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Figuras de atividades funcionais: concordância de nomeação e familiaridade

Functional activities pictures: name agreement and familiarity

Resumos

O objetivo do estudo foi verificar a concordância de nomeação e familiaridade de um conjunto de figuras de objetos/animais e de atividades funcionais. Participaram 26 crianças entre 5 e 7 anos e 24 estudantes universitários entre 18 e 25 anos, de ambos os sexos. Os participantes observaram 90 figuras, 45 de atividades funcionais e 45 de objetos/animais, nomearam uma a uma e referiram o grau de familiaridade. Os dados foram analisados pelo coeficiente de Kappa, correlação de Spearman e teste de Mann-Whitney. Os resultados mostraram que a concordância com o nome original foi maior do que a freqüência de outras nomeações. As crianças tiveram mais dificuldades em fazer a nomeação. As figuras de objetos/animais foram consideradas mais familiares. O estudo mostrou diferenças significativas entre as figuras e entre as crianças e adultos, sugerindo o uso de figuras de atividades funcionais em estudos neuropsicológicos.

figuras de atividades funcionais; nomeação; familiaridade


This study was done with the aim to examine the naming agreement and familiarity of a set of objects/animals and functional activities pictures. Twenty six children were used between 5-7 years old and 24 university students between 18-25 years old of both sexes. Participants should watch 90 pictures, being 45 of functional activities and 45 of objects/animals, nominate one by one, moreover, to refer the familiarity degree. Data were analyzed by coefficient of Kappa, Spearman correlation test and Mann-Whitney test. The original name agreement was bigger than the frequency of other nominations. The children had more difficult than adults to make the pictures nomination. The objects/animals pictures were considered more familiar, as well children as adults. This way, the study showed significant differences between the pictures and between children and adults, suggesting the use of functional activities pictures in neuropsychological studies.

functional activities pictures; naming; familiarity


Figuras de atividades funcionais: concordância de nomeação e familiaridade1 1 Agradecimentos: Ao Prof. Alexandre Augusto de Lara Menezes do Dept. de Fisiologia da UFRN, pela colaboração na seleção das figuras, e aos alunos do Curso de Fisioterapia da UFRN, pela contribuição na coleta dos dados.

Functional activities pictures: name agreement and familiarity

Tania Fernandes Campos2 2 Endereço: Universidade Federal do Rio Grande no Norte, Depto. de Fisioterapia, Av. Senador Salgado Filho, 3000, Natal, RN, Brasil 59066-800. E-mail: taniacampos@ufrnet.br ; Soraya Medeiros de Carvalho; Luciana Protásio de Melo; Ana Carolina de Azevedo Lima

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

RESUMO

O objetivo do estudo foi verificar a concordância de nomeação e familiaridade de um conjunto de figuras de objetos/animais e de atividades funcionais. Participaram 26 crianças entre 5 e 7 anos e 24 estudantes universitários entre 18 e 25 anos, de ambos os sexos. Os participantes observaram 90 figuras, 45 de atividades funcionais e 45 de objetos/animais, nomearam uma a uma e referiram o grau de familiaridade. Os dados foram analisados pelo coeficiente de Kappa, correlação de Spearman e teste de Mann-Whitney. Os resultados mostraram que a concordância com o nome original foi maior do que a freqüência de outras nomeações. As crianças tiveram mais dificuldades em fazer a nomeação. As figuras de objetos/animais foram consideradas mais familiares. O estudo mostrou diferenças significativas entre as figuras e entre as crianças e adultos, sugerindo o uso de figuras de atividades funcionais em estudos neuropsicológicos.

Palavras-chave: figuras de atividades funcionais; nomeação; familiaridade.

ABSTRACT

This study was done with the aim to examine the naming agreement and familiarity of a set of objects/animals and functional activities pictures. Twenty six children were used between 5-7 years old and 24 university students between 18-25 years old of both sexes. Participants should watch 90 pictures, being 45 of functional activities and 45 of objects/animals, nominate one by one, moreover, to refer the familiarity degree. Data were analyzed by coefficient of Kappa, Spearman correlation test and Mann-Whitney test. The original name agreement was bigger than the frequency of other nominations. The children had more difficult than adults to make the pictures nomination. The objects/animals pictures were considered more familiar, as well children as adults. This way, the study showed significant differences between the pictures and between children and adults, suggesting the use of functional activities pictures in neuropsychological studies.

