arterial sistêmica (HAS; 29,7%), tabagismo (12,8%) e de diabetes melito tipo 2 (DM2; 11,1%) (Fig. 1).

Fig. 1
Distribuição das patologias pregressas em termos de frequência e porcentagem.

A incidência de desenvolvimento das tenossinovites após o tratamento cirúrgico foi de 4,12% para a doença de De Quervain e de 10,2% para o dedo em gatilho (Fig. 2).

Fig. 2
Distribuição, em termos de frequência e porcentagem, do desenvolvimento de tenossinovite de De Quervain e de dedo em gatilho após tratamento cirúrgico da síndrome do túnel do carpo (STC).

No que se refere à distribuição dos dedos acometidos por gatilho após a cirurgia (Tabela 3), houve maior incidência para o polegar, tanto isolado (47,6%) quanto em conjunto outros dedos (52,48%). O segundo dedo mais acometido foi o médio, com valor de 24,4% isolado e de 36,6% associado a outros dedos. O terceiro dedo mais acometido foi o anular, sendo isolado em 8,54% e em conjunto com outros dedos em 14,64%. A combinação de dedos mais acometidos foi a dos dedos médio e anular: 6,1%.

Tabela 3
Distribuição, em termos de frequência e porcentagem, dos dedos acometidos por gatilho após tratamento cirúrgico de síndrome do túnel do carpo

A Fig. 3 apresenta as curvas de Kaplan-Meier para a probabilidade de desenvolvimento da tenossinovite de De Quervain após a cirurgia ao longo do acompanhamento; após a análise de dados censurados, o tempo médio foi de 73,7 (±2,08) meses, e a probabilidade de desenvolvimento da doença em 12, 24, 36, 48 e 60 meses foi de 5,5%, 10,5%, 11,5%, 13,5% e 13,5% respectivamente.

Fig. 3
Curvas de Kaplan-Meier para a probabilidade de desenvolver doença de De Quervain após tratamento cirúrgico de STC. Abreviaturas: Prob., probabilidade; Desenv., desenvolvimento. Nota: São exibidos os valores das estimativas e respectivos intervalos de confiança para o P25, a mediana e o P75 do tempo de sobrevida por meio da função “quantile”.

A Fig. 4 apresenta as curvas de Kaplan-Meier para a probabilidade de desenvolvimento dedo em gatilho após a cirurgia ao longo do acompanhamento; após a análise de dados censurados, o tempo médio foi de 61,4 (±2,37) meses, e a probabilidade de desenvolvimento da doença em 12, 24, 36, 48 e 60 meses foi 11,9%, 23,6%, 26,5%, 29,5% e 31,9%, respectivamente.

Fig. 4
Curvas de Kaplan-Meier para a probabilidade de desenvolver dedo em gatilho após tratamento cirúrgico de STC ao longo do tempo. Abreviaturas: Prob., probabilidade; Desenv., desenvolvimento. Nota: São exibidos os valores das estimativas e respectivos intervalos de confiança para o P25, a mediana e o P75 do tempo de sobrevida por meio da função “quantile”.

Utilizou-se a regressão de Cox simples para avaliar a influência da idade, do sexo e das patologias isoladas no risco de desenvolvimento das duas doenças (Tabela 4). Nenhuma dessas variáveis esteve individualmente associada ao risco de desenvolvimento da doença de De Quervain após o tratamento da STC. Em relação ao dedo em gatilho, notou-se que o aumento em 1 ano na idade aumenta o risco de dedo em gatilho em 2%. Não foi possível estimar o modelo para cardiopatia no desfecho doença de De Quervain, pois nenhum dos pacientes que desenvolveram essa doença apresentou cardiopatia.

Tabela 4
Regressão de Cox para avaliar os fatores associados à doença de De Quervain e ao dedo em gatilho após tratamento cirúrgico da síndrome do túnel o carpo

Para cada doença, também foi calculado o modelo múltiplo (multivariado) com a idade, o sexo e as patologias. Considerando o desfecho doença de De Quervain, nenhuma variável ficou no modelo, ou seja, a idade, o sexo e as patologias não influenciam individualmente (como visto na Tabela 4) o risco de desenvolvimento dessa doença após liberação aberta do ligamento transverso do carpo, nem se estiverem presentes em conjunto. No modelo para dedo em gatilho após a cirurgia para STC, a única variável que ficou foi a idade, ou seja, o sexo do paciente ou fato de ele apresentar qualquer uma das patologias não aumenta o risco de desenvolver a doença.

