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Os ‘estudos da tradução’ como área de pesquisa independente: dilemas e ilusões de uma disciplina em (des)construção

‘Translation studies’ as an independent area of research: dilemmas and illusions of a discipline in (de)construction

Resumos

A partir da década de 1960, a reflexão sobre tradução começou a conquistar espaços mais definidos dentro das instituições e publicações acadêmicas. Desde então, as tentativas explícitas de ampliar e consolidar esses espaços, de caráter basicamente essencialista, têm declarado seu interesse em tornar essa reflexão o mais racional e sistemática possível, o que não apenas a legitimaria enquanto área de pesquisa, mas também como instrumento legislador de toda a prática de tradução, quaisquer que sejam as línguas, os objetivos e as circunstâncias envolvidas. O presente trabalho se propõe apresentar um perfil crítico das principais tentativas de ocupação dos territórios acadêmicos reivindicados em nome dos "estudos da tradução", mostrando que o que as têm motivado, sobretudo, é um certo impulso imperialista em que o que está realmente em jogo é o prestígio e o poder das tendências em nome das quais se pretende disciplinar a tarefa do tradutor.

Estudos da Tradução como Disciplina Autônoma; Abordagens Lingüísticas à Tradução; Abordagens Essencialistas à Tradução; Pós-modernidade


Since the early 1960’s, the study of translation has begun to conquer a more defined space within academic institutions and publications. Since then, all the basically essentialist attempts at widening and consolidating such a space have declared their interest in making that study as rational and as systematic as possible, so that it would be recognized as a legitimate research area which should also legislate over all translation practices, no matter which languages, goals or circumstances were involved. This paper intends to present a critical account of the main attempts at occupying the academic terrain claimed by "translation studies," arguing that what has motivated them, above all, is a certain imperialistic thrust in which what is actually at stake is the prestige and the power of the trends in the name of which they intend to discipline the translator’s task.

Translation Studies as an Independent Discipline; Linguistic Approaches to Translation; Essentialist Approaches to Translation; Postmodernity


RETROSPECTIVA/OVERVIEW

Os ‘estudos da tradução’ como área de pesquisa independente: dilemas e ilusões de uma disciplina em (des)construção

(‘Translation studies’ as an independent area of research: dilemmas and illusions of a discipline in (de)construction)

Rosemary ARROJO (Universidade de Campinas/CNPq)

ABSTRACT: Since the earl y 1960’s, the study of translation has begun to conquer a more defined space within academic institutions and publications. Since then, all the basically essentialist attempts at widening and consolidating such a space have declared their interest in making that study as rational and as systematic as possible, so that it would be recognized as a legitimate research area which should also legislate over all translation practices, no matter which languages, goals or circumstances were involved. This paper intends to present a critical account of the main attempts at occupying the academic terrain claimed by "translation studies," arguing that what has motivated them, above all, is a certain imperialistic thrust in which what is actually at stake is the prestige and the power of the trends in the name of which they intend to discipline the translator’s task.

RESUMO: A partir da década de 1960, a reflexão sobre tradução começou a conquistar espaços mais definidos dentro das instituições e publicações acadêmicas. Desde então, as tentativas explícitas de ampliar e consolidar esses espaços, de caráter basicamente essencialista, têm declarado seu interesse em tornar essa reflexão o mais racional e sistemática possível, o que não apenas a legitimaria enquanto área de pesquisa, mas também como instrumento legislador de toda a prática de tradução, quaisquer que sejam as línguas, os objetivos e as circunstâncias envolvidas. O presente trabalho se propõe apresentar um perfil crítico das principais tentativas de ocupação dos territórios acadêmicos reivindicados em nome dos "estudos da tradução", mostrando que o que as têm motivado, sobretudo, é um certo impulso imperialista em que o que está realmente em jogo é o prestígio e o poder das tendências em nome das quais se pretende disciplinar a tarefa do tradutor.

KEY WORDS: Translation Studies as an Independent Discipline, Linguistic Approaches to Translation, Essentialist Approaches to Translation, Postmodernity.

PALAVRAS-CHAVE: Estudos da Tradução como Disciplina Autônoma, Abordagens Lingüísticas à Tradução, Abordagens Essencialistas à Tradução, Pós-modernidade.

Num dos livros mais importantes já publicados na área, George Steiner divide "a literatura sobre a teoria, a prática e a história da tradução"1 1 Esta e todas as outras traduções do inglês são minhas, a menos que cite obras traduzidas. produzida até meados de 1970 em quatro períodos que, como ele mesmo declara, não são exatamente estanques, nem absolutamente demarcados. O primeiro teria sido simbolicamente inaugurado pelo famoso princípio de Cícero de acordo com o qual não se deve traduzir "verbum pro verbo", discutido no Libellus de optimo genere oratorum, de 46 A.C., e referendado pelo apoio de Horácio a essa tese em sua Ars poetica, cerca de 20 anos mais tarde. Esse longo período — que, para Steiner, termina com os comentários "enigmáticos" de Holderlin sobre suas próprias traduções de Sófocles (1804) — teria como característica primordial um tráfico direto da prática para a reflexão, "em que análises e declarações seminais se originam diretamente da prática do tradutor" (1975: 237), incluindo, entre outros, comentários de Lutero (Sendbrief vom Dolmetschen, de 1530), du Bellay, Montaigne, Chapman, Jacques Amyot, Ben Jonson, Pope, Dryden e Rochefort. Mesmo os textos essencialmente teóricos dignos de destaque produzidos no período, como De interpretatione recta, de Leonardo Bruni, de 1420, e De optimo genere interpretandi, de Pierre Daniel Huet, publicado em Paris em 1680, têm como característica comum seu "foco imediatamente empírico" que informa, também, o conhecido Essay on the Principles of Translation, de Alexander Fraser Tytler, publicado em Londres em 1792, e o fundamental Ueber die verschiedenen Methoden des Ubersetzens (1813), de Friedrich Schleiermacher (1975: 236-237).

O segundo momento se caracterizaria por uma "indagação teórica e hermenêutica", examinada inicialmente por Schleiermacher e retomada, em seguida, por A. W. Schlegel e Humboldt, em que "a questão da natureza da tradução é abordada dentro do contexto mais geral de teorias da linguagem e da mente", assumindo um caráter "francamente filosófico", independentemente das questões mais imediatas levantadas pela prática, e em que a problemática da tarefa tradutória "passa a ter um vocabulário, um status metodológico próprio, separado das exigências e das singularidades de um determinado texto". Ao mesmo tempo, continuou, sem dúvida, "o intercâmbio entre teoria e necessidade prática", sobretudo através do trabalho de Goethe, Schopenhauer, Matthew Arnold, Paul Valéry, Ezra Pound, I.A. Richards, Benedetto Croce, Walter Benjamin e Ortega y Gasset (1975: 237).

Depois do Sous l’invocation de Saint Jérome, de Valery Larbaud, publicado em 1946, nos encontramos, segundo Steiner, "na corrente moderna", que incluiria os primeiros trabalhos sobre tradução mecânica divulgados no final dos anos 1940 e a aplicação de teorias lingüísticas e estatísticas, sobretudo por parte de especialistas e críticos russos e tchecos, herdeiros do movimento formalista. Importantes textos desse período são Word and Object, publicado por Quine em 1960, e Introdução à Teoria de Tradução, de Andrei Fedorov, originalmente publicado em russo em 1953. O período se caracteriza também pelo início de uma conscientização profissional mais pronunciada expressa na organização de associações, e pelo delineamento, ainda que incipiente, de uma área de estudos especialmente dedicada à tradução, visível, por exemplo, na publicação de revistas especializadas e de duas coletâneas de ensaios particularmente influentes no período: On Translation, organizada por Reuben A. Brower e publicada pela Harvard University Press em 1959, e The Craft and Context of Translation: A Critical Symposium, organizada por William Arrowsmith e Roger Shattuck para a University of Texas Press, em 1961. Para Steiner, as abordagens representadas nessas coletâneas — influenciadas pela lógica, pela análise contrastiva, literária, semântica e pelos estudos comparados — continuam a ser desenvolvidas na década de 1970 paralelamente a um novo interesse numa hermenêutica da tradução, despertado, sobretudo, por uma redescoberta do ensaio "A Tarefa do Tradutor", de Walter Benjamin, publicado inicialmente em 1923, cuja discussão passa a ser marcada também pela influência de Heidegger e Gadamer. Nesse quarto período, a reflexão sobre a teoria e a prática da tradução se transforma "num ponto de contacto entre disciplinas estabelecidas e emergentes, como a filologia clássica, a literatura comparada, a psicologia, a antropologia, a sociologia, a etnolingüística, a sociolingüística", entre outras, interessadas no ato tradutório e "no processo da vida entre línguas" (1975: 238).

O mapeamento da reflexão sobre tradução apresentada por Steiner nessa primeira obra de fôlego que se escreveu sobre o tema sugere que o próximo passo seria, certamente, a reivindicação e o estabelecimento de um espaço próprio e independente, reivindicação essa que, como tentarei argumentar, em geral se tem associado à possibilidade de se estabelecerem universais supostamente objetivos e implementáveis — princípios, definições, diretrizes, critérios de avaliação — para a tradução não apenas como atividade prática, mas também como reflexão teórica. O principal objetivo deste trabalho é precisamente o exame de algumas tentativas de conquista desse espaço teórico-acadêmico quase inexplorado esboçado por Steiner, bem como algumas das principais aspirações e ilusões que têm constituído os bastidores das lutas territoriais responsáveis pelos esforços de demarcar a área e de estabelecer a reflexão sobre tradução como uma disciplina reconhecida institucionalmente, em busca de uma certa autonomia. Por trás desse cenário pintado por Steiner, aparentemente antisséptico e pacífico, em que várias disciplinas e/ou tendências parecem motivadas principalmente por um interesse genuíno nos mecanismos e problemas da tradução e no "processo da vida entre línguas", é possível identificar-se uma gama de relações complexas e basicamente assimétricas não apenas entre a tradução como objeto de investigação e os interesses político-acadêmicos representados por essas tendências e disciplinas mas, também, entre concepções de teoria e prática que revelam uma ética no mínimo perversa, sempre parcial em relação à tarefa e ao suposto poder da teoria e dos teóricos.

