Acessibilidade / Reportar erro

Ensino de gramática: descrição e uso

RESENHA REVIEW

Resenhado por/by: Maria Helena de Moura Neves

U. Presbiteriana Mackenzie; UNESP-Araraquara/CNPq. E-mail: mhmneves@uol.com.br

VIEIRA, S.R.; BRANDÃO, S.F. (orgs.) 2007. Ensino de Gramática: descrição e uso. São Paulo: Contexto.

Por mais que o tema de uma obra interesse ao resenhador, ele sempre vai sentir-se, em sua tarefa, como um analista externo, alheio, colocado em atitude de exame e avaliação.

Entretanto, minha tarefa, neste momento, tem uma situação um tanto peculiar, porque o livro Ensino de gramática - descrição e uso, mais do que de meu interesse, é muito parecido comigo, especialmente pela atenção que dá ao uso lingüístico, demonstrando explicitamente (já no título) uma direção de análise não apenas "descritiva" mas também comprometida com a língua em funcionamento.

Isso me é muito agradável, pelo que representa de uma tendência que vejo, hoje, na comunidade científica brasileira, de buscar tratar as atividades escolares ligadas à gramática da língua como instigação para que se apreendam, no trato com a língua em uso, os mecanismos gramaticais de produção de sentido, e, por aí, a própria constituição do sistema da língua.

Trata-se de uma obra de vários autores, que, entretanto, traçou claramente uma linha geral de pesquisa e análise que não deixa perderem-se finalidades propostas em conjunto. A vantagem de uma direção de conjunto para uma obra coletiva é inegável, mas é difícil de obter, e, neste caso, conseguiu-se porque o livro é resultado de reflexões e análises desenvolvidas durante um curso de extensão ministrado pelos autores. Não há, pura e simplesmente, como é costume, um tema comum (registrado num título que abrigue tematicamente o conjunto dos capítulos), mas verificase, de fato, uma diretriz de análise pensada e decidida: sempre se tenta inicialmente pôr em equação uma questão, parte-se para a ilustração com fatos da língua, e busca-se, finalmente, ir ao "como" de um tratamento escolar do fato e/ou do conceito. Outro traço geral que valoriza o que vem oferecido é a sistemática invocação da tradição da gramática, quanto ao tratamento dos diversos fatos, o que se faz sem o surrado e inconseqüente vezo de apenas apontar falhas e apresentar o novo como inconteste superação de tais falhas.

A base geral é variacionista, o que em si confere legitimidade às análises, mas, mais que isso, o tratamento não se circunscreve a esse território teórico. As organizadoras dizem, na Apresentação, que o trabalho se pauta "no conhecimento teórico-científico e nos padrões lingüísticos e socioculturais que se observam hoje no país", e os textos mostram, de fato, um respaldo seguro no desenvolvimento teórico-científico disponível para os diversos níveis de análise. Não por acaso a primeira parte da obra assenta, como conceitos diretores das discussões, a relação entre norma e gramática, a tensão entre variação e mudança, a constituição de normas, a constituição de saberes específicos envolvidos na reflexão escolar sobre a gramática.

De um lado, há incursões por fatos gramaticais que realmente pedem uma análise acurada: a concordância, a referenciação pronominal, a colocação de clíticos. De outro lado, há incursões por questões teóricas cujo tratamento global instiga controvérsias (exatamente as duas básicas: classes de palavras; termos da oração/processos sintáticos), ou por questões teóricas em cujo tratamento o estabelecimento de dicotomias mais tem perturbado do que solucionado (também as duas básicas, que são flexão x derivação e coordenação x subordinação, ambas de face dupla: a primeira, morfossintática, a segunda, sintático-semântica). Não por acaso a teorização e a análise dos fatos desembocam no território de concretização dos atos comunicativos, que é o texto, com seu entorno e suas condições de produção.

Pode-se dizer que outras direções e outros fatos ficaram à margem, mas isso é inevitável, e o importante é a representatividade do que foi selecionado. Mais importante, ainda, é o esforço que se nota num sentido de especial relevância para todos os que queremos ver a escola como um espaço de reflexão sobre a linguagem: como diz a Apresentação em seu final, é necessário que os agentes da produção de saber nas universidades dêem, consistentemente, a sua contribuição para que "cada professor de língua materna se sinta, nos diferentes níveis do processo de escolarização, o agente por excelência de um ensino produtivo", aqui, no nosso caso, especificamente, no campo desta língua "que a nós todos une e identifica em sua rica heterogeneidade".

Recebido em julho de 2007

Aprovado em setembro de 2007

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Out 2008
  • Data do Fascículo
    2008
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP PUC-SP - LAEL, Rua Monte Alegre 984, 4B-02, São Paulo, SP 05014-001, Brasil, Tel.: +55 11 3670-8374 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: delta@pucsp.br