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Funções Executivas em Crianças com TDAH e/ou Dificuldade de Leitura

Resumo

Objetivou-se comparar o desempenho em Funções Executivas (FEs: controle inibitório, memória de trabalho auditiva e visuoespacial, flexibilidade cognitiva e fluência verbal) de crianças com TDAH, com dificuldade de leitura (DL), com comorbidade entre TDAH e dificuldade de leitura (TDAH/DL) e sem queixas de TDAH e dificuldades de leitura (SDL). Participaram 104 crianças, de ambos os sexos, com idades entre 8 e 11 anos. Os resultados apontaram piores desempenhos do TDAH/DL na maioria das FEs avaliadas quando comparado aos demais grupos. O grupo de crianças TDAH apresentou melhor desempenho do que o DL em fluência verbal semântica. O SDL obteve melhores escores que o TDAH/DL e o DL em praticamente todas as FEs avaliadas, mas não se diferenciou do TDAH.

Palavras-chave
controle executivo; déficit de atenção; leitura

Abstract

The objective of this study was to compare the Executive Functions performance (EFs: inhibitory control, auditory and visuospatial working memory, cognitive flexibility and verbal fluency) between children with ADHD, reading difficulties (RD), comorbidity ADHD/RD and without complaints of ADHD and RD (WRD). Participated 104 children, of both sexes, aged between eight and 11 years old. The results indicated worse performance of ADHD/RD group in the majority EFs. ADHD presented better performance than DL in semantic verbal fluency. The WRD obtained better scores than the ADHD / DL and DL in practically all the evaluated EFs, but did not differ of ADHD.

Keywords
executive control; attention deficit; reading

As Funções Executivas (FEs) envolvem um conjunto de habilidades que, de maneira articulada, dão ao sujeito a oportunidade de planejar, regular e orientar seu comportamento em relação às exigências e às demandas do ambiente (Mourão & Melo, 2011Mourão, C. A. M., & Melo, L. B. R. (2011). Integração de três conceitos: Função executiva, memória de trabalho e aprendizado. Psicologia: Teoria e Prática, 27(3), 309-314. http://www.scielo.br/pdf/ptp/v27n3/06.pdf.
http://www.scielo.br/pdf/ptp/v27n3/06.pd...
). Essas habilidades apresentam um papel biologicamente adaptativo, visto que as FEs são normalmente ativadas nos eventos em que o controle cognitivo das ações se faz necessário (Diamond, 2013Diamond, A. (2013). Executive functions. Annual Review of Psychology, 64, 135-68. https://doi.org/10.1146/annurev-psych-113011-143750.
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). A flexibilidade cognitiva, o controle inibitório, a memória de trabalho (Diamond & Ling, 2016Diamond, A., & Ling, D.S. (2016). Conclusions about interventions, programs, and approaches for improving executive functions that appear justified and those that, despite much hype, do not. Developmental Cognitive Neuroscience, 18, 34-48.) e a fluência verbal (Whiteside et al., 2016Whiteside, D., Kealey, T., Semla, M., Luu, H., Rice, L., Basso, M., & Roper, B. (2016). Verbal fluency: Language or executive function measure? Applied Neuropsychology Adult, 23(1), 29-34.) são algumas das habilidades de FEs.

Especificamente, a flexibilidade cognitiva pode ser definida como a capacidade de modificação consciente de perspectivas ou abordagens para solucionar um problema e adaptar-se, de forma flexível, às novas exigências, regras e prioridades. O controle inibitório, por sua vez, possibilita o controle da atenção, dos comportamentos, dos pensamentos e das emoções para substituir uma forte predisposição interna ou externa. Por meio da memória de trabalho, é possível manter e processar mentalmente informações sonoras ou visuais, tendo em vista a resolução de um problema. A fluência verbal é uma função básica da linguagem, medida pela quantidade de palavras produzidas em condições restritas de tempo (Charchat-Fichman et al., 2011Charchat-Fichman, H., Oliveira, R. M., & Silva, A. M. (2011). Performance of Brazilian children on phonemic and semantic verbal fluency tasks. Dementia Neuropsychologia, 5(2), 78-84. https://doi.org/10.1590/S1980-57642011DN05020004.
https://doi.org/10.1590/S1980-57642011DN...
; Diamond, 2013Diamond, A. (2013). Executive functions. Annual Review of Psychology, 64, 135-68. https://doi.org/10.1146/annurev-psych-113011-143750.
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).

