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Conjugalidade: Uma Leitura a Partir da Noção de Comunidade em Edith Stein

Resumo

A partir do livro Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espíritu, Edith Stein apresenta a intersubjetividade como exigência para a constituição do eu e do nós. Destarte, sua definição de comunidade permite uma compreensão da conjugalidade em seus aspectos constitutivos, destacando-a como um dos espaços de formação de subjetividades, conduzindo a temas como: autoformação, criatividade, ética, alteridade, abertura e responsabilidade individual e coletiva. Suas análises, a partir do conceito de pessoa, também clarificam que o processo de formação, especificamente correlacionado à identificação e repetição dos modelos intrafamiliares e sociais, é regido pelas leis de sentido e não reduzido à esfera psíquica, exibindo a possibilidade de autoconfiguração e reconfiguração de “si mesmo” e da conjugalidade.

Palavras-chave:
Edith Stein; relacões conjugais; fenomenologia; autoformação; criatividade

Abstract

From the book Contribuciones a la fundamentación filosófica de la psicología y de las ciencias del espíritu,Edith Stein introduces intersubjectivity as a requirement for constituting the “I” and the “We”. Accordingly, her definition of community enables us to understand conjugality in its constitutive aspects, highlighting it as one of the spaces of subjectivity formation, reminding us of themes like: self-formation, creativity, ethics, otherness, openness and individual and collective responsibility. The Stein’s analyses, from the concept of person, also clarify that the formation process, specifically correlated to identifying and repeating intra-family and social models, is governed by the laws of sense and not limited to the psychological sphere, showing the possibility of self-configuration and reconfiguration of “oneself” and of conjugality.

Keywords:
Edith Stein; marital relations; phenomenology; self-formation; creativity

O fenômeno da repetição da herança familiar e sociocultural tem sido alvo de grandes preocupações e gerado inúmeros estudos com foco psíquico e/ou social. A clínica de casais tem dado especial atenção a essa problemática, sobretudo quando as conjugalidades apresentam aspectos desfavoráveis, e mesmo violentos, que resultam de identificações com a dinâmica relacional do casal parental e mesmo de seus ancestrais (Almeida, 2016Almeida, E., & Romagnoli, R. C. (2016). O processo de identificação e repetição com os modelos intrafamiliares e socioculturais e o ato criativo na perspectiva de Edith Stein. Revista do NUFEN, 8(1), 91-109. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2175-25912016000100007&lng=pt&tlng=pt.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
; Eiguer, 1998Eiguer, A. (1998). La théorie groupale du couple. In Clinique psychanalitique de couple (pp. 47-74). Paris: Dunod. , 2012aEiguer, A. (2012a). Le couple et son héritage ancestral. In A. Eiguer, E. Granjon, & A. Loncan (Orgs.), La part des ancêtres (pp. 87- 100). Paris: Dunod., 2012bEiguer, A. (2012b). Interprétation dans les thérapies psychanalytiques de couple et de famille: La touche finale. Revue International de Psychoanalysis de Couple et Famille, 11, 49-64. ). Esses estudos apresentam a conjugalidade como matriz da vida psíquica, buscando os sentidos da herança intrafamiliar que servem de referência para o processo de identificação. A dificuldade de desmantelar as vicissitudes que resultam destas identificações que atravessam as gerações, revela o quanto torna-se difícil desconstruir na realidade subjetiva os modelos que são tomados nas primeiras relações afetivas e inscritos nas subjetividades. Além disso, descobrir a originalidade e autenticidade em relação a ser si mesmo e ao modo de ser casal, diferenciando-se dos modelos que remetem a sofrimentos por vezes incompreensíveis aos próprios casais, também se mostra uma tarefa difícil e um desafio no âmbito clínico.

A práxis do trabalho com casais esbarra em aspectos correlacionados à família de origem, os quais são desenhados e reforçados pelo contexto sociocultural. Essa articulação nos leva a refletir sobre as possibilidades reais quando os modelos inscritos nestes horizontes apresentam aspectos desfavoráveis à realização de um projeto de vida em comum e ao encontro entre duas alteridades. A construção da conjugalidade aponta para questões constitutivas do ser humano que são inseparáveis desta configuração que diz respeito à família de origem e à contemporaneidade. Coloca-se em cena a própria formação do modo de ser do sujeito, envolvendo não somente as implicações socioculturais, mas, ao mesmo tempo, as qualidades próprias da condição humana; o intercâmbio das possibilidades e os limites reais traçados no encontro do eu com o mundo. Nesse plano esbarramos na capacidade do sujeito para responder às provocações do mundo. Respostas que revelam características da complexidade da vida interior do sujeito, assinalando, ao mesmo tempo, um horizonte de possibilidades por meio da capacidade de autoconfiguração (Stein, 1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933), 1930/2003bStein, E. (2003b). Sobre el concepto de formación. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 177-194). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1930), 1916/2005aStein, E. (2005a). Introducción a la filosofía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1916), 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918), 1923/2007aStein, E. (2007a). Naturaleza, libertad y gracia. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa de pensamiento cristiano (vol. III, A. Pérez, J. Mardomingo & C. R. Garrido, Trads., pp. 55-112). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1923)), que é, portanto, o universo da autocriação.

Nesse contexto, nos propomos a pensar a conjugalidade a partir do conceito de comunidade em Edith Stein, o qual revela a vida intersubjetiva como uma exigência para a constituição do eu e do nós. Para tal estudamos o livro Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de das ciencias del espíritu, de 1918, buscando rastrear a definição do conceito e sustentar teoricamente essa associação. Através da nossa experiência com casais e das leituras efetuadas, analisamos o conceito de comunidade, explorando as possibilidades de seu uso na compreensão da conjugalidade. Assim, correlações foram feitas para uma compreensão da complexidade da conjugalidade, que pode ser entendida em seus aspectos constitutivos e como um dos espaços fundamentais de formação de subjetividades, conduzindo a temas como: autoformação, criatividade, ética, alteridade, reciprocidade, amor e responsabilidade individual e coletiva com a vida alheia.

A contribuição de Edith Stein para uma fundamentação antropológica filosófica sobre o sujeito humano apresenta, por meio da análise fenomenológica, a condição tripartida deste, evidenciando na categoria espiritual - correspondente ao intelecto e à vontade - a possibilidade de autoconfiguração no encontro do eu com o mundo. A autora adentra na questão da causalidade psíquica distinguindo-a em termos qualitativos e apresentando-a em sua abertura ao mundo e sua possibilidade de plasticidade. O fato de apresentar a coexistência dessas leis com as leis da motivação lança luzes para compreender o fenômeno da constituição da conjugalidade como comunidade que forma subjetividades e o fenômeno da identificação com a herança familiar e social em uma perspectiva não reducionista ao estrato psíquico e/ou sociocultural. Estas compreensões se fazem possíveis por meio das obras Introducción a la filosofia, de 1916Stein, E. (2005a). Introducción a la filosofía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1916), Sobre el problema de la empatia, de 1917Stein, E. (2005c). Sobre el problema de la empatía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 71-204). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1917), Ser finito y ser eterno, de 1937Stein, E. (2007b). Ser finito y ser eterno: Apendix II. La filosofía existencial de Martin Heidegger. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa de pensamiento cristiano (vol. III, A. Pérez, J. Mardomingo, & C. R. Garrido, Trads., pp. 1137-1200). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1937), Naturaleza, libertad y gracia, de 1923Stein, E. (2007a). Naturaleza, libertad y gracia. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa de pensamiento cristiano (vol. III, A. Pérez, J. Mardomingo & C. R. Garrido, Trads., pp. 55-112). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1923), Estructura de la persona humana, de 1932/1933Stein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933), entre outras.

Definir a conjugalidade significa pensar nas exigências para o encontro entre alteridades, bem como pensar nas qualidades que são propriamente humanas e que se tornam indispensáveis para a construção de um projeto de vida compartilhado. A partir da noção de comunidade, podemos definir a conjugalidade como um projeto de vida que inclui uma unidade de vivências a constituírem o nós e que ao mesmo tempo mantêm as vivências pessoais que conservam a identidade pessoal. Construir um projeto de vida que resulte em um nós e simultaneamente no eu implica em um vínculo que é ético e também em uma abertura ao outro que é caracterizada como um movimento de amor. Essas reflexões corroboram ainda a compreensão dos dilemas da vida a dois a partir da inauguração do individualismo na modernidade: o exercício de atender as exigências do espaço em comum e simultaneamente as demandas individuais (Almeida & Stengel, 2012Almeida, E., & Stengel, M. (2012). Individualismo e violência psicológica nas relações de conjugalidade. In R. C. Romagnoli & F. F. S. Martins (Orgs.), Violência doméstica: Estudos atuais e perspectivas (pp. 165-186). Curitiba: Editora CRV. ).