1. A reflexão tradicional sobre tradução: relatos de dúvidas e frustrações

No prefácio a um dos livros pioneiros citados por Steiner como marco importante da "corrente moderna" iniciada no quarto momento, seus organizadores Arrowsmith e Shattuck queixam-se da dificuldade de se ter acesso a "comentários inteligentes sobre tradução" que, ou quase não existem, ou apresentam argumentos dispersos e se escondem em "cantos estranhos" (citado em Steiner 1975: 272). Em seu detalhado mapeamento das perspectivas literárias, lingüísticas e filosóficas que têm se ocupado das questões relevantes à tarefa do tradutor, William Frawley chega à conclusão de que "a teoria de tradução hoje" é um "fantasma" que não nos oferece nenhum instrumento para a sistematização da transferência de significados entre diferentes línguas e culturas. Nesse sentido, tudo o que já se escreveu na área apenas apresenta "pseudo-teorias" (1984: 159). Ao mesmo tempo, esses comentaristas e estudiosos declaram sua expectativa de que a "obra crucial e abrangente" sobre o tema seja um dia finalmente escrita. Para Louis G. Kelly, essa obra culminaria com a formulação de uma teoria abrangente que não se aplicasse apenas à prática de tradução "moderna", mas que permitisse "a harmonia essencial entre as práticas de todos os tempos e gêneros", além de fornecer "uma análise satisfatória de suas diferenças" (1979: 227).

Para esses e tantos outros teóricos e comentaristas vinculados a concepções essencialistas de linguagem e cultura,2 2 Para ilustrar a oposição essencialismo x não-essencialismo, fundamental para a argumentação que pretendo desenvolver neste trabalho, o seguinte trecho de um texto de Richard Rorty me parece útil: " Há [...] duas formas de se pensar sobre várias coisas [...] A primeira [...] pensa na verdade como uma relação vertical entre a representação e o que representa. A segunda [...] pensa na verdade em termos horizontais — como a reinterpretação culminante da reinterpretação de nossos predecessores da reinterpretação de seus predecessores [...]. É a diferença entre considerar a verdade, o bem e a beleza como objetos eternos que tentamos localizar e revelar, e considerá-los como artefatos cujo desenho fundamental temos que alterar com frequência" (1982: 92). o ideal de uma teoria universal e capaz de sistematizar e enquadrar qualquer ato tradutório é a meta suprema da pesquisa na área. Ao mesmo tempo em que estabelecem objetivos tão ambiciosos, sugerem que esses poderiam ser alcançados se houvesse algum tipo de mobilização universal de todos aqueles que se dedicam a imaginá-la. Comentários sobre a suposta falta de organização, ou de substância, dos estudos e pesquisas vinculados à tradução têm sido lugar comum na área e geralmente expressam, em diferentes graus, a velha esperança de que a formulação de uma teoria abrangente e universalmente implementável pudesse, algum dia, tornar qualquer tradução não apenas previsível e independente das circunstâncias e idiossincrasias de seu tradutor ou tradutora mas, também, objeto de avaliações isentas, revertendo, assim, a situação de alegada indigência teórica e reflexiva, geralmente associada à inevitável inadequação supostamente intrínseca à atividade tradutória. Para Theodore H. Savory, por exemplo, a ausência de diretrizes objetivas e universais para a profissão se atribui a uma certa falta de disciplina por parte dos tradutores em geral que "há tanto tempo, e com tanta freqüência, se contradizem uns aos outros", tendo nos legado apenas "um volume de pensamentos confusos" dificilmente superados, em sua pobreza e desorganização, por outras áreas do conhecimento (1968: 49-50). Louis G. Kelly lamenta o isolacionismo dos teóricos e estudiosos que se dedicam à questão. Como declara, "há, ainda, pouco entendimento entre grupos de teóricos ou tradutores, embora o diálogo de fato tenha se iniciado com as coletâneas de Brower e de Arrowsmith e Shattuck" (1979: 225). Erwin Theodor, também entre tantos outros, lamenta a falta de prestígio da atividade tradutória e a associa à falta de organização e de profissionalização dos que nela atuam. Como sugere,

Essa atividade, tão importante desde os tempos mais remotos, não gozou, entretanto, nem do prestígio e nem da popularidade que era de esperar. Existem grandes encilopédias modernas, como por exemplo a Enciclopédia Britânica, que até bem pouco tempo descrevia com precisão o ato de ferrar cavalos, mas não dedicavam mais que algumas linhas à tradução, se é que a mencionavam. A última edição do Grande Brockhaus, famosa enciclopédia alemã em catorze volumes, que reúne cerca de dez mil páginas de informações úteis acerca de todos os ramos de atividade e do saber humanos, não concede mais de meia coluna à tradução. Talvez se trate de resquícios da época em que traduzir era considerado uma atividade subalterna, exercida por diplomatas em início de carreira ou literatos frustrados que, não conseguindo publicar as suas próprias produções, contentavam-se em aparecer em páginas de rosto, como transmissores de conhecimento. (1983: 12)

Para outros, a falta de princípios e/ou diretrizes universais se associa a uma suposta "imaturidade" da área, pressupondo-se, obviamente, que a definição e o fortalecimento de uma teoria idealizada, definitiva e objetiva, livre da "precariedade" que nos assola, seria basicamente uma questão de tempo e de mobilização dos que se dedicam a estudar a tradução. Segundo Francis Aubert, por exemplo, "os estudos tradutológicos ainda não se encontram amadurecidos a tal ponto que se possa propor, de maneira consistente, uma verdadeira Teoria da Tradução, precariedade essa que torna problemática a propositura de uma definição pronta e acabada dos conceitos ‘tradução’ e ‘traduzir’" (1993: 12).

Até mesmo Steiner — que parece, de certa forma, ter como meta última produzir a obra que pudesse começar a organizar a reflexão sobre tradução — se detém em lamentar a resistente indigência dos estudos disponíveis, associando-a à "percepção da inadequação" que, implícita e explicitamente, acompanha a tarefa do tradutor, tradicionalmente vista como servil e envergonhada. Ao comentar, por exemplo, a relação que Stephen MacKenna estabelece com a obra de Plotino, Steiner chama atenção para o que vê como "obscuro" e "milagroso" na tarefa do tradutor, que lhe lembra um verdadeiro processo de metempsicose, em que o tradutor, nas palavras de MacKenna, "deve nascer" para servir a seu autor (Steiner 1975: 269). Contudo, apesar dessa dedicação superlativa que beira o servilismo, o milagre "nunca é completo" já que, por não poder haver "uma circunscrição total", toda tradução necessariamente "decepciona". Conseqüentemente, a partir da "percepção [dessa] inadequação sem fim", ou dessa "miséria",3 3 Steiner explicitamente se refere ao conhecido texto de Ortega y Gasset, " Miseria y Esplendor de la Traducción" (1945). "emerge uma certa tristeza", uma "melancolia pós-Babel"4 4 Em sua tese de doutorado, Susana K. Lages (1996) propõe uma reflexão precisamente sobre essa "melancolia" a partir da perspectiva da psicanálise, focalizando a obra de Walter Benjamin. que "assombra a história e a teoria da tradução", reduzida, depois de quase dois milênios, a um "espectro de idéias teóricas [...] muito pequeno", apesar do calibre dos poucos que "já disseram algo fundamental ou novo" sobre a questão: São Jerônimo, Lutero, Dryden, Holderlin, Novalis, Schleiermacher, Nietzsche, Ezra Pound, Valéry, MacKenna, Franz Rosenzweig, Walter Benjamin e Quine (idem). Paradoxalmente, o próprio Steiner — cuja reflexão em After Babel foi associada ao florescimento do quarto momento por ele mapeado, ao apresentar como "marca essencial" precisamente a "consolidação da teoria" (Kelly 1979: 225) — chega a se perguntar se seria a tarefa do tradutor de fato um objeto legítimo de reflexão teórica, duvidando, inclusive, da "existência" da tradução "em termos abstratos", apesar de ponderar que há um "corpo de praxis tão grande e diferenciado" que resiste, entretanto, à "inclusão em qualquer esquema unitário" (Steiner 1975: 272). Assim, para o autor,

podem-se agrupar e examinar exemplos de tradução literária desde a Odisséia de Lívio Andrônico até o presente. Pode-se investigar a história cheia de altos e baixos da tradução de termos científicos e filosóficos. Seria possível, e fascinante, organizar o que há sobre o desenvolvimento da tradução comercial, legal e diplomática, ou estudar o intérprete e suas funções na história social e econômical. [...] Mas, cada uma dessas áreas — e quase tudo ainda precisa ser feito nelas — constitui apenas uma definição contingente e ad hoc: cada uma delas circunscreve um fenômeno empírico ou um agrupamento de fenômenos. Não há categorias axiomáticas. (Steiner 1975)

O tipo de expectativa cultivada por Steiner em relação a esse "quase tudo" que "ainda precisa ser feito" se esclarece ainda mais em seu apoio à sugestão de Arrowsmith e Shattuck segundo a qual "necessitamos desesperadamente de uma elaboração paciente e persuasiva dos princípios adequados [à tradução] dos diferentes gêneros na medida em que cada um deles encontrou sua expressão histórica, além da explicitação de suas diferentes funções e suas respectivas virtudes e limitações" (citado em Steiner 1975: 273). Ao considerar "vital" que os estudiosos se empenhem para que essa meta comece a ser atingida, Steiner não apenas antevê sua possibilidade — o que exigiria, segundo ele, "grande erudição e tato lingüístico" — mas, ao considerá-la, torna transparentes suas concepções de teoria e prática, que sintetizam boa parte das aspirações e idealizações inerentes à tradição essencialista dominante. Uma ilustração exemplar do nível de expectativa alimentada por essa tradição pode ser apontada na argumentação de Steiner, de acordo com a qual mesmo se elaborássemos "os princípios adequados [à tradução] dos diferentes gêneros", ainda assim não teríamos "um estudo formal e teórico da ‘questão da tradução’", já que tal elaboração "não leva a um modelo sistemático da estrutura geral e da validade epistemológica da transferência de significados entre línguas" (1975: 273).

