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Práticas Educativas e Comportamentos Infantis: Avaliações de Mães e Professores

Resumo

Objetivou-se descrever e comparar avaliações de mães e professores quanto às suas habilidades sociais educativas, práticas negativas e problemas de comportamento e de habilidades sociais das crianças. Participaram mães e professores de 81 crianças, distribuídas em 4 subgrupos quanto à presença/ausência de dificuldades na família e na escola. Aplicou-se instrumentos validados para mensurar práticas educativas e comportamentos infantis. Verificou-se que: (a) crianças com problemas nos dois ambientes apresentaram mais comprometimento para mães e professores; (b) as mães referiram mais habilidades (afeto), usaram mais práticas negativas e identificaram mais problemas de comportamento; (c) os professores referiram mais habilidades para estabelecer limites. Conclui-se que práticas de mães e professores diferem e tais dados podem nortear programas de prevenção e intervenção.

Palavras-chave:
problemas de comportamento; habilidades sociais; família; escola; práticas educativas

Abstract

The objective of this study was to describe and compare mothers’ and teachers’ reports concerning their educational social skills and negative practices and children’s behavioral problems and social skills. The mothers and teachers of 81 children participated in this study. The children were assigned to four groups depending on whether they presented problems exclusively at home, school, in both, or none of these contexts. Valid instruments measured educational practices and child behavior. The results show that: (a) mothers and teachers agreed that children with problems in both contexts presented the highest level of impairment; (b) the mothers more frequently reported skills such as affection, adopted negative practices, and identified problem behaviors; (c) the teachers reported more skills such as limit setting. The conclusion is that teachers’ and mothers’ practices differ, and such information can guide preventive programs and interventions.

Keywords:
problem behavior; social skills; family; school; educational practices

O tema práticas educativas e comportamentos infantis está bem documentado na literatura, na direção de que práticas educativas positivas influenciam comportamentos habilidosos de crianças e práticas negativas trazem prejuízos ao desenvolvimento infantil, seja tendo como respondentes os pais (Bolsoni-Silva et al., 2018Bolsoni-Silva, A. T., Marturano, E. M., & Loureiro, S. R. (2018). Roteiro de Entrevista de Habilidades Sociais Educativas para Professores (RE-HSE-Pr). Manual Técnico. Hogrefe/CETEPP. ; Bolsoni-Silva et al., 2016Bolsoni-Silva, A. T., Loureiro, S. R., & Marturano, E. M. (2016). Roteiro de entrevista de habilidades sociais educativas parentais (RE-HSE-P). Manual Técnico. Hogrefe/CETEPP.; Bolsoni-Silva & Loureiro, 2019Bolsoni-Silva, A. T., & Loureiro, S. R. (2019). Práticas parentais: Conjugalidade, depressão materna, comportamento das crianças e variáveis demográficas.Psico-USF,24(1), 69-83.https://doi.org/10.1590/1413-82712019240106
https://doi.org/10.1590/1413-82712019240...
; Borden et al., 2014Borden, L. A., Herman, K. C., Stormont, M., Goel, N., Darney, D., Reinke, W. M., & Webster-Stratton, C. (2014). Latent profile analysis of observed parenting behaviors in a clinic sample. Journal of Abnormal Child Psychology, 42(5), 731-742. https://doi.org/10.1007/s10802-013-9815-z
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; García-Linares et al., 2014García-Linares, M. C., García-Moral, A. T., & Casanova-Arias, P. F. (2014). Prácticas educativas paternas que predicen la agresividad evaluada por distintos informantes. Revista Latinoamericana de Psicología, 46(3), 198-210. https://doi.org/10.1016/S0120-0534(14)70023-8
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; Price et al., 2013Price, J. M., Chiapa, A., & Walsh, N. E. (2013). Predictors of externalizing behavior problems in early elementary-aged children: The role of family and home environments. The Journal of Genetic Psychology: Research and Theory on Human Development, 174(4), 464-471. https://doi.org/10.1080/00221325.2012.690785
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; Nunes et al., 2013Nunes, S. A. N., Faraco, A. M. X., & Vieira, M. L. (2013). Attachment and parental practices as predictors of behavioral disorders in boys and girls. Paidéia (Ribeirão Preto), 23(56), 369-377. https://doi.org/10.1590/1982-43272356201311
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; Vafaeenejad et al., 2019Vafaeenejad, Z., Elyasi,. F., Moosazadeh, M. & Shahhosseini, Z. (2019). Psychological factors contributing to parenting styles: A systematic review.F1000Research, 7(906), 1-23. doi: 10.12688/f1000research.14978.1
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; Zalewski et al., 2017Zalewski, M., Thompson, S. F., & Lengua, L. J. (2017). Parenting as a moderator of the effects of maternal depressive symptoms on preadolescent adjustment.Journal of Clinical Child and Adolescent Psychology, 46(4), 563-572. https://doi.org/10.1080/15374416.2015.1030752
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) ou os professores (Bolsoni-Silva et al., 2018Bolsoni-Silva, A. T., Marturano, E. M., & Loureiro, S. R. (2018). Roteiro de Entrevista de Habilidades Sociais Educativas para Professores (RE-HSE-Pr). Manual Técnico. Hogrefe/CETEPP. ; Fernandes et al., 2018Fernandes, L. M., Leme, V. B. R., Elias, L. C. S., & Soares, A. B. (2018). Preditores do desempenho escolar ao final do Ensino Fundamental: Histórico de reprovação, habilidades sociais e apoio social.Temas em Psicologia,26(1), 215-228.https://dx.doi.org/10.9788/TP2018.1-09Pt
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; Mariano & Bolsoni-Silva, 2018Mariano, M., & Bolsoni-Silva, A. T. (2018). Social interactions between teachers and students: A study addressing associations and predictions.Paidéia (Ribeirão Preto),28, e2816. https://doi.org/10.1590/1982-4327e2816
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; Roksa et al., 2017Roksa, J., Trolian, T. L., Blaich, C., & Wise, K. (2017). Facilitating academic performance in college: Understanding the role of clear and organized instruction. Higher Education, 74(2), 283-300. https://doi.org/10.1007/s10734-016-0048-2
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).

Na presente pesquisa, o termo “práticas educativas positivas” será considerado como sinônimo de habilidades sociais educativas (HSE), conforme definido por Bolsoni-Silva et al. (2016Bolsoni-Silva, A. T., Loureiro, S. R., & Marturano, E. M. (2016). Roteiro de entrevista de habilidades sociais educativas parentais (RE-HSE-P). Manual Técnico. Hogrefe/CETEPP.), cujas classes de respostas podem ser organizadas em comunicação, afeto e limites. Para Achenbach e Rescorla (2001Achenbach, T. M. & Rescorla, L. A. (2001). Manual for the ASEBA school-age forms & profiles. Technical Manual. University of Vermont, Research Center for Children, Youth, & Families.), os problemas de comportamento podem ser identificados como externalizantes (agressividade e desobediência) ou internalizantes (timidez, ansiedade). Esses comportamentos de práticas educativas são relevantes tanto a partir de relato de pais como de professores ( Bolsoni-Silva & Mariano, 2018Mariano, M., & Bolsoni-Silva, A. T. (2018). Social interactions between teachers and students: A study addressing associations and predictions.Paidéia (Ribeirão Preto),28, e2816. https://doi.org/10.1590/1982-4327e2816
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; Nunes et al., 2013Nunes, S. A. N., Faraco, A. M. X., & Vieira, M. L. (2013). Attachment and parental practices as predictors of behavioral disorders in boys and girls. Paidéia (Ribeirão Preto), 23(56), 369-377. https://doi.org/10.1590/1982-43272356201311
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; Mariano & Bolsoni-Silva, 2018Mariano, M., & Bolsoni-Silva, A. T. (2018). Social interactions between teachers and students: A study addressing associations and predictions.Paidéia (Ribeirão Preto),28, e2816. https://doi.org/10.1590/1982-4327e2816
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; Vafaeenejad et al., 2019Vafaeenejad, Z., Elyasi,. F., Moosazadeh, M. & Shahhosseini, Z. (2019). Psychological factors contributing to parenting styles: A systematic review.F1000Research, 7(906), 1-23. doi: 10.12688/f1000research.14978.1
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; Zalewski et al., 2017Zalewski, M., Thompson, S. F., & Lengua, L. J. (2017). Parenting as a moderator of the effects of maternal depressive symptoms on preadolescent adjustment.Journal of Clinical Child and Adolescent Psychology, 46(4), 563-572. https://doi.org/10.1080/15374416.2015.1030752
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). Smith e Sheridan (2019Smith, T. E., & Sheridan, S. M. (2019) The effects of teacher training on teachers’ family-engagement practices, attitudes, and knowledge: A meta-analysis. Journal of Educational and Psychological Consultation, 29(2), 128-157. https://doi.org/10.1080/10474412.2018.1460725
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), em um estudo de metanálise, verificaram que quando o professor é capaz de estimular a participação dos pais nas atividades escolares, bem como utilizam de práticas positivas de comunicação, planejamento colaborativo e estratégias de resolução de problemas, ocorre maior desenvolvimento socioemocional, comportamental e acadêmico dos alunos.

