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Dicionário de linguagem e lingüística

NOTAS SOBRE LIVROS BOOKNOTES

Francisco Gomes de Matos

Letras/CAC/UFPE, Recife

TRASK, R. L. 2004. Dicionário de Linguagem e Lingüística. Tradução e adaptação de Rodolfo Ilari. Revisão Técnica de Ingedore Villaça Koch e Thaís Cristófaro Silva. São Paulo: Contexto. 364 p. ISBN 85-7244-254-5.

Uma das maneiras de conhecer-se o desenvolvimento da Lingüística em um país é através dos dicionários ali publicados, sejas criações locais ou traduzidas. No Brasil, temos uma ainda pequena mas expressiva tradição, cuja notável sustentabilidade está bem representada pela 25ª. Edição do Dicionário de Lingüística e Gramática de J. Mattoso Câmara Jr. (Petrópolis, Vozes, 2004). Quanto a traduções de obras por lingüistas do exterior, cresce a bibliografia em língua portuguesa, agora significativamente enriquecida pela contribuição de um lingüista americano radicado há mais de 30 anos na Inglaterra: o Professor da Universidade de Sussex, R.L. Trask, já conhecido na área de Estudos da Linguagem por volumes importantes como Language Change (Routledge,1994) e Historical Linguistics (Arnold, 1996). Outra criação Traskiana, pouco conhecida entre nós, mas apreciada entre pesquisadores do prescritivismo em língua inglesa é Mind the Gaffe. The Penguin Guide to Common Errors in English (Penguink, 2001). Nesse caso, trata-se de um Guia espirituoso, às vezes mordaz, para usuários nativos do inglês desejosos de uma orientação estilística sobre comunicação escrita.

O volume auspiciosamente lançado pela Contexto destaca-se sob dois aspectos: (1) traduzido-adaptado por um versátil lingüista brasileiro, autor de criativa Introdução à Semântica (Contexto, 2001) e (2) enriquecido com 8 Anexos sobre temas relevantes: As Grafias do Português, Corpora Representativos do Português Brasileiro, Alguns Dados sobre Dicionários de Português, Crioulos de Base Portuguesa, Áreas Dialetais e Geolingüísticas, Alguns Traços Lingüísticos do Português Sub-Standard no Brasil, Perspectiva Histórica Sobre o Léxico do Português, A Língua Brasileira de Sinais, A Definição de Norma Lingüística, no Brasil.

DLL traz uma Relação dos Verbetes (5 p.), Nota do Tradutor (2 p.), Prefácio da Edição Inglesa (2 p.), Verbetes (2w92 p.), Anexos (19 p), Bibliografia original (8 p.), Suplemento bibliográfico (8 p.) e Índice remissivo (15 p.)

Para os que conhecem o volume em inglês (da Editora Routledge,1999), esta tradução-adaptação propicia excelente oportunidade de verificar-se como o tradutor e suas competentes revisoras técnicas solucionaram desafiadores problemas tradutórios, do inglês ao português. Assim, a edição brasileira tem duplo valor profissional: para lingüistas e tradutores atuais, emergentes e futuros.

Exemplifiquemos duas das felizes adaptações tradutórias: No original, lê-se "the works of Shakespeare; na tradução, encontramos "obras de Camões" (302). No original, alude-se a "Stockbrokers"; na tradução, cria-se "Os economistas do Banco Central" (303). Mas e a tradução de conceitos-termos como "language" e "literacy"? Colegas da área de Estudos Tradutórios certamente debruçar-se-ão nessa fascinante problemática. Damos três exemplos: no original, Trask escreveu "language and ethnicity", "language and identity", "language and ideology", "language and power". Preferências tradutórias de Ilari: língua e etnicidade, língua e identidade, língua e ideologia, língua e poder .

Em definições, podemos constatar também preferências tradutórias autorais: assim, no original, lê-se "Psycholinguistics. The study of the connections between language and mind" e na tradução, o literalismo ocorre: Psicolingüística. O estudo das conexões entre a linguagem e a mente" (243). Se, porém, compararmos os verbetes Sociolinguistics e Sociolingüística, deparar-nos-emos com a correspondência locucional "Language and Society"/ Língua e sociedade. Moral da história: em português, haverá contextos em que tanto "linguagem" quanto "língua" poderiam ser usadas, cabendo aos usuários o direitos estilístico de optar, mas ... deixemos essa instigante questão para os leitores interessados.

A tradução de "literacy" por "letramento" é brasileiramente adequada, mas, se considerarmos que em Portugal também ocorre "literacia" (neste caso, opto pela variante portuguesa), a informação poderia ter sido dada. No original, Trask opta por "code-switching"; na tradução, encontra-se o equivalente adequado,"mudança de código", mas, curiosamente, seguido de uma variante terminológica em parênteses: code-shifting (202).

Embora o valioso dicionário Traskiano pretenda ser abrangente e atual, há lacunas conceituais-terminológicas: assim, Direitos Lingüísticos (Linguistic Rights) e Lingüística da Paz (Peace Linguistics) não constam da obra, mas já aparecem no The Penguin Dictionary of Language (second edition,1999) de David Crystal.

Pensando positivamente, há muito o que louvar nesta oportuna contribuição de Ilari: o Suplemento Bibliográfico, por exemplo, será de imensa utilidade para pós-graduandos à procura de fontes relevantes inspiradoras. Igualmente louvável é a inclusão do Índice Remissivo. Assim, "discourse analysis" (o termo original foi mantido, por razões convincentemente expostas) está tratado às páginas 32, 83, 84,185 e) e "criatividade", à página 16. Por falar nesta propriedade da linguagem, ou, mais rigorosamente, nessa maravilhosa capacidade cognitiva que têm os usuários de línguas, à Bibliografia Traskiana e Ilariana sugerirmos acrescentar-se o volume Language and Creativity, do britânico Ronald Carter, publicado por Routledge (2004) e objeto de Nota nesta revista.

Em suma, Ilari e Editora Contexto merecem nosso aplauso, por trazerem ao público leitor de língua portuguesa uma obra que honra a Tradição de Lexicografia Lingüística, aclamado pela síntese clara, elegante e erudita de Trask, e agora, pela igualmente magistral tradução do lingüista da UNICAMP.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jan 2006
  • Data do Fascículo
    Jun 2005
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