Em seus mais básicos alicerces, o modelo de teoria que inspira as expectativas de Steiner e de toda a tradição que sintetiza e representa é, sem dúvida, derivado das ciências chamadas exatas ou naturais e de suas promessas de racionalidade e isenção. No caso exemplar de Steiner, esse modelo se associa, mais especificamente, às ciências naturais, como deixa claro o tipo de metáfora que utiliza para descrever os estudos sobre tradução, tanto os "possíveis" quanto os "ideais". Ao considerar que os limites do tipo de estudos que se poderiam vir a desenvolver nessa área talvez sejam "aqueles determinados pelo paciente acúmulo de classes descritivas, pela coleta de sugestões práticas organizadas de acordo com o período, o local e o gênero específico", Steiner conclui que "a disciplina da tradução talvez possa ser objeto apenas de um tipo de formalização lineana, e não mendeliana"5 5 Steiner se refere a Lineu (1707-1778) e a Mendel (1822-1884). O primeiro é reconhecido como o primeiro botânico a estabelecer os princípios para a definição do gênero e da espécie dos vegetais, além de um uso uniforme dos nomes científicos. Sua obra Genera Plantarum é considerada o ponto de partida da moderna botânica sistemática. O segundo é o realizador das célebres experiências de cruzamento entre variedades de ervilhas que o levaram à descoberta das leis da herança biológica, conhecidas até hoje como "as leis de Mendel" (Enciclopédia Barsa). (idem). Ainda assim, mesmo que adotássemos essa "perspectiva modesta" e, portanto, mesmo que considerássemos o estudo da tradução como "descritivo-taxonômico", ao invés de "adequadamente teórico" — em que "teórico" significa "passível de generalização indutiva, predição e comprovação de autencidade através de contra-exemplo" — Steiner vê uma "dificuldade grave":

Na avassaladora maioria dos casos, o material a ser estudado é um produto terminado: um texto original e uma ou mais supostas traduções. Nossa análise e nosso julgamento operam externamente, acontecem depois do fato. Não sabemos quase nada sobre o processo genético que atuou na prática do tradutor, nem sobre os princípios ou recursos prescritivos, ou puramente empíricos, que controlaram sua escolha deste ou daquele equivalente, de um nível estilístico em vez de outro, da palavra "x" ao invés da "y". Não podemos dissecar, ou apenas raramente. Como foi sempre considerada trabalho de escrevinhadores banais, a grande massa de traduções não deixou registros. Não há rascunhos. (273-274)

Nesse contexto determinado por expectativas de sistematização supostamente objetiva e universalizante, é possível detectarmos a influência direta do ideal da modernidade e do iluminismo, segundo o qual "o homem [...é] um animal racional e a ciência o ápice da racionalidade" (Rorty 1991: 46). A partir desse enredo, em que a ciência se torna "a atividade humana paradigmática", as outras áreas da cultura "se reduzem a uma esperança ansiosa de que algumas delas (como, por exemplo, a filosofia) pudessem se tornar mais científicas" (idem). Para Steiner — e para os demais estudiosos da tradução ainda vinculados a esse sonho iluminista — como não há uma "ciência natural" da tradução, como não se pode dissecá-la, nem tampouco imobilizá-la em condições laboratoriais para uma análise isenta, o "equipamento teórico do tradutor tende a ser minguado e empírico". Da mesma forma, "o que o historiador ou o estudioso da tradução" pode nos fornecer é apenas "um comentário, mais ou menos informado, mais ou menos perceptivo, sobre alguma instância de tradução em particular" (1975: 273). Nesse contexto, em que o que é real e possível parece limitado e insatisfatório, Steiner conclui seu conhecido capítulo sobre teoria com uma espécie de consolo mal disfarçado em relação às imprecisões teimosas que assombram as traduções e seus estudos que, para ele, parecem se esgotar com o cotejamento, a comparação e a avaliação de traduções de textos clássicos e canônicos:

Um erro, uma tradução incorreta inicia a história moderna de nosso tópico. As línguas românicas derivam seus termos para "tradução" de traducere porque Leonardo Bruni entendeu mal uma sentença das Noctes, de Aulus Gellius, na qual o latim na verdade quer dizer "introduzir, levar a". Esse ponto é trivial mas simbólico. Com frequência, [...] uma tradução incorreta afortunada é a origem de uma nova vida. As precisões que se têm como meta são de um tipo extremo, porém não sistemático. Como mutações na evolução das espécies, atos importantes de tradução parecem ter uma necessidade fortuita. A lógica vem depois do fato. Estamos lidando não com uma ciência, mas com uma arte exata. (1975: 295)

Como sugerem as metáforas empregadas acima, em que o processo de tradução é equiparado a um ser vivo que devesse ser observado e estudado objetivamente, a relação próxima que Steiner parece estabelecer com o ideal moderno de ciência não esmorece mesmo quando afirma que o estudo da tradução não pode constituir um saber científico. Sua conclusão segundo a qual "estamos lidando não com uma ciência, mas com uma arte exata", além de sugerir sua dificuldade de abrir mão da expectativa de que algum dia se possa controlar e sistematizar a tarefa do tradutor, deixa implícita a relação que sua concepção textual costuma estabelecer entre teoria e prática, ou entre teórico e tradutor. Afinal, se estamos lidando com "uma arte exata", devemos supor, obviamente, que há formas absolutamente exatas, ou corretas, de se traduzir um texto. A quem caberá, contudo, a tarefa de definir essa exatidão? Julgando-se o discurso e as expectativas basicamente essencialistas de Steiner, parece claro que atribui esse papel definidor somente aos teóricos e comentaristas comprometidos com um ideal moderno de conhecimento e pesquisa. O que torna a proposta de Steiner diferente daquelas da maioria de seus contemporâneos, entretanto, é que não chega a defender o território acadêmico de nenhuma disciplina em particular como a única área supostamente capaz de abrigar a tradução e abordar seus "problemas" de forma adequada. Como já observei acima, Steiner parece crer na possibilidade de um esforço interdisciplinar "desinteressado" que pudesse, finalmente, transformar a tradução numa "arte exata".

2. A Tradução como Objeto de Estudo da "Ciência da Linguagem"

As velhas expectativas em torno da possibilidade de sistematização da tradução encontraram um novo alento no estabelecimento da lingüística como a "ciência da linguagem" que, implícita e explicitamente, prometia livrar os estudos da tradução de seu endêmico e indesejado "empirismo". Georges Mounin, J. C. Catford e Eugene Nida são os nomes geralmente associados às primeiras tentativas de se articular lingüística e tradução. Dos três, o trabalho de Mounin é o que mais diretamente interessa a este ensaio não apenas por ser considerado "a alvorada de uma teoria de tradução moderna", e por representar "a primeira tentativa de um autor europeu no sentido de desenvolver um arcabouço teórico para a tradução com base na lingüística" (Sager 1995: 87-88) mas, sobretudo, por sua reivindicação do direito que teria essa "ciência" de circunscrever a tradução em seus domínios. Essa dimensão política explícita registra uma diferença radical na abordagem de Mounin, em comparação àquelas propostas pela maioria dos teóricos e especialistas comentados no item anterior, o que determina, inclusive, a divisão que propõe de toda a reflexão sobre a tarefa do tradutor em dois grandes períodos. O primeiro se caracterizaria pelo que chama de um "empirismo da tradução", constituído, sobretudo, de "impressões gerais, intuições pessoais, inventários de experiências e receitas artesanais", alguns deles sob a forma de "testemunhos" de autores como Cícero, Horácio, São Jerônimo, Dante, Erasmo, Étienne Dolet, Joachim du Bellay, Amyot, Lutero, Pope, Chateaubriand, Schlegel, Schopenhauer, Humboldt, Mallarmé, Croce, entre outros (1975: 22-23). O segundo momento representaria uma suposta mudança radical inaugurada pela publicação de dois livros que "reivindicam para a tradução a condição de objeto distinto, ou de domínio distinto, de estudo científico". O primeiro deles, Introdução à Teoria da Tradução (Vvednie v teoriju perevoda), de A. F. Fédorov, publicado pela primeira vez em Moscou em 1953, "isola" a "operação" da tradução "para constituir o seu estudo científico (e promover uma ciência da tradução) [, afirmando] em primeiro lugar que se trata de uma operação lingüística, de um fenômeno linguístico, [...determinando, assim, que] toda teoria da tradução deve ser incorporada ao conjunto das disciplinas lingüísticas" (citado em Mounin 1975: 23). O segundo, Estilística Comparada do Francês e do Inglês (Stylistique comparée du français et de l’anglais), de J.P. Vinay & Darbelnet, publicado na França em 1958, propõe, como explica Mounin, "‘a inscrição normal (da tradução) no quadro da lingüística’ e pelos mesmos motivos que Fédorov: [considera] que ‘a tradução é uma disciplina exata, possuindo técnicas e problemas particulares’[, que] merecem ser estudados à luz das ‘técnicas de análise atualmente consagradas (em lingüística)’" (citado em Mounin 1975: 23-24).