A comparação da avaliação simultânea de pais e professores sobre comportamentos das crianças foi objeto de vários estudos (Bernedo et al., 2014Bernedo, I. M., Salas, M. D., Fuentes, M. J., & García-Martin, M. A. (2014). Foster children's behavior problems and impulsivity in the family and school context.Children and Youth Services Review,42, 43-49. https://doi.org/10.1016/j.childyouth.2014.03.022; Ercan et al., 2015Ercan, E. S., Bilaç, Ö., Özaslan, T. U., & Rohde, L. A. (2015). Is the prevalence of ADHD in Turkish elementary school children really high?Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology,50(7), 1145-1152. https://doi.org/10.1007/s00127-015-1071-9
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; Korsch & Petermann, 2014Korsch, F., & Petermann, F. (2014). Agreement between parents and teachers on preschool children’s behavior in a clinical sample with externalizing behavioral problems.Child Psychiatry and Human Development,45(5), 617-627. https://doi.org/10.1007/s10578-013-0430-6
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; Lavigne et al., 2015Lavigne, J. V., Dahl, K. P., Gouze, K. R., LeBailly, S. A., & Hopkins, J. (2015). Multi-domain predictors of Oppositional Defiant Disorder symptoms in preschool children: Cross-informant differences. Child Psychiatry and Human Development,46(2), 308-319. https://doi.org/10.1007/s10578-014-0472-4
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; Rescorla et al., 2014Rescorla, L. A., Bochicchio, L., Achenbach, T. M., Ivanova, M. Y., Almqvist, F., Begovac, I., Bilenberg, N., Bird, H., Dobrean, A., Erol, N., Fombonne, A. F., Frigerio, AC., Fung, D. S. S., Lambert, M .C., Leung, P. W. L., Liu, X., Markovic, I., Markovic, J., Minaei, A., Ooi, Y. P. (...), & Verhulst, F. C. (2014). Parent-teacher agreement on children’s problems in 21 societies.Journal of Clinical Child & Adolescent Psychology, 43(4), 627-642. https://doi.org/10.1080/15374416.2014.900719
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; Rudasill et al., 2014Rudasill, K. M., Prokasky, A., Tu, X., Frohn, S., Sirota, K., & Molfese, V. J. (2014). Parent vs. teacher ratings of children's shyness as predictors of language and attention skills.Learning and Individual Differences,34, 57-62. https://doi.org/10.1016/j.lindif.2014.05.008
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). Contudo, tais estudos não consideraram a identificação de crianças com problemas de comportamento exclusivamente no ambiente familiar, no escolar ou em ambos ambientes. Adicionalmente, esses estudos de comparação focaram nos comportamentos das crianças e, menos frequentemente, avaliaram as práticas educativas de pais e de professores (Garcia et al., 2016Garcia, V. E. C., Gómez, V. L. A., Gómez, D. S. M., Marín, I. P. G., & Rodas, A. M. C. (2016). Madres, padres y profesores como educadores de la resiliencia en niños colombianos. Psicologia Escolar e Educacional, 20(3), 569-579. https://doi.org/10.1590/2175-3539201502031049
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; Santiago et al., 2016Santiago, R. T., Garbacz, S. A., Beattie, T., & Moore, C. L. (2016). Parent-teacher relationships in Elementary School: An examination of parent-teacher trust. Psychology in the Schools, 53(10), 1003-1017. https://doi.org/10.1002/pits.21971
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; Silveira & Wagner, 2009Silveira, L. M. O. B, & Wagner, A. (2009). Relação família-escola: Práticas educativas utilizadas por pais e professores. Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, 13(2), 283-291. https://dx.doi.org/10.1590/S1413-85572009000200011
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).

Os relatos de pais e professores nem sempre são concordantes quanto aos comportamentos das crianças; em parte dos estudos encontrou-se divergência (Korsch & Petermann, 2014Korsch, F., & Petermann, F. (2014). Agreement between parents and teachers on preschool children’s behavior in a clinical sample with externalizing behavioral problems.Child Psychiatry and Human Development,45(5), 617-627. https://doi.org/10.1007/s10578-013-0430-6
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; Lavigne et al., 2015Lavigne, J. V., Dahl, K. P., Gouze, K. R., LeBailly, S. A., & Hopkins, J. (2015). Multi-domain predictors of Oppositional Defiant Disorder symptoms in preschool children: Cross-informant differences. Child Psychiatry and Human Development,46(2), 308-319. https://doi.org/10.1007/s10578-014-0472-4
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; Rescorla et al., 2014Rescorla, L. A., Bochicchio, L., Achenbach, T. M., Ivanova, M. Y., Almqvist, F., Begovac, I., Bilenberg, N., Bird, H., Dobrean, A., Erol, N., Fombonne, A. F., Frigerio, AC., Fung, D. S. S., Lambert, M .C., Leung, P. W. L., Liu, X., Markovic, I., Markovic, J., Minaei, A., Ooi, Y. P. (...), & Verhulst, F. C. (2014). Parent-teacher agreement on children’s problems in 21 societies.Journal of Clinical Child & Adolescent Psychology, 43(4), 627-642. https://doi.org/10.1080/15374416.2014.900719
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; Rudasill et al., 2014Rudasill, K. M., Prokasky, A., Tu, X., Frohn, S., Sirota, K., & Molfese, V. J. (2014). Parent vs. teacher ratings of children's shyness as predictors of language and attention skills.Learning and Individual Differences,34, 57-62. https://doi.org/10.1016/j.lindif.2014.05.008
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) e, em parte, concordância (Bernerdo et al., 2014Bernedo, I. M., Salas, M. D., Fuentes, M. J., & García-Martin, M. A. (2014). Foster children's behavior problems and impulsivity in the family and school context.Children and Youth Services Review,42, 43-49. https://doi.org/10.1016/j.childyouth.2014.03.022; Ercan et al., 2015Ercan, E. S., Bilaç, Ö., Özaslan, T. U., & Rohde, L. A. (2015). Is the prevalence of ADHD in Turkish elementary school children really high?Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology,50(7), 1145-1152. https://doi.org/10.1007/s00127-015-1071-9
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). Nas pesquisas em que pais e professores discordaram, os professores apontaram mais problemas de comportamento em alguns dos estudos (Santiago et al., 2016Santiago, R. T., Garbacz, S. A., Beattie, T., & Moore, C. L. (2016). Parent-teacher relationships in Elementary School: An examination of parent-teacher trust. Psychology in the Schools, 53(10), 1003-1017. https://doi.org/10.1002/pits.21971
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) e os pais, em outros (Rescorla et al., 2014Rescorla, L. A., Bochicchio, L., Achenbach, T. M., Ivanova, M. Y., Almqvist, F., Begovac, I., Bilenberg, N., Bird, H., Dobrean, A., Erol, N., Fombonne, A. F., Frigerio, AC., Fung, D. S. S., Lambert, M .C., Leung, P. W. L., Liu, X., Markovic, I., Markovic, J., Minaei, A., Ooi, Y. P. (...), & Verhulst, F. C. (2014). Parent-teacher agreement on children’s problems in 21 societies.Journal of Clinical Child & Adolescent Psychology, 43(4), 627-642. https://doi.org/10.1080/15374416.2014.900719
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), não havendo consenso, portanto. O mesmo ocorreu quanto às habilidades sociais, em que os pais identificaram mais repertório habilidoso que os professores (Korsch & Petermann, 2014Korsch, F., & Petermann, F. (2014). Agreement between parents and teachers on preschool children’s behavior in a clinical sample with externalizing behavioral problems.Child Psychiatry and Human Development,45(5), 617-627. https://doi.org/10.1007/s10578-013-0430-6
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), mas não de maneira consensual, pois o contrário também foi verificado (Bolsoni-Silva & Loureiro, 2016Bolsoni-Silva, A. T., & Loureiro, S. R. (2016). Simultaneous assessment of social skills and behavior problems: Education and gender. Estudos de Psicologia (Campinas), 33(3), 453-464. https://doi.org/10.1590/1982-02752016000300009
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). Essas diferenças que geram lacunas no conhecimento podem ser resultado de múltiplos fatores, sendo que um deles refere-se ao uso de instrumentos dirigidos, como escalas, e não dirigidos, como entrevistas ou observações, que produzem dados diferentes e complementares (Bolsoni-Silva et al., 2011Bolsoni-Silva, A. T., Loureiro, S. R., & Marturano, E. M. (2011). Problemas de comportamento e habilidades sociais infantis: Modalidades de relatos.Psico, 42(3), 354-361. https://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/revistapsico/article/view/5813
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).