Key words: functional activities pictures; naming; familiarity.

Estudos mostram que um estímulo visual pode facilitar a eficiência, precisão e velocidade com que o sistema perceptual identifica e processa a informação recebida (Greene, Easton & Lashell, 2001; Stenberg, Radeborg & Hedman, 1995). Além disso, figuras são utilizadas, a fim de comparar o efeito dos estímulos visual e verbal e correlacionar com a localização de lesões cerebrais (Allegri, Harris, Serrano & Delavald, 2001; Yetkin, Rosenberg, Weiner, Purdy & Cullum, 2006). Também observa-se que estímulos pictoriais possibilitam a compreensão do funcionamento dos processos mnemônicos como a aquisição, codificação e evocação (Degenszajn, Caramelli, Caixeta & Nitrini, 2001).

Testes com figuras em preto e branco, de objetos e animais, de faces conhecidas ou desconhecidas, são freqüentemente utilizados para avaliação da memória explícita (Ballesteros, Reales, Garcia & Carrasco, 2006) e implícita (Zago, Fenske, Aminoff & Martinos, 2005). Figuras de paisagens, pessoas mutiladas e de crianças, por serem reconhecidas como estímulos agradáveis ou desagradáveis, são indicadas para avaliação da memória emocional (Abrisqueta-Gomez, Ueta, Oliveira, Bertolucci & Bueno, 1998; Arntz, De Groot & Kindt, 2005). Entretanto, a realização desses testes é precedida por um processo de validação das figuras. No Brasil, Pompéia, Miranda e Bueno (2001) validaram, quanto a nomeação, familiaridade e complexidade visual, 400 figuras de animais e objetos, retiradas do estudo original de Snodgrass e Vanderwart (1980), obtendo índices satisfatórios de confiabilidade e validade ao ser comparado com estudos internacionais (Pompéia, Miranda & Bueno, 2003).

Pesquisas têm mostrado que a utilização de figuras de ações pode ser importante na avaliação neuropsicológica de pacientes com lesões cerebrais, a fim de ser estabelecido o perfil neuropsicológico e a correlação com a localização das lesões, entretanto, resultados são ainda controversos. No estudo com a Doença de Alzheimer, pacientes responderam mais rápido e fizeram menos erros na nomeação de figuras de objetos (substantivos) do que de figuras de ações (verbos) (Druks & cols., 2006). Por outro lado, estudos têm encontrado que a nomeação de verbos é mais comprometida do que a de substantivos, sugerindo que verbos são semanticamente mais complexos (Kim & Thompson, 2004; Robinson, Grossman, White-Devine & D'Esposito, 1996).

Os resultados encontrados vêm indicando que a nomeação de figuras pode ser seletivamente comprometida após lesão cerebral se o córtex ou as conexões envolvidas no processamento de um atributo crítico dos conceitos representados pelas figuras são afetados (Lu & cols., 2002). Segundo Warrington e Shallice (1984), o atributo de figuras representandocoisas vivas (animais, frutas, vegetais e flores) é a forma visual e de coisas não-vivas (ferramentas, utensílios de cozinha, móveis e itens de transporte) é a sua função. Outros diferentes atributos podem ser relevantes para a representação de figuras incluindo cor, movimento, faixa de interação e modalidades sensoriais (Lu & cols., 2002).

Os achados da avaliação diagnóstica estão diretamente relacionados com a programação da intervenção terapêutica. Estudos já relataram que o programa de tratamento deve priorizar as tarefas genéricas no lugar das ações específicas, sendo assim, adequado adotar uma abordagem direcionada para as atividades funcionais, em tarefas e habilidades que possam ser diretamente aplicadas no dia-a-dia (Abrisqueta-Gomez & cols., 2004; Ávila, 2003). Uma seqüência de movimentos aprendidos pode ser mais fortemente associada com a apresentação de figuras de objetos pessoais familiares usados rotineiramente pelos pacientes com demência do que de objetos não-familiares, o que tem contribuído para o planejamento do tratamento (Giovannetti & cols., 2006).