A conjugalidade tem se mostrado um fenômeno complexo e multifacetado, e os profissionais que lidam com o atendimento a casais esbarram em questões que se referem às características da contemporaneidade, em que o sujeito lida com a coexistência de dois sistemas de valores distintos, um deles diz respeito à tradicionalidade e o outro faz referência ao individualismo, princípio que inaugurou os tempos modernos. Contudo, na atualidade, a excessiva ênfase nas sensações prazerosas, a hipervalorização e o culto da autoimagem, o exagero no cuidado de si mesmo, a hipervalorização da independência e consequente fuga da intimidade, a liberdade e a centralidade desmedida e absoluta do eu, as relações descartáveis, o afrouxamento da alteridade e da solidariedade, a falta de responsabilidade e de compromisso com a vida alheia, são algumas marcas da nova configuração da contemporaneidade que possibilitam considerar o narcisismo como a nova modalidade do individualismo (Almeida, 2016Almeida, E., & Romagnoli, R. C. (2016). O processo de identificação e repetição com os modelos intrafamiliares e socioculturais e o ato criativo na perspectiva de Edith Stein. Revista do NUFEN, 8(1), 91-109. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2175-25912016000100007&lng=pt&tlng=pt.
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; Almeida & Stengel, 2012Almeida, E., & Stengel, M. (2012). Individualismo e violência psicológica nas relações de conjugalidade. In R. C. Romagnoli & F. F. S. Martins (Orgs.), Violência doméstica: Estudos atuais e perspectivas (pp. 165-186). Curitiba: Editora CRV. ; Bauman, 2004Bauman, Z. (2004). Amor líquido: Sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar. ; Lasch, 1983Lasch, C. (1983). A cultura do narcisismo: A vida americana numa era de esperanças em declínio. Rio de Janeiro: Imago.; Lipovetsky, 2005Lipovetsky, G. (2005). A era do vazio: Ensaios sobre o individualismo contemporâneo. Barueri: Manole.).

Desse modo, a atualidade parece extrair do amor apenas a parte que “interessa”, reduzindo a experiência amorosa ao erotismo, prazer, imediatismo e utilitarismo, como uma espécie de fragmentação de seu propósito que incide na possibilidade de vidas compartilhadas. Nesse contexto, a vivência do reconhecimento, reciprocidade, cuidado e responsabilidade com o outro é facilmente descartada, de modo que a conjugalidade se torna cada vez mais impraticável ou difícil de ser construída. Estas posturas, consideradas essenciais para a construção de um projeto em comum ou, mais precisamente, a constituição do nós, nos termos descritos por Stein (1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)), são pouco cultivadas em meio aos valores contemplados pelo nosso tempo. Ao se fugir da consciência da alteridade e da responsabilidade dificilmente se alcançam as exigências básicas para formar uma associação que possa ser reconhecida como nós, já que o outro como sujeito não existe, o que significa, na perspectiva steiniana, a impossibilidade de construir uma unidade que permita a vida em comum. Enquanto o individualismo extremo associado ao narcisismo provoca o sujeito a atitudes unicamente em favor de si, o amor como abertura e como ato social, conforme especifica Stein (1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)), é capaz de vivificar a vida alheia e trabalhar na construção de vidas compartilhadas por almejar o bem do outro e conduzi-lo em direção a ser si mesmo. Com efeito, o conceito de conjugalidade como expressão de um tipo de comunidade, cuja correlação apresentamos nesse ensaio, surge como resposta para uma época exacerbadamente atravessada, como pontua Giovanetti (2010Giovanetti, J. P. (2010). O tédio existencial na sociedade contemporânea. In A. M. L. C. Feijoo (Org.), Tédio e finitude: Da filosofia à psicologia (pp. 233-261). Belo Horizonte: Fundação Guimarães Rosa.), pelo afrouxamento da alteridade, solidariedade, amor, amizade e doação. Estes afetos e atitudes considerados transitivos, no sentido de lançarem os sujeitos a uma abertura ao outro e a posturas mais transcendentes, parecem arrefecer o seu significado no espaço intersubjetivo em razão dos valores contraditórios da atualidade (Giovanetti, 2010Giovanetti, J. P. (2010). O tédio existencial na sociedade contemporânea. In A. M. L. C. Feijoo (Org.), Tédio e finitude: Da filosofia à psicologia (pp. 233-261). Belo Horizonte: Fundação Guimarães Rosa.).

Examinamos inicialmente aspectos fundamentais sobre a noção de pessoa, cuja formação compreende as leis do espírito, o que permite elevar o processo de identificação e constituição do nós e do si mesmo para além da vida psíquica. Em seguida, refletimos sobre a questão da comunidade em suas características fundamentais para transpô-las para o âmbito da conjugalidade. Esse percurso nos permite apreender o processo de identificação com o espaço formador, a partir das leis da motivação, enunciando, na singularidade das respostas às provocações do mundo, a capacidade da pessoa de autocriação.

A Vida do Eu: A Vida Psíquica e Espiritual

A antropologia filosófica de Edith Stein explicita o fenômeno humano por meio das vivências, definindo os diversos tipos de ordens que o atravessam nas categorias que o revelam em sua tríplice condição: corpo, psique e espírito em unidade e interatividade (Stein, 1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933), 1916/2005aStein, E. (2005a). Introducción a la filosofía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1916), 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918), 1923/2007aStein, E. (2007a). Naturaleza, libertad y gracia. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa de pensamiento cristiano (vol. III, A. Pérez, J. Mardomingo & C. R. Garrido, Trads., pp. 55-112). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1923), 1937/2007bStein, E. (2007b). Ser finito y ser eterno: Apendix II. La filosofía existencial de Martin Heidegger. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa de pensamiento cristiano (vol. III, A. Pérez, J. Mardomingo, & C. R. Garrido, Trads., pp. 1137-1200). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1937)). A análise das vivências permite alcançar uma definição de pessoa e os atos nelas encerrados exprimem o que é próprio de cada uma dessas categorias, revelando uma estrutura vivencial que é comum a todos os sujeitos humanos e cujas esferas, em função de serem modeladas por disposições culturais e sociais, expõem seu caráter de abertura e plasticidade.

Neste contexto, o corpo pertence a um sujeito que sente através dele e que por meio dele está inserido num mundo material exterior. Stein (1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933)) sublinha que para cada corpo existe um sujeito, e essa vinculação do corpo físico a uma consciência individual caracteriza-o como corpo vivo. A distinção entre a psique e a consciência é fundamental para não reduzir a vida interior aos fenômenos psíquicos, alcançar outras realidades constitutivas que a atravessam e apreender suas implicações na subjetividade (Stein, 1916/2005aStein, E. (2005a). Introducción a la filosofía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1916)). A consciência é o que possibilita ao sujeito estar cônscio daquilo que está vivenciando e simultaneamente registrar os atos que se efetivam em seu vivenciar, tornando possível tanto a manifestação de qualquer realidade ao sujeito, como o ato de conhecê-la. É por meio de sua vivência que o sujeito percebe e conhece si mesmo e a realidade externa. A psique é qualificada como um ente inserido nas categorias da realidade e, portanto, da causalidade (Stein, 1916/2005aStein, E. (2005a). Introducción a la filosofía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1916)). Contudo, conforme explicita Stein (1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)), não se trata daquela causalidade definida pelas ciências da natureza de maneira exata ou quantitativa, mas sim de uma causalidade qualitativa, assegurando um não determinismo à vida psíquica. Os estados psíquicos são estados reais, mas também estados vivenciados do eu, pois sofrem a influência do espaço que recebe o indivíduo. Logo, a vida psíquica atual constitui-se da ligação com a realidade, dependendo do mundo exterior. O estado interno provocado pelo encontro motivacional do sujeito com seu mundo constitui o aspecto espiritual inserido na vida real da psique.

Assim como o corpo e a psique, o espírito também nos é dado, no entanto não é determinado, mas é a sede da decisão e da vontade, portanto, da liberdade (Ales Bello, 2004Ales Bello, A. (2004). Fenomenologia e ciências humanas (M. Mahfoud & M. Massimi, Trads.). Bauru: Edusc.). A esfera espiritual se apresenta como uma instância constituída pelo aspecto intelectivo e volitivo, pois “o espírito é entendimento e vontade simultaneamente: conhecer e querer se encontram reciprocamente condicionados” (Stein, 1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933), p. 651, tradução nossa).6 6 “...el espíritu es entendimiento y voluntad simultáneamente: conocer y querer se hallan recíprocamente condicionados” (Stein, 1932/1933/2003a, p. 651).. Disso resulta que o homem recebe o mundo com o intelecto e o configura por meio da vontade (Stein, 1923/2007aStein, E. (2007a). Naturaleza, libertad y gracia. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa de pensamiento cristiano (vol. III, A. Pérez, J. Mardomingo & C. R. Garrido, Trads., pp. 55-112). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1923)). Intelecto, vontade, liberdade, querer e decisão são propriedades inerentes à esfera espiritual, aspectos imprescindíveis no processo de conhecer e de autoformação, que expõe tanto aquilo que é o comum a todos os indivíduos, quanto aquilo que se exprime no singular. Enquanto a vida psíquica é algo que acontece e se apresenta como uma esfera passiva - pois independe de o indivíduo escolher ter ou não reações psíquicas -, simultaneamente emerge um eu diferente e dotado de características que o permitem agir. Essa é a esfera ativa do ser humano, o qual, apesar de encontrar limites ordenados pela esfera psíquica, pelo corpo vivo e pelo entorno sociocultural, pode e deve agir sobre essas realidades, porque que o ato de posicionar-se indica uma direção, exigência de sua própria condição humana.

A abertura para dentro e para fora é a condição existencial que permite ao homem saber de si e das coisas alheias a si, recebendo em si o outro e o mundo. A partir das impressões da realidade manifestam-se reações psíquicas, como horror ou surpresa, e igualmente atividades que ultrapassam este domínio, como o querer e o atuar, próprias da dimensão ativa (Stein, 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)). Do encontro entre a interioridade e a exterioridade é que nasce o ser assim e não de outro modo, pois cada resposta do sujeito às provocações que vêm de fora consiste em sua ação sobre o mundo no sentido de configurá-lo, mas simultaneamente expressa um ato em direção a si mesmo que resulta em autoconfiguração.