Bernedo et al. (2014Bernedo, I. M., Salas, M. D., Fuentes, M. J., & García-Martin, M. A. (2014). Foster children's behavior problems and impulsivity in the family and school context.Children and Youth Services Review,42, 43-49. https://doi.org/10.1016/j.childyouth.2014.03.022), com uma amostra de 104 crianças adotadas, avaliaram problemas de comportamento, impulsividade e desatenção, concluindo que pais e professores concordaram para os problemas externalizantes, mas discordaram da ocorrência de ansiedade, depressão, complicações somáticas e impulsividade/inatenção, que foram mais relatadas por pais. Rohenkohl e Castro (2012Rohenkohl, L. M. A., & Castro, E. K. (2012). Afetividade, conflito familiar e problemas de comportamento em pré-escolares de famílias de baixa renda: Visão de mães e professoras. Psicologia: Ciência e Profissão, 32(2), 438-451. https://doi.org/10.1590/S1414-98932012000200012
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), com amostra de 59 crianças pré-escolares, também identificaram no relato dos pais maior ocorrência de problemas totais e de queixas somáticas, ansiedade e depressão. Quanto à ocorrência no relato de pais e professores do Transtorno de Deficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), Ercan et al. (2015Ercan, E. S., Bilaç, Ö., Özaslan, T. U., & Rohde, L. A. (2015). Is the prevalence of ADHD in Turkish elementary school children really high?Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology,50(7), 1145-1152. https://doi.org/10.1007/s00127-015-1071-9
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), com uma amostra de 417 crianças entre 6 e 14 anos de idade, verificaram concordâncias em escalas gerais de internalização, externalização e problemas totais. Korsch e Petermann (2014Korsch, F., & Petermann, F. (2014). Agreement between parents and teachers on preschool children’s behavior in a clinical sample with externalizing behavioral problems.Child Psychiatry and Human Development,45(5), 617-627. https://doi.org/10.1007/s10578-013-0430-6
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), com 160 pré-escolares, também verificaram disparidade nos relatos de pais e professores, sendo que pais relataram mais habilidades sociais que professores, ainda que não tenham diferido no relato de problemas de comportamento. Por outro lado, Rescorla et al. (2014Rescorla, L. A., Bochicchio, L., Achenbach, T. M., Ivanova, M. Y., Almqvist, F., Begovac, I., Bilenberg, N., Bird, H., Dobrean, A., Erol, N., Fombonne, A. F., Frigerio, AC., Fung, D. S. S., Lambert, M .C., Leung, P. W. L., Liu, X., Markovic, I., Markovic, J., Minaei, A., Ooi, Y. P. (...), & Verhulst, F. C. (2014). Parent-teacher agreement on children’s problems in 21 societies.Journal of Clinical Child & Adolescent Psychology, 43(4), 627-642. https://doi.org/10.1080/15374416.2014.900719
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) compararam relatos de pais e professores referentes a 27.962 crianças de 21 sociedades distintas e apontaram muita divergência entre os respondentes, sendo que os pais identificaram mais problemas que os professores. Llanes et al. (2020Llanes, E., Blacher, J., Stavropoulos, K., & Eisenhower, A. (2020). Parent and teacher reports of comorbid anxiety and ADHD symptoms in children with ASD.Journal of Autism and Developmental Disorders, 50, 1520-1531. https://doi.org/10.1007/s10803-018-3701-z
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) examinaram as prevalências de TDAH e comorbidade em uma amostra de 180 crianças pré-escolares e em idade escolar, usando o CBCL e o TRF. Eles constataram que os pais relataram mais problemas comportamentais que os professores, havendo baixa concordância entre os relatos.

De Los Reyes et al. (2015De Los Reyes, A., Augenstein, T. M., Wang, M., Thomas, S. A., Drabick, D. A. G., Burgers, D. E., & Rabinowitz, J. (2015). The validity of the multi-informant approach to assessing child and adolescent mental health. Psychological Bulletin, 141(4), 858-900. https://doi.org/10.1037/a0038498
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) conduziram uma metanálise, tendo por fonte de dados 341 estudos publicados entre 1989 e 2014. A metanálise teve por objetivo analisar pesquisas que compararam avaliações de diferentes informantes (pais, professores e o próprio adolescente/criança) a respeito da saúde mental de adolescentes e crianças. Os principais resultados foram: (a) correlação de baixa a moderada entre os respondentes para problemas de comportamento internalizantes e externalizantes; (b) muita variação dos achados quanto aos problemas de comportamento considerando os diversos estudos analisados; (c) maior concordância nos relatos de pais e professores quanto aos problemas externalizantes; (d) quando pai e mãe responderam sobre a mesma criança, portanto, no mesmo contexto, ocorreu mais concordância do que nas outras comparações entre os demais pares de respondentes. Os autores atribuíram a divergência de avaliações a dois fatores: o primeiro deles refere à avaliação dos comportamentos de crianças/adolescentes em diferentes contextos e o segundo motivo apontado correspondeu ao uso de instrumentos diferentes, com propriedades psicométricas distintas.

Diante desse cenário, ao se perguntar por que há tanta diversidade, pode-se concordar com Lavigne et al. (2015Lavigne, J. V., Dahl, K. P., Gouze, K. R., LeBailly, S. A., & Hopkins, J. (2015). Multi-domain predictors of Oppositional Defiant Disorder symptoms in preschool children: Cross-informant differences. Child Psychiatry and Human Development,46(2), 308-319. https://doi.org/10.1007/s10578-014-0472-4
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) e com De Los Reyes et al. (2015De Los Reyes, A., Augenstein, T. M., Wang, M., Thomas, S. A., Drabick, D. A. G., Burgers, D. E., & Rabinowitz, J. (2015). The validity of the multi-informant approach to assessing child and adolescent mental health. Psychological Bulletin, 141(4), 858-900. https://doi.org/10.1037/a0038498
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) quanto à afirmativa de que a escola e a família são ambientes com exigências próprias e, então, a criança pode apresentar padrões comportamentais diferentes nesses contextos, os quais podem se influenciar mutuamente. Lavigne et al. (2015Lavigne, J. V., Dahl, K. P., Gouze, K. R., LeBailly, S. A., & Hopkins, J. (2015). Multi-domain predictors of Oppositional Defiant Disorder symptoms in preschool children: Cross-informant differences. Child Psychiatry and Human Development,46(2), 308-319. https://doi.org/10.1007/s10578-014-0472-4
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) apontaram que o conflito familiar foi um preditor de discrepância nos relatos e Santiago et al. (2016Santiago, R. T., Garbacz, S. A., Beattie, T., & Moore, C. L. (2016). Parent-teacher relationships in Elementary School: An examination of parent-teacher trust. Psychology in the Schools, 53(10), 1003-1017. https://doi.org/10.1002/pits.21971
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) verificaram que o conflito com o professor foi o preditor mais forte de discrepância nas avaliações. Santiago et al. (2016Santiago, R. T., Garbacz, S. A., Beattie, T., & Moore, C. L. (2016). Parent-teacher relationships in Elementary School: An examination of parent-teacher trust. Psychology in the Schools, 53(10), 1003-1017. https://doi.org/10.1002/pits.21971
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), com uma amostra de 732 crianças, do jardim da infância ao quarto ano escolar, verificaram que professores, mais que mães, apontaram problemas de comportamento, e que esses influenciaram fortemente os conflitos professor-criança.

Tais achados permitem inferir que a ocorrência de conflitos pode influenciar a avaliação dos comportamentos das crianças em ambientes diversos. Heatly e Votruba-Drzal (2017Heatly, M. C., & Votruba-Drzal, E. (2017). Parent- and teacher-child relationships and engagement at school entry: Mediating, interactive, and transactional associations across contexts. Developmental Psychology, 53(6), 1042-1062. https://doi.org/10.1037/dev0000310
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), com uma amostra de 1.364 crianças de primeira série, verificaram que os conflitos das crianças com os professores dificultaram o engajamento delas na escola, mas também notaram que práticas educativas maternas influenciavam no conflito com o professor e no engajamento da criança. Os autores apontaram que as interações familiares conflituosas podem gerar comportamentos disruptivos que serão motivos de conflitos com os professores.

Verifica-se também peculiaridades quanto às práticas utilizadas frente às dificuldades comportamentais. Silveira e Wagner (2009Silveira, L. M. O. B, & Wagner, A. (2009). Relação família-escola: Práticas educativas utilizadas por pais e professores. Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, 13(2), 283-291. https://dx.doi.org/10.1590/S1413-85572009000200011
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), com uma amostra reduzida (4 pais e 4 professores), verificaram que, diante de problemas de comportamento, pais e professores utilizavam as mesmas estratégias, tanto indutivas quanto coercitivas, mas os professores usavam menos as coercitivas e igualmente as indutivas. Na mesma direção, Garcia et al., (2016Garcia, V. E. C., Gómez, V. L. A., Gómez, D. S. M., Marín, I. P. G., & Rodas, A. M. C. (2016). Madres, padres y profesores como educadores de la resiliencia en niños colombianos. Psicologia Escolar e Educacional, 20(3), 569-579. https://doi.org/10.1590/2175-3539201502031049
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), com uma amostra de 417 pais de crianças/adolescentes de 7 a 12 anos de idade e 199 professores, também constataram que pais e professores usavam as mesmas estratégias para educar, mas os professores utilizavam com menor frequência as estratégias de monitoramento e afirmação de poder.

Analisando-se a literatura identificada, conclui-se que, ainda que alguns estudos tenham avaliado os comportamentos de crianças, pais e professores simultaneamente, há pouca regularidade nos resultados. Até onde pode alcançar a revisão apresentada, nenhum estudo diferenciou as crianças que apresentavam problemas de comportamento em exclusivamente um contexto ou nos ambientes familiar e escolar, o que pode inclusive ser motivo dos relatos divergentes quanto à avaliação de pais e professores. Nesse sentido, evidencia-se a relevância de estudos que investiguem as práticas educativas, positivas e negativas, considerando os relatos de pais e professores de modo a verificar a ocorrência de problemas de comportamento e de habilidades sociais infantis nesses diferentes ambientes interacionais e fundamentais para o desenvolvimento das crianças.