Segundo essa divisão, o que determinaria a "modernidade" nos estudos da tradução seria o seu ingresso na área de atuação da lingüística estrutural e é, inclusive, a defesa apaixonada desse ingresso que se torna a meta primeira do livro de Mounin. Como declara, o seu "propósito" nada mais é do que "fundamentar o direito que tem a tradução de figurar, como problema lingüístico digno de nota, num tratado de lingüística geral" (1975: 209). Em outro trecho, explicita o "problema" que pretende abordar em seu livro: "explorar todas as teorias lingüísticas modernas a fim de verificar se, destruindo por completo a confiança em nossa aptidão para lidar inteligentemente com o sentido dos enunciados lingüísticos, elas atingem a legitimidade da tradução" (1975: 43). Assim, basicamente, o que parece mais importante para Mounin nessa tentativa de estabelecer uma interface entre tradução e lingüística é a garantia e a expansão do poder acadêmico-institucional da disciplina estabelecida que defende e, não, exatamente, uma investigação isenta dos mecanismos e dos "problemas teóricos" da tradução. Ao rebater, por exemplo, as críticas do tradutor Edmond Cary às pretensões de Fedorov em relação às possíveis contribuições da "ciência da linguagem" para a tradução, Mounin não apenas identifica linguagem e lingüística, assumindo que todo processo lingüístico seja automaticamente objeto de estudo exclusivo dessa "ciência", mas também atribui ao lingüista o poder e o direito de decidir até mesmo sobre "a legimitimade ou ilegitimidade da operação de traduzir":

A tradução (sobretudo nas áreas do teatro, do cinema, da interpretação) comporta sem dúvida aspectos francamente não-lingüísticos, extra-lingüísticos. Mas toda operação de tradução — tem razão Fédorov — comporta, basicamente, uma série de análises e de operações especificamente dependentes da lingüística e susceptíveis de serem mais e melhor esclarecidos pela ciência lingüística aplicada corretamente do que por qualquer empirismo artesanal. Poderemos dizer, se fizermos questão disto, que, tal como a medicina, a tradução é ainda uma arte — mas uma arte alicerçada numa ciência. Os problemas teóricos suscitados pela legitimidade ou ilegitimidade da operação de traduzir, e por sua possibilidade ou impossibilidade, só podem ser esclarecidos em primeiro lugar no quadro da ciência lingüística

. (1975: 26-27).

A discussão proposta por Mounin sempre explicita suas prioridades. Como já comentei em trabalhos anteriores (cf. Arrojo 1990, 1997 e 1998), se considerarmos a oposição tradicionalmente estabelecida entre teoria e prática, jamais ocorre a Mounin reavaliar o poder que teria a teoria sobre a prática ou, mais especificamente, a "superioridade" da lingüística em relação à prática de tradução, mesmo depois de reconhecer que a primeira carece de recursos que expliquem adequadamente os mecanismos da segunda. Em seu capítulo introdutório, por exemplo, declara:

A atividade de tradução suscita um problema teórico para a lingüística contemporânea: se aceitarmos as teses correntes a respeito da estrutura dos léxicos, das morfologias e das sintaxes, seremos levados a afirmar que a tradução deveria ser impossível. Entretanto, os tradutores existem, eles produzem, recorremos com proveito às suas produções. Seria quase possível dizer que a existência da tradução constitui o escândalo da lingüística contemporânea. (1975: 19, meu grifo)

Paradoxalmente, a "ciência da linguagem" — cuja meta seria o exame e a explicação de todos os eventos lingüísticos — permite descrições desses eventos que, quando levadas às últimas conseqüências, teriam que negar certos aspectos inegáveis de seu próprio objeto, ou, nesse caso, a própria possibilidade da tradução, uma atividade que, como concede Mounin, realmente "existe". Essa negação é, então, explicitada pelo autor que, depois de reconhecer que "a tradução tem estado até agora sempre ausente da ciência lingüística registrada em nossos grandes tratados de lingüística" (1975: 20), propõe duas alternativas para a resolução do impasse entre teoria (lingüística) e prática (tradução): a condenação da possibilidade teórica da tradução em nome da lingüística, relegando essa atividade para "a zona das operações aproximativas não científicas em questão de linguagem" (idem); ou o questionamento da "validade das teorias lingüísticas em nome da atividade de tradução" (idem). Embora Mounin descarte essas alternativas e adote uma terceira, cujo desenvolvimento constitui a meta principal de seu livro, não deixa de ser significativo o fato de que a primeira alternativa que lhe ocorre é a proteção da lingüística contra seu próprio objeto de estudo. Como já comentei acima, essa terceira alternativa se resume basicamente na tentativa de "fundamentar o direito" que teria a tradução "de figurar, como problema lingüístico digno de nota, num tratado de lingüística geral", inclusive para "contrariar certos tradutores" que não acreditam numa ciência da tradução, reafirmando, conseqüentemente, "o direito que tem a lingüística de encarar a tradução como um problema de sua alçada" (1975: 209).6 6 Como já foi sugerido, Mounin sempre explicita sua "solução" para o conflito latente entre teoria e prática, ou entre as visões do lingüista e do tradutor, inerente às abordagens baseadas na lingüística. Como declara, a "candidatura da tradução a figurar num tratado de lingüística geral [...] foi contestada desde o início, e não pelos lingüistas mas sim pelos tradutores. Encarando a tradução sobretudo como arte, negam eles que ela deva ser definida como uma operação que depende estritamente do conhecimento científico e especificamente da análise lingüística" (1975: 24).

Entretanto, no final de Os Problemas Teóricos da Tradução, em vez de uma teoria lingüística da tradução — teoria essa pela qual, segundo Sager, "ainda estamos esperando" (1995: 91) — o que encontramos é a principal conclusão de Mounin, de acordo com a qual

Em lugar de afirmar, como faziam os antigos práticos da tradução, que esta é sempre possível, ou sempre impossível, sempre total, ou sempre incompleta, a lingüística contemporânea chega a definir a tradução como uma operação, de sucesso relativo, e variável nos níveis de comunicação por ela atingidos. [...] A tradução sempre pode ter início, pelas situações mais claras, pelas mensagens mais concretas, pelos universais mais elementares. Tratando-se porém de uma língua considerada em conjunto — inclusive as mensagens mais subjetivas — através da investigação de situações comuns e da multiplicação dos contatos susceptíveis de trazer esclarecimentos, a comunicação pela tradução sem dúvida alguma nunca chega a estar verdadeiramente concluída, o que significa, ao mesmo tempo, que ela nunca chega a ser inexoravelmente impossível. (1975: 252)

O que Mounin nos oferece como conclusão, em seu livro tão explicitamente ambicioso, é apenas a repetição dos mesmos lugares-comuns que pretende superar através da utilização do instrumental supostamente científico da lingüística. Embora não nos ofereça as soluções pretendidas aos "problemas teóricos" que associa à tarefa do tradutor, Mounin, num gesto típico dos especialistas que defendem concepções essencialistas de saber e de ciência, projeta para um futuro distante o final feliz que não pôde nos oferecer no livro em questão. Ao comentar, por exemplo, as implicações para a tarefa do tradutor da afirmação de Bloomfield segundo a qual "é cientificamente impossível captar o sentido dos enunciados lingüísticos, o que equivaleria [...] a postular ‘nada mais nada menos que a onisciência’", já que "o estudo das situações dos falantes e dos comportamentos-respostas dos ouvintes equivale à soma total dos conhecimentos humanos" (Bloomfield 1955: 74; citado em Mounin 1975: 37), Mounin não se deixa intimidar. Por um lado, percebe que "a teoria bloomfieldiana com relação ao sentido implicaria por conseguinte uma negação da legitimidade teórica ou então da possibilidade prática de qualquer tradução" pois se "o sentido de um enunciado permanece inacessível, nunca se poderia ter certeza de haver transportado esse sentido de uma língua para outra" (1975: 38). Por outro, declara sua esperança e sua expectativa de que o "avanço" científico possa mudar esse quadro:

Mas essa definição do sentido, aos olhos do próprio Bloomfield, exprime um procedimento ideal, um absoluto de que nos aproximaremos muito gradativamente graças à marcha da humanidade em direção a um maior conhecimento, através de séculos e séculos. É no momento atual, por razões metodológicas e provisórias, que se revela impossível captar o sentido, cientificamente falando; por conseguinte, é no momento atual que a tradução é impossível, no sentido científico.(Mounin, 1975)