Patologias como o Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH), Dificuldades de Leitura (DL) e sua comorbidade (TDAH/DL) apresentam-se associadas às dificuldades em FEs. Essa informação é reconhecida e investigada por diversos autores (Bental & Tirosh, 2007Bental, B., & Tirosh, E. (2007). The relationship between attention, executive functions and reading domain abilities in attention deficit hyperactivity disorder and reading disorder: a comparative study. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 48(5), 455-463. https://doi.org/10.1111/j.1469-7610.2006.01710.x
https://doi.org/10.1111/j.1469-7610.2006...
; Bolfer, 2014Bolfer, C. P. M. (2014). Avaliação neuropsicológica das funções executivas e da atenção antes e depois do uso do metilfenidato em crianças com transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (Doctoral dissertation). Faculdade de Medicina de São Paulo, São Paulo, Brasil.; Booth et al., 2014Booth, J. N., Boyle, J. M. E., & Kelly, S. W. (2013). The relationship between inhibition and working memory in predicting children’s reading difficulties. Journal of Research in Reading, 37(1), 84-101. https://doi.org/10.1111/1467-9817.12011
https://doi.org/10.1111/1467-9817.12011...
; Cozza, 2005Cozza, H. F. P. (2005). Avaliação das funções executivas em crianças e correlação com atenção e hiperatividade (Master thesis). Universidade São Francisco, Itatiba, Brasil.; Cruz-Rodrigues et al., 2014Cruz-Rodrigues, C., Barbosa, T., Toledo-Piza, C. M. J., Miranda, M. C., & Bueno, O. F. A. (2014). Neuropsychological Characteristics of Dyslexic Children. Psicologia Reflexão e Crítica, 27(3), 539-546. https://doi.org/http://dx.doi.org/10.1590/1678-7153.201427315.
https://doi.org/http://dx.doi.org/10.159...
; Gonçalves et al., 2013Gonçalves, H. A., Mohr, R. M., Moraes, A. L., Siqueira, L. S., Prando, M. L., & Fonseca, R. P. (2013). Componentes atencionais e de funções executivas em meninos com TDAH: Dados de uma bateria neuropsicológica flexível. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 62(1), 13-21. https://doi.org/10.1590/S0047-20852013000100003.
https://doi.org/10.1590/S0047-2085201300...
; Horowitz-Kraus, 2015Horowitz-Kraus, T. (2015). Differential effect of cognitive training on executive functions and reading abilities in children with ADHD and in children with ADHD comorbid with reading difficulties. Journal of Attention Disorders, 19(6), 515-526. https://doi.org/10.1177/1087054713502079.
https://doi.org/10.1177/1087054713502079...
, 2016Horowitz-Kraus, T. (2013). Can the error monitoring system differentiate ADHD from ADHD with reading disability? Reading and executive dysfunction as reflected in error monitoring. Journal of Attention Disorders, 22(10), 889-902. https://doi.org/10.1177/1087054713488440.
https://doi.org/10.1177/1087054713488440...
; Lima et al., 2013Lima, R. F., Azoni, C. A. S., & Ciasca, S. M. (2013). Atenção e funções executivas em crianças com dislexia do desenvolvimento. Psicologia em Pesquisa, 7(2), 208-219. https://doi.org/10.5327/Z1982-1247201300020009
https://doi.org/10.5327/Z1982-1247201300...
; Lima et al., 2012Lima, R. F., Travaini, P. P., Azoni, C. A. S., & Ciasca, S. M. (2012). Atención sostenida visual y funciones ejecutivas en niños con dislexia de desarrollo. Anales de Psicologia, 28(1), 66-70. http://www.redalyc.org/pdf/167/16723161008.pdf.
http://www.redalyc.org/pdf/167/167231610...
; Nigg, 2001Nigg, J. T. (2001). Is ADHD a disinhibitory disorder? Psychological Bulletin, 127, 571-598. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/11548968.
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/1154...
; Marzocchi et al., 2008Marzocchi, G. M., Oostrlaan, J. Zuddas, A. Cavolina, P., Geurts, H., Redigolo, D., Vio, C., & Sergeant, J. A. (2008). Contrasting deficits on executive functions between ADHD and reading disabled children. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 49(5), 543-552. https://doi.org/10.1111/j.1469-7610.2007.01859.x.
https://doi.org/10.1111/j.1469-7610.2007...
; Saboya et al., 2007Saboya, E., Saraiva, D., Palmini, A., Lima, P., & Coutinho, G. (2007). Disfunção executiva como uma medida de funcionalidade em adultos com TDAH. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 56(1), 30-33. https://doi.org/10.1590/S0047-20852007000500007.
https://doi.org/10.1590/S0047-2085200700...
; Pennington, 2005Pennington, B. F. (2005). From single to multiple deficit models of developmental disorders. Cognition, 101, 385-413. https://doi.org/10.1016/j.cognition.2006.04.008.
https://doi.org/10.1016/j.cognition.2006...
; Pereira, 2011Pereira, A. P. P. (2011). Desenvolvimento de funções executivas em crianças sem domínio da linguagem escrita e relação com desatenção e hiperatividade (Master thesis). Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, Brasil.; Wodka et al., 2008Wodka, E. L., Mostofsky, S. H., Prahme, C., Larson, J. C. G., Loftis, C., Denckla, M. B., & Mahone, E. M. (2008). Process examination of executive function in ADHD: sex and subtype effects. The Clinical Neuropsychologist, 22(5), 826-841. https://doi.org/10.1080/13854040701563583.
https://doi.org/10.1080/1385404070156358...
; Wolfe, 2004Wolfe, E. M. (2004). Executive function processes: Inhibition, working memory, planning and attention in children and youth with attention deficit hyperactivity disorder (Master thesis). Texas A&M University, Texas, USA.; Voorde et al., 2010Voorde, S. V. D., Roeyers, H., Verté, S., & Wiersema, J. R. (2010). Working memory, response inhibition, and within-subject variability in children with attention-deficit/ hyperactivity disorder or reading disorder. Journal of Clinical and Experimental Neuropsychology, 32(4), 366-379. https://doi.org/10.1080/13803390903066865.
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; Wang & Gathercole, 2013Wang, S., & Gathercole, S. E. (2013). Working memory deficits in children with reading difficulties: memory span and dual task coordination. Journal of Experimental Child Psychology, 115, 188-197. https://doi.org/10.1016/j.jecp.2012.11.015.
https://doi.org/10.1016/j.jecp.2012.11.0...
).

Outra questão investigada se refere às possíveis diferenças e semelhanças nas FEs nessas três patologias. Em pesquisa realizada por Bental e Tirosh (2007Bental, B., & Tirosh, E. (2007). The relationship between attention, executive functions and reading domain abilities in attention deficit hyperactivity disorder and reading disorder: a comparative study. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 48(5), 455-463. https://doi.org/10.1111/j.1469-7610.2006.01710.x
https://doi.org/10.1111/j.1469-7610.2006...
), os autores buscaram investigar tais aspectos, além de habilidades linguísticas (nomeação e consciência fonológica), atenção e leitura em quatro grupos: TDAH, DL, TDAH/DL e sem dificuldades em leitura (SDL). Por meio de regressão logística, os resultados evidenciaram que a habilidade linguística de nomeação seriada rápida e a FE de memória de trabalho auditiva melhor explicava as características clínicas do grupo TDAH/DL.

Em pesquisa realizada por Voorde et al. (2010Voorde, S. V. D., Roeyers, H., Verté, S., & Wiersema, J. R. (2010). Working memory, response inhibition, and within-subject variability in children with attention-deficit/ hyperactivity disorder or reading disorder. Journal of Clinical and Experimental Neuropsychology, 32(4), 366-379. https://doi.org/10.1080/13803390903066865.
https://doi.org/10.1080/1380339090306686...
), foram investigadas possíveis diferenças nas FEs e em habilidades linguísticas de crianças distribuídas em quatro grupos: TDAH, DL e TDAH/DL e SDL. Para avaliação da linguagem, os autores avaliaram o processamento fonológico e a nomeação automática rápida; para as FEs, controle inibitório e memória de trabalho visual e auditiva. Os resultados indicaram que o grupo DL se diferenciou apenas do SDL nas habilidades linguísticas. Foi verificado, também, que nas avaliações das FEs houve pior desempenho em controle inibitório, estatisticamente significativo, do TDAH/DL em relação aos outros grupos. No entanto, não foram verificadas diferenças em memória de trabalho entre nenhuma das comparações intergrupo.

Por sua vez, Horowitz-Kraus (2013Horowitz-Kraus, T. (2013). Can the error monitoring system differentiate ADHD from ADHD with reading disability? Reading and executive dysfunction as reflected in error monitoring. Journal of Attention Disorders, 22(10), 889-902. https://doi.org/10.1177/1087054713488440.
https://doi.org/10.1177/1087054713488440...
) realizou um estudo que teve o objetivo de traçar o perfil cognitivo de sujeitos com TDAH e TDAH/DL. Os resultados demonstraram que os sujeitos com TDAH/DL apresentaram menores desempenhos em funções executivas (memória de trabalho auditiva, velocidade de processamento, planejamento e fluência) e habilidades de leitura (velocidade de leitura oral, precisão e compreensão), quando comparados com indivíduos que eram acometidos somente pelo TDAH. No entanto, essas diferenças não foram significativas estatisticamente.

Horowitz-Kraus (2015Horowitz-Kraus, T. (2015). Differential effect of cognitive training on executive functions and reading abilities in children with ADHD and in children with ADHD comorbid with reading difficulties. Journal of Attention Disorders, 19(6), 515-526. https://doi.org/10.1177/1087054713502079.
https://doi.org/10.1177/1087054713502079...
) buscou novamente investigar possíveis diferenças entre o TDAH e o TDAH/DL, por meio do treino diferencial de oito semanas em habilidades de leitura e FEs em crianças com ambas patologias. Como medidas para controle das FEs, foram utilizados testes de nomeação de letras e símbolos (para avaliação do acesso lexical), de procurar símbolos (atenção) e de memória de dígitos (memória de trabalho auditiva), além de uma tarefa para percepção espacial e do Teste de Cartas Wisconsin (flexibilidade). Em relação às habilidades de leitura, a autora avaliou a precisão, fluência e compreensão, controlando também a escrita. Antes do treino, as avaliações indicaram diferenças significativas, com pior desempenho do TDAH/DL nas habilidades executivas de nomeação e atenção. Houve diferenças em praticamente todas habilidades de leitura. Após intervenção, foi verificado ganhos em leitura significativos no TDAH/DL, bem como na maioria das FEs em ambos os grupos.