O objetivo do presente estudo se insere nessa lacuna, propondo-se a descrever e comparar as avaliações de mães e professores quanto às suas habilidades sociais educativas, às práticas negativas e aos problemas de comportamento e habilidades sociais das crianças.

Método

Aspectos Éticos

Este projeto conta com a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa na universidade onde o projeto foi desenvolvido. É parte de um projeto maior, cujo número do protocolo é 5826/46/01/10.

Percurso Amostral

Os participantes do estudo têm como fonte um banco de dados coletados entre os anos de 2010 e 2012, com 112 professores, que avaliaram 224 crianças, e 186 mães/pais/cuidadores que também avaliaram as crianças. Desse banco, verificou-se serem elegíveis 118 crianças, as quais foram avaliadas tanto por professores como por mães/pais/cuidadores. Na etapa seguinte, excluiu-se dessa amostra as crianças cujos respondentes eram pais ou cuidadores (20 crianças) e aquelas cujas mães eram adotivas, viúvas ou divorciadas (17 crianças), de forma a permanecer exclusivamente mães biológicas em famílias biparentais. Dessa forma, a amostra final ficou composta por 81 mães biológicas, casadas ou em união consensual, e os professores dessas crianças.

Participantes

Foram participantes deste estudo 81 díades mães-filhos, distribuídas em quatro subgrupos, uma amostra não clínica, com 32 crianças sem problemas comportamentais e três amostras clínicas, a saber: 23 crianças que apresentam problemas comportamentais nos dois ambientes escola e família, segundo a avaliação de professores e mães, 18 crianças com problemas exclusivamente na família, identificadas na avaliação de suas mães e 8 crianças que apresentam problemas comportamentais exclusivamente na escola, identificadas por seus professores.

Os critérios utilizados para distribuição das crianças nos grupos clínicos foi pontuar como clínico ou limítrofe nas escalas Child Behavior Checklist (CBCL), respondida pelas mães, e Teachers Report Form (TRF), respondida pelos professores (Inventários de Comportamentos da Infância e Adolescência - Achenbach & Rescorla, 2001Achenbach, T. M. & Rescorla, L. A. (2001). Manual for the ASEBA school-age forms & profiles. Technical Manual. University of Vermont, Research Center for Children, Youth, & Families.), e como não clínico quando os escores nesses instrumentos foram classificados como normal.

Considerando só os grupos clínicos, a distribuição entre crianças no ensino infantil e fundamental entre os diferentes grupos de problemas de comportamento foi equivalente (X2 = 1,969, p = 0,374), bem como quanto ao sexo (X2 = 2,852, p = 0,240). Nas comparações entre os grupos clínicos versus não clínico quanto à distribuição de escolaridade (X2=3,291; p=0,349) não foi identificada diferença estatística, mas a distribuição de meninos e meninas entre as crianças clínicas e não clínicas não foi equivalente (X2=10,670; p=0,014): 11 meninos e 21 meninas não clínicas; 33 meninos (18 = ambos ambientes; 10 = família; 5 = escola) e 16 meninas clínicas (5 = ambos ambientes; 8 = família; 3 = escola).

Ao analisar cada grupo clínico quanto às variáveis escolaridade e sexo, têm-se: (a) no grupo clínico para os ambientes escolar e familiar constatou-se diferença estatística (X2 = 0,002; p = 0,964) entre a distribuição de meninos (7 pré-escolares e 11 escolares) e de meninas (2 pré-escolares e 3 escolares) nos ensinos infantis e fundamentais; (b) o mesmo ocorreu para o grupo com problemas exclusivamente no contexto familiar (X2=0,000; p=1,000), sendo 5 meninos e 4 meninas em cada grupo escolar, perfazendo 18 crianças (10 meninos e 8 meninas); (c) e ocorreu equivalência no grupo de crianças com problemas exclusivamente na escola (X2=0,036; p=0,850), tendo-se, nesse grupo clínico, 3 meninos e 2 meninas pré-escolares e dois meninos e uma menina escolar. Na amostra não clínica, também há equivalência na distribuição de meninos (5 pré-escolares e 6 escolares) e meninas (15 pré-escolares e 6 escolares) nas idades escolares (X2=2,078; p=0,149). A análise mostrou que a escolaridade não interfere nas comparações entre grupos clínicos e não clínicos, mas o sexo da criança foi uma variável não equivalente, com mais meninos com problemas de comportamento. Entretanto, a distribuição entre meninos e meninas pré-escolares e escolares foi equivalente considerando cada grupo separadamente. As crianças pré-escolares tinham idade média de 4,3 anos (DP=1,09) e as escolares tinham, em média, 8,2 anos (DP=1,84).

A idade das mães respondentes variou de 20 a 44 anos, com média de 31 anos (DP=5,69), sendo todas mães biológicas, casadas ou com união estável. O número de filhos variou de 1 a 5 (M=2,33; DP=1,10). Quanto à escolaridade, 32,1% da amostra possuía o primeiro grau (completo ou incompleto), 53% tinha o segundo grau (completo ou incompleto) e 13,6%, o terceiro grau (completo ou incompleto); (d) 39,5% da amostra trabalhava fora e 59,3% não trabalhavam; (e) quanto à renda familiar, em salários mínimos, os dados foram: 8,6% - até um salário; 29,6% - 2 salários mínimos; 29,6% - 3 salários mínimos; 12,3% - 4 salários; 11,1% - 5 salários; 7,4% acima de 6 salários.

Quanto aos 38 professores respondentes, a média de idade na pré-escola foi de 43 anos (DP=8,04) e dos professores do ensino fundamental foi de 36 anos (DP=9,48). O tempo de serviço foi em média de 10 anos (DP=7,20) e 80% concluíram o curso superior. Na amostra de professores, somente 6% eram homens.

Quanto ao perfil comportamental das crianças dos grupos clínicos, têm-se: (a) as crianças com problemas em ambos os ambientes apresentavam mais dificuldades em comparação aos outros dois grupos, no relato de mães (18 internalizantes, 14 externalizantes e 18 problemas totais, comorbidade em 11 casos) e no relato de professores (15 internalizantes, 16 externalizantes e 16 problemas totais, comorbidade em 3 casos); (b) das crianças com problemas exclusivamente na família, no relato de mães 15 apresentavam problemas internalizantes, 6 externalizantes, 9 problemas totais e comorbidade em 4 casos; os professores dessas crianças identificaram poucos casos com problemas (1 internalizante, 1 externalizante e 1 problema total); (c) das crianças identificadas como tendo problemas exclusivamente na escola, as mães pouco identificaram problemas (1 internalizante, 0 externalizante e 1 problema total), enquanto que os professores relataram 4 casos de internalizantes, 8 de externalizantes e 10 com problemas totais, sendo 3 deles com comorbidade.

Instrumentos

Child Behavior Checklist (CBCL) e Teachers Report Form (TRF) (Inventários de Comportamentos da Infância e Adolescência - Achenbach & Rescorla, 2001Achenbach, T. M. & Rescorla, L. A. (2001). Manual for the ASEBA school-age forms & profiles. Technical Manual. University of Vermont, Research Center for Children, Youth, & Families.) para pré-escolares e escolares foram utilizados para avaliar problemas de comportamento e distribuir as crianças em grupos clínicos e não clínicos. Os instrumentos investigam, respectivamente, com base no relato de pais e de professores, a frequência de respostas indicativas de problemas de comportamento. Os resultados são organizados de acordo com escalas de problemas de comportamento internalizantes (por exemplo, ansiedade e depressão), externalizantes (por exemplo, desobediência e oposição) e totais. Os instrumentos também preveem a identificação de transtornos de acordo com síndromes e classificações do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - DSM-IV; os instrumentos ainda estão sendo atualizados para o DSM 5. Para todos os problemas identificados, há a classificação em clínico, não clínico e limítrofe. Para o presente estudo, considerando recomendações de Achenbach e Rescorla (2001Achenbach, T. M. & Rescorla, L. A. (2001). Manual for the ASEBA school-age forms & profiles. Technical Manual. University of Vermont, Research Center for Children, Youth, & Families.), as classificações limítrofes foram consideradas como clínicas. Bordin et al. (1995Bordin, I. A. S., Mari, J. J., & Caeiro, M. F. (1995). Validação da versão brasileira do “Child Behavior Checklist (CBCL)” (Inventário de Comportamentos da Infância e Adolescência): Dados preliminares. Revista ABP-APAL, 17(2), 55-66. https://www.scienceopen.com/document?vid=5a4f76aa-d9f1-4048-985f-beb6af08d820
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) encontraram critérios satisfatórios de teste-positividade e de morbidade para os perfis clínico e não clínico.