O interesse em se chegar a uma abordagem científica à tradução não se esgotou, de forma alguma, com o trabalho de Mounin, nem com a década de 1960 que, sem dúvida, testemunhou um verdadeiro boom das teorias da linguagem de vocação supostamente científica. Além de Mounin, e além das tentativas por parte de lingüistas ingleses e americanos como J. C. Catford (1965), que baseou sua abordagem no conceito de gramática sistêmica de M. A. K. Halliday; e Eugene A. Nida (1964; Nida e Taber 1969),7 7 Para uma análise atualizada da obra de Catford e Nida, ver Rodrigues 1998. que tentou aliar sua experiência com traduções da Bíblia a conceitos da gramática transformacional, pode-se mencionar também a "tradutologia" de ascendência alem㠗 a Ubersetzungswissenschaft — desenvolvida a partir de meados de 1960 pela chamada Escola de Leipzig (representada por Otto Kade, Gert Jager and Albrecht Neubert, entre outros), e por especialistas como Wolfram Wilss, Katharina Reiss e Werner Koller sobretudo durante a década seguinte (cf. Snell-Hornby 1988: 14). Como observa Mary Snell-Hornby, "da mesma forma que a lingüística tem como meta tornar o estudo da linguagem estritamente científico, a Ubersetzungswissenschaft tem como meta tornar o estudo da tradução rigorosamente científico e inequívoco", o que implica, naturalmente, uma rejeição das chamadas teorias de tradução tradicionais, consideradas "subjetivas", e até mesmo "ingênuas" (idem). Como a lingüística, a Ubersetzungswissenschaft "adotava perspectivas e métodos das ciências exatas, em particular da matemática e da lógica formal" (idem). Nesse sentido, é exemplar o trabalho de Wolfram Wills, ao propor a formulação de uma "teoria da tradução moderna" que deveria ser uma tentativa "de decompor em fatores o ato tradutório e determinar as relações entre as constantes individuais do processo tradutório de forma tão explícita quanto possível [, e quaisquer que sejam as duas línguas envolvidas]" (1982: 14). Obviamente, nenhuma dessas abordagens conseguiu chegar nem mesmo perto de suas ambiciosas metas e, como muito bem observa Snell-Hornby, levaram apenas a "um beco sem saída" (1988: 14).

Esse "beco sem saída", entretanto, não desencorajou outras tentativas. No início da década de 1980, por exemplo, Joseph Graham novamente repete os passos de seus antecessores, particularmente daqueles interessados na gramática transformacional chomskiana. Antes de apresentar sua proposta, como é de praxe, desvaloriza os estudos "não-científicos", baseados exclusivamente na experiência e na prática:

Muito do que se tem escrito sobre tradução fornece muito pouco quando se procede a uma análise minuciosa de sua substância teórica porque sempre se escreveu como se se estivesse falando da oficina. As histórias pessoais e os conselhos podem muito bem proporcionar alguma ajuda, mas, certamente, não a teoria coerente e consistente de que se necessita para a tradução. (1981: 23).

Considerando que "o problema da tradução é teórico, estritamente falando, sendo um problema de e em teoria: não simplesmente a teoria certa, mas o tipo certo de teoria, que é realmente o único tipo verdadeiro", Graham procura uma abordagem que não se baseie em nenhum tipo de "empirismo ou pragmatismo" (idem). Influenciado pela "revolução" instaurada nos estudos da linguagem pela gramática transformacional, Graham propõe o desenvolvimento de "uma teoria de tradução rigorosa" que "incluiria algo como um procedimento prático de avaliação, com critérios necessariamente específicos, embora gerais" (1981: 26). A "novidade" dessa teoria seria a proposta de uma distinção "entre uma arte e uma ciência da tradução" inspirada pela distinção saussuriana entre langue e parole e, sobretudo, pela oposição de Chomsky entre competência e desempenho, que dissolveria "a maior parte da confusão sobre a natureza e a função de uma teoria de tradução". Através de "um uso regular da distinção entre competência e desempenho", a velha "oposição entre arte e ciência em tradução" seria simplesmente "resolvida" de uma vez por todas: "teoria científica e prática artística estariam intimamente relacionadas, apesar de certamente independentes — assim como a lingüística e o discurso real ou, mais adequadamente, como a retórica e a persuasão, a poética e os poemas" (1981: 27).

Num gesto semelhante ao de Mounin, que, como vimos, chega a sugerir "a condenação da possibilidade teórica da tradução em nome da lingüística" (1975: 20), Graham pretende resolver os problemas da teoria longe de "qualquer tipo de empirismo ou pragmatismo" (1981: 23), mas dentro de um modelo chomskiano que, propõe, ao mesmo tempo, uma alienação explícita (e impossível) da prática e uma conveniente intimidade com esta. Contudo, em vez de resolver a onipresente "oposição entre arte e ciência em tradução" (1981: 27), Graham simplesmente enfatiza os seus contornos, deixando inequívoca sua opção pela valorização da teoria (e, obviamente, da lingüística) em detrimento da prática.

As abordagens aos "problemas teóricos da tradução" vinculadas a concepções essencialistas de linguagem — entre as quais incluiria, sem exceção, todas as propostas comentadas até aqui — sempre articulam algum tipo de oposição clara e demarcada entre teoria e prática, ou entre uma "ciência" e uma "arte" da tradução, optando por alguma versão da primeira como o elemento legislador ao qual se deve submeter a segunda. Enquanto essa tendência é bastante clara nos teóricos influenciados pela lingüística, como Mounin, Graham e Wills, também permeia os comentários de especialistas filiados a outros interesses e disciplinas. Um exemplo apropriado é, sem dúvida, Steiner que, ao defender o estudo da tradução como uma "arte exata", demonstra entreter expectativas semelhantes às dos seus colegas comprometidos com a lingüística.

3. Tentativas pioneiras para o estabelecimento de uma disciplina independente: Holmes, Lefevere e Bassnett

Alguns anos antes da publicação de After Babel, James Holmes começa a tentar mapear os limites e as especificidades da tradução como objeto de estudo de uma disciplina idealmente autônoma. Em primeiro lugar, é importante notar que essa tentativa de emancipação diferencia sua proposta das comentadas acima, marcando, pela primeira vez, um movimento político-acadêmico que, potencialmente, poderia criar um espaço privilegiado para o desenvolvimento de uma reflexão sobre a teoria e a prática da tradução. Entretanto, ao justificar o estabelecimento dessa "nova" disciplina, a partir do que considera o fracasso de toda uma tradição que não apenas deixou de prestar a devida atenção à tarefa do tradutor mas que, sempre que o fêz, não obteve resultados exatamente satisfatórios, Holmes parece repetir a grande maioria de seus predecessores e contemporâneos em sua expectativa de que se pudesse, de alguma forma, organizar e unificar o que se pensa e prescreve em relação à tradução. Como declara num ensaio pioneiro, as teorias de tradução até então propostas pelas disciplinas institucionalizadas

não são, na realidade, teorias, em nenhum sentido acadêmico do termo, mas um amontoado de axiomas, postulados e hipóteses que são formulados de forma a ser, ao mesmo tempo, abrangentes demais (cobrindo também atos não-tradutórios e não-traduções) e excludentes demais (deixando de fora alguns atos tradutológicos e algumas obras geralmente reconhecidas como traduções). (1972/75) (1988: 73)8 8 " The Name and Nature of Translation Studies", ensaio em questão, foi inicialmente publicado em 1975, a partir de uma versão anterior apresentada durante o Third International Congress of Applied Linguistics, realizado em Copenhage, entre 21 e 26 de agosto de 1972.

Como essas teorias são, na realidade, "pouco mais do que uma introdução" à teoria de tradução geral e definitiva que as disciplinas institucionalizadas não conseguiram formular, o estabelecimento dos "estudos da tradução" como disciplina autônoma passa a se justificar como o espaço em que se deverão determinar, finalmente, as bases, as metas e os limites desse conhecimento ideal de que parecem sentir falta tanto tradutores como especialistas em tradução. Além do mais, como não deixa de lembrar Holmes, o momento seria estrategicamente oportuno para a conquista e a organização de um espaço próprio. Afinal,

depois de séculos de atenção casual e irregular [prestada à tradução] por parte de uma variedade de autores, filólogos e especialistas em literatura, além de um ou outro teólogo ou lingüista idiossincrático, o tema da tradução passou a ser alvo de um interesse cada vez maior e constante por parte de especialistas nos últimos anos, tendo a Segunda Guerra Mundial como um tipo de turning point. (1988: 67-68).

Para Holmes, o estabelecimento de uma disciplina especialmente dedicada à tradução se liga diretamente à necessidade de se desenvolver um paradigma que demonstre sua eficiência naquilo que as disciplinas institucionalizadas "falharam". Aliás, é com base na expectativa desse desenvolvimento que Holmes planeja tornar legítima a nova disciplina perante os especialistas e as instituições acadêmicas, baseando-se, como os defensores de abordagens inspiradas pela lingüística, em modelos calcados nas ciências. A partir da definição de "ciência" de Michael Mulkay, segundo o qual esta "tende a se desenvolver através da descoberta de novas áreas de ignorância" (1969: 136), Holmes argumenta que tal "descoberta" geralmente traz como conseqüência "um influxo de pesquisadores de áreas adjacentes que trazem com eles os paradigmas e os modelos que se mostraram frutíferos em suas áreas" (1988: 67). A aplicação desses "paradigmas e modelos" ao "novo problema" provoca, basicamente, dois tipos de situação: em algumas, "o problema mostra ser submisso à explicitação, à análise, à explicação e, pelo menos, a uma solução parcial dentro dos limites de um dos paradigmas ou modelos e, nesse caso, esse paradigma ou modelo acaba se tornando um ramo legítimo de uma área de estudo estabelecida" (Holmes, 1988). Em outros casos, entretanto, como na questão exemplar dos estudos sobre tradução, "os paradigmas ou modelos não conseguem produzir resultados suficientes e os pesquisadores se conscientizam de que novos métodos são necessários para a abordagem ao problema em questão" (Homes, 1988).