Stein (1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933)) distingue que no centro da estrutura humana existe um eu livre que se diferencia do eu real correspondente à esfera psíquica, portanto, que não se identifica às leis da causalidade. É por meio do eu pessoal ou centro pessoal que o todo da pessoa é plasmado e a unidade psicofísica se mantém, pois ele se exprime como o princípio formador que prescreve um modo singular ao desenvolvimento das instâncias constitutivas do humano. Tudo aquilo que a vida pessoal expressa, cria e configura corresponde ao exercício das capacidades correspondentes à pessoalidade. Assim, o ato criativo resulta da ação da vontade e esta, por sua vez, encontra-se orientada por e para a nota individual que somente o eu pessoal é capaz de conferir (Stein, 1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933), 1916/2005aStein, E. (2005a). Introducción a la filosofía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1916)).

Para Stein (1916/2005aStein, E. (2005a). Introducción a la filosofía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1916), 1923/2007cStein, E. (2007c). ¿Qué es la fenomenología? In Obras completas. Escritos filosóficos etapa de pensamiento cristiano (vol. III, A. Pérez, J. Mardomingo & C. R. Garrido, Trads., pp. 145-159). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1923)) é impossível existir um eu sem que exista liberdade, porquanto ela é parte constitutiva do ser humano e corresponde à pessoa como sujeito dotado de vontade. Como constitutiva do eu, a liberdade vive de modo imanente nas atividades da liberdade, sendo o que permite ao eu ser pessoa e ser si mesmo, sua autoformação e transformação. Movimentos nos quais registra-se uma exigência insuprimível de um eu livre que se encontra no centro e que pode agir por si mesmo livremente, pois, como afirma Stein (1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933)), pode ter os comandos em suas mãos, de forma que utilizá-los ou não é uma expressão de liberdade. Segundo Stein (1916/2005aStein, E. (2005a). Introducción a la filosofía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1916)), ao tomar consciência de que liberdade também é poder para tomar decisões, e de um livre gerar das ações, o sujeito percebe o seu dever na formação de seu próprio caráter, no seu desenvolvimento em direção a tornar-se si mesmo. Contudo, não se pode afirmar que o ser humano seja totalmente livre, mas se pode assegurar que existem possibilidades de liberdade, uma vez que ele não possui o controle total sobre si mesmo devido às disposições naturais, os mecanismos psíquicos e os limites impostos pelo mundo externo.

Segundo Stein (1916/2005aStein, E. (2005a). Introducción a la filosofía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1916)), os estados psíquicos, enquanto vivências, não se explicam unicamente por meio das leis causais, pois encerram outros aspectos da vida do eu que revelam o caráter intencional do vivenciar, a forma fundamental da vida psíquica. Esse movimento que parte da abertura do homem para fora, no ato de abrir seu olhar para o mundo dos valores, retorna à sua interioridade por meio desta mesma fissura, mas não regressa vazio, e sim carregado de sentidos. Se o homem se encontra existencialmente aberto às experiências no mundo em que vive, todas as suas esferas constitutivas possuem alguma abertura, ou não seria possível imprimir sobre as mesmas aquela particularidade que emana do eu pessoal. Os sentidos constituídos nesse encontro do sujeito com o mundo penetram na realidade psíquica preenchendo-a e tonalizando-a. Portanto, os estados psíquicos não são indiferentes àquilo que retorna ao interior do homem carregado de conteúdo de sentido. Outro ponto importante em relação a esse voltar à interioridade - especificamente no que diz respeito a preenchê-la com os valores disponibilizados no mundo humano - é o fato de esse movimento conter em si a exigência de uma tomada de posição ante o mundo com o qual o eu pessoal se encontra. Distinguimos ainda outro movimento que parte da interioridade e que se dirige novamente ao mundo externo, mas agora já ancorado e embebido do registro desta vivência plena de significado, que preencheu a realidade psíquica e espiritual, e que, a partir de então, exprime-se num determinado agir sobre o mundo e si mesmo dando-lhes alguma forma. Esse é o âmbito dos atos do eu, que só pode ser compreendido numa lógica diferente.

Assim como a esfera psíquica possui suas leis, a dimensão espiritual também possui suas leis próprias. A vida da psique possui raízes no estrato sensível da vida natural interior e no estrato espiritual originado na exterioridade, de maneira que as duas leis coexistem em sua realidade e possuem certa conexão e cooperação. A lei fundamental da vida espiritual é traduzida pela filósofa como a lei de sentido ou motivação. Leis que não obedecem a uma relação de causalidade, pois nelas não existe a necessidade que rege as leis da natureza. O que essas leis expressam, em termos universais, é que existe uma possibilidade essencial. Diz-nos Stein (1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)) que na motivação um ato encontra-se vinculado a outro ato e isso significa que ele se concretiza em virtude e por razão de outro ato.

A motivação, em seu significado mais geral, diz respeito à ligação que conecta os atos entre si, referindo-se ao fato de um ato querer realizar-se baseado em outro ato, ou seja, esse movimento possui algum significado para o sujeito que o realiza. Logo, não existe motivação sem que haja algum sentido que a desperte e a movimente. Como a conexão entre os atos é imersa em significados, a motivação pode ser considerada como o mover-se do eu “em razão de”, e esse “de” como o sentido que indica uma direção, uma vez que a motivação, como explicita a filósofa, é um emaranhado de sentidos (Stein, 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)). Desse modo, nenhum ato é vazio, mas encontra-se embebido de significado, porquanto sua direção é movida por motivações e impregnada de sentido, uma vez que o sujeito se dirige a um objeto pelo fato de existir nele algum conteúdo de sentido que o provoca de alguma maneira. Esse movimento é característico da consciência intencional e apresenta dois aspectos fundamentais: um referente ao movimento do eu que se dirige a um objeto e outro relativo à forma peculiar de apreensão do mundo que se revela ao eu. A essência dessa relação depende de como essas vivências se processam e são significadas, pois tais atos se originam no eu e as motivações que os movem e os conectam se sustentam continuamente no eu.

Diante do exposto, a realização de um ato pressupõe a existência de algum sentido que o motive e o movimente e de um posicionamento e um propósito que o sustente, o que implica em vivências que o antecedam, em torno das quais o sujeito se organiza de forma pessoal; logo, não se trata de um movimento vazio, como algo que parte do nada e se dirige para o nada ou que acontece de modo contingente. É como se cada ato do sujeito contivesse em si uma história particular assentada intimamente nas vivências que o antecedem, em que os sentidos atribuídos a todo o vivido o sustentassem como fios condutores que o movem com o desígnio de sua concretização. Isso significa que a motivação enquanto vinculação entre as vivências e seus atos possui um papel fundamental no processo de formação do sujeito, permitindo compreender determinados atos do indivíduo em seu mundo e em suas relações interpessoais. As motivações para um ato específico podem influenciar a escolha de uma pessoa, mas não determinam a sua ação, visto que o eu pessoal pode ter motivos razoáveis, reconhecê-los e, ainda assim, omitir uma ação específica. Com efeito, as motivações por si mesmas não podem determinar o agir, pois é necessário que algo mais entre em cena: o querer. O querer é imprescindível para a compreensão do processo de autoconfiguração na constituição do ser si mesmo e ser nós numa perspectiva não determinista.

Intersubjetividade: Do Ato Empático à Vida em Comum

Como vimos, existe no ser humano uma necessidade fundamental que se traduz como abertura para dentro e para fora e que lhe permite dirigir-se a si mesmo e ao mundo externo configurado por seu espírito criativo e repleto de bens culturais. Mundo no qual se efetiva a experiência de si mesmo e do outro, enfim, mundo intersubjetivo. A intersubjetividade se revela como necessidade do outro para a formação e como exigência mesma para conhecer, porque toda experiência do indivíduo passa também pela experiência do outro (Stein,1916/2005aStein, E. (2005a). Introducción a la filosofía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1916); 1917/2005cStein, E. (2005c). Sobre el problema de la empatía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 71-204). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1917)). O ato que possibilita o conhecimento entre duas alteridades é traduzido pela filósofa como empatia. A vivência empática é, portanto, a sede, o princípio vital da vida compartilhada entre sujeitos, o que envolve, por sua vez, os valores, a ética e a autoformação (Ales Bello, 2000Ales Bello, A. (2000). A fenomenologia do ser humano: Traços de uma filosofia do feminino (A. Angonese, Trad.). Bauru: Edusc., 2006Ales Bello, A. (2006). Introdução à fenomenologia (J. T. Garcia & M. Mahfoud, Trads.). Bauru, SP: Edusc. , 2007aAles Bello, A. (2007a). The study of the soul between psychology and phenomenology at Edith Stein. International Journal of Philosophy of Culture and Axiology, 4, 90-108. doi: 10.5840/cultura2007427.
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, 2015Ales Bello, A. (2015). Pessoa e comunidade: Comentários. Psicologia e Ciências do Espírito de Edith Stein. Belo Horizonte: Artesã Editora.; Barreira, 2014Barreira, C. R. A. (2014) A bela adormecida e outras vinhetas. A empatia, do corpo a corpo cotidiano à clínica. In J. Savian Filho (Org), Empatia. Edmund Husserl e Edith Stein: Apresentações didáticas (pp. 53-92). São Paulo: Edições Loyola.; Stein, 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918), 1917/2005cStein, E. (2005c). Sobre el problema de la empatía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 71-204). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1917)).