O Roteiro de Entrevista de Habilidades Sociais Educativas Parentais e o Roteiro de Entrevista de Habilidades Sociais Educativas para Professores (RE-HSE-P, Bolsoni-Silva et al., 2016Bolsoni-Silva, A. T., Loureiro, S. R., & Marturano, E. M. (2016). Roteiro de entrevista de habilidades sociais educativas parentais (RE-HSE-P). Manual Técnico. Hogrefe/CETEPP.; RE-HSE-Pr, Bolsoni-Silva et al., 2018Bolsoni-Silva, A. T., Marturano, E. M., & Loureiro, S. R. (2018). Roteiro de Entrevista de Habilidades Sociais Educativas para Professores (RE-HSE-Pr). Manual Técnico. Hogrefe/CETEPP. ) foram utilizados para avaliar as interações pais-filhos e professores-alunos. Ambos os instrumentos são testes psicológicos aprovados pelo Conselho Federal de Psicologia e avaliam, via entrevista com perguntas guias, habilidades sociais educativas (comunicação, afeto e limites), práticas negativas e variáveis de contexto na interação com os comportamentos dos filhos/alunos, tanto os considerados habilidosos quanto os que indicam problemas de comportamento. Os instrumentos apresentam dois fatores, configurando total positivo e total negativo de interações adulto-criança e discriminaram crianças com e sem problemas de comportamento nos testes de validade discriminante.

Foram utilizados o Questionário de Respostas Socialmente Habilidosas para Pais (QRSH-Pais, Bolsoni-Silva & Loureiro, 2020Bolsoni-Silva, A. T. & Loureiro, S. R. (2020). Evidence of validity for Socially Skillful Responses Questionnaires - SSRQ-Teachers and SSRQ-Parents. Revista Psico-USF, 25(1), 155-170. https://doi.org/10.1590/1413-82712020250113
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) e o Questionário de Respostas Socialmente Habilidosas para Professores (QRSH-Pr, Bolsoni-Silva & Loureiro, 2020Bolsoni-Silva, A. T. & Loureiro, S. R. (2020). Evidence of validity for Socially Skillful Responses Questionnaires - SSRQ-Teachers and SSRQ-Parents. Revista Psico-USF, 25(1), 155-170. https://doi.org/10.1590/1413-82712020250113
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), que avaliam respostas de habilidades sociais, com base no relato de pais/cuidadores e professores. O QRSH-Pais apresenta dados satisfatórios de validades de constructo e discriminativa e alfa de 0,79. O QRSH-Pr também apresenta dados satisfatórios de validades de constructo e discriminativa, e alfa de 0,94. Ambos os instrumentos possuem ponto de corte para deficits em habilidades sociais, considerando análises de curva ROC.

Procedimentos de Coleta de Dados

Antes de iniciar a coleta de dados, foi obtida a aprovação da Secretaria de Educação de uma cidade do interior paulista. Em um segundo momento, foram contatadas escolas de Educação Infantil e de Ensino Fundamental para verificar a disponibilidade em participar do projeto. Foram colhidos dados junto a 14 Escolas Municipais Infantis e 12 Escolas Municipais de Ensino Fundamental, sendo que foi informado às mães que se tratava de uma pesquisa sobre interações pais e filhos e interações professores-alunos, as quais, ao aceitarem participar, assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Nas escolas, a pesquisadora informou os objetivos da pesquisa para a diretora ou coordenadora pedagógica e, na sequência, para os professores interessados em colaborar. Os professores que aceitaram participar também assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e indicaram uma criança que consideravam ter problemas de comportamento e outra sem problemas de comportamento. As mães autorizaram que os professores respondessem instrumentos sobre suas crianças.

A coleta com as mães ocorreu em locais que os participantes julgaram de melhor acesso (na própria casa ou na escola) e com os professores a coleta ocorreu na escola. Foram entregues materiais informativos sobre o tema da pesquisa e, para as escolas que solicitaram, foram conduzidas palestras sobre as temáticas problemas de comportamento, habilidades sociais e práticas educativas, para garantir a finalidade ética com a pesquisa.

Procedimento de Tratamento e Análise de Dados

A sequência de tabulação de dados foi: (a) lançar os dados no Software ASEBA para codificar os comportamentos das crianças a partir do TRF e do CBCL em todas as categorias previstas nos instrumentos; (b) organizar os participantes em grupos de acordo com ter ou não problemas de comportamento exclusivamente na família (CBCL), exclusivamente na escola (TRF), em ambos os ambientes (CBCL e TRF) ou sem problemas de comportamento; (c) descrever a frequência dos problemas por meio de análises estatísticas descritivas, considerando os grupos com problemas só na escola, só na família ou em ambos os ambientes; (d) tabular os dados do RE-HSE-P, RE-HSE-Pr, QRSH-Pais e QRSH-Pr conforme as instruções próprias; (e) comparar os relatos de mães e professores (Teste Wilcoxon), no que se refere às variáveis de interesse do estudo, em cada um dos grupos clínicos (ambos ambientes, exclusivamente na família e exclusivamente na escola) e no grupo não clínico; (e) comparar os relatos de mães de cada grupo de crianças clínicas com crianças não clínicas (Teste Mann Whitney), no que se refere às variáveis de interesse do estudo; (f) comparar os relatos de professores de cada grupo de crianças clínicas com crianças não clínicas (Teste Mann Whitney), no que se refere às variáveis de interesse do estudo. Foi considerado o nível de significância a 5%. Os resultados foram organizados na forma de tabelas.

Resultados

A seção está organizada em três tabelas. A primeira delas apresenta o perfil das habilidades sociais educativas (HSE), práticas negativas, habilidades sociais e comportamentos infantis a partir dos relatos de mães e professores. As demais comparam os grupos clínicos e não clínico considerando os relatos de mães e de professores.

De acordo com a Tabela 1, verificaram-se diferenças entre os avaliadores para a maioria dos comportamentos avaliados. Para o grupo de crianças com problemas nos dois ambientes, têm-se que: (a) as habilidades sociais educativas totais são mais frequentes para as mães; (b) mães e professores não divergiram quanto à diversidade de assuntos na comunicação com as crianças, mas divergiram quanto ao afeto (mais frequente para as mães) e quanto aos limites (mais frequente para os professores); (c) as variáveis de contexto que indicam a diversidade no uso de HSE foi mais relatada por mães; (d) as práticas negativas foram mais frequentes para mães também na comparação com os professores, ainda que (e) professores identifiquem mais que as mães queixas de problemas de comportamento; (f) as habilidades sociais mensuradas pelos RE-HSE-P/Pr foram mais citadas por mães, ainda que, pelo relato dirigido (QRSH-P/Pr), não tenha diferença; (g) o total positivo teve maiores médias para mães e o total negativo não apresentou diferença.

Tabela 1
Comparações entre as avaliações de mães e professores para os grupos clínicos e grupo não clínico, considerando as médias de ocorrência de práticas educativas, problemas de comportamentos e habilidades sociais infantis

As mães das crianças com problemas exclusivamente na família relataram ser mais habilidosas (com destaque para o afeto), mas também referiram usar mais práticas negativas. Queixas de problemas de comportamento, diversidade de comunicação e HSE - estabelecer limites não diferenciaram os relatos de mães e de professores. O contexto ocorreu mais no relato de mães, o que está em acordo com serem mais habilidosas nas interações com as crianças. As habilidades sociais infantis mensuradas pelos instrumentos não dirigidos (RE-HSE-P/Pr) e dirigidos (QRSH-P/Pr) foram mais relatadas por mães. O total positivo foi mais relatado por mães e o total negativo não diferenciou os avaliadores.

Em relação às crianças que apresentavam problemas exclusivamente na escola, verificou-se que as mães relataram mais habilidades sociais educativas totais e variáveis de contexto que os professores, ainda que as HSE de comunicação, afeto e limites não tenham diferenciado os grupos. As habilidades sociais das crianças via relato espontâneo também foram mais frequentes paras mães, bem como o total positivo de interações. As práticas negativas, queixas de problemas e total negativo não diferenciaram os grupos.

As comparações entre relatos de mães e de professores no grupo não clínico demonstraram que mães são mais habilidosas (HSE total e HSE-afeto) e em número maior de situações (contexto). Interessante notar que, diferentemente dos grupos clínicos, no não clínico os professores, mais que as mães, identificaram comportamentos de habilidades sociais nas crianças pelo instrumento dirigido (QRSH-P/Pr), mas as mães continuaram avaliando mais habilidades sociais pela entrevista (RE-HSE-P/Pr), o que culminou em maiores médias no total positivo. As queixas de problemas e as práticas negativas também foram mais relatadas pelas mães que pelos professores, com maiores médias no total negativo.

A Tabela 2 apresenta as comparações entre os relatos de mães de crianças clínicas com o relato de mães de crianças não clínicas.

Tabela 2
Comparações entre as avaliações de mães de crianças clínicas com mães de crianças não clínicas, considerando as médias de ocorrência de práticas educativas, problemas de comportamentos e habilidades sociais infantis

As comparações expressas na Tabela 2 identificaram que mães de crianças com problemas em dois ambientes relataram mais que as mães das crianças não clínicas queixas de problemas de comportamento, uso de práticas negativas e total negativo de interações, enquanto que as HSE e as habilidades sociais infantis não diferenciaram os grupos. Nas comparações de mães de crianças com problemas exclusivamente na família com as não clínicas, também se verificou que, nesse grupo clínico, as mães identificaram mais problemas de comportamento e usavam mais práticas negativas, configurando mais interações sociais negativas (total negativo); adicionalmente, essas mães relataram usar mais de HSE-afeto, diferentemente do esperado. No grupo de crianças com problemas exclusivamente na escola, apenas as queixas de problemas de comportamento diferenciaram os grupos, com mais ocorrência para o grupo clínico na comparação com o não clínico.