Na literatura, não foram encontrados estudos com figuras específicas de atividades funcionais, como as atividades básicas da vida diária (ABVDs) e as atividades instrumentais de vida diária (AIVDs). As ABVDs dizem respeito aos cuidados pessoais da vida diária, como alimentar-se, vestir-se, fazer higiene e mover-se. As AIVDs são habilidades mais avançadas e consideradas como determinantes para a independência do indivíduo na comunidade, como cozinhar, fazer compras, executar tarefas domésticas, dirigir, entre outras (Almeida & Nitrini, 1995). Essas atividades são realizadas com bastante freqüência no dia-a-dia e ao longo da história de vida do indivíduo. A familiaridadepré-mórbida com umconceito é considerada um preditor benéfico do desempenho de pacientes com demência semântica (Rogers, Patterson & Graham, 2007). A análise de efeitos de percepção de categoria semântica na representação interna cerebral demonstrou que verbos produzem mais distinta representação interna por causa de seu envolvimento mais direto com as ações motoras (Cangelosi & Harnad, 2000).

Pelos dados da literatura, utilizando figuras de ações relacionadas com o desempenho motor, é possível supor que o uso de figuras de atividades funcionais possa determinar a habilidade para coordenar mentalmente, manipular uma diversificada faixa de informações que pode estar associada com a atividade apresentada e contribuir para maior representação interna cerebral. Dessa forma, sentiu-se a necessidade de realizar um estudo com o objetivo de validar um conjunto de figuras de atividades funcionais, quanto à nomeação e à familiaridade, comparando com figuras de objetos/animais, entre crianças e adultos jovens, a fim de que essas figuras possam ser utilizadas em estudos posteriores, visando facilitar a recuperação das habilidades funcionais de pacientes com comprometimento cognitivo-motor.

Método

Amostra

Participaram 26 estudantes de uma entidade particular do ensino fundamental entre 5 e 7 anos de idade (oito meninos e 18 meninas) e 24 estudantes de uma entidade do ensino superior entre 18 e 25 anos (cinco homens e 19 mulheres). Foram excluídos os indivíduos que faziam uso de medicação ou tinham alguma patologia. O termo de consentimento foi assinado pelos pais das crianças e pelos estudantes universitários e o estudo recebeu a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa.

Procedimentos

Foram selecionadas do CorelDRAW noventa figuras coloridas, 45 de atividades funcionais (Figura 1), que representavam ABVDs e AIVDs, e 45 de objetos/animais (Figura 2). As figuras foram nomeadas previamente, impressas em cartões de 7 x 7cm, misturadas aleatoriamente e em seguida apresentadas uma de cada vez. Durante a apresentação, os indivíduos faziam a nomeação das figuras (sem saberem a nomeação dada anteriormente) e determinavam o grau de familiaridade (1- pouco familiar; 3 - médio; 5 - muito familiar). Duas sessões de apresentação foram realizadas pelo mesmo examinador num intervalo de dois dias. Foram dadas instruções para que a nomeação dasfiguras de atividades funcionais fosse realizada com base na ação expressa na figura, para isso questionou-se: O que está acontecendo nessa figura? Que nome você dá para ela? Para avaliar a familiaridade, perguntou-se aos participantes: Quanto essa figura é familiar para você, pouco (1), médio (3) ou muito (5)?



Após a coleta, foram obtidas as seguintes medidas:

a) Concordância de nomeação: percentual de indivíduos que fizeram a nomeação de acordo com o nome original. Para as figuras de atividades funcionais, considerou-se como concordante o nome que representava uma ação correspondente a atividade apresentada na figura, independentemente se o verbo utilizado fosse diferente. Ex: partindo carne = cortando carne. Foi classificado como satisfatório o percentual de concordância acima de 50%.

b) Confiabilidade teste-reteste: índice de correlação entre os dois testes quanto a concordância de nomeação e ao grau de familiaridade.

c) Nome freqüente: nomeação que obteve maior freqüência percentual para os adultos e crianças. Quando houve desacordo, foi realizado um julgamento para estabelecer a nomeação mais adequada.

d) Familiaridade: grau de familiaridade com a ação ou objeto e animal mostrados nas figuras.