É por meio da vivência empática que acontece o conhecimento e o intercâmbio entre o eu e o tu. Vivência que é consciencial, que faz referência à percepção e à noção de si mesmo como eu sou - não apenas à consciência de um modo de ser - e, ao mesmo tempo, à consciência da existência de um alter ego, podendo o conhecimento do outro alcançar graus de profundidade que permitem captá-lo em sua singularidade (Ales Bello, 2004Ales Bello, A. (2004). Fenomenologia e ciências humanas (M. Mahfoud & M. Massimi, Trads.). Bauru: Edusc., 2006Ales Bello, A. (2006). Introdução à fenomenologia (J. T. Garcia & M. Mahfoud, Trads.). Bauru, SP: Edusc. , 2007aAles Bello, A. (2007a). The study of the soul between psychology and phenomenology at Edith Stein. International Journal of Philosophy of Culture and Axiology, 4, 90-108. doi: 10.5840/cultura2007427.
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; Mahfoud, 2007Mahfoud, M. (2007). Centro pessoal e núcleo comunitário, segundo Edith Stein: Indicações para estudos sobre família. In L. Moreira & A. M. A. Carvalho (Orgs.), Família, subjetividade, vínculos (pp. 107-124). São Paulo: Paulinas.). Esse dinamismo expõe o encontro de um eu com outro eu, traduzindo o campo da intersubjetividade como uma relação fundante para a autoformação, campo no qual a consciência de ser notado e avaliado remete a questionamentos do próprio modo de ser no mundo. Nesse confronto, o eu pessoal toma as provocações que se estabelecem de um modo ou de outro, colocando em jogo a autoformação, ou em direção a tornar-se si mesmo ou no sentido inverso, para longe de seu eu autêntico (Mahfoud, 2007Mahfoud, M. (2007). Centro pessoal e núcleo comunitário, segundo Edith Stein: Indicações para estudos sobre família. In L. Moreira & A. M. A. Carvalho (Orgs.), Família, subjetividade, vínculos (pp. 107-124). São Paulo: Paulinas.).

Pela empatia é possível entrar em contato com o outro, sentir ou captar o que se passa em sua interioridade, colocando-se em relação para compreender aquilo que ele vivencia, porquanto possui a mesma estrutura humana, ainda que os conteúdos vivenciados sejam distintos e apesar de a interioridade alheia não ser totalmente transparente e alcançável. O ato de colher a experiência alheia, que pode permanecer na fronteira do superficial ou adentrar as esferas mais profundas, é uma possibilidade essencial para o fenômeno intersubjetivo, embora possua as suas restrições (Ales Bello, 2007aAles Bello, A. (2007a). The study of the soul between psychology and phenomenology at Edith Stein. International Journal of Philosophy of Culture and Axiology, 4, 90-108. doi: 10.5840/cultura2007427.
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; Barreira, 2014Barreira, C. R. A. (2014) A bela adormecida e outras vinhetas. A empatia, do corpo a corpo cotidiano à clínica. In J. Savian Filho (Org), Empatia. Edmund Husserl e Edith Stein: Apresentações didáticas (pp. 53-92). São Paulo: Edições Loyola.; Savian Filho, 2014Savian Filho, J. (2014). A empatia segundo Edith Stein. Pode-se empatizar a “vivência” de alguém que está dormindo? In J. Savian Filho (Org), Empatia. Edmund Husserl e Edith Stein: Apresentações didáticas (pp. 29-52). São Paulo: Edições Loyola.). A empatia não se reduz a uma mera identificação do outro, mas exprime também a possibilidade de captar e experimentar o objeto ou o conteúdo de suas experiências, colocar-se em seu lugar e compreendê-lo, como também de vidas compartilhadas. Nesse sentido, é possível apreender aquilo que o outro está vivendo e estabelecer relações de compreensão recíproca, mas jamais viveríamos a experiência alheia, uma vez que esta é originariamente particular e de fato intransferível (Stein, 1917/2005cStein, E. (2005c). Sobre el problema de la empatía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 71-204). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1917)).

A empatia se revela como um ato fundamental para o reconhecimento da alteridade. Como a empatia é compreendida como o ato que possibilita o contato intersubjetivo, e a intersubjetividade remete à conduta nas relações inter-humanas, percebemos que existe uma fundamentação empática do campo ético desde os primeiros degraus de sua manifestação, no reconhecimento do outro como igualmente humano, como na consciência de sua diferença respeitando-a, bem como no cuidado com a experiência e as necessidades alheias (Ales Bello, 2004Ales Bello, A. (2004). Fenomenologia e ciências humanas (M. Mahfoud & M. Massimi, Trads.). Bauru: Edusc., 2007bAles Bello, A. (2007b). Família e intersubjetividade. In L. Moreira & A. M. A. Carvalho (Orgs.), Família, subjetividade, vínculos (pp. 83-106). São Paulo: Paulinas.; Barreira, 2014Barreira, C. R. A. (2014) A bela adormecida e outras vinhetas. A empatia, do corpo a corpo cotidiano à clínica. In J. Savian Filho (Org), Empatia. Edmund Husserl e Edith Stein: Apresentações didáticas (pp. 53-92). São Paulo: Edições Loyola.). “Na relação com o outro se coloca inerentemente a conduta ética, quer se pense ou não nela” (Barreira, 2014Barreira, C. R. A. (2014) A bela adormecida e outras vinhetas. A empatia, do corpo a corpo cotidiano à clínica. In J. Savian Filho (Org), Empatia. Edmund Husserl e Edith Stein: Apresentações didáticas (pp. 53-92). São Paulo: Edições Loyola., p. 55-56).

É verdade que se pode negar o reconhecimento do outro, em função de sua diferença, como outro eu igualmente humano. Essa negação, como adverte Ales Bello (2004Ales Bello, A. (2004). Fenomenologia e ciências humanas (M. Mahfoud & M. Massimi, Trads.). Bauru: Edusc.), nasce da insegurança que a diferença provoca no âmbito do psiquismo, na qual se constata uma primeira reação de afastar o diferente, como se fosse uma ameaça ao nosso mundo. Isso significa que nesse nível a empatia pode ser negada. Contudo, tais reações no campo psíquico podem ser superadas pela atividade espiritual, ou seja, uma ação intelectual e voluntária que se coloca acima e questiona nossas ações. “A alteridade se reconhece através da entropatia,7 7 Ales Bello (2004) adota o termo entropatia justificando sua preferência por essa tradução. Entretanto, ela está se referindo ao processo empático descrito por Edith Stein em sua tese doutoral. mas depois é preciso uma tomada de posição espiritual; ...encontro-me diante de outro ser humano, ainda que não me agrade, ainda que eu não queira, que atrapalhe” (Ales Bello, 2004Ales Bello, A. (2004). Fenomenologia e ciências humanas (M. Mahfoud & M. Massimi, Trads.). Bauru: Edusc., p. 193).

Existem diferentes espaços intersubjetivos nos quais se desenlaça o processo formativo do sujeito, entretanto o tipo de associação dado como o ambiente de autorrealização e autoformação mais ajustado para o germinar da pessoa é a comunidade (Ales Bello, 2000Ales Bello, A. (2000). A fenomenologia do ser humano: Traços de uma filosofia do feminino (A. Angonese, Trad.). Bauru: Edusc., 2007bAles Bello, A. (2007b). Família e intersubjetividade. In L. Moreira & A. M. A. Carvalho (Orgs.), Família, subjetividade, vínculos (pp. 83-106). São Paulo: Paulinas., 2015Ales Bello, A. (2015). Pessoa e comunidade: Comentários. Psicologia e Ciências do Espírito de Edith Stein. Belo Horizonte: Artesã Editora.; Mahfoud, 2007Mahfoud, M. (2007). Centro pessoal e núcleo comunitário, segundo Edith Stein: Indicações para estudos sobre família. In L. Moreira & A. M. A. Carvalho (Orgs.), Família, subjetividade, vínculos (pp. 107-124). São Paulo: Paulinas.; Stein, 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)). Existe um tipo de associação inconfundível com a vida comunitária: a massa, tipo de associação no qual o desenvolvimento e a realização do outro não é colocado em pauta, prevalecendo as finalidades egoísticas. A massa é caracterizada pelo contágio psíquico e nesse caso a atividade espiritual - que diz respeito à reflexão e ao discernimento - encontra-se arrefecida por sua ação, de modo que os sujeitos se deixam conduzir por reações instintivas. Outro tipo de organização que se diferencia é a sociedade; agregação qualificada por uma finalidade de ordem intelectual ou ética, na qual se sobressaem os interesses e as disposições em torno dos quais os sujeitos se congregam, contudo, sem ligações pessoais.

É impossível se referir ao termo pessoa e ao processo de formação desta sem mencionar a vida comunitária como espaço de sua constituição. Nela está implicada uma conexão profunda entre seus membros, porque seus vínculos são assinalados pelo predomínio das ligações pessoais, sendo estas marcadas pela responsabilidade recíproca e, desse modo, cada membro é avaliado como insubstituível. Nesse sentido, trata-se de uma vida em comum que conduz à característica estrutural de abertura do sujeito humano ao âmbito do mundo dos valores e da ética, objetivando o germinar da totalidade tripartida. Na comunidade o sujeito se implica, interessa, ocupa e se responsabiliza pela vida alheia, julgando os valores sobre os quais se propõe a viver uma vida em comum, podendo livremente ligar-se ou desligar-se.