Antes de se deter nas questões delicadas de nomear a nova disciplina e de determinar seus limites com base no "segundo tipo de situação" acima exposto, Holmes prevê as objeções de alguns especialistas e, em particular, dos lingüistas, ao estabelecimento de uma disciplina exclusivamente dedicada à reflexão sobre tradução, independente das áreas já institucionalizadas. A escolha do nome, por exemplo, também revela uma tentativa de se afastar de um certo cientificismo geralmente associado à lingüística tradicional, embora, como vimos, baseie seu esboço de proposta em modelos diretamente inspirados pelas ciências, o que sugere uma concepção moderna e, claro, essencialista de disciplina, pressupondo como condição primeira para seu estabelecimento a necessidade de um delineamento absolutamente racional de seu objeto de estudo e, conseqüentemente, também a necessidade de consenso unânime entre os pesquisadores que a ele se dedicam. Depois de considerar várias denominações, entre as quais "translatology" (inspirado pelo francês traductologie), "translation theory", e até mesmo "science of translation" ou "translation science" (inspirado pelo alemão Ubersetzungswissenschaft), Holmes finalmente opta por "translation studies", argumentando que o termo "studies" é geralmente adotado pelas disciplinas que, "dentro da velha distinção vigente nas universidades [anglo-americanas, presume-se,] tendem a se classificar entre as humanidades ou as artes, e não entre as ciências", como, por exemplo, "Russian studies", "American studies", "Commonwealth studies", "population studies", "communication studies", etc. (1988: 70). Por trás dessa escolha e dessa justificativa, que, sem dúvida, tentam circunscrever um espaço autônomo para a tradução que seja independente sobretudo da lingüística, também é possível apontar alguma semelhança com a argumentação de Steiner ao propor que o estudo da tradução não deve se constituir numa "ciência", mas numa "arte exata" (1975: 295). Ou seja, como Steiner, Holmes parece entreter o ideal de ciência "exata", ou "natural", mas, por não conseguir encaixar a reflexão sobre tradução nesses modelos, tenta nos oferecer um substituto que, entretanto, deverá se aproximar o máximo possível do ideal vislumbrado.

Além disso, a criação dessa nova disciplina teria que enfrentar um desafio muito maior do que chegar a um acordo em relação ao seu próprio nome, ou seja, definir consensualmente sua especificidade:

O que constitui o campo dos estudos da tradução? Poucos diriam que coincide com estudos terminológicos ou lexicográficos comparativos (ou contrastivos); vários o consideram como praticamente idêntico à lingüística comparativa ou contrastiva; muitos o considerariam, em grande parte, sinônimo de teoria de tradução. (1988: 71)

Sua proposta de "delineamento" da nova área se baseia, em termos gerais, num texto de Werner Koller, para quem "os estudos da tradução devem ser compreendidos como uma designação coletiva e abrangente para todas as atividades de pesquisa que tomam o fenômeno do traduzir e da tradução como sua base ou seu foco" (1971: 4; minha tradução da versão inglesa de Holmes 1988: 71). A partir dessa fundamentação ampla, Holmes conclui que esses estudos, na concepção de Carl G. Hempel, teriam dois objetivos principais: "descrever determinados fenômenos do mundo de nossa experiência e estabelecer princípios gerais através dos quais esses fenômenos poderiam ser explicados e previstos" (Hempel 1967: 1; citado em Holmes 1988: 71). Mais especificamente, enquanto "área de pesquisa pura", os estudos da tradução teriam como metas: "descrever os fenômenos do traduzir e das traduções na medida em que se manifestam no mundo da experiência, e estabelecer princípios gerais por meio dos quais esses fenômenos poderão ser explicados e previstos" (Holmes 1988: 71). Com o objetivo de atingir essas metas, propõe que "os estudos da tradução" sejam divididos em três ramos distintos, dedicados à "descrição", à "teoria" e à "aplicação", articulados numa "relação dialética", em que "cada um dos três ramos fornece material para os outros dois, ao mesmo tempo em que utiliza as descobertas que deles recebe" (Homes, 1988).

Embora declare ter partido da proposta geral de Koller segundo a qual os estudos da tradução "devem ser compreendidos como uma designação coletiva e abrangente para todas as atividades de pesquisa que tomam o fenômeno do traduzir e da tradução como sua base ou seu foco", o estabelecimento da nova disciplina delineada por Holmes passa a ter como meta uma especificidade que depende da possibilidade não apenas de se explicar e prever o trabalho de tradução, mas também de se prescreverem princípios gerais e universais. Como declara, os estudos téoricos da tradução deveriam ter como função a utilização dos "resultados dos estudos descritivos, em combinação com a informação disponível nas áreas e disciplinas afins, para o desenvolvimento de princípios, teorias, e modelos que servirão para explicar e prever o que o traduzir e as traduções são e serão" (Holmes, 1988: 73). A partir dessa perspectiva,

a meta última do teórico da tradução em seu sentido amplo deve ser, sem dúvida, o desenvolvimento de uma teoria completa e abrangente que acomodasse tantos elementos quanto necessários para explicar e prever todos os fenômenos que ocorrem dentro do terreno do traduzir e das traduções, excluindo aqueles fora dele. Quase não é necessário lembrar que uma teoria de tradução geral, nesse sentido preciso do termo, se é que será possível formulá-la, será necessariamente altamente formalizada e, por mais que o especialista possa tentar ser econômico, também altamente complexa. (Holmes, 1988)

Num ensaio publicado alguns anos mais tarde, Holmes amplia ainda mais os poderes que idealmente atribui ao "especialista que deseja descrever a relação entre o texto traduzido e seu original": "ele deve tentar determinar as características dos dois mapas do tradutor [, referentes às línguas e culturas envolvidas,] e descobrir seu sistema de regras, aquelas que indicam os desvios, a projeção e, sobretudo, a correspondência — em outras palavras, a poética do tradutor" (Holmes 1978: 77). Além disso, caberia a esse especialista "a tarefa de elaborar [um] repertório" que mapeasse toda a evolução de uma determinada literatura para que pudesse relacionar originais e suas traduções em termos de sua essência estável", tarefa essa que Holmes considera "enorme" e que lhe sugere o sistema de classificação lineano, também imaginado por Steiner como um modelo ideal para os estudos da tradução:

[...Se] os especialistas chegassem a um consenso em relação [a toda a evolução de uma determinada literatura], da mesma forma, por exemplo, que botânicos desde Lineu chegaram a um consenso em relação a métodos sistemáticos para a descrição das plantas, seria então possível, pela primeira vez, chegar a descrições de textos originais e traduzidos, de seus mapas respectivos, e das redes de correspondência, regras e hierarquias que seriam mutuamente comparáveis. E apenas com base em descrições mutuamente comparáveis podemos então produzir estudos de maior escopo bem fundamentados: estudos comparativos das traduções de um autor ou de um tradutor, ou — um passo ainda maior — envolvendo período, gênero, uma língua (ou uma cultura), ou histórias gerais de tradução. (1978: 81)

Vale a pena compararmos essas concepções de Holmes às que apresenta num texto escrito alguns anos antes, em que discute a impossibilidade da equivalência nos termos em que é tradicionalmente teorizada, concluindo que nenhuma tradução de poema será exatamente "equivalente" a seu original (1973-4: 67):

Coloque cinco tradutores para traduzir, por exemplo, um poema de imagens simples, de métrica livre e sintaxe direta, como

"Fog",

de Carl Sandberg, para o holandês. A probabilidade de que duas, entre as cinco versões, sejam idênticas é, realmente, muito pequena. Depois, peça a vinte e cinco tradutores que traduzam essas versões de volta para o inglês, cinco tradutores para cada versão. Novamente, o resultado mostrará, quase com certeza, tantas versões quanto há tradutores. Chamar isso de equivalência é perverso. (1973-4: 68; citado em Gentzler 1993: 95)

Esse interesse pela "subjetividade" ou, como diríamos hoje, pela "visibilidade" do tradutor que, como lembra Gentzler, as teorias de tradução sempre evitaram (1993: 95), é, sem dúvida, menos importante do que o desejo de fundar uma disciplina exclusivamente dedicada aos estudos da tradução, em que as noções tradicionais de "objetividade", ou "racionalidade", aliadas a expectativas de formulação de leis supostamente universais, são vistas como alicerces indispensáveis. Como os teóricos influenciados pela "ciência da linguagem", Holmes não parece considerar compatível com o estudo sistemático da tradução a inclusão do tradutor e do seu "viés".

A proposta de criação de uma disciplina independente foi prontamente encampada por André Lefevere, que resume o objetivo dessa nova "utopia disciplinar" nos seguintes termos:

O objetivo da disciplina é produzir uma teoria abrangente que possa ser usada como uma diretriz para a produção de traduções. A teoria se beneficiaria se fosse desenvolvida a partir de argumentos não inspirados pelo neopositivismo, nem pela hermenêutica. A teoria se beneficiaria se fosse elaborada num pano de fundo constituído de relatos de casos, a partir dos quais seria constantemente testada. Assim, a teoria não seria estática, mas evoluiria de acordo com o consenso dinâmico de especialistas qualificados que constituem um fórum de competição.

(1978: 234)

De acordo com Lefevere, a nova disciplina não apenas se tornaria independente das duas principais áreas onde tradicional e marginalmente se incluem as investigações sobre tradução — a lingüística, que associa ao neopositivismo, e os estudos literários, que associa à hermenêutica — mas, sobretudo, começaria a influir sobre essas mesmas áreas de cujo jugo estaria se libertando. Como declara, "não seria inconcebível" que uma teoria de tradução elaborada nos moldes acima esboçados "pudesse auxiliar na formulação de teorias lingüísticas e literárias, da mesma forma que não seria inconcebível que as traduções realizadas de acordo com as diretrizes apontadas de forma experimental pela teoria pudessem influenciar o desenvolvimento da cultura receptora" (idem). Novamente, como deixou claro Holmes, a criação de uma disciplina exclusivamente dedicada à tarefa do tradutor pressupõe que os "especialistas qualificados" detenham todo o poder decisório sobre as "diretrizes" a serem seguidas para a produção de traduções, ao mesmo tempo em que atribui somente às traduções realizadas sob essas "diretrizes" o poder de "influenciar o desenvolvimento da cultura receptora".