Todos os procedimentos foram baseados no estudo de Pompéia e cols. (2001), assim como no estudo de Cycowicz, Friedman, Snodgrass e Duff. (2001).

Análise de dados

Os dados foram analisados pelo programa SPSS 12.0 0 (Statistical Package for the Social Science), atribuindo-se o nível de significância de 5%. A comparação da freqüência de concordância entre a nomeação prévia das figuras e a estabelecida pelos participantes foi verificada pelo teste Quiquadrado. A confiabilidade teste-reteste quanto à nomeação foi analisada pelo Índice de Kappa e para a familiaridade pelo teste de correlação de Spearman. As diferenças entre crianças e adultos quanto ao grau de familiaridade foram verificadas pelo teste de Mann-Whitney e quanto ao tipo de figura pelo teste de Wilcoxon.

Resultados

Concordância de nomeação

Para as crianças, a freqüência percentual de concordância de nomeação no primeiro teste foi em média 74% para as figuras de atividades funcionais e 85% para as figuras de objetos/animais e, no segundo teste, foi de 75% e 88%, respectivamente. Nos adultos jovens, observou-se no primeiro teste uma concordância de 84% nas figuras de atividades funcionais e de 97% nas figuras de objetos/animais e, no segundo teste, foi de 87% e 99%, respectivamente. No primeiro teste, não foram encontradas diferenças significativas entre crianças e adultos quanto à freqüência de concordância de nomeação nas figuras de atividades funcionais (p=0,392) e de objetos/animais (p=0,149), assim como no segundo teste (atividades funcionais: p=0,288 e de objetos/animais: p=0,619). Para as crianças, não se verificou diferença nos percentuais entre os testes (atividades funcionais: p=0,936; objetos/animais: p=0,758), como também para os adultos (atividades funcionais: p=0,765; objetos/animais: p=0,619).

Concordância maior do que 50% foi encontrada para a maioria das figuras. Índices igual ou abaixo de 50% foram encontrados no primeiro teste em três figuras de atividades funcionais para as crianças ("andando de ônibus", "arrancando dente" e "digitando no computador") e em três para os adultos ("andando de ônibus", "arrancando dente" e "cuidando de criança"). Além de cinco figuras de objetos/animas ("aspirador", "barbeador", "churrasqueira", "sinuca" e "tapete") para as crianças e em uma figura para os adultos ("churrasqueira"). No segundo teste, observou-se para as crianças em duas figuras de atividades funcionais ("arrancando dente" e "digitando no computador") e para os adultos nas mesmas figuras do primeiro teste. Para as figuras de objetos/animas, apenas as crianças apresentaram esses índices em três figuras ("aspirador", "churrasqueira" e "sinuca") (Tabelas 1 e 2).

Do total de figuras para os adultos, oito de atividades funcionais e 32 de objetos/animais no primeiro teste e 18 e 41 figuras, respectivamente, no segundo teste, apresentaram 100% de concordância, ou seja, os nomes atribuídos concordaram com a ação ou o objeto/animal apresentados na figura. Para as crianças, os resultados foram semelhantes entre os dois testes, somente houve concordância de 100% em 13 de objetos/animais (Tabelas 1 e 2).

Confiabilidade teste-reteste

O índice de Kappa mostrou correlação significativa da nomeação entre os dois testes em 37 figuras de atividades funcionais e 36 figuras de objetos/animais para as crianças e em 37 figuras de atividades funcionais e para todas as figuras de objetos/animais nos adultos (Tabela 3). Quanto à familiaridade, verificou-se correlação significativa, com os adultos apresentando maiores coeficientes tanto para as figuras de atividades funcionais (criança: R=0,31, p=0,001; adulto: R=0,73, p=0.001) quanto para as figuras de objetos/animais (criança: R=0,51, p=0,001; adulto: R= 0,78, p=0,001).

Nome freqüente

Em algumas figuras, foi possível observar nomeações semelhantes às estabelecidas anteriormente, ocorrendo apenas mudança nos verbos, porém estes apresentavam o mesmo significado. A figura "falando ao telefone" foi nomeada mais freqüentemente como "atendendo telefone", assim como "partindo carne" que foi chamada como "cortando carne", "andando de ônibus" ficou "passeando de ônibus", "cuidando de criança" como "segurando o bebê", "tomando mamadeira" foi chamada mais de "dando mamadeira" e "dirigindo moto" como "andando de moto".