O processo de formação da pessoa se inicia em uma comunidade familiar que precisa responder às suas necessidades físicas, psíquicas e espirituais, criando condições para o seu desenvolvimento, e segue em outros espaços comunitários, que poderão ou não despertar outras potencialidades, aperfeiçoar aquelas que já se encontram desabrochadas e, ainda, provocar novas tomadas de posição que culminem em atos criativos (Ales Bello, 2007bAles Bello, A. (2007b). Família e intersubjetividade. In L. Moreira & A. M. A. Carvalho (Orgs.), Família, subjetividade, vínculos (pp. 83-106). São Paulo: Paulinas.; Coelho Júnior & Mahfoud, 2006Coelho Júnior, A. G., & Mahfoud, M. (2006). A relação pessoa-comunidade na obra de Edith Stein. Memorandum, 11, 8-27. Recuperado de http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/a11/coelhomahfoud01.htm.
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; Stein, 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918), 1923/2007cStein, E. (2007c). ¿Qué es la fenomenología? In Obras completas. Escritos filosóficos etapa de pensamiento cristiano (vol. III, A. Pérez, J. Mardomingo & C. R. Garrido, Trads., pp. 145-159). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1923)).

A vida em comunidade é uma vida em comum notadamente marcada por atos sociais, é um convite para viver uns com os outros e realizar atos propriamente humanos. Estar e viver junto ao(s) outro(s) significa vê-lo(s) agir e ao mesmo tempo agir com ele(s), ajudar a formar e ser formado por ele(s), portanto, é possível afirmar que a vida humana é uma vida cultural (Stein, 1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933)). Com efeito, a comunidade é avaliada como uma estrutura orgânica e um espaço de formação, distinguindo uma relação de interdependência entre seus membros, na qual uns afetam os outros conforme os posicionamentos assumidos. Cada comunidade possui uma história marcada por valores estéticos, éticos, religiosos e pessoais, expressando dimensões de prescrição de comportamentos e aspectos que vivificam e fortalecem a vida em comum (Ales Bello, 1998Ales Bello, A. (1998). Culturas e religiões: Uma leitura fenomenológica (A. Angonese, Trad.). Bauru: Edusc., 2000Ales Bello, A. (2000). A fenomenologia do ser humano: Traços de uma filosofia do feminino (A. Angonese, Trad.). Bauru: Edusc., 2015Ales Bello, A. (2015). Pessoa e comunidade: Comentários. Psicologia e Ciências do Espírito de Edith Stein. Belo Horizonte: Artesã Editora.; Coelho Júnior & Mahfoud, 2006Coelho Júnior, A. G., & Mahfoud, M. (2006). A relação pessoa-comunidade na obra de Edith Stein. Memorandum, 11, 8-27. Recuperado de http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/a11/coelhomahfoud01.htm.
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; Stein, 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)). As comunidades particulares se fundam pela associação, objetivando atos produtivos, com base em modos de pensar que aproximam os indivíduos, em condições e modos de vida comuns ou em uma origem em comum, como é o caso do povo e da família (Stein, 1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933)). A força vital de uma comunidade é considerada subjetiva pelo fato de nascer de seus membros e depender da maneira como cada um se posiciona e se envolve em sua formação e manutenção, mas também possui fontes objetivas que podem ser identificadas nos valores que são compartilhados, como nas características territoriais e nas obras culturais da vida comunitária (Ales Bello, 2000Ales Bello, A. (2000). A fenomenologia do ser humano: Traços de uma filosofia do feminino (A. Angonese, Trad.). Bauru: Edusc.; Coelho Júnior & Mahfoud, 2006Coelho Júnior, A. G., & Mahfoud, M. (2006). A relação pessoa-comunidade na obra de Edith Stein. Memorandum, 11, 8-27. Recuperado de http://www.fafich.ufmg.br/~memorandum/a11/coelhomahfoud01.htm.
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; Stein, 1916/2005aStein, E. (2005a). Introducción a la filosofía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1916), 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)). Para formar uma unidade de vivência comunitária é necessário antes um fluxo de vivências coletivas intensas cujo vínculo entre seus membros seja fundamentado pela reciprocidade (Stein, 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)).

A vida espiritual da comunidade revela uma abertura para o mundo objetivo e, ao mesmo tempo, a existência de um fluxo de vivências comunitárias contemporâneas aos seus membros, as quais se somam àquelas que se transmitem de geração em geração, compondo uma história repleta de sentidos, que garante a sua continuidade. Isso significa que existe uma unidade qualitativa no interior desse tipo de associação, a qual se constitui a partir de um centro para uma totalidade, expressando uma ligação mais viva e profunda entre seus membros, que proporciona o sentimento de pertença e o livre engajamento e envolvimento pessoal. A forma como os membros se vinculam expressa a qualidade da inserção e da relação que cada um estabelece com o todo, e isso significa que uma comunidade se diferencia da outra também em função do posicionamento pessoal. De acordo com a autora, a forma mais alta de comunidade corresponde à união de pessoas totalmente livres, porque a aceitação e a convicção que as movem a vincular suas vidas são fundamentadas pela atividade espiritual de maneira autêntica e, portanto, não são o efeito de um contágio psíquico que as arrasta e agrupa impulsivamente, sem reflexão e autonomia, como no caso da massa.

O conteúdo da vivência comunitária é traduzido como um núcleo de sentido comum para o qual os seus membros se dirigem, mas a maneira de vivenciá-lo é sempre pessoal. Com efeito, “assim como o conteúdo de sentido está revestido de uma coloração vivencial, assim também o vivenciar, por outro lado, está determinado pelo sentido do conteúdo” (Stein, 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918), p. 352, tradução nossa).8 8 “Así como el contenido de sentido está revestido de una coloración vivencial, así también el vivenciar, por otra parte, está determinado per lo sentido del contenido” (Stein, 1918/2005b, p. 352, tradução nossa). Disso resulta que cada membro vive como pessoa e como comunidade e isso significa que sua singularidade não é suprimida pelo conjunto, pois permanece sempre como eu pessoal, vivendo de maneira particular aquilo que é vivido na vida comunitária (Stein, 1918/ 2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918); Ales Bello, 2015Ales Bello, A. (2015). Pessoa e comunidade: Comentários. Psicologia e Ciências do Espírito de Edith Stein. Belo Horizonte: Artesã Editora.).

Para a filósofa, é somente por meio da abertura de um indivíduo para o outro que acontece a reciprocidade, princípio considerado fundamental para a constituição de uma comunidade. Sem a reciprocidade não existe um compromisso ético de responsabilização com a vida do outro e tampouco de solidariedade e cuidado, elementos essenciais para compô-la. Como realça Stein (1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918), p. 423, tradução nossa)9 9 “...allí existe una vida comunitária, allí ambos son miembros de la totalidad” (1918/2005b, p. 423, tradução nossa). , onde existe abertura entre as pessoas e suas atitudes penetram, irradiam e estimulam a vida do outro, é possível gerar uma unidade, de modo que “ali existe uma vida comunitária, ali ambos são membros de uma totalidade”. Quando o outro é apenas tomado e tratado como um objeto que atende a determinados interesses pessoais, em lugar de ser reconhecido e valorizado como pessoa, é quebrada a unidade de vida - aquilo que constitui a essência da comunidade - e se extingue a possibilidade de um mundo de e uma energia em comum. As atitudes que exprimem abertura não são apenas fundamentais para constituir uma comunidade, mas necessárias para a qualidade de seus laços, sua continuidade e vitalidade.

Toda tomada de posição em direção a algo e a alguém diz respeito aos valores que se encontram vinculados ao ser da pessoa e também fazem referência à vida em comum. A comunidade precisa de valores para existir e ter continuidade; são eles que determinam o engajamento de seus membros e o empenho para cultivá-los. Tanto os valores objetivos quanto aqueles pessoais podem desencadear atitudes específicas e seus conteúdos podem produzir energia capaz de vivificar a vida espiritual individual e comunitária. Quando os valores são vividos com consciência, discernimento e responsabilidade, tornam-se a expressão da vida comunitária.

A tomada de posição de cada membro em relação ao outro se diferencia pelo seu caráter positivo ou negativo e pode intervir diretamente em sua vida interior; porque nela se afirma ou se nega o outro como pessoa, respectivamente (Stein, 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)). Segundo Stein (1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933)), as tomadas de posição como o amor, o respeito ou a admiração, são alcançadas como atos sociais, uma vez que compõem uma resposta a valores pessoais e, portanto, considerados essenciais para um projeto de vida compartilhado. O amor se torna fato espiritual quando indica abertura ao outro, significando que o outro ocupa um lugar capital na associação comunitária; seu valor se traduz pelo desejo de seu bem-estar, pela aceitação de seu ser singular e elevação de suas capacidades pessoais (Ales Bello, 2007bAles Bello, A. (2007b). Família e intersubjetividade. In L. Moreira & A. M. A. Carvalho (Orgs.), Família, subjetividade, vínculos (pp. 83-106). São Paulo: Paulinas.; Stein, 1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933), 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)). Todos os atos dirigidos ao outro são passíveis de atingi-lo, influenciá-lo e provocar algum tipo de posicionamento, uma vez que a pessoa os experimenta em seu íntimo (Stein, 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)). Ajuizamos que, por esta razão - partindo do princípio de que o ser humano possui liberdade e é capaz de realizar atos livres e de que, em função disso, é convocado a uma responsabilidade pessoal em relação a si mesmo, no que diz respeito à sua autoconfiguração e igualmente ao outro, pois suas ações afetam a vida alheia -, o amor traduzido como abertura e não apenas como sentimento implica em reciprocidade, em querer o bem do outro e também em responsabilização.