A Fig. 5 mostra a curva de Kaplan-Meier com a probabilidade de desenvolvimento de dedo em gatilho após tratamento cirúrgico da STC ao longo do tempo em dois grupos de idade; os grupos foram separados pela mediana (50 anos), e notou-se que a probabilidade de desenvolvimento dessa doença foi maior no grupo com mais de 50 anos.

Fig. 5
Curva de Kaplan-Meier para a probabilidade de desenvolver dedo em gatilho após tratamento cirúrgico de STC ao longo do tempo por idade. Abreviaturas: Prob., probabilidade; Desenv., desenvolvimento.

Discussão

O estudo de Hombal e Owen77 Hombal JW, Owen R. Carpal tunnel decompression and trigger digits. Hand 1970;2(02):192–196 identificou uma incidência de 22% de dedo em gatilho em pacientes submetidos a descompressão do túnel do carpo. A média de aparecimento dos sintomas foi de quatro a seis semanas, sendo o polegar, o anular e o dedo médio os mais acometidos. Segundo esses autores,77 Hombal JW, Owen R. Carpal tunnel decompression and trigger digits. Hand 1970;2(02):192–196 a abertura do ligamento transverso do carpo possibilita um efeito tipo corda de arco nos tendões flexores, que aumenta a tensão nas polias proximais.

Hayashi et al.88 Hayashi M, Uchiyama S, Toriumi H, Nakagawa H, Kamimura M, Miyasaka T. Carpal tunnel syndrome and development of trigger digit. J Clin Neurosci 2005;12(01):39–41 encontraram uma associação de 31,7% entre o desenvolvimento de dedo em gatilho e o tratamento cirúrgico da STC. O tempo médio de ocorrência foi de 5,6 meses, sendo o polegar o dedo mais acometido. Nesse estudo,88 Hayashi M, Uchiyama S, Toriumi H, Nakagawa H, Kamimura M, Miyasaka T. Carpal tunnel syndrome and development of trigger digit. J Clin Neurosci 2005;12(01):39–41 os pesquisadores excluíram pacientes com DM, artrite reumatoide, e insuficiência renal crônica dialítica. Segundo Goshtasby et al.,99 Goshtasby PH, Wheeler DR, Moy OJ. Risk factors for trigger finger occurrence after carpal tunnel release. Hand Surg 2010;15(02): 81–87 a incidência de desenvolvimento de dedo em gatilho em pacientes com doenças crônicas submetidos a cirurgia na mão foi de 6,3%. O tempo de aparecimento foi de 4 meses em média, e o polegar foi o dedo mais acometido (48,3%), seguido pelos dedos médio e indicador.

Após uma revisão sistemática, Lin et al.22 Lin FY, Wu CI, Cheng HT. Coincidence or complication? A systematic review of trigger digit after carpal tunnel release. J Plast Surg Hand Surg 2018;52(02):67–73 encontraram uma média de prevalência de dedo em gatilho após liberação do túnel do carpo de 8,5%, e uma incidência que variava de 5,2% a 31,7%. Somado a isso, o desenvolvimento do dedo em gatilho pode ser diagnosticado durante a evolução da STC. O tempo de evolução até o diagnóstico de dedo em gatilho após liberação do túnel do carpo foi de até seis meses. O dedo mais comumente afetado foi o polegar, com incidência reportada de até 50%.1010 Kim JH, Gong HS, Lee HJ, Lee YH, Rhee SH, Baek GH. Pre- and postoperative comorbidities in idiopathic carpal tunnel syndrome: cervical arthritis, basal joint arthritis of the thumb, and trigger digit. J Hand Surg Eur Vol 2013;38(01):50–56

Para pacientes previamente submetidos a tratamento cirúrgico de STC, este estudo encontrou valor compatível com os da literatura para a incidência de dedo em gatilho (10,2%); valor esse aproximadamente 5 vezes superior à incidência relatada na literatura para pacientes não diabéticos (2,2%).1111 Stahl S, Kanter Y, Karnielli E. Outcome of trigger finger treatment in diabetes. J Diabetes Complications 1997;11(05):287–290 Tal discrepância chama a atenção para uma possível correlação positiva entre o surgimento do engatilhamento secundário à abordagem terapêutica cruenta.