A Tabela 3 apresenta as comparações entre os relatos de professores de crianças clínicas e o relato de professores de crianças não clínicas.

Tabela 3
Comparações entre as avaliações de professores de crianças clínicas com professores de crianças não clínicas, considerando as médias de ocorrência de práticas educativas, problemas de comportamentos e habilidades sociais infantis

Conforme a Tabela 3, verificaram-se diferenças nos relatos de professores das crianças com problemas em ambos os ambientes com as não clínicas em quase todas as comparações, sendo que nesse grupo clínico os professores relataram mais queixas de problemas de comportamento e mais uso de práticas negativas. Quanto às HSE, os professores das crianças clínicas usavam mais as relacionadas ao estabelecimento de limites e os das crianças não clínicas conversavam mais sobre assuntos diversos, do interesse da criança e em diferentes contextos; as habilidades sociais infantis foram mais relatadas pelo grupo não clínico (na entrevista RE-HSE-Pr e na escala QRSH-Pr). Nas comparações de professores das crianças com problemas exclusivamente na família com o grupo não clínico, as queixas de problemas, as práticas negativas e o total negativo foi mais relatado pelo grupo clínico e, por outro lado, as habilidades sociais das crianças foram identificadas com mais frequência no grupo não clínico pelo QRSH-Pr. Nas comparações das avaliações dos professores de crianças com problemas exclusivamente na escola com o grupo não clínico, também verificou-se mais queixas de problemas, práticas negativas e total negativo, sendo que as habilidades sociais infantis foram mais relatadas pelo grupo não clínico por meio dos dois instrumentos utilizados.

Discussão

Com base nesses achados das comparações de avaliadores, tendo por base o CBCL e o TRF, conclui-se que mães e professores concordaram que as crianças com problemas em ambos os ambientes possuem mais comprometimento, com alta ocorrência de problemas internalizantes, externalizantes e total, sendo que, pela avaliação das mães, essas crianças apresentavam também mais comorbidade de problemas internalizantes e externalizantes. No entanto, para as crianças com problemas exclusivamente na família ou na escola constatou-se divergência no relato dos avaliadores. Considerando a metanálise de De Los Reys et al. (2015De Los Reyes, A., Augenstein, T. M., Wang, M., Thomas, S. A., Drabick, D. A. G., Burgers, D. E., & Rabinowitz, J. (2015). The validity of the multi-informant approach to assessing child and adolescent mental health. Psychological Bulletin, 141(4), 858-900. https://doi.org/10.1037/a0038498
https://doi.org/10.1037/a0038498...
) e o estudo de Llanes et al. (2020Llanes, E., Blacher, J., Stavropoulos, K., & Eisenhower, A. (2020). Parent and teacher reports of comorbid anxiety and ADHD symptoms in children with ASD.Journal of Autism and Developmental Disorders, 50, 1520-1531. https://doi.org/10.1007/s10803-018-3701-z
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), pode-se afirmar que a presente pesquisa concorda com esses autores, uma vez que constataram de baixa a moderada correlação entre relatos de pais e professores. Os autores afirmaram que a discordância poderia ser explicada pelo uso de diferentes instrumentos e pela avaliação em contextos distintos, pois pais e mães que avaliam no mesmo contexto são mais concordantes que outros pares de avaliadores. De fato, a família e a escola são contextos distintos que exigem repertórios próprios, no entanto, segundo os avaliadores, é curioso que as crianças com dificuldades na família e na escola apresentaram perfis comportamentais semelhantes nos dois contextos, o que talvez seja explicado pela natureza das interações sociais estabelecidas nesses dois ambientes, o que será discutido mais à frente.

Desse modo, ainda que a literatura que compara relato de mães e professores quanto aos comportamentos das crianças não tenha consenso, alguns estudos verificaram concordância (Bernedo et al., 2014Bernedo, I. M., Salas, M. D., Fuentes, M. J., & García-Martin, M. A. (2014). Foster children's behavior problems and impulsivity in the family and school context.Children and Youth Services Review,42, 43-49. https://doi.org/10.1016/j.childyouth.2014.03.022; Ercan et al., 2015Ercan, E. S., Bilaç, Ö., Özaslan, T. U., & Rohde, L. A. (2015). Is the prevalence of ADHD in Turkish elementary school children really high?Social Psychiatry and Psychiatric Epidemiology,50(7), 1145-1152. https://doi.org/10.1007/s00127-015-1071-9
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) e outros discordâncias (Korsch & Petermann, 2014Korsch, F., & Petermann, F. (2014). Agreement between parents and teachers on preschool children’s behavior in a clinical sample with externalizing behavioral problems.Child Psychiatry and Human Development,45(5), 617-627. https://doi.org/10.1007/s10578-013-0430-6
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; Lavigne et al., 2015Lavigne, J. V., Dahl, K. P., Gouze, K. R., LeBailly, S. A., & Hopkins, J. (2015). Multi-domain predictors of Oppositional Defiant Disorder symptoms in preschool children: Cross-informant differences. Child Psychiatry and Human Development,46(2), 308-319. https://doi.org/10.1007/s10578-014-0472-4
https://doi.org/10.1007/s10578-014-0472-...
; Rescorla et al., 2014Rescorla, L. A., Bochicchio, L., Achenbach, T. M., Ivanova, M. Y., Almqvist, F., Begovac, I., Bilenberg, N., Bird, H., Dobrean, A., Erol, N., Fombonne, A. F., Frigerio, AC., Fung, D. S. S., Lambert, M .C., Leung, P. W. L., Liu, X., Markovic, I., Markovic, J., Minaei, A., Ooi, Y. P. (...), & Verhulst, F. C. (2014). Parent-teacher agreement on children’s problems in 21 societies.Journal of Clinical Child & Adolescent Psychology, 43(4), 627-642. https://doi.org/10.1080/15374416.2014.900719
https://doi.org/10.1080/15374416.2014.90...
; Rudasill et al., 2014Rudasill, K. M., Prokasky, A., Tu, X., Frohn, S., Sirota, K., & Molfese, V. J. (2014). Parent vs. teacher ratings of children's shyness as predictors of language and attention skills.Learning and Individual Differences,34, 57-62. https://doi.org/10.1016/j.lindif.2014.05.008
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), o que de algum modo traz consonância com os achados do presente estudo, uma vez que parte das comparações não diferenciaram mães de professores e outras sim. No entanto, nenhuma dessas pesquisas compararam crianças com problemas em ambos ambientes ou exclusivamente na escola ou na família, como o presente estudo, o que pode ser uma variável relevante para explicar porque os relatos concordaram em alguns aspectos, mas discordaram em outros. Santiago et al. (2016Santiago, R. T., Garbacz, S. A., Beattie, T., & Moore, C. L. (2016). Parent-teacher relationships in Elementary School: An examination of parent-teacher trust. Psychology in the Schools, 53(10), 1003-1017. https://doi.org/10.1002/pits.21971
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) verificaram que o maior preditor para a discrepância no relato de pais e professores foi a ocorrência de conflitos da criança com o professor e, por sua vez, esses conflitos foram fortemente associados com a identificação de problemas de comportamento. Os achados da presente pesquisa parecem concordar com Santiago et al. (2016Santiago, R. T., Garbacz, S. A., Beattie, T., & Moore, C. L. (2016). Parent-teacher relationships in Elementary School: An examination of parent-teacher trust. Psychology in the Schools, 53(10), 1003-1017. https://doi.org/10.1002/pits.21971
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) ao verificar a frequência alta do relato de queixas comportamentais e de práticas negativas pelo professor, como será discutido na sequência. Rohenkohl e Castro (2012Rohenkohl, L. M. A., & Castro, E. K. (2012). Afetividade, conflito familiar e problemas de comportamento em pré-escolares de famílias de baixa renda: Visão de mães e professoras. Psicologia: Ciência e Profissão, 32(2), 438-451. https://doi.org/10.1590/S1414-98932012000200012
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) também encontraram que mães relataram mais problemas internalizantes do que professores.