As posturas adotadas ante o outro em particular e em relação ao conjunto refletem a questão da ética nas relações inter-humanas. Ética que se refere à vida em comum e possui um papel fundamental que orienta as posturas para a vida do nós. Uma vez ferida essa ética, produzem-se efeitos devastadores, tanto individual quanto coletivamente. A questão ética está presente em todas as exposições da antropologia steiniana e se revela de modo peculiar em cada detalhe explicitado na relação entre a pessoa e a comunidade. Não apenas a comunidade como um todo deverá adotar uma postura ética em relação ao novo membro que irá compô-la, como também a pessoa em suas atitudes particulares deverá assumi-la em relação à mesma.

Concluímos que o princípio fundamental que diz respeito à ética se expressa no ato empático, inicialmente no movimento que permite reconhecer que diante de si encontra-se um outro, igualmente humano em razão da similaridade de sua estrutura constitutiva. Em seguida, esse reconhecimento deve lidar com a diferença que o torna singular e, nesse aspecto, sua valorização ultrapassa o primeiro nível do “dar-se conta de” outro ser humano, para apreender que a diversidade não o desqualifica como tal, mas aumenta o seu valor. Com efeito, o valor pessoal remete ao respeito à sua liberdade de expressão no que se refere a ser si mesmo, no pensar e no ser diferente, que faz referência ao seu eu pessoal, único e não repetível. Nesse nível, não basta dar-se conta da alteridade, mas é necessário criar espaço e condições para que o outro possa ser si mesmo.

Buscar o bem comum é considerar a pessoa e a comunidade, tarefa nada fácil, uma vez que exige juízos, reflexão e posicionamentos que se orientem por uma ética. Reconhecimento, respeito à diferença, valorização do outro como pessoa e responsabilidade com a sua vida exprimem abertura e ética. Atos que se iniciam na empatia e estão sujeitos à liberdade, podendo ser negados aos extremos e conduzir para direções menos favoráveis ao crescimento e realização do outro.

O pertencimento a uma comunidade é valor que se julga e que se incorpora, é a ética adotada como fio condutor que norteia as tomadas de posição entre seus membros e também em relação às outras comunidades que compõem a humanidade. Ética que se desenvolve num contexto intersubjetivo e que resulta da capacidade intelectiva de reflexão, de um juízo sobre as questões correlacionadas às relações inter-humanas, que implica em liberdade de decisão e em vontade de realização.

Para Stein (1923/2007cStein, E. (2007c). ¿Qué es la fenomenología? In Obras completas. Escritos filosóficos etapa de pensamiento cristiano (vol. III, A. Pérez, J. Mardomingo & C. R. Garrido, Trads., pp. 145-159). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1923)), as comunidades, de forma geral, têm responsabilidade na formação do indivíduo. Nesse sentido, a comunidade familiar é o primeiro espaço de formação da pessoa humana, nela os valores dos pais são disponibilizados e cada filho em particular é reconhecido como pessoa independente e pode posicionar-se livremente, no sentido de poder tomá-los e assumi-los como seus. Por esta razão, existe uma responsabilização com o material oferecido para a formação de uma pessoa, mas isso não extingue a responsabilidade individual que se exprime pela forma pessoal como ela se posiciona.

A consciência de fazer parte de uma comunidade desperta a consciência da responsabilidade pessoal e coletiva em relação à totalidade e, ao mesmo tempo, acende uma atitude de autoavaliação em cada um dos membros sobre os comportamentos pessoais em relação ao todo; e pensamos que a capacidade de dar-se conta e refletir sobre os atos individuais e comunitários permite o desenvolvimento, o amadurecimento e o aperfeiçoamento da vida ética (Ales Bello, 2007bAles Bello, A. (2007b). Família e intersubjetividade. In L. Moreira & A. M. A. Carvalho (Orgs.), Família, subjetividade, vínculos (pp. 83-106). São Paulo: Paulinas.; Mahfoud, 2007Mahfoud, M. (2007). Centro pessoal e núcleo comunitário, segundo Edith Stein: Indicações para estudos sobre família. In L. Moreira & A. M. A. Carvalho (Orgs.), Família, subjetividade, vínculos (pp. 107-124). São Paulo: Paulinas.; Sberga, 2014Sberga, A. A. (2014). A formação da pessoa em Edith Stein. São Paulo: Paulus.; Stein, 1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933), 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918), 1923/2007cStein, E. (2007c). ¿Qué es la fenomenología? In Obras completas. Escritos filosóficos etapa de pensamiento cristiano (vol. III, A. Pérez, J. Mardomingo & C. R. Garrido, Trads., pp. 145-159). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1923)).

Diante do exposto, pensamos que o amor, definido pela autora como abertura e como ato social, se revela como atividade da vida espiritual que favorece a intersubjetividade no sentido da construção de um nós. Construção que resulta num exercício do querer e da liberdade, porque não se pode obrigar o outro a amar, bem como não se pode impor-lhe uma abertura ou um tipo de vida em comum. Conforme as colocações steinianas, o amor como ato espiritual busca o bem comum, cria condições para que o outro possa tornar-se o que é e, além disso, não lhe impõe as coisas, mas respeita e permite que seja livre. Diante do exposto, pensamos que o amor encontra-se intimamente ligado à ética, uma vez que a abertura e o posicionar-se em relação ao outro, nos termos discutidos, envolvem amor e ética. Nessa perspectiva, poderia o amor, como ato social, também ser a ética nas relações inter-humanas?

Conjugalidade: Construindo a Vida do “Eu” e do “Nós”

Existem vários tipos de organizações que espelham vinculações do tipo comunitárias, a família é uma delas e, em nosso entender, a conjugalidade também pode ser traduzida nesse âmbito - um tipo de associação que diz respeito à construção do “nós” e que exprime características fundamentais para sua constituição e continuidade. Tomada como associação comunitária, a conjugalidade se traduz como uma aliança fundada num compromisso ético que sustentará um projeto de vida comum compartilhado. Contudo, diferente de outros tipos de comunidade, a conjugalidade possui também um vínculo sexual (Saint-Arnaud, 1984Saint-Arnaud, Y. (1984). A pessoa humana: Introdução ao estudo da pessoa e das relações interpessoais. São Paulo: Loyola.). Nos termos refletidos em relação à ética, consideramos que o vínculo conjugal também possui o seu eixo no ato empático e, por conseguinte, sua constituição possui a exigência do reconhecimento da alteridade e da consciência de que a singularidade do outro é terreno sagrado. Na perspectiva comunitária, a vida conjugal pode ser considerada um espaço intersubjetivo marcado por ligações pessoais profundas, que exige abertura e reciprocidade como atos que orientam o casal para a responsabilidade mútua e para o cuidado com a vida do outro. Mas, como vimos, a abertura não é uma imposição, e sim o efeito de um ato de liberdade e vontade, e apenas nessas condições a ligação entre o par e a sua continuidade pode ser compreendida como sendo autêntica, em virtude de ser fundada em um posicionamento pessoal resultante de uma atividade espiritual e não apenas como consequência de um contágio psíquico, embora isso possa acontecer em certos tipos de aliança.

A relação intersubjetiva, nesses termos, se torna um espaço favorável para que cada um possa desenvolver-se, descobrir-se e dar continuidade ao seu processo formativo iniciado em sua família de origem; pois a família é o primeiro espaço de autoformação, mas não é o único, encontrando-se em interconexão com outras comunidades formadoras (Almeida, 2016Almeida, E., & Romagnoli, R. C. (2016). O processo de identificação e repetição com os modelos intrafamiliares e socioculturais e o ato criativo na perspectiva de Edith Stein. Revista do NUFEN, 8(1), 91-109. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2175-25912016000100007&lng=pt&tlng=pt.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
). Nessa perspectiva, construir um espaço favorável para o nós significa permitir o desabrochar do eu autêntico de cada um que compõe o casal e, nesse caso, o outro é avaliado como alguém insubstituível: posicionamento considerado essencial na constituição do laço comunitário (Ales Bello, 2007bAles Bello, A. (2007b). Família e intersubjetividade. In L. Moreira & A. M. A. Carvalho (Orgs.), Família, subjetividade, vínculos (pp. 83-106). São Paulo: Paulinas.; Mahfoud, 2007Mahfoud, M. (2007). Centro pessoal e núcleo comunitário, segundo Edith Stein: Indicações para estudos sobre família. In L. Moreira & A. M. A. Carvalho (Orgs.), Família, subjetividade, vínculos (pp. 107-124). São Paulo: Paulinas.; Stein, 1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933), 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)).

O vínculo conjugal também envolve a solidariedade e o amor como atos de reciprocidade na busca do bem do outro, no desejo de seu bem-estar, na aceitação de seu ser singular e na elevação de suas capacidades pessoais. Viver a conjugalidade como comunidade significa acolher o outro de maneira que ele possa sentir o seu pertencimento ao conjunto. Abrigar o outro se traduz no reconhecimento e valorização de sua singularidade, na consciência de que o pertencimento a um nós envolve uma responsabilidade recíproca. De tal modo, a vida conjugal pode ser tomada como comunitária, porque, conforme expõe Mahfoud (2007Mahfoud, M. (2007). Centro pessoal e núcleo comunitário, segundo Edith Stein: Indicações para estudos sobre família. In L. Moreira & A. M. A. Carvalho (Orgs.), Família, subjetividade, vínculos (pp. 107-124). São Paulo: Paulinas.), o viver algo em comum é o que torna uma relação a expressão de uma comunidade e, como afirma Ales Bello (2000Ales Bello, A. (2000). A fenomenologia do ser humano: Traços de uma filosofia do feminino (A. Angonese, Trad.). Bauru: Edusc.), o que a caracteriza fundamentalmente é a existência de um objetivo e uma finalidade comum, o que permite dizer que carrega em si um caráter estritamente pessoal.