Seguindo os exemplos de Holmes e Lefevere, Susan Bassnett faz questão de demarcar o território dos "Estudos da Tradução" na abertura de um livro apropriadamente intitulado Translation Studies, lembrando que esse termo "pode talvez surpreender aqueles que sempre consideraram que tal disciplina já existia, tendo em vista o uso disseminado do termo ‘tradução’, particularmente no processo de aprendizagem de línguas estrangeiras", e anuncia seu objetivo de "tentar esboçar o escopo dessa disciplina" e de "demonstrar que os estudos da tradução constituem, sem dúvida, uma disciplina independente, e não, meramente, uma subárea menor dos estudos de literatura comparada, nem uma área específica da lingüística, mas um campo vastamente complexo com muitas ramificações de grande alcance" (1980: 1). Ao tentar estabelecer os estudos da tradução como disciplina autônoma, Bassnett associa essa reivindicação de independência a um suposto direito exclusivo que teria essa nova disciplina de legislar sobre os tradutores e seu trabalho: "se houver critérios a serem estabelecidos para a avaliação de uma tradução, esses critérios serão estabelecidos no interior da disciplina, e não fora dela" (1980: 10-11), num gesto que certamente lembra o de Georges Mounin em sua tentativa de reivindicar para a lingüística o "direito" de decidir, inclusive, sobre a própria legitimidade, ou ilegitimidade, da tarefa do tradutor (cf. Arrojo 1997a). Segundo Bassnett, contudo, o instrumental necessário para a sistematização e a disciplina dessa tarefa seria fornecido pela semiótica, com base na convicção de que "há princípios gerais regentes do processo tradutório que podem ser determinados e categorizados e, finalmente, utilizados no ciclo texto/teoria/texto, quaisquer que sejam as línguas envolvidas" (idem). Entretanto, também como os defensores de abordagens lingüísticas, diante de metas tão ambiciosas e inatingíveis, Bassnett não pode deixar de declarar que "o estudo sistemático da tradução se encontra ainda em cueiros" (1980: 1).

4. Os "Estudos da Tradução" de Base Essencialista Hoje

Se avaliarmos, ainda que de forma genérica, os resultados atingidos nas duas últimas décadas, a partir dos termos e dos planos inicialmente propostos por Holmes, Bassnett, ou Lefevere, podemos dizer que, enquanto área independente, capaz de controlar toda a prática, gerando regras, leis, princípios ou definições universalmente aceitáveis e implementáveis, a disciplina idealizada por esses e outros especialistas nunca deixou os "cueiros". Aliás, nesses termos, essa disciplina nunca foi — nem poderia ser — nada além de uma ilusão projetada pelas concepções textuais de seus idealizadores e defensores, ilusão essa que continua estimulando o trabalho de vários estudiosos entre os quais destaco, por exemplo, Kirsten Malmkjaer que, num texto recente, tenta esboçar uma definição de tradução, em termos absolutos, ainda seguindo os passos originalmente idealizados por Holmes (1993) (cf. Arrojo 1998). Contudo, diferentemente do que pretendiam e ainda pretendem esses estudos, nunca se chegou a esboçar nenhuma diretriz única para qualquer projeto de sistematização efetivo que pudesse servir de modelo universal e inquestionável para a pesquisa na área. Apesar das várias tentativas de tornar esta ou aquela tendência a legítima definidora desses estudos, até mesmo um exame superficial do que se vem realizando na área a partir do início desta década mostra que ainda convivem, não muito pacificamente, tendências filiadas aos quatro períodos em que George Steiner dividiu toda "a literatura sobre a teoria, a prática e a história da tradução" (1975: 237), reunidos agora sob a designação genérica de "estudos da tradução".

Nesse quadro, a grande maioria dos debates e das questões que têm ocupado a reflexão divulgada nesta década também não mudou muito desde Mounin e Steiner, e a competição por uma suposta conquista territorial "definitiva" da área — já tomada, formal e informalmente, por diversas tendências — continua estimulando o discurso dos defensores de concepções e ideais fundamentalmente essencialistas. Para ilustrar meu argumento, pretendo me deter num desses debates que têm dividido, de um lado, interessados em abordagens lingüísticas e, obviamente, na possibilidade de um paradigma objetivo e universalizante para os estudos da tradução; e, de outro, especialistas identificados com abordagens associadas aos chamados "cultural studies" ("estudos da cultura"), que têm como objeto abrangente as implicações políticas e ideológicas da "visibilidade" do tradutor e da tradutora e descrentes, portanto, da possibilidade de uma abordagem ingenuamente científica aos estudos da tradução (cf. Baker 1996, Neubert/Shreve 1994, Venuni 1996 e Malmkjaer 1993). Na visão de Mona Baker, por exemplo, os estudos da tradução

estão realmente atravessando um período de mudança radical. Infelizmente, também estão atravessando um período de fragmentação: de abordagens, escolas, metodologias. O principal conflito que atualmente ameaça reduzir o discurso sobre tradução a uma série de exercícios de apontar defeitos e divergências é aquele verificado entre um paradigma relativamente novo, ou seja, os estudos da cultura, e os modelos derivados da lingüística, bem estabelecidos mas, de forma alguma, perfeitos. (1996: 9).

Para a autora que, de forma semelhante a Mounin, ainda defende o "direito" praticamente exclusivo da lingüística contemporânea de formular abordagens à tradução, essa "ciência" teria feito progressos substanciais nos últimos anos, deixando para trás sua "ingenuidade" sobretudo no trato de questões ideológicas. Segundo afirma, "tanto a lingüística, como os estudos da tradução de orientação lingüística, conseguiram um progresso notável nos últimos anos", particularmente em sua forma de lidar com "questões ideológicas em relação à linguagem e à tradução" (Baker 1996: 15). Esse "progresso" geralmente é creditado à influência de novos desenvolvimentos associados à "análise do discurso", ou à "lingüística crítica", cujo princípio básico seria que "todo uso lingüístico codifica padrões ideológicos ou estruturas discursivas que medeiam representações do mundo na linguagem" (Fowler, in Malmkjaer 1991: 89; citado em Baker 1996: 15). Contudo, ao examinarmos mais detalhadamente algumas dessas abordagens "progressistas" à tradução, parece claro que, apesar de sua declarada aceitação das implicações da ideologia para a linguagem e para o texto, ainda não podem levar essas implicações até suas últimas conseqüências. Ao mesmo tempo em que defende o suposto avanço da lingüística crítica, que "se recusa a teorizar a linguagem e a sociedade como entidades diferentes" (1996: 15) e, portanto, ao mesmo tempo em que parece aceitar a possibilidade de uma concepção não-essencialista de significado e da relação que se pode estabelecer entre texto e sujeito, Mona Baker critica os estudos da tradução influenciados pelo paradigma dos "estudos da cultura" por seu interesse persistente em abordar aspectos políticos e ideológicos, classificando-os como "amadores", sobretudo por seu "fracasso" em desenvolver metodologia própria e por sua tendência em "rejeitar valores absolutos" (1996: 14).

Novamente, essa crítica se fundamenta num ideal racionalista de ciência, em que "profissionalismo" e "disciplina" parecem compatíveis apenas com as tentativas (sempre inevitavelmente fadadas ao fracasso) de se atingir um nível metateórico a que se pudesse submeter toda a prática de tradução, quaisquer que fossem suas circunstâncias e interesses. Contudo, o que torna suspeitas essa defesa tão veemente de "valores absolutos" e essa associação imediata entre "profissionalismo" e "ciência" é a óbvia (e inescapável) falta de isenção dos que a propõem. Nesse contexto, "profissionalismo" e "ciência" seriam privilégios da lingüística, alçada à posição de instrumento exclusivamente capaz de revelar aos tradutores os segredos da "matéria-prima" com que trabalham e de livrá-los do "amadorismo", como revela a significativa analogia que Baker propõe entre lingüística e medicina: se aceitarmos que o estudo da lingüística é "irrelevante para o trabalho do tradutor", nunca seremos considerados nada além de "curandeiros" e, "embora seja suficiente para alguns indivíduos imaginar que possam curar pessoas porque desfrutam de poderes mágicos ou de uma relação especial com Deus, o fato é que os curandeiros não são profissionais reconhecidos e os médicos o são" (1992: 3). Resumindo, um determinado tipo dominante de medicina — européia, ocidental — se torna a ciência mestra elevada à posição de modelo supostamente desinteressado e isento, em comparação ao qual todas as outras tentativas de cura são ilegítimas, ao mesmo tempo em que a lingüística seria a única "cura" profissional que pudesse livrar tradutores e especialistas de suas tentativas desprestigiadas e ineficientes de "curandeirismo" (cf. Arrojo 1998).

