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Oficina de lingüística aplicada: a natureza social e educacional dos processos de ensino/aprendizagem de línguas

MOITA LOPES, L.P. da (1996) Oficina de lingüística aplicada: a natureza social e educacional dos processos de ensino/aprendizagem de línguas. Campinas: Mercado de Letras. (Coleção Letramento, Educação e Sociedade) 192 p. (ISBN 85-85725-16-8)

Resenhado por Alice Cunha de FREITAS (Universidade Federal de Uberlândia) &

Maria Aparecida C.M.Borges da SILVA (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo/Fac.Sant’Anna)

KEY WORDS: Applied Linguistics. Language Learning and Teaching. Language Teaching Research.

PALAVRAS-CHAVE: Lingüística Aplicada. Ensino e Aprendizagem de Línguas. Pesquisa em Ensino de Línguas.

Oficina de Lingüística Aplicada, como o sub-título nos informa, discute questões relativas à natureza social e educacional dos processos de ensino-aprendizagem de línguas. Professor e pesquisador, conhecido nas universidades brasileiras não somente pelos trabalhos que desenvolve, mas também pelo seu constante engajamento com questões políticas relacionadas à Lingüística Aplicada, Luiz Paulo da Moita Lopes traz nesse livro novas contribuições para a área.

A obra tem um valor especial, visto que ainda são poucas as publicações voltadas ao mesmo tempo para professores e para estudantes de graduação e pós-graduação, nas quais são discutidos o ensino de língua inglesa nas escolas brasileiras, as pesquisas sobre a sala de aula e na sala de aula e a formação do professor.

Organizada em seis partes, a coletânea inicia-se com UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA DE LINGÜÍSTICA APLICADA. Dois artigos constam dessa seção: Afinal, o que é Lingüística Aplicada? e Lingüística Aplicada no Brasil: uma perspectiva. O autor sinaliza, logo no primeiro artigo, suas preocupações com uma questão política ao discutir os parâmetros que definem a Lingüística Aplicada e a estabelecem como uma Ciência Social, uma área de investigação e não mais (de forma simplista) como uma mera aplicação de Teorias Lingüísticas ou, nas palavras do próprio autor, como "um apêndice da Lingüística".

Ainda no mesmo artigo, Moita Lopes apresenta algumas características que estão subjacentes a grande parte das pesquisas que têm sido feitas nessa área de investigação: são de natureza aplicada, focalizam a linguagem do ponto de vista processual, são de natureza interdisciplinar e mediadora, envolvem formulação teórica, utilizam métodos de investigação de base positivista (mais na década de 80) e interpretativista.

Embora, como alerta o próprio autor, para alguns pesquisadores voltar a falar sobre esse tema possa parecer uma questão estéril, acreditamos (como ele) ser esta uma questão ainda necessária, e sempre retomada pelos professores universitários, para os iniciantes em cursos de graduação e de pós-graduação da área. Afinal, nossos alunos-professores conhecem a Lingüística, mas e a Lingüística Aplicada, como fica?

No artigo seguinte, Lingüística Aplicada no Brasil: uma perspectiva, Moita Lopes nos fornece um panorama do que tem sido feito em termos de pesquisas na área, nas universidades brasileiras, remetendo-nos aos programas de pós-graduação em Lingüística Aplicada existentes no Brasil, que até hoje são poucos. Destaca, ainda, a importância da criação, em 1990, da Associação de Lingüística Aplicada do Brasil (ALAB) para o estabelecimento da "independência" da Lingüística Aplicada como área de investigação. Marca, aqui, de forma clara, suas preocupações com questões políticas que envolvem a Lingüística Aplicada (doravante LA).

Dois outros trabalhos compõem a Parte 2: O APRENDIZ E O PROFESSOR DE LÍNGUAS NA ESCOLA PÚBLICA. Neles são levantadas questões polêmicas tais como as diferentes atitudes de alunos e professores e as ideologias preconceituosas, como "a falta de aptidão" e "o déficit lingüístico" interferindo no processo de aprendizagem de línguas. Usando um título bastante sugestivo e instigante, em Yes, nós temos bananas ou Paraíba não é Chicago não..., o autor discute a alienação e o ensino de inglês no Brasil, mais especificamente, no que se refere às atitudes de alguns professores e alunos de inglês (no Brasil) em relação às culturas de língua inglesa. "Observa-se uma atitude exageradamente positiva e de quase adoração" (p.37) pela cultura americana principalmente. Poderíamos acrescentar que as palavras do autor podem certamente ser endossadas por muitos que atuam na área de ensino/aprendizagem de línguas.

Os resultados de sua pesquisa levam à conscientização de que deve existir uma certa preocupação, por parte dos professores, em ensinar aspectos culturais ligados à língua estrangeira em questão. Por outro lado, não podemos permitir que essa preocupação possa fomentar preconceitos em relação ao Brasil (p.41), o que muitas vezes acontece. Esta é uma das questões políticas que havia sido discutida anteriormente pelo autor, em forma de artigo.