O tempo médio até o desenvolvimento observado foi maior do que o previamente relatado (61,3 meses), e o dedo mais comumente acometido foi o polegar (47,6%), seguido pelos dedos médio (24,4%) e anular (8,54%). A associação mais comum entre os dedos foi a do dedo médio e do anular com incidência de 6,1%, seguida pela do polegar e do dedo médio (3,66%) e pela do indicador e do dedo médio (2,44%).

A única variável que demonstrou ter efeito sobre o desenvolvimento de dedo em gatilho após liberação cirúrgica aberta de STC foi a idade (p = 0,012). Demonstrou-se que o aumento em um ano na idade aumenta o risco de dedo em gatilho em 2%. Cabe o questionamento se o incremento dessa incidência é consequente ao tempo pós-operatório ou ao aumento natural da prevalência com o envelhecimento.

Ainda no âmbito cronológico da questão, observamos que os tempos médios de desenvolvimento das tenossinovites se mostraram muito superiores à média de treze meses de seguimento dos pacientes avaliados no estudo, o que nos leva a pensar se trabalhos com acompanhamentos mais longos podem trazer resultados diferentes.

No âmbito da presença de patologias pregressas e do sexo do paciente, não se observou influência no desenvolvimento de dedo em gatilho.

Em relação à incidência de tenossinovite de De Quervain, a literatura menciona taxa de 0,5%. Para King et al.,1212 King BA, Stern PJ, Kiefhaber TR. The incidence of trigger finger or de Quervain's tendinitis after carpal tunnel release. J Hand Surg Eur Vol 2013;38(01):82–83 a liberação do ligamento transverso do carpo não é fator de risco para o desenvolvimento de tenossinovite de De Quervain.

Já a incidência encontrada neste estudo para o desenvolvimento de doença de De Quervain foi de 4,12%, taxa substancialmente superior à relatada em textos científicos e à incidência global da doença, que varia de 0,5% a 1,3%.1313 Vasconcelos BM, Alves Rezende LGR, Chamon HG, Vilela LH. Efetividade da infiltração de corticosteroides no tratamento de pacientes com tenossinovite estenosante de De Quervain: resultado terapêutico. Arch Health Invest 2019;8(05):245–250 A origem dessa dessemelhança acaba por ser difícil de se determinar pela dificuldade em identificar os pacientes com quadros de tenossinovite estenosante do primeiro compartimento em estágios iniciais e assintomáticos ou pouco sintomáticos, que podem ter se submetido ao tratamento da compressão no túnel do carpo sem conhecimento prévio dessa comorbidade.

O tempo médio de desenvolvimento dessa tenossinovite foi de 73,7 meses, e não há trabalhos em língua inglesa ou portuguesa para comparação com essa variável.

Conclusão

A incidência de dedo em gatilho após liberação cirúrgica aberta da STC encontrada (10,2%) foi equivalente aos valores já descritos na literatura, e a incidência encontrada (4,12%) para o desenvolvimento de doença de De Quervain nas mesmas condições foi destacadamente superior à relatada na literatura, mas sem aparente associação entre o tratamento e o fenômeno.

Não foi observada relação com o sexo e com as comorbidades avaliadas para ambas as tenossinovites, sendo a idade a única variável que afetou os valores de incidência de dedo em gatilho.

  • Suporte Financeiro
    Os autores declaram que não receberam apoio financeiro de fontes públicas, comerciais, ou sem fins lucrativos.
  • *
    Trabalho desenvolvido no Departamento de Ortopedia e Anestesiologia, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo (HC-FMRP-USP), Ribeirão Preto, SP, Brasil

Agradecimentos

Ao Dr. Tardelli Lapaz da Silva Prudêncio,mídico residente egresso do Programa de Cirurgia da Mão do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Out 2023
  • Data do Fascículo
    Jul-Aug 2023

Histórico

  • Recebido
    25 Jan 2022
  • Aceito
    12 Set 2022
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