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Editorial

EDITORIAL

Identidade de um periódico consolidado na atual sociedade da informação

Tereza Cristina Cavalcanti Ferreira de Araujo

Editora

Hoje que a tarde é calma e o céu tranqüilo,

E a noite chega sem que eu saiba bem,

Quero considerar-me e ver aquilo

Que sou, e o que sou o que é que tem.

(...) Serei eu, porque todo o pensamento

Podendo conceber, bem pode ser,

Um dilatado e múrmuro momento,

De tempos-seres de quem sou o viver?

Fernando Pessoa

Ao longo de quase duas décadas, o projeto editorial de Psicologia: Teoria e Pesquisa cresceu e se consolidou em meio às dificuldades da editoração brasileira, principalmente de natureza financeira, e às importantes mudanças no âmbito da comunicação científica resultantes da incorporação de novas tecnologias próprias da sociedade da informação. Destinado a constituir-se como um periódico generalista da área de Psicologia e ciências afins, manteve seu propósito e continua a oferecer um panorama da evolução dos conhecimentos gerados pela pesquisa e intervenção psicológicas no Brasil e no exterior em suas diferentes sub-áreas. Ao mesmo tempo, em resposta aos imperativos da atualidade, diversificou sua identidade ao integrar a biblioteca eletrônica denominada Scientific Electronic Library Online – SciELO.

Cabe destacar que essa biblioteca resulta de um projeto apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), em parceria com o Centro Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde (BIREME) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) que reúne, até o momento, 121 periódicos científicos brasileiros. Fundamentada em uma metodologia especialmente desenvolvida para preparação, armazenamento, disseminação e avaliação da produção científica, a SciELO gerou uma tecnologia exportada para outros países (Chile, Cuba e Espanha).

Com a constituição da SciELO, a editoração eletrônica passou a ser acessível aos periódicos aprovados pelos critérios estabelecidos pelo projeto, incluindo mais recentemente a necessidade de cadastramento de um identificador que individualiza essa modalidade de publicação seriada. No caso de Psicologia: Teoria e Pesquisa, além do número internacional normalizado (International Standard Serial Number) específico para sua versão impressa, agrega-se o ISSN 1806-3446 para a versão online.

Portanto, a integração na coleção SciELO proporciona vantagens consideráveis, favorecendo, por exemplo, o aumento da acessibilidade e uma avaliação de impacto com indicadores complementares aos do Institute for Scientific Information e mais adaptados às características das revistas brasileiras.

Por outro lado, essa conquista impõe a reflexão sobre o futuro da edição científica e suas conseqüências. Essa "nova comunicação" provocada pela Terceira Revolução do Livro, que disponibiliza a textualidade eletrônica do livro e do periódico, vem alterar definitivamente as relações entre editor, autor, leitor, comunidade científica, veículo comunicacional e texto (Mercier, 2002). Essas mudanças, aceleradamente impostas em um contexto de economia globalizada, preocupam os especialistas da Ciência da Informação que nos alertam quanto aos riscos de ampliação da exclusão. Por outro lado, instauram o debate sobre pluralismo, identidade e autonomia progressivamente formulado por uma "nova cultura" passível de se constituir como resultado dessa sociedade de informação (Miranda, 2000).

Dessa maneira, para atender tais necessidades de diversificação e ampliação, novos membros passam a integrar o Conselho Editorial Internacional de Psicologia: Teoria e Pesquisa a partir desse número. Nesse mesmo sentido, foram atualizadas as Normas de Publicação, com base na 5ª edição do Publication Manual of the American Psychological Association.

Também em consonância com a nossa contemporaneidade, as questões centrais desse número de Psicologia: Teoria e Pesquisa gravitam em torno da(s) identidade(s). Seja de natureza política, étnica, religiosa, social, formadora, "desenvolvimental" ou educativa, o questionamento sobre identidade é incontornável na sociedade da informação.

Assim, interessados em conhecer os sistemas de valores democráticos, no atual cenário de mudanças da América Latina, Cícero Pereira, Ana Torres e Thaís Barros propõem um estudo com centenas de estudantes universitários. A problemática do racismo no contexto brasileiro é atualizada com a discussão sobre os efeitos do sucesso social e do branqueamento propiciada pela investigação de Marcus Lima e Jorge Vala. No plano da identidade religiosa, Geraldo Paiva analisa o sincretismo pós-moderno na adesão de brasileiros às "novas religiões japonesas". No mundo do trabalho, continuamente confrontado às transformações, Ronaldo Pilati e Jairo Borges-Andrade estudam medidas de impacto do treinamento em quatro organizações. Ainda nessa esfera laboral, Sheila Murta e Bartholomeu Tróccoli propõem a avaliação de uma intervenção em estresse ocupacional. O Discurso de Roma, significativo programa lacaniano de leitura da psicanálise para a formação, é abordado por Léa Sales. O crescente interesse pela qualidade de vida na Terceira Idade, chama a atenção para os experimentos de Terezinha Erven e Gerson Janczura sobre a memória de idosos. Essencial na constituição do sujeito, a consciência sintática da criança é analisada por Jane Correa a partir de uma revisão metodológica sobre as principais tarefas de mensuração. No campo educacional, Edna Neves e Evely Boruchovitch investigam a motivação dos alunos das séries iniciais em relação à progressão continuada.

Como nossa modernidade exige, cada vez mais, competências em relações interpessoais para contextos diversos, Maria Rita Soares resenha a obra intitulada "Habilidades sociais, desenvolvimento e aprendizagem: questões conceituais, avaliação e intervenção".

Marcus Pinheiro noticia o V Congresso Nacional da Psicologia. Marina Massimi e Regina Campos historiam a trajetória de Joseph Brožek, falecido em janeiro, e suas contribuições para a historiografia da Psicologia brasileira e internacional. Rachel da Cunha e Luciana Verneque oferecem uma homenagem de Psicologia: Teoria e Pesquisa por ocasião da comemoração do centenário do nascimento de B. F. Skinner. Por fim, Maria Júlia Kovács relembra Wilma da Costa Torres, pioneira da Tanatologia no Brasil, recentemente falecida.

A título de conclusão, insistimos na evocação de Fernando Pessoa, notável poeta da língua portuguesa – constitutiva de nossa identidade cultural – cuja obra é um instigante convite à introspecção identitária e aos questionamentos provocados pelo reconhecimento da unidade na multiplicidade e vice-versa.

REFERÊNCIAS

Mercier, A. (Org.). (2002). Les trois révolutions du livre. Paris: Musée des Arts et Métiers/Imprimerie Nationale.

Miranda, A. (2000). Sociedade de informação: Globalização, identidade cultural e conteúdos.Ciência da Informação, 29(2),78-88.

Pessoa, F. (1986). Obra poética (3ª ed.). Rio de Janeiro: Nova Aguilar (Originalmente publicado em 1931).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Mar 2005
  • Data do Fascículo
    Abr 2004
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