Um outro exemplo digno de nota pode ser encontrado em texto recente de Basil Hatim e Ian Mason que também defendem a propriedade de uma relação íntima entre tradução e ideologia, supostamente influenciados pela lingüística contemporânea "a partir de cuja perspectiva todo uso da linguagem reflete um conjunto de pressuposições dos usuários que estão intimamente ligadas às atitudes, crenças e sistemas de valores" em que se situam (1997: 144). Esses autores definem "ideologia" com base em Simpson (1993: 5) — ou seja, como "as pressuposições, as crenças e sistemas de valores tácitos que são compartilhados coletivamente pelos grupos sociais" — concepção essa que associam ao ramo da lingüística que chamam de "análise crítica do discurso" (Hatim e Mason 1997: 146). Contudo, as concepções de significado e de sujeito implícitas em seus comentários certamente sugerem que não aceitam todas as implicações da noção de ideologia que aparentam defender. Ao comentarem, por exemplo, "um dos poucos estudos de tradução já realizados do ponto de vista da análise crítica do discurso", em que Knowles e Malmkjaer (1989) analisam quatro traduções para o inglês do conto de fadas "Den Standhaftige Tinsoldat" ("O Soldadinho de Chumbo Inflexível"), de Hans Christian Andersen, Hatim e Mason observam que "diferentes traduções, em muitos pontos do texto, refletem com graus variáveis de explicitação a ideologia do universo textual de Andersen", sendo que um desses pontos se refere ao uso de repetições "do adjetivo nydelight — ‘pretty’ [em inglês], com conotações pejorativas de superficialidade, mantidas numa tradução, mas traduzido por ‘pretty’, ‘lovely’, ‘fine’, ‘charming’, ‘enchanting’ e ‘graceful’, nas outras" (1997: 147). Ao mesmo tempo, entretanto, previnem o leitor de que

a decisão de, digamos, traduzir todas as instâncias de nydelight no texto fonte pelo termo pretty na língua alvo pode refletir uma preocupação em veicular o valor ideológico implícito no uso do recurso coesivo da repetição ou, mais simplesmente, uma orientação geral tendendo para a tradução literal, no sentido de selecionar o ‘equivalente’ lexical mais próximo sempre que possível. Apenas quando uma evidência desse tipo é parte de uma tendência discernível, refletida na forma pela qual todo um espectro de características lingüísticas é tratado numa tradução em particular é que o analista pode considerar que detectou uma motivação ou orientação subjacente por parte do tradutor. Na verdade, a tendência discernível pode ser vista em termos de graus de mediação, ou seja, pela extensão da intervenção dos tradutores no processo de transferência, colocando seus próprios conhecimentos e crenças no processamento do texto. (Knowles e Malmkjaer, 1997)

O tratamento da ideologia que efetivamente propõem Hatim e Mason nesse breve excerto pressupõe que alguns "usuários da linguagem", pelo menos em determinadas circunstâncias, estejam imunes à influência das "atitudes, crenças e sistemas de valores" em que se situam. Um desses "usuários" é, sem dúvida, o "analista" de traduções para o qual Hatim e Mason pretendem estabelecer parâmetros objetivos de análise que possam indicar quando um determinado recurso ou característica textual deve ser classificado, ou não, como "uma motivação ou orientação" ideológica por parte do tradutor. Assim, o trabalho do tradutor apresenta "graus de mediação" que indicam a "extensão" de sua "intervenção" no processo de transferência de significados, ao mesmo tempo em que ao autor se atribui o uso de recursos, como a repetição de um determinado adjetivo no exemplo em questão, que têm "valor ideológico" implícito, enquanto que a tarefa do "analista", como árbitro e juiz soberano, parece se situar acima dessas "limitações". Além disso, obviamente, da mesma forma que há "usuários" imunes à ideologia, há, também, opções de tradução que podem, ou não, "refletir uma preocupação em veicular [...] valor ideológico". Se, como defendem Hatim e Mason, "todo uso da linguagem reflete um conjunto de pressuposições dos usuários que estão intimamente ligadas às atitudes, crenças e sistemas de valores", como poderiam esses mesmos autores explicar, por exemplo, uma determinada opção de tradução isenta de "valor ideológico"? A "orientação geral [,que tende] para a tradução literal", apontada pelos autores no texto em questão, não seria também (e inevitavelmente) marcada por "valores ideológicos"? De forma semelhante, como se poderia justificar a posição privilegiada que atribuem ao "analista crítico" do discurso traduzido?

xxx

Os defensores de abordagens lingüísticas à tradução, mesmo aqueles declaradamente influenciados por tendências contemporâneas que supostamente teriam superado as limitações dos estudos marcadamente cientificistas dos anos 1960 e 70, ainda não abrem mão de concepções fundamentalmente essencialistas de texto e de significado que, de uma forma ou de outra, os levam a reivindicar uma posição de autoridade privilegiada perante a prática da tradução. Ao tentarem legitimar os "estudos da tradução" como disciplina autônoma com base em ideais inatingíveis, deixam de lado todo um universo de pesquisa centrado nas implicações e nas conseqüências da visibilidade inevitável do tradutor e da tradutora, que apenas passou a ser objeto de estudos mais regulares nos últimos dez ou quinze anos com a disseminação de reflexões sobre a linguagem geralmente creditadas à pós-modernidade (cf. Arrojo 1996). Como tenho argumentado em outros textos, não parece ser uma mera coincidência o fato de que é a partir desse turning point — em que se reconhece o impacto autoral do ato tradutório e se começam a superar as noções de inferioridade e inadequação associadas à tarefa do tradutor e difundidas pelas propostas essencialistas — que toma corpo o verdadeiro boom dos estudos da tradução percebido na última década, sobretudo através da proliferação da bibliografia e das revistas especializadas, de programas de pós-graduação e de encontros acadêmicos exclusivamente dedicados à área, tanto entre nós como no exterior (cf. Arrojo 1997 e 1998). Em lugar de um incômodo "problema teórico" que precisaria ser resolvido a qualquer custo principalmente em nome dos interesses desta ou daquela disciplina, o reconhecimento da visibilidade do tradutor (e da tradutora) passa a abrir novas perspectivas e a constituir novas interfaces que não têm como metas a perseguição irredutível do mesmo e a "disciplina" da tarefa tradutória, mas o exame das conseqüências e implicações da complexa produção de significados que qualquer tradução necessariamente promove entre o doméstico e o estrangeiro, entre tradutor e autor, ou entre o "mesmo" e o outro. Entre essas interfaces, poderíamos mencionar, por exemplo, aquelas constituídas entre tradução e pós-colonialismo (cf. Rafael 1988, Niranjana 1992, Vieira 1994, Arrojo 1998a); tradução e psicanálise (cf. Silveira Jr. 1983, Bass 1985, Benjamin 1989, Arrojo 1993); tradução e gênero (cf. Chamberlain 1988, von Flotow 1991, Bassnett 1992, Arrojo 1994, Arrojo 1995, Simon 1996), que têm em comum o estudo da tradução como uma forma de transformação e apropriação do chamado "original", em que a diferença enquanto conseqüência necessária do encontro entre duas línguas e duas culturas não é reprimida, mas incansavelmente investigada. A discussão e o detalhamento do que se tem realizado nessas e em outras interfaces recentemente estabelecidas deveriam constituir o objeto de novas retrospectivas.

(Recebido em março de 1998. Aceito em junho de 1998)

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  • WILLS, Wolfram (1982) The Science of Translation Problems and Methods, Tubingen: Gunter Narr Verlag.
  • 1
    Esta e todas as outras traduções do inglês são minhas, a menos que cite obras traduzidas.
  • 2
    Para ilustrar a oposição essencialismo x não-essencialismo, fundamental para a argumentação que pretendo desenvolver neste trabalho, o seguinte trecho de um texto de Richard Rorty me parece útil: " Há [...] duas formas de se pensar sobre várias coisas [...] A primeira [...] pensa na verdade como uma relação vertical entre a representação e o que representa. A segunda [...] pensa na verdade em termos horizontais — como a reinterpretação culminante da reinterpretação de nossos predecessores da reinterpretação de seus predecessores [...]. É a diferença entre considerar a verdade, o bem e a beleza como objetos eternos que tentamos localizar e revelar, e considerá-los como artefatos cujo desenho fundamental temos que alterar com frequência" (1982: 92).
  • 3
    Steiner explicitamente se refere ao conhecido texto de Ortega y Gasset, "
    Miseria y Esplendor de la Traducción" (1945).
  • 4
    Em sua tese de doutorado, Susana K. Lages (1996) propõe uma reflexão precisamente sobre essa "melancolia" a partir da perspectiva da psicanálise, focalizando a obra de Walter Benjamin.
  • 5
    Steiner se refere a Lineu (1707-1778) e a Mendel (1822-1884). O primeiro é reconhecido como o primeiro botânico a estabelecer os princípios para a definição do gênero e da espécie dos vegetais, além de um uso uniforme dos nomes científicos. Sua obra
    Genera Plantarum é considerada o ponto de partida da moderna botânica sistemática. O segundo é o realizador das célebres experiências de cruzamento entre variedades de ervilhas que o levaram à descoberta das leis da herança biológica, conhecidas até hoje como "as leis de Mendel" (Enciclopédia Barsa).
  • 6
    Como já foi sugerido, Mounin sempre explicita sua "solução" para o conflito latente entre teoria e prática, ou entre as visões do lingüista e do tradutor, inerente às abordagens baseadas na lingüística. Como declara, a "candidatura da tradução a figurar num tratado de lingüística geral [...] foi contestada desde o início, e não pelos lingüistas mas sim pelos tradutores. Encarando a tradução sobretudo como arte, negam eles que ela deva ser definida como uma operação que depende estritamente do conhecimento científico e especificamente da análise lingüística" (1975: 24).
  • 7
    Para uma análise atualizada da obra de Catford e Nida, ver Rodrigues 1998.
  • 8
    "
    The Name and Nature of Translation Studies", ensaio em questão, foi inicialmente publicado em 1975, a partir de uma versão anterior apresentada durante o
    Third International Congress of Applied Linguistics, realizado em Copenhage, entre 21 e 26 de agosto de 1972.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Jan 2000
    • Data do Fascículo
      1998

    Histórico

    • Recebido
      Mar 1998
    • Aceito
      Jun 1998
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