Alguns nomes mostraram abreviação em relação aos nomes anteriores, como "digitando no computador", que ficou somente "digitando", "dirigindo carro" como "dirigindo" e "espanando móveis" como "espanando". Por outro lado, nomes pequenos receberam especificações como "plantando" que ficou "plantando flores" e, nas figuras de objetos, "copo" que foi especificada como "copo de suco" e "aspirador" como "aspirador de pó", porém estes últimos nomes não foram os mais freqüentes.

Várias interpretações foram observadas em algumas figuras. A figura "passando o aspirador" recebeu nomeações como "limpando a casa" e "tirando a sujeira", porém o nome mais freqüente foi "limpando o chão" e a figura "arrancando dente" foi chamada de "fazendo uma consulta", mas a nomeação mais freqüente foi "indo ao dentista". Todos os nomes das figuras considerados mais freqüentes encontram-se nas Tabelas 1 e 2.

Familiaridade

Observou-se diferença entre adultos e crianças quanto ao grau de familiaridade, nas figuras de atividades funcionais (p<0,001) e de objetos/animais (p<0,01), com as crianças apresentando escoresmaiores do que os adultosemambosostiposde figuras. Foi verificado que as figuras de objetos/animais tiveram escore maior do que as figuras de atividades funcionais, tanto para as crianças (p<0,0001) quanto para os adultos (p=0,01).

Discussão

No estudo, foi encontrada concordância satisfatória de nomeação para os dois tipos de figuras, os dois testes realizados e para ambos os grupos estudados. O índice de Kappa confirmou o nível aceitável de confiabilidade teste-reteste para a nomeação. As figuras de atividades funcionais foram mais difíceis de serem nomeadas, houve uma freqüência maior de nomes, diferentes verbos foram utilizados e os participantes nomearam com mais detalhes como em "apagando fogo", que foi nomeada como "homem tirando fogo do prédio", e a figura "fazendo churrasco" como "fazendo churrasco de salsicha". Segundo estudo anterior, esse tipo de figura exige mais atenção, percepção, discriminação dos elementos incluídos na ação, bem como de conteúdos da memória de longo-prazo (Szekely & cols., 2005). Outro aspecto importante de ser analisado é que todas as figuras de ações envolvem ao menos uma pessoa, animal ou objeto, e muitas delas envolvem dois ou mais protagonistas e isso é necessário para produzir significados relacionais, além disso, existe uma dificuldade em categorizar semanticamente figuras de ações (Vigliocco, Vinson, Damian & Levelt, 2002).

Ficou bem evidente, no presente estudo, que as figuras de atividades funcionais representam contextos de vida, visto que "pulando corda" foi dito "brincando"; "limpando tapete" como "fazendo faxina"; "digitando" como "entrando na internet" e "fazendo tarefa"; "andando de bicicleta" como "andando de Caloi". Algumas figuras apresentam componente emocional como a figura "arrancando dente" que foi dito "medo de ir ao dentista", a figura "tomando sorvete" foi nomeada "mulher chupando sorvete e homem com inveja dela". Também pode-se observar que os participantes fizeram uma interpretação própria da figura, "passando aspirador" como "fazendo limpeza mais fácil", "escrevendo" como "corrigindo prova" ou "fazendo as contas", "cozinhando" como "fazendo sopa". Esses resultados mostram a possibilidade de explorar figuras de atividades funcionais para a compreensão de diferentes situações de vida e utilização em testes neuropsicológicos. No estudo de Greene e cols. (2001), verificou-se que uma figura de ação facilita tanto o reconhecimento visual, quanto auditivo, por exemplo, a figura de um bebê chorando pode ser identificada de forma visual e auditiva. No estudo de Okochi, Takahashi, Takamuku, Matsuda e Takagi (2005), observou-se que figuras de ações facilitaram o entendimento do idoso a determinar o grau de comprometimento da capacidade funcional.