O campo intersubjetivo é uma necessidade constitucional que preenche a alma humana e dá sentido à sua existência. Em condições favoráveis, permite ao sujeito tornar-se si mesmo e pertencer; entre outras exigências próprias da sua condição, possibilita o amar e o ser amado. Nessa perspectiva, se “a família se apresenta como o modo mais completo de comunidade”, como explicita Ales Bello (2007bAles Bello, A. (2007b). Família e intersubjetividade. In L. Moreira & A. M. A. Carvalho (Orgs.), Família, subjetividade, vínculos (pp. 83-106). São Paulo: Paulinas., p. 99), a conjugalidade, enquanto um dos pontos de partida para o seu surgimento e composição, se revela como um dos espaços de autoconfiguração do sujeito humano que pode construir e cultivar as condições necessárias para formar o nós e o eu da maneira mais autêntica possível.

O amor como abertura possibilita a configuração de si mesmo e do nós (Almeida, 2016Almeida, E., & Romagnoli, R. C. (2016). O processo de identificação e repetição com os modelos intrafamiliares e socioculturais e o ato criativo na perspectiva de Edith Stein. Revista do NUFEN, 8(1), 91-109. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2175-25912016000100007&lng=pt&tlng=pt.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
; Almeida & Stengel, 2012Almeida, E., & Stengel, M. (2012). Individualismo e violência psicológica nas relações de conjugalidade. In R. C. Romagnoli & F. F. S. Martins (Orgs.), Violência doméstica: Estudos atuais e perspectivas (pp. 165-186). Curitiba: Editora CRV. ; Stein, 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)) em direção a uma ética que implica no reconhecimento da alteridade. A construção do nós exige um ato que ultrapasse as fronteiras da superficialidade, como um movimento de saída de si mesmo que busca penetrar na interioridade do outro e conhecê-lo, transformando-o em alguém reconhecidamente valorizado em sua singularidade. De tal modo, parece-nos que aquilo que mais se destaca na ética dessa configuração funda-se na questão da postura de alteridade dentro da relação, questão que se encontra intimamente ligada ao amor como abertura. Ética que parte do pressuposto de que ambos os parceiros procurarão atender às suas necessidades fundamentais de amor, de tornar-se si mesmo e igualmente às exigências próprias do ambiente sociocultural no qual o sujeito realiza sua autoformação, reconhecendo o outro como alguém singular na construção do nós (Almeida, 2016Almeida, E., & Romagnoli, R. C. (2016). O processo de identificação e repetição com os modelos intrafamiliares e socioculturais e o ato criativo na perspectiva de Edith Stein. Revista do NUFEN, 8(1), 91-109. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2175-25912016000100007&lng=pt&tlng=pt.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
; Almeida & Stengel, 2012Almeida, E., & Stengel, M. (2012). Individualismo e violência psicológica nas relações de conjugalidade. In R. C. Romagnoli & F. F. S. Martins (Orgs.), Violência doméstica: Estudos atuais e perspectivas (pp. 165-186). Curitiba: Editora CRV. ; Stein, 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)). Nessa lógica, o nós não deve ser confundido com uma fusão na qual os parceiros perdem a identidade individual, mas sim considerado como o comum compartilhado que oferece abertura para que cada um possa tornar-se casal e, ao mesmo tempo, si mesmo; ele não apaga as individualidades, ao contrário, as acende quando é constituído como um terreno que fomenta o crescimento e a realização pessoal.

Diz-nos Ales Bello (2015Ales Bello, A. (2015). Pessoa e comunidade: Comentários. Psicologia e Ciências do Espírito de Edith Stein. Belo Horizonte: Artesã Editora.) que a garantia da identidade pessoal só é possível se uma comunidade funciona bem. Contudo, é preciso considerar que em todos os tipos de comunidades, e a conjugalidade não seria uma exceção, nem todos os indivíduos que as compõem desenvolveram em suas vidas a abertura e as posturas transcendentes tão necessárias para que o ambiente em que vivem seja adequado à formação do nós e do si mesmo. Posicionamentos contrários às exigências para a formação da conjugalidade nas duas direções são possíveis em todas as épocas, mas são especialmente sustentados na contemporaneidade. Atitudes de violência psicológica são desferidas no espaço conjugal quando um se coloca acima do outro e tenta minar sua existência, tentando impedir que sua singularidade ascenda (Almeida, 2016Almeida, E., & Romagnoli, R. C. (2016). O processo de identificação e repetição com os modelos intrafamiliares e socioculturais e o ato criativo na perspectiva de Edith Stein. Revista do NUFEN, 8(1), 91-109. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2175-25912016000100007&lng=pt&tlng=pt.
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; Almeida & Stengel, 2012Almeida, E., & Stengel, M. (2012). Individualismo e violência psicológica nas relações de conjugalidade. In R. C. Romagnoli & F. F. S. Martins (Orgs.), Violência doméstica: Estudos atuais e perspectivas (pp. 165-186). Curitiba: Editora CRV. ). Além disso, existe uma coexistência de atitudes de fechamento sobre si mesmo - alimentadas pela exacerbação dos valores individualistas e narcisistas - e de abertura ao outro (Almeida, 2012Almeida, E., & Stengel, M. (2012). Individualismo e violência psicológica nas relações de conjugalidade. In R. C. Romagnoli & F. F. S. Martins (Orgs.), Violência doméstica: Estudos atuais e perspectivas (pp. 165-186). Curitiba: Editora CRV. ). Para que a vida como “nós” seja favorável ao casal, é necessária uma constante autoavaliação, negociação e desenvolvimento de uma ética que permita ao outro abrir-se às experiências que o conduzam a ser si mesmo. Quando o espaço conjugal no qual o sujeito se encontra oferece condições para ser si mesmo e desenvolver-se nessa direção, expressa a forma mais alta de comunidade, conforme as reflexões steinianas, pois nele pode cada um se posicionar livremente e ser valorizado como pessoa única e insubstituível.

Assim como a realidade tripartida é preenchida pelas produções culturais que habitam no território em que o sujeito se desenvolve (Stein, 1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933)), concluímos que o vínculo conjugal é a construção do nós tecido segundo um horizonte de significados do contexto sociocultural. A vivência da conjugalidade assume a forma de um contrato no qual se pressupõe que ambos irão definir suas bases em regras, valores, exigências, expectativas, deveres e responsabilidades de acordo com o ambiente cultural no qual estão inseridos. Conforme explicita Almeida (2012Almeida, E., & Stengel, M. (2012). Individualismo e violência psicológica nas relações de conjugalidade. In R. C. Romagnoli & F. F. S. Martins (Orgs.), Violência doméstica: Estudos atuais e perspectivas (pp. 165-186). Curitiba: Editora CRV. ), em termos de expectativas - mesmo ante a heterogeneidade de configurações amorosas que se apresentam na atualidade e a fluidez e transitoriedade das regras e valores morais -, destacam-se alguns aspectos que pareceram ser os mais relevantes para um projeto de vida compartilhado: a liberdade na escolha do parceiro, a manutenção da relação baseada na presença do amor, a atração sexual, o respeito à individualidade, liberdade e autonomia e o compromisso de exclusividade ou fidelidade.

A Conjugalidade como Espaço de Autoformação para os Filhos

Definida como comunidade, a conjugalidade faz fronteira com o ambiente sociocultual e se revela como um dos espaços que atua na formação da pessoa. O processo de autoformação se desenha em meio ao universo cultural com o qual a pessoa se depara ao ser lançada no mundo, sendo por isso determinada, em certa medida, pelos mais diversos conteúdos de sentido nele configurados (Stein, 1923/2007aStein, E. (2007a). Naturaleza, libertad y gracia. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa de pensamiento cristiano (vol. III, A. Pérez, J. Mardomingo & C. R. Garrido, Trads., pp. 55-112). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1923)). Determinada, porque seu ser é preenchido pelo contexto desta realidade, e em certa medida, porque sua maneira de responder aos mesmos, no sentido de significá-los, é pessoal e, portanto, esbarramos nas mais diferentes respostas possíveis de um sujeito para outro.

Afirma Stein (1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933), 1916/2005aStein, E. (2005a). Introducción a la filosofía. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1916)) que o eu pessoal é livre e possuidor de uma consciência sobre as possibilidades e as exigências diante das quais realizará suas escolhas no processo de autoconfiguração. Entretanto, essa consciência não alcança uma imagem geral daquilo que o sujeito deve ser e, por isso mesmo, busca um modelo para um modo de ação. Assim sendo, a criança não surge com as características típicas de um grupo, mas as desenvolve na medida em que busca em seu mundo os modelos com os quais deverá identificar-se e na medida em que se deixa impactar por sua realidade (Stein, 1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933)). Segundo a filósofa, tomar como modelo significa conhecer uma pessoa e receber da mesma a impressão de que se poderia ser da mesma forma. Com efeito, tomar como modelo ou não uma pessoa e seu respectivo pensamento ou forma de pensar o mundo, é uma questão de decisão, portanto, trata-se de um ato livre. O ato de decidir resulta de uma atividade avaliativa e de um ato da vontade que são despertados em um contexto motivacional intimamente ligado ao mundo no qual se vive. Para que uma pessoa se veja motivada em uma direção e não em outra, precisa ativar o seu centro pessoal, julgar e posicionar-se.