Por fim, na investigação realizada por Marzocchi et al. (2008Marzocchi, G. M., Oostrlaan, J. Zuddas, A. Cavolina, P., Geurts, H., Redigolo, D., Vio, C., & Sergeant, J. A. (2008). Contrasting deficits on executive functions between ADHD and reading disabled children. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 49(5), 543-552. https://doi.org/10.1111/j.1469-7610.2007.01859.x.
https://doi.org/10.1111/j.1469-7610.2007...
), buscou-se identificar o funcionamento executivo de sujeitos com TDAH, DL e SDL, sem consideração de um grupo comórbido. Foram testadas 87 crianças, com idades entre 7 e 12 anos, em cinco domínios de FEs: controle inibitório, memória de trabalho visual, flexibilidade cognitiva, planejamento e fluência verbal. A análise comparativa entre os grupos constatou que o TDAH obteve pior desempenho que o SDL nas habilidades de memória de trabalho visual, planejamento, flexibilidade e fluência. O DL se diferenciou do SDL somente em fluência, com pior desempenho. A única diferença entre o TDAH e o SDL foi em planejamento, com pior desempenho do TDAH.

A partir dos estudos apresentados, pôde-se perceber, de modo geral, que o TDAH/DL apresentou desempenhos mais baixos em habilidades de FEs, quando comparado aos diagnósticos isolados do TDAH e DL. No entanto, não foi observado um padrão nos achados, já que ora não foram observadas diferenças estatisticamente significativas entre os grupos, ora as habilidades diferenciadas entre os grupos nos diversos estudos não foram as mesmas.

O padrão geral das pesquisas já realizadas sugere que o TDAH e a dificuldade de leitura estão associados ao rebaixamento do funcionamento executivo e que as crianças comórbidas apresentariam um fenótipo com déficits nas funções executivas mais graves do que as crianças com apenas TDAH ou dificuldade na leitura. A fim de elucidar o perfil de funcionamento das FE’s entre esses quadros, o presente estudo foi proposto. O objetivo central foi verificar possíveis diferenças em FE’s (controle inibitório, memória de trabalho auditiva e visuoespacial, flexibilidade cognitiva e fluência verbal) em crianças com TDAH, com dificuldade de leitura, com TDAH em comorbidade com dificuldade de leitura e crianças sem queixas de TDAH e dificuldades de leitura.

Método

Participantes

Participaram do estudo 104 crianças, com idades entre 8 e 11 anos (M = 9,23, DP = 0,87), sendo a maioria do sexo feminino (n = 54; 51,9%). Elas estavam matriculadas no 3º (n = 31; 29,8 %), 4º (n = 37; 35,6 %) e 5º (n = 36; 34,6%) ano do Ensino Fundamental I, em escolas públicas. Pôde-se identificar também suas rendas familiares, a saber: até um salário mínimo (n = 4; 3,8%); entre um e três salários mínimos (n = 85; 81,7%); entre três e cinco salários mínimos (n = 3; 2,9%); entre cinco e dez salários mínimos (n = 8; 7,7%); entre dez e 20 salários mínimos (n = 4; 3,8%).

Como pode ser observado na Tabela 1, a amostra total foi distribuída em quatro grupos, a saber: (1) estudantes com TDAH e sem dificuldade em leitura (TDAH; n = 11; 10,6%); (2) estudantes com TDAH e com dificuldade de leitura (TDAH/DL); n = 15; 14,4%); (3) estudantes com dificuldade de leitura (DL); n = 45; 43,3%); e (4) estudantes sem queixas de TDAH e sem dificuldade em leitura (SDL; n = 33; 31,7%). A partir do teste Qui-Quadrado de Pearson, observou-se que os grupos não apresentaram diferenças estatisticamente significativas no que se refere a variável ano escolar [χ2(6) = 10,02, p = 0,12]. O teste de Kruskal-Wallis também indicou que os grupos não apresentaram diferenças estatisticamente significativas em relação à variável idade [H(3) = 1,58, p = 0,67]. Por outro lado, testes de Qui-Quadrado indicaram diferenças estatisticamente significativas dos grupos em relação às variáveis sexo [χ2(3) = 16,37, p = 0,001] e renda familiar [χ2(12) = 72,53, p = 0,001].

Tabela 1.
Descrição da amostra em função das variáveis: sexo, idade, ano escolar e renda familiar.

Especificamente em relação à variável sexo, foram consideradas partições sucessivas dos grupos e um p = 0,001, verificando-se que o grupo 4 (SDL) diferenciou-se dos grupos 1 (TDAH) [χ2(1) = 11,53, p = 0,001] e grupo 2 (TDAH/DL) [χ2(1) = 10,39, p = 0,001]. Baseando-se no cálculo do odds ratio, observou-se que a chance de ser estudante do sexo masculino com TDAH é 14,1 vezes maior do que ser estudante do sexo masculino sem dificuldades de leitura. Ainda, a chance de ser estudante do sexo masculino com TDAH/DL é de 8,6 vezes maior do que ser estudante do sexo masculino sem dificuldades de leitura.

Critérios de Inclusão e Exclusão da Amostra

Para inclusão das crianças em todos os grupos, foram adotados os seguintes critérios de inclusão: (a) possuir nível de desempenho intelectual igual ou superior ao percentil 25 no teste de inteligência Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (Angelini et al., 1999Angelini, A. L., Alves, I. C. B., Custódio, E. M., Duarte, W. F., & Duarte, J. L. M. (1999). Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Escala especial. Manual. Centro Editor de Testes e Pesquisa em Psicologia.); (b) não possuir queixas de problemas auditivos e/ou visuais não corrigidos; (c) não possuir necessidades educativas especiais; (d) não apresentar queixas emocionais; (e) não apresentar queixas de alterações em linguagem oral. Especificamente para os dois grupos com dificuldades de leitura, foi adotado também o critério de inclusão de possuir desempenho abaixo da média nas habilidades de compreensão de leitura e de reconhecimento de palavras, avaliadas pelos instrumentos de Teste de competência na leitura de palavras e pseudopalavras (Seabra & Capovilla, 2010Seabra, A. G., & Capovilla, F. C. (2010). Teste de competência de leitura de palavras e pseudopalavras (TCLPP). Memnon.) e Técnica de Cloze (Santos, 2005Santos, A. A. A. (2005). O Teste de Cloze como instrumento de avaliação da compreensão em leitura (Technical report). Universidade São Francisco, Bragança Paulista, SP, Brasil.). Para o grupo SDL, o critério foi o oposto, ou seja, possuir desempenho dentro ou acima da média em tais instrumentos. Tanto para esse grupo quanto para o DL, também se adotou o critério de não possuir sintomatologia de TDAH, de acordo com avaliação do Swanson, Nolan and Pelham Questionnaire - IV (SNAP-IV; Mattos et al., 2006Mattos, P., Pinheiro, M. A. S., Rohde, L. A., & Pinto, D. (2006). Apresentação de uma versão em português para uso no Brasil do instrumento MTA-SNAP-IV de avaliação de sintomas de transtorno do déficit de atenção//hiperatividade e sintomas de transtorno desafiador e de oposição. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, 28(3), 290-297. https://doi.org/10.1590/S0101-81082006000300008.
https://doi.org/10.1590/S0101-8108200600...
).