As figuras de objetos e ações invariavelmente diferem em suas propriedades lexicais (substantivos e verbos, respectivamente) (Szekely & cols., 2005), além disso, já existem evidências de uma diferenciação na organização cerebral. Figuras de ações causam maior ativação bilateral nas áreas motoras e próximas à região temporal do que as figuras de objetos (Kable, Kan, Wilson, Thompson-Schill & Chatterjee, 2005). O córtex occipito-temporal lateral contém regiões neurais que processam diferentes aspectos do movimento, no que se refere à percepção de objetos se movendo no espaço e ao conceito de movimento implicado na ação verbal, nesse sentido, coordena as informações perceptual e conceitual das ações e o córtex occipito-temporal ventral está relacionado com a percepção dos objetos (Kable, Lease-Spellmeyer & Chatterjee, 2002).

No presente estudo, as crianças apresentaram maior número de nomes alternativos nas figuras de atividades funcionais, coincidindo com os achados de Pompéia e cols. (2001), em que sugerem que as crianças têm dificuldade em integrar adequadamente a informação perceptual e conceitual em função de diferenças na capacidade atencional e de discriminação (Cycowicz & cols., 2001). No entanto, os percentuais de concordância encontrados indicam que as figuras selecionadas representam conceitos que são conhecidos por estudantes universitários e crianças. A literatura mostra que a idade de aquisição é um importante preditor de recuperação de nomes em adultos normais. Observou-se que substantivos (nomes de objetos comuns) são adquiridos cedo no desenvolvimento, enquanto verbos principais (nomes de ações comuns) são raros até o vocabulário expandir para aproximadamente 200 palavras, em função de que estruturas semânticas dos verbos são inerentemente mais complexas. A aquisição de verbos e adjetivos não pode proceder até a criança ter adquirido substantivos suficientes para realizar a predicação (O'Grady, 1987). Outro aspecto importante é que objetos comuns são relativamente fáceis de serem representados em desenhos, ao contrário de ações que freqüentemente são representadas em desenhos estáticos (Davidoff & Masterson, 1996).

Quanto à familiaridade, a confiabilidade teste-reteste foi maior para os adultos, entretanto, os dois tipos de figuras foram considerados mais familiares pelas crianças. É possível que o caráter lúdico, assim como a cor das figuras, tenha tido influência. Considera-se que representações de objetos são mediadas somente pela forma e detalhes da superfície, entretanto, quando as figuras têm formas similares, a cor é que permite diferenciá-las, mostrando que o reconhecimento de objetos do dia-a-dia é facilitado pela presença da informação da cor, sendo parte integrante da representação do objeto juntamente com a forma e textura (Rossion & Pourtois, 2004). Apesar desses aspectos, a análise da familiaridade é uma função difícil, pois familiaridade é definida como um julgamento subjetivo de quanto o indivíduo freqüentemente teve contato ou pensa sobre um certo objeto ou conceito (Allegri & cols., 2001).

Todas as comparações levam à conclusão de que a nomeação de figuras de atividades funcionais difere das figuras de objetos/animais e de acordo com a idade. Elas são mais difíceis de serem nomeadas, apresentam maior número de nomeações e são consideradas menos familiares do que as figuras de objetos/animais. As crianças apresentam mais dificuldades em fazer nomeação, porém consideram essas figuras mais familiares do que os adultos. É necessário ainda avaliar se as figuras de atividades funcionais que representam as ABVDs e AIVDs podem servir como um instrumento para pesquisa cognitiva, elaboração de testes de memória e aplicação clínica.

Recebido em 25.09.2006

Primeira decisão editorial em 22.08.2007

Versão final em 05.03.2008

Aceito em 25.08.2008

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    Agradecimentos: Ao Prof. Alexandre Augusto de Lara Menezes do Dept. de Fisiologia da UFRN, pela colaboração na seleção das figuras, e aos alunos do Curso de Fisioterapia da UFRN, pela contribuição na coleta dos dados.
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    Endereço: Universidade Federal do Rio Grande no Norte, Depto. de Fisioterapia, Av. Senador Salgado Filho, 3000, Natal, RN, Brasil 59066-800. E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Nov 2008
    • Data do Fascículo
      Set 2008

    Histórico

    • Recebido
      25 Set 2006
    • Aceito
      25 Ago 2008
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