Quebrar falsos mitos e ideologias preconceituosas sobre o processo ensino-aprendizagem de línguas, criados ao longo de décadas, não é tarefa fácil, o que não significa dizer que seja impossível, diz Moita Lopes em Eles não aprendem Português quanto mais Inglês. E é dentro desse panorama de desafio que o autor "conclama" os colegas lingüistas aplicados da área de ensino de línguas a subverter a ordem e "voltar seu foco de ação para a educação em LE das classes subalternas" (p.77), ao invés de concentrar suas pesquisas em tópicos relacionados com a educação das classes dominantes.

É com relação a este ponto proposto pelo autor que um acréscimo seria interessante. Ao se falar em ensino de línguas, a nosso ver, fala-se sobre o ensino de qualquer língua, incluindo a língua materna. Assim, o que o autor propõe deveria ser também aplicado ao contexto de ensino de Língua Materna (LM). Por que não voltar o foco das pesquisas sobre o ensino de LM também para as classes subalternas ? Por que não discutir também os falsos mitos sobre o processo ensino/aprendizagem de LM ?

Na Parte 3 do livro (A SALA DE AULA DE LÍNGUAS) o autor mostra Tendências da pesquisa na sala de aula de línguas no Brasil e questões ligadas à Interação na sala de aula de língua estrangeira. Antes de nos fornecer uma descrição dos tipos de pesquisa que estão sendo desenvolvidas, atualmente, no Brasil, Moita Lopes nos apresenta um panorama retrospectivo da tradição de pesquisa nesta área, mostrando desde pesquisas típicas de pesquisadores que trabalham a Lingüística Aplicada (LA) de forma periférica, encarando-a como uma área secundária de atuação, ou como uma "aplicação da Lingüística", até as tendências mais atuais de pesquisas na sala de aula, que classificou de pesquisas de diagnóstico e de intervenção.

O conceito de "interlíngua" é o foco da discussão na Parte 4 - A LÍNGUA DO APRENDIZ. Mais uma vez, o autor mostra que os conceitos (e/ou preconceitos) que permeiam as atitudes de professores e de alunos de LE são importantes, e muitas vezes determinantes, pois interferem no processo e podem afetá-lo de forma positiva, levando ao êxito, ou de forma negativa, levando a um fracasso muitas vezes irreversível.

Na Parte 5 (UMA ABORDAGEM DE ENSINO DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS PARA A ESCOLA PÚBLICA: O ENSINO DE LEITURA), o autor toca em duas questões extremamente relevantes, especialmente neste momento em que novos parâmetros curriculares estão sendo propostos pelo MEC para o ensino fundamental e médio. O autor defende uma abordagem de ensino de língua estrangeira com ênfase na leitura, e mostra por que a leitura é a habilidade em LE que parece se justificar socialmente no Brasil e que parece atender às necessidades reais dos alunos brasileiros, especialmente se levarmos em conta o contexto das escolas públicas brasileiras.

Em segundo momento, o autor esboça Um modelo interacional de leitura, argumentando acerca da relevância pedagógica desse modelo. O modelo interacional proposto fundamenta-se em teorias de esquema e em uma visão de discurso entendido como "o processo comunicativo entre leitor e escritor na negociação de significado do texto" (p.138).

A contribuição deste capítulo talvez seja, justamente, conscientizar os professores de LE sobre a importância de se fazer um trabalho de desenvolvimento de consciência (e de postura) crítica junto ao aluno, de forma que ele perceba a leitura como uma prática social, e para que ele perceba também a natureza social da linguagem; a linguagem como um instrumento que reflete relações de poder na sociedade. Essa consciência por parte do leitor é fundamental, nas relações escritor/leitor, para que o último não se deixe manipular pelos textos (discursos escritos) a que tem acesso, e para que possa reagir de forma crítica nesse processo.

Na Parte 6 (A EDUCAÇÃO PERMANENTE DO PROFESSOR DE LÍNGUAS), que fecha a coletânea, o autor propõe uma formação teórico-crítica para o professor de línguas, e questiona o que chamou de formação dogmática que geralmente permeia os cursos de formação de professores de línguas no Brasil.

A nosso ver, a obra aqui resenhada representa uma contribuição valiosa e pode ser considerada uma leitura obrigatória tanto para professores quanto para alunos de Prática de Ensino de Línguas. O caráter de oficina de trabalho, garantido pelas tarefas propostas ao final de cada capítulo, possibilita reflexões mais aprofundadas referentes à natureza social e educacional do processo ensino/aprendizagem de línguas (incluindo a língua materna).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Jan 2000
  • Data do Fascículo
    1998
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