Já para os dois grupos que apresentavam diagnóstico de TDAH, além dos critérios de inclusão de “a” a “e”, anteriormente apresentados, foram considerados também os critérios de: ter sido diagnosticado por profissional habilitado e que seguiu parâmetros baseados no Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais, quinta edição (DSM-5) e ter a sintomatologia comprovada por meio da escala SNAP-IV (Mattos et al., 2006Mattos, P., Pinheiro, M. A. S., Rohde, L. A., & Pinto, D. (2006). Apresentação de uma versão em português para uso no Brasil do instrumento MTA-SNAP-IV de avaliação de sintomas de transtorno do déficit de atenção//hiperatividade e sintomas de transtorno desafiador e de oposição. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, 28(3), 290-297. https://doi.org/10.1590/S0101-81082006000300008.
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), preenchida por professores e pais e/ou responsáveis. Ressalta-se que, nos grupos com bom desempenho em leitura (TDAH e SDL), houve somente a inclusão de crianças sem histórico de reprovação escolar. Por fim, foram considerados os seguintes critérios de exclusão: (a) sentir algum incômodo físico e/ou emocional durante a aplicação; (b) não compreender as instruções fornecidas pelas psicólogas aplicadoras. Ao final, foram excluídas seis crianças que não atenderam os critérios: não apresentaram os termos assinados e não atingiram o ponto de corte estabelecido para o Raven.

Instrumentos

Questionário Sociodemográfico

O questionário foi autoaplicável e apresentava 15 questões que versavam sobre os dados sociodemográficos do sujeito, como sexo, data de nascimento, idade, escolaridade, histórico de reprovações e renda familiar. Além disso, continha questões referentes a possíveis alterações em linguagem oral, auditiva ou visual, necessidade educativa especial e queixas emocionais.

Teste de Matrizes Progressivas Coloridas de Raven (TMPCR; Angelini et al., 1999Angelini, A. L., Alves, I. C. B., Custódio, E. M., Duarte, W. F., & Duarte, J. L. M. (1999). Matrizes Progressivas Coloridas de Raven: Escala especial. Manual. Centro Editor de Testes e Pesquisa em Psicologia.)

O TMPCR avalia a capacidade edutiva, em crianças de cinco a 11 anos, que é estritamente relacionada ao desenvolvimento da inteligência não-verbal (Bandeira et al., 2004Bandeira, D. R., Alves, I. C. B., Giacomel, A. E., & Lorenzatto, L. (2004). Matrizes progressivas coloridas de Raven - Escala especial: Normas para Porto Alegre. Psicologia em Estudo, 9(3), 479-486. https://doi.org/10.1590/S1413-73722004000300016.
https://doi.org/10.1590/S1413-7372200400...
). É composto de 36 itens, distribuídos igualmente em três séries: A, Ab e B. Os itens e as séries seguem uma ordem crescente de dificuldade. A classificação do teste é resultante da soma dos escores (somam-se as três etapas do teste, cada uma contendo 12 itens, que totalizam, no final, 36 pontos), que são convertidos em percentis.

Swanson, Nolan and Pelham Questionnaire - IV (SNAP-IV ; Mattos et al., 2006Mattos, P., Pinheiro, M. A. S., Rohde, L. A., & Pinto, D. (2006). Apresentação de uma versão em português para uso no Brasil do instrumento MTA-SNAP-IV de avaliação de sintomas de transtorno do déficit de atenção//hiperatividade e sintomas de transtorno desafiador e de oposição. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, 28(3), 290-297. https://doi.org/10.1590/S0101-81082006000300008.
https://doi.org/10.1590/S0101-8108200600...
)

O SNP-IV é uma escala utilizada para analisar a presença, a frequência e a gravidade dos sintomas do TDAH. A versão IV do SNAP foi construída com base nos sintomas listados (critérios A) pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Doenças Mentais, quarta edição (DSM-IV). O SNAP-IV é composto de 26 questões que devem ser respondidas por pais e/ou professores. Dos 26 itens elaborados, os de 1 a 9 se referem a sintomas de desatenção; os de 10 a 18, a sintomas de hiperatividade/impulsividade; e os de 19 a 26, a sintomas de transtorno opositor. As respostas apresentam-se em uma escala de 4 pontos, que varia de 0 a 3: 0 equivale a “nenhum/pouco”; 1 = “um pouco”; 2 = “bastante”; 3 = “demais”. Por meio da análise quantitativa dos escores, pode-se quantificar a gravidade dos sintomas, em vez do simples cômputo da presença dos sintomas do critério A do DSM-IV. Ressalta-se, por fim, que os critérios estabelecidos pelo SNAP-IV (critérios A do DSM-IV) são idênticos aos critérios do DSM-5 para identificar sintomas do TDAH, o que justifica a escolha dessa escala. O SNAP-IV é um questionário de domínio público, cujas tradução e adaptação para a população brasileira foram feitas por Mattos et al. (2006Mattos, P., Pinheiro, M. A. S., Rohde, L. A., & Pinto, D. (2006). Apresentação de uma versão em português para uso no Brasil do instrumento MTA-SNAP-IV de avaliação de sintomas de transtorno do déficit de atenção//hiperatividade e sintomas de transtorno desafiador e de oposição. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, 28(3), 290-297. https://doi.org/10.1590/S0101-81082006000300008.
https://doi.org/10.1590/S0101-8108200600...
).

Teste de Competência na Leitura de Palavras e Pseudopalavras (TCLPP; Seabra & Capovilla, 2010Seabra, A. G., & Capovilla, F. C. (2010). Teste de competência de leitura de palavras e pseudopalavras (TCLPP). Memnon.)

O TCLPP visa avaliar os processos de reconhecimento e decodificação na leitura silenciosa de palavras isoladas, identificando quais rotas e estratégias de leitura são empregadas pelos indivíduos. Além disso, o instrumento é coadjuvante no diagnóstico diferencial de distúrbios de aquisição da leitura. Aplicado individual ou coletivamente, sem tempo pré-determinado, o teste é constituído de oito itens de treino e 70 de teste. Cada item é composto de uma imagem e um elemento escrito, que pode ser uma palavra ou uma pseudopalavra. O papel do estudante é de circundar as palavras corretas (semântica e ortografia) e riscar as incorretas. A resposta aos itens é dicotômica, na qual pontua-se 0, para cada item respondido de maneira inadequada, e 1, para cada item respondido corretamente. O escore bruto total pode variar de zero a 70 pontos. Essa pontuação é convertida em escore-padrão, a partir das tabelas de normatização (conforme idade e nível de escolaridade).