As mães deste estudo pareceram ter bons recursos quanto às HSE totais e HSE-afeto, o que é reconhecido como relevante para prevenir problemas de comportamento (Bolsoni-Silva & Loureiro, 2019Bolsoni-Silva, A. T., & Loureiro, S. R. (2019). Práticas parentais: Conjugalidade, depressão materna, comportamento das crianças e variáveis demográficas.Psico-USF,24(1), 69-83.https://doi.org/10.1590/1413-82712019240106
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; García-Linares et al., 2014García-Linares, M. C., García-Moral, A. T., & Casanova-Arias, P. F. (2014). Prácticas educativas paternas que predicen la agresividad evaluada por distintos informantes. Revista Latinoamericana de Psicología, 46(3), 198-210. https://doi.org/10.1016/S0120-0534(14)70023-8
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; Nunes et al., 2013Nunes, S. A. N., Faraco, A. M. X., & Vieira, M. L. (2013). Attachment and parental practices as predictors of behavioral disorders in boys and girls. Paidéia (Ribeirão Preto), 23(56), 369-377. https://doi.org/10.1590/1982-43272356201311
https://doi.org/10.1590/1982-43272356201...
; Rohenkohl & Castro, 2012Rohenkohl, L. M. A., & Castro, E. K. (2012). Afetividade, conflito familiar e problemas de comportamento em pré-escolares de famílias de baixa renda: Visão de mães e professoras. Psicologia: Ciência e Profissão, 32(2), 438-451. https://doi.org/10.1590/S1414-98932012000200012
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; Vafaeenejad et al., 2019Vafaeenejad, Z., Elyasi,. F., Moosazadeh, M. & Shahhosseini, Z. (2019). Psychological factors contributing to parenting styles: A systematic review.F1000Research, 7(906), 1-23. doi: 10.12688/f1000research.14978.1
doi: 10.12688/f1000research.14978.1...
; Zalewski et al., 2017Zalewski, M., Thompson, S. F., & Lengua, L. J. (2017). Parenting as a moderator of the effects of maternal depressive symptoms on preadolescent adjustment.Journal of Clinical Child and Adolescent Psychology, 46(4), 563-572. https://doi.org/10.1080/15374416.2015.1030752
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). No entanto, o uso de práticas negativas com alta frequência possivelmente mantém forte a ocorrência dos problemas de comportamento das crianças, como apontado em estudos prévios (García-Linares et al., 2014García-Linares, M. C., García-Moral, A. T., & Casanova-Arias, P. F. (2014). Prácticas educativas paternas que predicen la agresividad evaluada por distintos informantes. Revista Latinoamericana de Psicología, 46(3), 198-210. https://doi.org/10.1016/S0120-0534(14)70023-8
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; Price et al., 2013Price, J. M., Chiapa, A., & Walsh, N. E. (2013). Predictors of externalizing behavior problems in early elementary-aged children: The role of family and home environments. The Journal of Genetic Psychology: Research and Theory on Human Development, 174(4), 464-471. https://doi.org/10.1080/00221325.2012.690785
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; Vafaeenejad et al., 2019Vafaeenejad, Z., Elyasi,. F., Moosazadeh, M. & Shahhosseini, Z. (2019). Psychological factors contributing to parenting styles: A systematic review.F1000Research, 7(906), 1-23. doi: 10.12688/f1000research.14978.1
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; Zalewski et al., 2017Zalewski, M., Thompson, S. F., & Lengua, L. J. (2017). Parenting as a moderator of the effects of maternal depressive symptoms on preadolescent adjustment.Journal of Clinical Child and Adolescent Psychology, 46(4), 563-572. https://doi.org/10.1080/15374416.2015.1030752
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).

Heatly e Votruba-Drzal (2017Heatly, M. C., & Votruba-Drzal, E. (2017). Parent- and teacher-child relationships and engagement at school entry: Mediating, interactive, and transactional associations across contexts. Developmental Psychology, 53(6), 1042-1062. https://doi.org/10.1037/dev0000310
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) verificaram que a interação pais-filhos influenciava no engajamento da criança na primeira série escolar, bem como a ocorrência de conflitos com o professor. Nesse sentido, a referência ao uso de muitas práticas negativas para educar os filhos por parte das mães é preocupante, ainda que também tenham relatado usar habilidades sociais educativas.

Quanto às crianças com problemas exclusivamente no ambiente familiar, no qual há a ocorrência maior de problemas internalizantes, tal dado também tem concordância com outros estudos que identificaram mais ocorrência no uso de práticas negativas nessa condição (Tandon et al., 2009Tandon, M., Cardeli, E., & Luby, J. (2009). Internalizing disorders in early childhood: A review of depressive and anxiety disorders.Child and Adolescent Psychiatric Clinics of North America,18(3), 593-610. https://doi.org/10.1016/j.chc.2009.03.004
https://doi.org/10.1016/j.chc.2009.03.00...
). De maneira geral, pode-se afirmar que, como relatado por Silveira e Wagner (2009Silveira, L. M. O. B, & Wagner, A. (2009). Relação família-escola: Práticas educativas utilizadas por pais e professores. Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, 13(2), 283-291. https://dx.doi.org/10.1590/S1413-85572009000200011
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), tanto pais quanto professores, diante de problemas de comportamento das crianças, relataram utilizar tanto práticas positivas quanto negativas, ainda que mães referissem usarem mais práticas negativas que os professores, mas também usaram mais habilidades sociais de afeto. Interessante destacar que os professores, para o grupo clínico problemas em ambos os ambientes, referiram usar mais de HSE-limites, contudo também referiram usar comunicação diversa quando comparados aos grupos não clínicos, como já foi verificado por Bolsoni-Silva et al. (2018Bolsoni-Silva, A. T., Marturano, E. M., & Loureiro, S. R. (2018). Roteiro de Entrevista de Habilidades Sociais Educativas para Professores (RE-HSE-Pr). Manual Técnico. Hogrefe/CETEPP. ).

Quanto às comparações entre os relatos de mães e professores referente às suas práticas educativas e aos comportamentos das crianças, conclui-se que: (a) mães são mais habilidosas que os professores incluindo às variáveis de contexto (diversidade de interações positivas), as HSE gerais e as HSE-afeto para as crianças com problemas de comportamento nos dois ambientes, exclusivamente na família, e no grupo não clínico; e as HSE gerais e contexto também tiveram maiores médias para as mães no grupo de crianças com problemas exclusivamente no ambiente escolar; (b) as HSE-comunicação diversa e HSE-limites não diferenciaram mães e professores; (c) as HSE-limites foram relatadas com mais frequência pelos professores de crianças com problemas em ambos os ambientes; (d) as mães relataram utilizar mais práticas negativas quando a criança apresentava problemas nos dois ambientes, exclusivamente na família e no grupo não clínico, não diferenciando do relato de professores para as crianças com problemas exclusivamente na escola; (e) mães relataram mais queixas de problema de comportamento para as crianças sem problemas de comportamento e os professores, mais para aquelas com problemas em dois ambientes; não se diferenciando nas demais comparações; (f) mães identificaram pelos relatos espontâneos (RE-HSE-P) mais habilidades sociais nas crianças de todos os grupos clínicos e do grupo não clínico, mas, pelos instrumentos dirigidos (QRSH-Pais/Pr), as mães apontaram maiores escores para o grupo com problemas exclusivamente na família e os professores para as crianças sem problemas.

Sintetizando, pode-se dizer que tanto mães quanto professores relataram usar práticas positivas como negativas na interação com as crianças e que os professores relataram menos o uso de práticas negativas na comparação com as mães, o que é concordante com a pesquisa desenvolvida por Silveira e Wagner (2009Silveira, L. M. O. B, & Wagner, A. (2009). Relação família-escola: Práticas educativas utilizadas por pais e professores. Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, 13(2), 283-291. https://dx.doi.org/10.1590/S1413-85572009000200011
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), os quais também verificaram que pais e professores usavam, na mesma frequência, práticas indutivas, que têm relação com as práticas identificadas como HSE-limites no presente estudo. Pode-se afirmar que os achados desta pesquisa confirmam em parte os de Silveira e Wagner (2009Silveira, L. M. O. B, & Wagner, A. (2009). Relação família-escola: Práticas educativas utilizadas por pais e professores. Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, 13(2), 283-291. https://dx.doi.org/10.1590/S1413-85572009000200011
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), pois professores relataram emitir mais essas habilidades exclusivamente com as crianças com problemas em ambos os ambientes. Em direção semelhante, Garcia et al. (2016Garcia, V. E. C., Gómez, V. L. A., Gómez, D. S. M., Marín, I. P. G., & Rodas, A. M. C. (2016). Madres, padres y profesores como educadores de la resiliencia en niños colombianos. Psicologia Escolar e Educacional, 20(3), 569-579. https://doi.org/10.1590/2175-3539201502031049
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) verificaram que professores usavam das mesmas práticas educativas que os pais, embora com menor frequência, o que se pode dizer ter sido confirmado na presente investigação, pois tanto as HSE quanto as práticas negativas foram utilizadas por mães e professores, mas com mais frequência pelas mães.