A conjugalidade, como comunidade, possui uma unidade repleta de sentidos que se refere às vivências comuns e à dinâmica que são próprias do casal, e que pode se tornar uma referência para a formação dos filhos. Soma-se a isso o fato de que os atos efetivados no espaço comunitário afetam todos os membros e, nesse caso, as atitudes entre o casal se transformam em material que poderá nutrir a vida dos filhos. Stein (1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918)) afirma que é necessário ocorrer uma convicção em relação àquilo que se apresenta a uma pessoa, a fim de que este algo seja absorvido e passe a fazer parte de sua vida interior. Desse modo, pode ela identificar-se ao conteúdo de sentidos da conjugalidade parental e transformá-lo em um começo para um modo de pensar, o qual, uma vez admitido, afirmado e transformado em hábito, tornar-se-á tão sólido que posteriormente será complexo ceder a uma nova percepção. Com efeito, a questão da responsabilidade mútua se mostra fundamental, pois deixa de ser centrada apenas na relação direta dos pais com seus filhos e faz referência também ao cultivo da qualidade da relação entre o casal, independente de eles viverem juntos ou não.

Em Edith Stein percebemos que a identificação é uma das possibilidades no processo de autoconfiguração, uma vez que o ser humano possui uma dimensão criativa que emana do eu pessoal. O processo de tomar os modelos do mundo em que se vive numa perspectiva micro e macrossocial é apresentado como uma necessidade própria do humano, que precisa ser preenchido pelo entorno em que vive para ganhar vida e sentido, o que, entendemos, remete à questão da identificação, repetição e do ato de criação (Almeida & Romagnoli, 2016Almeida, E., & Romagnoli, R. C. (2016). O processo de identificação e repetição com os modelos intrafamiliares e socioculturais e o ato criativo na perspectiva de Edith Stein. Revista do NUFEN, 8(1), 91-109. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2175-25912016000100007&lng=pt&tlng=pt.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
). O fenômeno da identificação e da repetição é tomado como atividade espiritual em lugar de ser reduzido à vida da psique e suas leis, portanto, pode ser considerado, em certa medida, como sendo atos livres, regidos pelas leis de sentido ou motivação (Almeida, 2016Almeida, E. (2016). Assim como nossos pais? Possibilidades de reinvenção nas relações de conjugalidade (Tese de Doutorado em Psicologia). Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte. ; Almeida & Romagnoli, 2016Almeida, E., & Romagnoli, R. C. (2016). O processo de identificação e repetição com os modelos intrafamiliares e socioculturais e o ato criativo na perspectiva de Edith Stein. Revista do NUFEN, 8(1), 91-109. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2175-25912016000100007&lng=pt&tlng=pt.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
). A identificação expõe duas questões importantes: quanto à qualidade daquilo que está disponível no espaço no qual o sujeito se forma e quanto ao fato de minar ou ascender a sua singularidade. A grande questão é se aquilo que tomamos das relações intersubjetivas se soma ao que somos sem retirar de nós a nossa singularidade ou se, contrariamente, o que elegemos na identificação se sobrepõe à nossa individualidade, ou seja, nos leva para longe do que significaria ser si mesmo, distanciando-nos daquilo que deveríamos ser para assumir algo, muitas vezes, inversamente ao que se é. Isso significa que nas relações intersubjetivas podemos despertar aquilo que somos de fato somando com o tesouro das experiências alheias e, nesse caso, a identificação seria um enriquecimento, um ato livre de querer tornar-se, como afirma a filósofa, como aquele modelo que ajuizamos como desejável, mas sem que isso roube de nós a nossa singularidade no sentido de autenticidade. Se a conjugalidade dos pais, por exemplo, alcança atitudes éticas, pode ser ela uma referência de um bem com o qual os filhos queiram e devam se identificar.

A criatividade nasce da unidade entre corpo, psique e espírito em intercomunicação com o meio cultural, mas é por meio da esfera ativa que ela revela os vestígios da espontaneidade nos movimentos da mão que é orquestrada pelo eu pessoal; aqui ela ganha luz, forma e expressividade que são únicas. A espontaneidade é a essência mais alta que expressa um ato criativo, pois exprime que existe algo que o sujeito coloca de si mesmo e que escapa ao universo de sua socialização. A capacidade de criar e configurar faz parte do processo formativo e, para que não haja adestramento ou deformação da pessoa, “a formação que parte de fora tem que contar com a formação a partir de dentro” (Stein, 1930/2003b, p. 178, tradução nossa).10 10 “...la formación desde fuera tiene que contar con la formación desde dentro, si no hay adestramento y no formación, o deformación” (Stein, 1930/2003b, p. 178, tradução nossa).

Considerações Finais

Se a comunidade é considerada o ambiente mais favorável para a autoconfiguração, podemos considerar que a constituição do nós pode ser um processo de crescimento, de amadurecimento e de transformação que se concretiza à medida que cada um encontra espaço para tornar-se si mesmo. O contato com a alteridade, aplicado ao vínculo conjugal, remete o sujeito ao diferente do outro que pode movê-lo a olhar para dentro de si mesmo. Nesse confronto, o eu pessoal toma as provocações que se estabelecem, colocando em jogo a autoformação, ou em direção a tornar-se si mesmo, ou no sentido inverso.

As leis da motivação e a noção de pessoa permitem pensar que a experiência da alteridade e os acontecimentos que interpelam a existência do casal podem potencializar a reconfiguração do vivido em torno da conjugalidade parental. Assim, a conjugalidade não pode ser tomada apenas como lugar no qual se expressa o sentido atribuído ao vivido em família de origem, mas como espaço que pode oferecer condições para que o atual retrabalhe reconfigurando as vivências passadas, possibilitando igualmente que os parceiros possam recriar sua maneira de ser individual e ser casal. Estar com o outro pode ser um contínuo ato de autocriação que remete ao imprevisível. O ato criativo que diz respeito à autoformação se apresenta desde muito cedo, quando a criança toma para si o mundo de forma singular e imprevisível, quando reconfigura o vivido a partir de um olhar diferente de outrora, quando suas respostas são surpreendentes e diferentes do esperado, o seu modo de ser ultrapassa os modelos disponíveis no mundo que habita (Almeida & Romagnoli, 2016Almeida, E., & Romagnoli, R. C. (2016). O processo de identificação e repetição com os modelos intrafamiliares e socioculturais e o ato criativo na perspectiva de Edith Stein. Revista do NUFEN, 8(1), 91-109. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2175-25912016000100007&lng=pt&tlng=pt.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
). Mesmo diante dos limites impostos pela condição natural e pela sociedade na qual a criança nasce, a imprevisibilidade se encontra ali, dizendo que o sujeito humano não é determinado de modo absoluto e não se reduz à vida da psique.

Se na contemporaneidade encontramos valores que conduzem o homem a fechar-se sobre si mesmo e por vezes deixar de ver o outro como pessoa para tratá-lo como objeto, esses parecem golpear exatamente o princípio ético das relações inter-humanas, o ato empático que coloca o outro em situação de igualdade em sua diferença. No caso da conjugalidade, atitudes assim arrefecem a alteridade, o cuidado, o respeito e a responsabilidade com a vida do outro. Sem essas qualidades, não se pode dizer que a vida a dois caminhará em direção à autorrealização dos pares e sem os conflitos que resultam dessas posturas. Como adverte Stein (1923/2007aStein, E. (2007a). Naturaleza, libertad y gracia. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa de pensamiento cristiano (vol. III, A. Pérez, J. Mardomingo & C. R. Garrido, Trads., pp. 55-112). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1923)), nem tudo aquilo que preenche o homem é capaz de conduzi-lo a si mesmo, questão que remete à responsabilidade diante do que circula no mundo que o forja e que é, ao mesmo tempo, forjado por ele.

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  • *
    Apoio: CAPES
  • 6
    “...el espíritu es entendimiento y voluntad simultáneamente: conocer y querer se hallan recíprocamente condicionados” (Stein, 1932/1933/2003aStein, E. (2003a). Estructura de la persona humana. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 555-749). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1932/1933), p. 651)..
  • 7
    Ales Bello (2004Ales Bello, A. (2004). Fenomenologia e ciências humanas (M. Mahfoud & M. Massimi, Trads.). Bauru: Edusc.) adota o termo entropatia justificando sua preferência por essa tradução. Entretanto, ela está se referindo ao processo empático descrito por Edith Stein em sua tese doutoral.
  • 8
    “Así como el contenido de sentido está revestido de una coloración vivencial, así también el vivenciar, por otra parte, está determinado per lo sentido del contenido” (Stein, 1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918), p. 352, tradução nossa).
  • 9
    “...allí existe una vida comunitária, allí ambos son miembros de la totalidad” (1918/2005bStein, E. (2005b). Contribuiciones a la fundamentación filosófica de la psicologia de las ciencias del espiritu. In Obras completas. Escritos filosóficos: Etapa fenomenológica (vol. II, C. R. Garrido & J. L. C. Bono, Trads., pp. 655-913). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1918), p. 423, tradução nossa).
  • 10
    “...la formación desde fuera tiene que contar con la formación desde dentro, si no hay adestramento y no formación, o deformación” (Stein, 1930/2003bStein, E. (2003b). Sobre el concepto de formación. In Obras completas. Escritos antropológicos y pedagógicos (vol. 4, S. Fermín & F. Javier, Trads., pp. 177-194). Madrid: Monte Carmelo. (Original publicado em 1930), p. 178, tradução nossa).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    29 Dez 2016
  • Revisado
    30 Out 2017
  • Aceito
    16 Fev 2018
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