Técnica de Cloze (TC; Santos, 2005Santos, A. A. A. (2005). O Teste de Cloze como instrumento de avaliação da compreensão em leitura (Technical report). Universidade São Francisco, Bragança Paulista, SP, Brasil.)

O teste TC visa avaliar a compreensão leitora. É composta de uma tarefa na qual são suprimidos os quintos vocábulos de um texto, e o leitor deve preencher os espaços deixados da forma que considerar mais adequada (Taylor, 1953Taylor, W. L. (1953). Cloze procedure: a new tool for measuring read-ability. Journalism Quarterly, 30, 415-433. http://journals.sagepub.com/doi/pdf/10.1177/107769905303000401.
http://journals.sagepub.com/doi/pdf/10.1...
). Em um estudo elaborado por Santos (2005Santos, A. A. A. (2005). O Teste de Cloze como instrumento de avaliação da compreensão em leitura (Technical report). Universidade São Francisco, Bragança Paulista, SP, Brasil.), foi utilizada a história infantil “Uma vingança infeliz” para ser trabalhada com crianças do ensino fundamental. O texto apresenta 100 palavras, das quais foram suprimidas todas as quintas a partir da segunda frase, totalizando 15 espaços para serem preenchidos. O teste foi corrigido com base no método não literal, em que foi aceito o uso de sinônimos de palavras que possibilitassem a compreensão textual. A resposta aos itens foi dicotômica: para cada resposta incorreta, foi pontuado zero; para cada resposta, um. O número possível de acertos do texto é de 15 pontos.

Teste de Trilhas (TT; Montiel & Capovilla, 2007Montiel, J. M., & Capovilla, A. G. S. (2007). Teste de Trilhas - parte B. In A. G. S. Capovilla, & F. C. Capovilla. (Eds), Teoria e pesquisa em avaliação neuropsicológica (pp. 94-95). Memnon.)

O TT é subdividido em A e B; o TT-A avalia a atenção sustentada visual e o TT-B a flexibilidade cognitiva. Para esta pesquisa, foi usada a parte TT-B que é composta de uma folha com círculos que contém números e letras e apresenta números de 1 a 12 e letras, de A a M. Nele, a criança deve passar um traço que ligue, alternadamente, os círculos com números e letras, seguindo as ordens numérica e alfabética, por exemplo: 1-A-2-B-3-C. O número de acertos é computado pela soma do número total de itens ligados corretamente em sequência (varia de zero a 24 pontos). Exemplo: a resposta 1-A-2-B-3-C corresponde a 6 pontos.

Subteste “Dígitos” da Escala Wechsler de Inteligência para Crianças (WISC-IV; Rueda et al., 2013Rueda, F. J. M., Noronha, A. P. P., Sisto, F. F., Santos, A. A. A., & Castro, N. R. (2013).Escala Wechsler de inteligência para crianças - WISC-IV. Casa do Psicólogo.)

O WISC-IV objetiva avaliar a capacidade intelectual de crianças e adolescentes (6 a 16 anos). É composto de 15 subtestes, com cinco suplementares. Nesta pesquisa, foi utilizado somente o subteste de “Dígitos”, na ordem direta e inversa. O primeiro mede a memória auditiva sequencial e o segundo a capacidade da memória de trabalho. É esperado que o resultado na ordem inversa seja um ou dois pontos inferiores à ordem direta (Simões, 2002Simões, M. R. (2002). Utilizações da WISC-III na avaliação neuropsicológica de crianças e adolescentes. Paidéia, 12(23), 113-132. https://doi.org/10.1590/S0103-863X2002000200009.
https://doi.org/10.1590/S0103-863X200200...
). O subteste apresenta dois grupos de sequências numéricas com a mesma quantidade de números em cada item. A ordem direta e a inversa apresentam o total de 8 itens cada. A cada item, a quantidade de números é aumentada nas duas sequências. As sequências são apresentadas oralmente pelo aplicador e em seguida é solicitado que a criança repita a sequência que acabou de escutar. No primeiro grupo, a repetição deveria ser em ordem direta e no segundo, em ordem inversa. Na avaliação do subteste, é atribuído zero ponto se o examinando errar ambas as sequências; um ponto, se responder corretamente uma das sequências; 2 pontos, se acertar ambas as sequências. Os escores para ordem direta e inversa são somados separadamente. Nesse sentido, o escore máximo para o subteste, na ordem direta, é de 16 pontos, e de 16 pontos para a ordem inversa, portanto, 32 pontos no total.

Blocos de Corsi (BC; Guevara et al., 2014Guevara, M. A., Sanz-Martin, A., Hernández-González, M., & Sandoval-Carrillo, I. K. (2014). CubMemPC: prueba computadorizada para evaluar la memoria a corto plazo visuoespacial con y sin distractores. Revista Mexicana de Ingenieria Biomédica, 35(2), 175-186. http://www.rmib.somib.org.mx/pdfs/Vol35/No2/5.pdf.
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)

Os Blocos de Corsi são utilizados para avaliar a memória visuoespacial. Foi utilizada a versão computadoriza dos blocos de Corsi (sem interferência). Esse instrumento apresenta, no centro do monitor, dez cubos de cor azul (3 x 3cm), distribuídos aleatoriamente sobre uma superfície retangular cinza (21,2 x 17 cm). A separação entre os cubos na horizontal é de 0,1 a 1,9 cm, enquanto na vertical é de 0, 2 e 0,8 cm.

A tarefa inicia de forma automática, quando a criança toca na tela do computador (touch screen); em seguida, uma sequência de cubos será apresentada. No momento em que o último cubo é apresentado, a criança é solicitada a reproduzir a sequência, tocando nos cubos da tela. O desempenho na tarefa de Blocos de Corsi é computado de acordo com o número de posições lembradas corretamente pelo examinando em cada sequência. Atribuiu-se um ponto à recordação na posição e na ordem corretas e 0,5 pontos para recordação na posição correta, mas fora da ordem apresentada.

Teste dos Cinco Dígitos (FDT; Sedó et al., 2015Sedó, M., Paula, J. J, & Malloy-Diniz, L. F. (2015). O Teste dos Cinco Dígitos. Hogrefe.)

O FDT objetiva avaliar a velocidade do processamento, da atenção e das funções executivas (controle inibitório e flexibilidade cognitiva). Trata-se de um instrumento não verbal, que é aplicado individualmente, e que contempla a faixa etária de 6 a 92 anos de idade. O FDT é uma tarefa numérica dividida em quatro etapas: leitura, contagem, escolha e alternância. Na etapa da Leitura, a criança é solicitada a reconhecer e nomear os números. São apresentados os dígitos, em quantidades diversas, que correspondem exatamente a seus valores. Na etapa de Contagem, o aplicador apresenta grupos de um a cinco asteriscos e a criança é solicitada a reconhecer o conjunto e contar o número de asteriscos existentes. Na etapa Escolha, a criança deveria inibir a leitura dos números apresentados e identificar quantos números existem em cada estímulo. Na última etapa, de Alternância, um de cada cinco grupos de dígitos é delimitado por uma borda preta mais grossa. Nesses estímulos, é solicitado à criança que alterne entre duas ações: nos itens sem a borda, deve-se proceder como na etapa Escolha; já nos itens com a borda, deve-se apenas ler um dos números, como na etapa Leitura. Em suma, as duas primeiras etapas do FDT envolvem processamento atencional automático e velocidade do processamento. A terceira e a quarta etapas demandam processamento atencional controlado e fluidez verbal (controle inibitório e flexibilidade cognitiva). Para analisar o desempenho no instrumento, computa-se o tempo de reação da tarefa, erros cometidos, bem como os escores de interferência (subtração do tempo de leitura, do tempo de escolha, e este do tempo de alternância, dando origem aos escores de inibição e flexibilidade cognitiva) (Oliveira et al., 2014Oliveira, T. D., Malloy-Diniz, L. F., Magalhões, S., Costa, D. S., Lacerda, S. R., Querino, E. H. G., & Paula, J. J. (2014). Propriedades psicométricas do Teste dos Cinco Dígitos para o contexto brasileiro: estudo preliminar com a população adulta (Conference paper). Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil.).