As mães identificaram, de maneira geral, mais habilidades sociais que os professores, o que parece concordar com Korsch e Petermann (2014Korsch, F., & Petermann, F. (2014). Agreement between parents and teachers on preschool children’s behavior in a clinical sample with externalizing behavioral problems.Child Psychiatry and Human Development,45(5), 617-627. https://doi.org/10.1007/s10578-013-0430-6
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), que verificaram que pais relataram mais comportamentos pró-sociais que os professores. Por outro lado, os professores apontaram mais habilidades sociais de mães para as crianças sem problemas de comportamento no instrumento dirigido. Bolsoni-Silva e Loureiro (2016Bolsoni-Silva, A. T., Loureiro, S. R., & Marturano, E. M. (2016). Roteiro de entrevista de habilidades sociais educativas parentais (RE-HSE-P). Manual Técnico. Hogrefe/CETEPP.) verificaram que os professores identificaram um número maior de comportamentos de habilidades sociais que as mães quando comparados grupos clínicos e não clínicos, o que tem consonância com o presente estudo. Sabe-se que repertórios de habilidades sociais e de problemas de comportamento são inversamente proporcionais, seja no relato de pais (Fernandes et al., 2018Fernandes, L. M., Leme, V. B. R., Elias, L. C. S., & Soares, A. B. (2018). Preditores do desempenho escolar ao final do Ensino Fundamental: Histórico de reprovação, habilidades sociais e apoio social.Temas em Psicologia,26(1), 215-228.https://dx.doi.org/10.9788/TP2018.1-09Pt
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; Kim et al., 2011Kim, M.-J., Doh, H.-S., Hong, J. S., & Choi, M.-K. (2011). Social skills training and parent education programs for aggressive preschoolers and their parents in South Korea. Children and Youth Services Review, 33(6), 838-845. https://doi.org/10.1016/j.childyouth.2010.12.001
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; Reynolds et al., 2010Reynolds, M. R., Sander, J. B., & Irvin, M. J. (2010). Latent curve modeling of internalizing behaviors and interpersonal skills through Elementary School. School Psychology Quarterly, 25(4), 189-201. https://doi.org/10.1037/a0021543
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), seja no de professores (Kettler et al., 2011Kettler, R. J., Elliott, S. N., Davies, M., & Griffin, P. (2011). Testing a multi-stage screening system: Predicting performance on Australia’s national achievement test using teachers’ ratings of academic and social behaviors. School Psychology International, 33(1), 93-111. https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/0143034311403036
https://journals.sagepub.com/doi/10.1177...
; Pizato et al., 2014Pizato, E. C. G., Marturano, E. M., & Fontaine, A. M. G. V. (2014). Trajetórias de habilidades sociais e problemas de comportamento no Ensino Fundamental: Influência da Educação Infantil. Psicologia: Reflexão e Crítica, 27(1), 189-197. https://doi.org/10.1590/S0102-79722014000100021
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). Desse modo, era de se esperar mais queixas de problemas de comportamento e menos repertório de habilidades sociais, o que foi corroborado na presente investigação. Com base no que foi constatado neste estudo, pode-se hipotetizar que o uso de HSE e de práticas negativas ocorreu de modo contingente aos comportamentos problema e habilidosos das crianças (Assis-Fernandes & Bolsoni-Silva, 2020Assis-Fernandes, R. P., & Bolsoni-Silva, A. T. (2020). Educational social skills and repertoire of children differentiated by behavior and sex.Paidéia (Ribeirão Preto),30, e3015. https://doi.org/10.1590/1982-4327e3015
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).

Nessa direção, verificou-se que as HSE-afeto das mães, as HSE-limites do professor e as HSE-comunicação diversa dos professores são bons indicadores de recursos, uma vez que se sabe que o afeto pais-filhos (Bolsoni-Silva et al., 2016Bolsoni-Silva, A. T., Loureiro, S. R., & Marturano, E. M. (2016). Roteiro de entrevista de habilidades sociais educativas parentais (RE-HSE-P). Manual Técnico. Hogrefe/CETEPP.; Borden et al., 2014Borden, L. A., Herman, K. C., Stormont, M., Goel, N., Darney, D., Reinke, W. M., & Webster-Stratton, C. (2014). Latent profile analysis of observed parenting behaviors in a clinic sample. Journal of Abnormal Child Psychology, 42(5), 731-742. https://doi.org/10.1007/s10802-013-9815-z
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) e o grau de proximidade na interação professor-aluno diminui a chance de comportamentos externalizantes (Bolsoni-Silva & Mariano, 2018Bolsoni-Silva, A. T., & Mariano, M. (2018). Comportamentos de professores e alunos: Descrições e comparações.Arquivos Brasileiros de Psicologia,70(3), 80-97. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672018000300007&lng=pt&tlng=pt.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
; O’Connor et al., 2011O’Connor, E. E., Dearing, E., & Collins, B. A. (2011). Teacher-child relationship and behavior problem trajectories in Elementary School. American Educational Research Journal, 48(1), 120-162. https://doi.org/10.3102/0002831210365008
https://doi.org/10.3102/0002831210365008...
; Ribeiro, 2010Ribeiro, M. L. (2010). A afetividade na relação educativa.Estudos de Psicologia (Campinas), 27(3), 403-412. https://doi.org/10.1590/S0103-166X2010000300012
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), bem como o estabelecimento de regras (Bolsoni-Silva & Loureiro, 2019Bolsoni-Silva, A. T., & Loureiro, S. R. (2019). Práticas parentais: Conjugalidade, depressão materna, comportamento das crianças e variáveis demográficas.Psico-USF,24(1), 69-83.https://doi.org/10.1590/1413-82712019240106
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) e o manejo positivo (Bolsoni-Silva & Mariano, 2018Bolsoni-Silva, A. T., & Mariano, M. (2018). Comportamentos de professores e alunos: Descrições e comparações.Arquivos Brasileiros de Psicologia,70(3), 80-97. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-52672018000300007&lng=pt&tlng=pt.
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?scr...
). No entanto, como se está discutindo acerca de crianças com problemas de comportamento, pode-se pensar que a qualidade da comunicação diversa que inclua assuntos de interesse da criança e assuntos acadêmicos (Bolsoni-Silva et al., 2018Bolsoni-Silva, A. T., Marturano, E. M., & Loureiro, S. R. (2018). Roteiro de Entrevista de Habilidades Sociais Educativas para Professores (RE-HSE-Pr). Manual Técnico. Hogrefe/CETEPP. ; Mariano & Bolsoni-Silva, 2018Mariano, M., & Bolsoni-Silva, A. T. (2018). Social interactions between teachers and students: A study addressing associations and predictions.Paidéia (Ribeirão Preto),28, e2816. https://doi.org/10.1590/1982-4327e2816
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), menor uso de afeto pelos professores e excesso no uso de práticas negativas (Santiago et al., 2016Santiago, R. T., Garbacz, S. A., Beattie, T., & Moore, C. L. (2016). Parent-teacher relationships in Elementary School: An examination of parent-teacher trust. Psychology in the Schools, 53(10), 1003-1017. https://doi.org/10.1002/pits.21971
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) pode estar favorecendo a manutenção dos problemas de comportamento tanto na escola quanto no ambiente familiar.

Destaca-se como relevante o uso de dois instrumentos para avaliar habilidades sociais infantis, sendo um de relato espontâneo na forma de entrevista e outro dirigido (escala tipo likert), pois os instrumentos identificaram diferenças no relato de mães e professores, como já verificado por Bolsoni-Silva e Loureiro (2019Bolsoni-Silva, A. T., & Loureiro, S. R. (2019). Práticas parentais: Conjugalidade, depressão materna, comportamento das crianças e variáveis demográficas.Psico-USF,24(1), 69-83.https://doi.org/10.1590/1413-82712019240106
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). O relato espontâneo sugere maior discriminação e com maior chance de os adultos identificarem e consequenciarem os comportamentos das crianças, o que ocorreu mais no relato das mães. O uso da escala, por outro lado, favoreceu ao respondente a avaliação de uma gama maior de comportamentos. Desse modo, o uso combinado dos dois instrumentos mostrou-se útil.

Com os achados da presente pesquisa, pode-se afirmar que o comportamento da criança, habilidoso ou não, recebe influência de ambos ambientes familiar e escolar e, portanto, intervenções em cada um desses contextos tornam-se úteis e necessárias.

Considerações finais

Esta pesquisa identificou semelhanças e diferenças entre os relatos de mães e professores quanto às suas práticas educativas e os comportamentos das crianças. Nas comparações entre avaliadores, verificou-se que as mães relataram ser mais habilidosas de maneira geral e especialmente quanto ao afeto, enquanto que os professores referiram ser mais hábeis que as mães no uso de HSE para estabelecer limites no grupo com problemas nos dois ambientes. Por outro lado, as mães, mais que os professores, relataram usar de práticas negativas para educar as crianças; as mães queixavam-se mais de problemas de comportamento no grupo não clínico e os professores no grupo com problemas em ambos ambientes; ainda, as mães identificaram mais habilidades sociais nas crianças com problemas exclusivamente na família e os professores naquelas não clínicas.

Como pontos fortes deste estudo, tem-se: a comparação dos grupos considerando a ocorrência de problemas em ambos ambientes (familiar e escolar) ou em exclusivamente um deles; a manutenção na amostra exclusivamente mães biológicas e provenientes de famílias biparentais também foi importante, pois controlou variáveis de confundimento quanto às práticas educativas; e ao utilizar dados de diferentes informantes sobre os próprios comportamentos e os comportamentos das crianças ampliou a compreensão sobre as questões investigadas. Como limitações, é preciso indicar a amostra reduzida, bem como a diferença perfis de problemas para as crianças com dificuldades exclusivamente na família ou exclusivamente na escola. Tais limitações poderão ser consideradas em futuros estudos, além de incluir os pais como informantes e contar não só com dados de relato, incluindo métodos de observação.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Out 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    12 Jun 2018
  • Aceito
    01 Set 2020
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