Teste de Fluência Verbal (TFV; Charchat-Fichman et al., 2011Charchat-Fichman, H., Oliveira, R. M., & Silva, A. M. (2011). Performance of Brazilian children on phonemic and semantic verbal fluency tasks. Dementia Neuropsychologia, 5(2), 78-84. https://doi.org/10.1590/S1980-57642011DN05020004.
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)

O TFV é dividido em duas partes, fluência fonológica (TFV-F) e fluência semântica (TFV-S). Na primeira, é solicitada que a criança verbalize o maior número de palavras que comecem com as letras “F”, “A” e “M”. Na segunda, é solicitada que a criança diga todos os animais, frutas e roupas que conseguir recordar. Para cada estímulo-alvo (letra ou categoria), a criança tem o tempo máximo de 60 segundos de produção de palavras. As respostas foram registradas com gravador para posterior análise dos dados. O número de acertos foi computado com base na soma da quantidade de palavras evocadas em cada tarefa, com escores para cada estímulo-alvo (letra ou categoria) e para cada uma das duas partes do teste (fonológica e semântica).

Procedimento

Inicialmente, o projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (Plataforma Brasil), sob o número de parecer 1.536.901. Em seguida, buscou-se anuência para aplicação do projeto em instituições escolares e em um Hospital Universitário, bem como em clínicas particulares do município que atendessem crianças com TDAH. Em seguida, os TCLEs foram enviados aos pais e/ou responsáveis e foi solicitada assinatura, caso concordassem com a participação de seus filhos. Esses pais e/ou responsáveis foram selecionados por conveniência. Aos que aceitaram participar foram enviados para preenchimento o questionário sociodemográfico e a escala SNAP-IV, este para ser preenchido também pelos professores.

Posteriormente, foram organizadas salas para aplicação dos instrumentos nos três locais onde foram recrutadas as crianças. Foram realizadas três sessões com cada uma delas, de aproximadamente 50 minutos cada, em horário e data previamente marcados. Na primeira sessão, foi estabelecido um rapport e foram explicados, de maneira lúdica, os objetivos da pesquisa, e apresentado o Termo de Assentimento. Caso aceitassem participar, as crianças assinavam tal termo e já nessa mesma sessão realizariam o TMPCR.

Na segunda sessão, foram aplicados o TCLPP e a Técnica de Cloze. Essa avaliação foi de suma importância, pois permitiu composição dos quatro grupos de análise desta pesquisa, de acordo com o desempenho em ambos os instrumentos. Na terceira sessão, foram aplicados os testes que avaliaram as FEs. Considerou-se o TT para avaliação do construto flexibilidade cognitiva, Dígitos para memória de trabalho auditiva, Blocos de Corsi para memória de trabalho visuoespacial, FDT para controle inibitório e TFV para fluência verbal (fonológica e semântica). Todos os dados foram analisados com auxílio do software Statistical Package for Social Sciences (SPSS) 21.0 para Windows®. Os níveis de significância adotados foram: p < 0,05 (valor significativo), p < 0,01 (valor muito significativo) e p < 0,001 (valor altamente significativo).

Resultados

Na Tabela 2, pode-se observar as médias e desvios-padrão obtidos em cada um dos testes utilizados para avaliação das FEs, de acordo com cada grupo estudado. Para a análise inferencial, os testes estatísticos escolhidos foram não paramétricos, já que os dados não atenderam aos parâmetros de normalidade, como comprovado pelo teste Komogorov-Sminorv (p < 0,05), e aos parâmetros de homogeneidade da variância, comprovados pelo teste de Levene (p < 0,05). Para a análise, foram utilizados os escores brutos para traçar o perfil das funções executivas nos grupos clínicos.

Tabela 2.
Médias e desvios-padrões obtidos nos testes utilizados para avaliação das FEs, por grupo

Para analisar as diferenças entre todos os grupos de uma só vez, foi utilizado inicialmente o teste Kruskal-Wallis. Houve diferenças estatisticamente significativas no desempenho de praticamente todos os testes: TT-B (H (3) = 17,02, p = 0,001), Dígitos (H (3) =15,05, p = 0,002), FDT (H (3) = 12,86, p = 0,005) e TFV-F (H (3) = 18,07, p = 0,001) e TFV-S (H (3) = 12,19, p = 0,007). Somente no BC não foi encontrada diferença (H (3) = 6,37, p = 0,095).

A fim de realizar uma comparação mais pormenorizada entre os grupos, os dados foram comparados grupo a grupo. Para isso, foi utilizado o teste Mann-Whitney (U) e o cálculo do d de Cohen (r), para o tamanho do efeito. Os valores de referência para essa última análise foram de: valores próximos a 0,2 considerado pequeno efeito; valores próximos a 0,5 considerados como médio efeito; valores próximos a 0,8 considerados grande efeito. Esses dados podem ser observados na Tabela 3.

Tabela 3.
Comparações entre os grupos nos testes utilizados para avaliação das FEs

Como pode ser observado na Tabela 3, os resultados indicaram que no teste TT somente não foram apresentadas diferenças entre os grupos SDL e TDAH, bem como TDAH e DL, com pequeno efeito. Houve as seguintes diferenças: quando comparados o SDL e TDAH/DL (médio efeito) e SDL e DL (pequeno efeito), com melhor desempenho do SDL; entre o TDAH e o TDAH/DL (médio efeito), com melhor desempenho do TDAH; e entre o TDAH/DL e o DL (pequeno efeito), com melhor desempenho do DL.

No teste Dígitos, não houve diferença na comparação entre os grupos TDAH e DL e TDAH/DL, com o DL obtendo pequeno efeito. Identificaram-se diferenças entre os grupos SDL e TDAH/DL (médio efeito); entre SDL e DL (pequeno efeito), com melhor desempenho do SDL; entre TDAH e TDAH/DL (pequeno efeito), com melhor desempenho do TDAH.

No BC, as análises indicaram que houve diferenças somente nas seguintes comparações: entre os grupos SDL e TDAH/DL (pequeno efeito), com melhor desempenho do SDL; e entre o TDAH e o TDAH/DL (pequeno efeito), com melhor desempenho do TDAH.

No FDT, também somente houve diferença entre os seguintes grupos: SDL e TDAH/DL (médio efeito), com melhor desempenho do SDL; TDAH e TDAH/DL (médio efeito), com melhor desempenho do TDAH; e entre o TDAH/DL e o DL (médio efeito), com melhor desempenho do DL. É importante observar que o cálculo de desempenho nesse teste foi realizado a partir do tempo despendido para realização da tarefa. Dessa forma, quanto maiores as médias, piores os desempenhos.

No TFV-F, somente não houve diferenças em duas comparações: entre SDL e TDAH e entre TDAH e DL, com pequenos efeitos. Houve diferença quando comparados os grupos SDL e TDAH/DL (médio efeito); SDL e DL (pequeno efeito), com melhor desempenho do SDL; TDAH e TDAH/DL (médio efeito), com melhor desempenho do TDAH; TDAH/DL e DL (pequeno efeito), com melhor desempenho do DL.

No TFV-S, houve resultados diferentes do TFV-F. Verificou-se que, na maioria das comparações, não houve diferença. Quando comparados os grupos SDL e DL (pequeno efeito), identificou-se melhor desempenho do SDL; e quando se comparou os grupos TDAH e DL (pequeno efeito), identificou-se melhor desempenho do TDAH.

Discussão

O objetivo principal da presente investigação foi verificar a existência de diferenças no perfil de desempenho das funções executivas (FEs) de crianças com TDAH, com dificuldade de leitura, TDAH em comorbidade com dificuldade de leitura e crianças sem TDAH e sem dificuldades de leitura. Vale lembrar que as FEs aqui analisadas foram: flexibilidade cognitiva (inferida pelo TT), memória de trabalho auditiva (pelo teste Dígitos), memória de trabalho visuoespacial (teste BC), controle inibitório (teste FDT) e fluência verbal (teste TFV).

No geral, de acordo com os resultados encontrados, pôde-se observar que o perfil das funções executivas (controle inibitório, flexibilidade, memória de trabalho e fluência verbal) do grupo comórbido (TDAH/DL) é significativamente diferente e se manifesta com o mais baixo desempenho, quando comparado aos demais grupos analisados. No entanto, semelhanças sutis existiram no padrão dos achados em fluência verbal semântica entre o grupo comórbido e o grupo com dificuldades de leitura (DL). A condição comórbida possivelmente favoreceu maiores prejuízos nas funções executivas,

As pesquisas anteriores já apontavam para a existência de uma diferença entre o perfil das funções executivas em grupos de crianças com dificuldades de leitura, com TDAH e grupos comóbidos (Horowitz-Kraus, 2013Horowitz-Kraus, T. (2013). Can the error monitoring system differentiate ADHD from ADHD with reading disability? Reading and executive dysfunction as reflected in error monitoring. Journal of Attention Disorders, 22(10), 889-902. https://doi.org/10.1177/1087054713488440.
https://doi.org/10.1177/1087054713488440...
; Voorde et al., 2010Voorde, S. V. D., Roeyers, H., Verté, S., & Wiersema, J. R. (2010). Working memory, response inhibition, and within-subject variability in children with attention-deficit/ hyperactivity disorder or reading disorder. Journal of Clinical and Experimental Neuropsychology, 32(4), 366-379. https://doi.org/10.1080/13803390903066865.
https://doi.org/10.1080/1380339090306686...
). Entretanto, não está claro se o perfil do grupo comórbido trata-se de uma sobreposição de sintomas ou se é a manifestação mais grave dos sintomas (Doyle, 2017Doyle, C. (2017). Executive Function (EF) in Dyslexia: Examining an EF profile associated with dyslexia and comorbid dyslexia-ADHD and exploring the near and far transfer effects of EF Training in Dyslexia Alone (Doctoral dissertation). Dublin City University.), já que as evidências sobre esse perfil não são consistentes. Os estudos de Bental e Tirosh (2007Bental, B., & Tirosh, E. (2007). The relationship between attention, executive functions and reading domain abilities in attention deficit hyperactivity disorder and reading disorder: a comparative study. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 48(5), 455-463. https://doi.org/10.1111/j.1469-7610.2006.01710.x
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) revelaram que grupos de crianças com dificuldades de leitura teriam apenas dificuldades em controle inibitório. Porém, os estudos de Menghini et al. (2010Menghini, D., Finzi, A., Benassi, M., Bolzani, R., Facoetti, A., Giovagnoli, S., & Vicari, S. (2010). Different underlying neurocognitive deficits in developmental dyslexia: A comparative study. Neuropsychologia, 48(4), 863-872.) e Poljac et al. (2010Poljac, E., Simon, S., Ringlever, L., Kalcik, D., Groen, W. B., Buitelaar, J. K., & Bekkering, H. (2010). Impaired task switching performance in children with dyslexia but not in children with autism. The Quarterly Journal of Experimental Psychology, 63(2), 401-416.) apresentaram que as dificuldades nesse grupo seriam apenas em flexibilidade. Destaca-se que outros pesquisadores revelaram diferenças nos grupos comórbidos (TDAH/DL) e também no grupo com TDAH (Voorde et al., 2010Voorde, S. V. D., Roeyers, H., Verté, S., & Wiersema, J. R. (2010). Working memory, response inhibition, and within-subject variability in children with attention-deficit/ hyperactivity disorder or reading disorder. Journal of Clinical and Experimental Neuropsychology, 32(4), 366-379. https://doi.org/10.1080/13803390903066865.
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).

Nesta investigação, foram encontradas diferenças entre o grupo com TDAH e DL apenas no desempenho em fluência verbal semântica, com pior desempenho do DL. Tal dado pode ser explicado pelo que a literatura tem afirmado: não haveria somente um déficit funcional individual, como em FEs, responsável por compreender a natureza complexa desses transtornos. Haveria, por exemplo, no TDAH, também déficits em atenção; e, no DL, déficits em habilidades verbais, mais fortemente atreladas ao processamento fonológico, que seriam também característicos a essas condições (Pennington, 2005Pennington, B. F. (2005). From single to multiple deficit models of developmental disorders. Cognition, 101, 385-413. https://doi.org/10.1016/j.cognition.2006.04.008.
https://doi.org/10.1016/j.cognition.2006...
).

Ao comparar os três grupos clínicos com o grupo controle, constatou-se que o grupo comórbido e o grupo com dificuldades de leitura apresentaram menores desempenhos em todas as tarefas de FEs. Este achado permite supor que as funções executivas estariam mais prejudicadas no grupo comórbido, sendo o perfil de prejuízo semelhante ao que se apresenta no grupo com dificuldades de leitura. O grupo com TDAH teria menos prejuízo nas funções executivas, quando comparado aos demais.

Reflexões semelhantes foram relatadas por diversos estudos que realizaram esse tipo de comparação (Bental & Tirosh, 2007Bental, B., & Tirosh, E. (2007). The relationship between attention, executive functions and reading domain abilities in attention deficit hyperactivity disorder and reading disorder: a comparative study. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 48(5), 455-463. https://doi.org/10.1111/j.1469-7610.2006.01710.x
https://doi.org/10.1111/j.1469-7610.2006...
; Booth et al., 2013Booth, J. N., Boyle, J. M. E., & Kelly, S. W. (2013). The relationship between inhibition and working memory in predicting children’s reading difficulties. Journal of Research in Reading, 37(1), 84-101. https://doi.org/10.1111/1467-9817.12011
https://doi.org/10.1111/1467-9817.12011...
; Cimadon, 2012; Lima et al., 2012Lima, R. F., Travaini, P. P., Azoni, C. A. S., & Ciasca, S. M. (2012). Atención sostenida visual y funciones ejecutivas en niños con dislexia de desarrollo. Anales de Psicologia, 28(1), 66-70. http://www.redalyc.org/pdf/167/16723161008.pdf.
http://www.redalyc.org/pdf/167/167231610...
; Voorde et al., 2010Voorde, S. V. D., Roeyers, H., Verté, S., & Wiersema, J. R. (2010). Working memory, response inhibition, and within-subject variability in children with attention-deficit/ hyperactivity disorder or reading disorder. Journal of Clinical and Experimental Neuropsychology, 32(4), 366-379. https://doi.org/10.1080/13803390903066865.
https://doi.org/10.1080/1380339090306686...
; Wang & Gathercole, 2013Wang, S., & Gathercole, S. E. (2013). Working memory deficits in children with reading difficulties: memory span and dual task coordination. Journal of Experimental Child Psychology, 115, 188-197. https://doi.org/10.1016/j.jecp.2012.11.015.
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), demonstrando a não existência de diferenças entre o desempenho do grupo controle e grupo com TDAH, na maioria das FEs avaliadas. Fato semelhante também foi descrito por Wodka et al. (2008Wodka, E. L., Mostofsky, S. H., Prahme, C., Larson, J. C. G., Loftis, C., Denckla, M. B., & Mahone, E. M. (2008). Process examination of executive function in ADHD: sex and subtype effects. The Clinical Neuropsychologist, 22(5), 826-841. https://doi.org/10.1080/13854040701563583.
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), ao compararem grupos de crianças com TDAH e sem TDAH nas habilidades executivas de controle inibitório (Stroop Test), planejamento (Torre de Londres), atenção e flexibilidade (TT) e fluência verbal (TFV, fonológico e semântico). Os resultados não indicaram diferenças entre os grupos em nenhuma dessas habilidades. Entretanto, esses achados são inconsistentes com resultados que revelam o prejuízo nas funções executivas em crianças com TDAH (Capovilla et al., 2007Capovilla, A. G. S., Assef, E. C. S., & Cozza, H. F. P. (2007). Avaliação neuropsicológica das funções executivas e relação com desatenção e hiperatividade. Avaliação Psicológica, 6(1), 51-60. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-04712007000100007.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
; Gonçalves et al., 2013Gonçalves, H. A., Mohr, R. M., Moraes, A. L., Siqueira, L. S., Prando, M. L., & Fonseca, R. P. (2013). Componentes atencionais e de funções executivas em meninos com TDAH: Dados de uma bateria neuropsicológica flexível. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 62(1), 13-21. https://doi.org/10.1590/S0047-20852013000100003.
https://doi.org/10.1590/S0047-2085201300...
, Wolfe, 2004Wolfe, E. M. (2004). Executive function processes: Inhibition, working memory, planning and attention in children and youth with attention deficit hyperactivity disorder (Master thesis). Texas A&M University, Texas, USA.).

Possíveis razões para essas inconsistências nos achados podem estar relacionadas com discrepâncias no que se refere a questões de medição/instrumentação e conteúdo das tarefas. Por exemplo, Wodka et al. (2008Wodka, E. L., Mostofsky, S. H., Prahme, C., Larson, J. C. G., Loftis, C., Denckla, M. B., & Mahone, E. M. (2008). Process examination of executive function in ADHD: sex and subtype effects. The Clinical Neuropsychologist, 22(5), 826-841. https://doi.org/10.1080/13854040701563583.
https://doi.org/10.1080/1385404070156358...
) discutiram os seus resultados, considerando que as tarefas utilizadas (bateria Delis Kaplan Executive Function System) não foram sensíveis em diferenciar os grupos com e sem TDAH. É possível que esse problema em relação à sensibilidade dos instrumentos para diferenciar os grupos também tenha ocorrido no presente estudo.

As questões de medição/instrumentação tornam difíceis as possibilidades de inferências sobre o perfil executivo dos grupos analisados, contudo, a utilização do grupo controle tem sido uma sugestão de alguns pesquisadores para diminuir essas dificuldades. Nesse sentido, pôde-se verificar que o grupo comórbido investigado apresentou um prejuízo maior nas funções executivas e a manifestação desse prejuízo foi mais intensa e diferente, quando comparada ao grupo de TDAH ou ao DL. Embora alguns pesquisadores tenham sugerido a hipótese de déficit múltiplo para caracterizar o perfil executivo do grupo comórbido (Menghini et al., 2010Menghini, D., Finzi, A., Benassi, M., Bolzani, R., Facoetti, A., Giovagnoli, S., & Vicari, S. (2010). Different underlying neurocognitive deficits in developmental dyslexia: A comparative study. Neuropsychologia, 48(4), 863-872.; Poljac et al., 2010Poljac, E., Simon, S., Ringlever, L., Kalcik, D., Groen, W. B., Buitelaar, J. K., & Bekkering, H. (2010). Impaired task switching performance in children with dyslexia but not in children with autism. The Quarterly Journal of Experimental Psychology, 63(2), 401-416.), outros afirmam que não existem evidências claras até o momento para essa conclusão e sugerem que o baixo desempenho no grupo comórbido é um fator de sobreposição. Nesta investigação, foi possível observar maior intensidade das dificuldades no grupo comórbido, porém com um perfil diferente em relação aos demais grupos. O grupo comórbido teve mais semelhanças com o grupo com dificuldades de leitura do que com o grupo com TDAH.

Considerações Finais

Pode-se concluir, diante do estudo realizado, que o grupo comórbido (TDAH/DL) foi o que apresentou maiores prejuízos em habilidades de FEs, uma vez que apresentou prejuízos característicos, tanto no TDAH quanto no DL separadamente, porém de forma mais intensa. Esse dado se torna relevante, pois demonstra que esse quadro deve ser criteriosamente avaliado para que haja intervenções eficazes e específicas. Além disso, outro achado importante foi que, ao comparar o grupo controle (SDL) com os demais, todos apresentaram diferenças, com exceção do grupo TDAH. Isso poderia ter acontecido pelo fato de os instrumentos utilizados possivelmente não terem sido sensíveis à diferenciação desses grupos. Por fim, quanto ao grupo TDAH e DL, houve diferença de desempenho entre ambos na habilidade de fluência verbal semântica, que se mostrou pior para o grupo DL.

Os achados deste estudo apontam para a necessidade de um maior número de pesquisas que analisem o funcionamento de condições comórbidas e chamem a atenção para a importância desses estudos para o diagnóstico, para o diagnóstico diferencial e principalmente para a construção de protocolos de intervenção adequados ao perfil comórbido. Possíveis razões para a discrepância entre os dados encontrados nesta investigação bem como a inconsistência na literatura podem estar relacionadas com os critérios utilizados para classificação dos grupos, com os instrumentos utilizados e/ou com o conteúdo das tarefas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Ago 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    03 Out 2017
  • Revisado
    08 Maio 2018
  • Aceito
    15 Jun 2018
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