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Inglês e globalização em uma epistemologia de fronteira: ideologia lingüística para tempos híbridos

English and globalization through a border epistemology: linguistic ideology for hybrid times

Resumos

Este artigo focaliza o fenômeno do inglês como língua que colabora na construção da globalização, seguindo os princípios de uma epistemologia de fronteira. Tem o objetivo de contribuir na elaboração de uma ideologia lingüística para os tempos híbridos em que vivemos. Baseia-se em uma teorização assentada nos construtos de Império, histórias locais e performatividade, possibilitando uma redescrição da relação entre inglês e globalização. O inglês é compreendido então como língua de fronteira por meio da qual as pessoas se apropriam de discursos globais e reinventam a vida local em suas performances cotidianas. São analisados exemplos de tais usos do inglês em e-mails translingüísticos e no rap brasileiro. Ao concluir, usa-se uma lógica que reconhece tanto o papel imperial do inglês assim como o seu uso transimperial, que possibilita a reinvenção da vida local não como mímica de designs globais, mas como possibilidade de construir uma outra globalização, anti-hegemônica, em performances lingüísticoidentitárias inovadoras nos fluxos da fronteira.

Inglês; Globalização; Epistemologia de Fronteira; Ideologia Lingüística


This paper focuses on English as a language which helps to construct globalization, following principles of a border epistemology. It aims at contributing to the elaboration of a linguistic ideology for the hybrid times in which we live. It is based on a theorization informed by the constructs of Empire, local histories and performativity, making it possible to re-describe the relationship between English and globalization. English is then understood as a border language through which people appropriate global discourses and re-invent local life in their everyday performances. Examples of such uses of English in translinguistic e-mails and in the Brazilian rap are analyzed. By way of conclusion, it is used a logic which acknowledges both the imperial role of English and its transimperial use, which may re-invent local life not as mimicry of global designs, but as the possibility of constructing an anti-hegemonic globalization through innovative linguistic-identity performances on the border fluxes.

English; Globalization; Border Epistemology; Linguistic Ideology


ARTIGOS

Inglês e globalização em uma epistemologia de fronteira: ideologia lingüística para tempos híbridos* * Sou grato ao CNPq (306756/2006-4 e 400340/2007-0) e à FAPERJ (E-26/100.575/2007 - Programa Cientistas do Nosso Estado) pelos auxílios à pesquisa que possibilitaram a investigação relatada aqui.

English and globalization through a border epistemology: linguistic ideology for hybrid times

Luiz Paulo da Moita Lopes

Universidade Federal do Rio de Janeiro

RESUMO

Este artigo focaliza o fenômeno do inglês como língua que colabora na construção da globalização, seguindo os princípios de uma epistemologia de fronteira. Tem o objetivo de contribuir na elaboração de uma ideologia lingüística para os tempos híbridos em que vivemos. Baseia-se em uma teorização assentada nos construtos de Império, histórias locais e performatividade, possibilitando uma redescrição da relação entre inglês e globalização. O inglês é compreendido então como língua de fronteira por meio da qual as pessoas se apropriam de discursos globais e reinventam a vida local em suas performances cotidianas. São analisados exemplos de tais usos do inglês em e-mails translingüísticos e no rap brasileiro. Ao concluir, usa-se uma lógica que reconhece tanto o papel imperial do inglês assim como o seu uso transimperial, que possibilita a reinvenção da vida local não como mímica de designs globais, mas como possibilidade de construir uma outra globalização, anti-hegemônica, em performances lingüísticoidentitárias inovadoras nos fluxos da fronteira.

PALAVRAS-CHAVE: Inglês; Globalização; Epistemologia de Fronteira; Ideologia Lingüística

ABSTRACT

This paper focuses on English as a language which helps to construct globalization, following principles of a border epistemology. It aims at contributing to the elaboration of a linguistic ideology for the hybrid times in which we live. It is based on a theorization informed by the constructs of Empire, local histories and performativity, making it possible to re-describe the relationship between English and globalization. English is then understood as a border language through which people appropriate global discourses and re-invent local life in their everyday performances. Examples of such uses of English in translinguistic e-mails and in the Brazilian rap are analyzed. By way of conclusion, it is used a logic which acknowledges both the imperial role of English and its transimperial use, which may re-invent local life not as mimicry of global designs, but as the possibility of constructing an anti-hegemonic globalization through innovative linguistic-identity performances on the border fluxes.

KEY-WORDS: English; Globalization; Border Epistemology; Linguistic Ideology

Três histórias à guisa de introdução

Três pequenas narrativas sobre o uso do inglês no mundo contemporâneo servem de mote para emoldurar este artigo. A primeira relata uma matéria publicada na Folha de S.Paulo, em 13 de maio de 2001, sobre cultos religiosos, celebrados em inglês na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Apesar de os participantes não compreenderem inglês, a notícia informa que os cultos tinham se tornado cada vez mais populares, atraindo muitas pessoas. Como diz uma delas, "não entendo nada dessa língua, mas adorei. Vou vir sempre". Provavelmente, estamos ainda diante da força civilizatória do cristianismo, travestido de inglês global, sobre o qual Pennycook e Makoni (2005) bem como Pennycook e Coutand-Marin (2003) se referiram, ao chamarem atenção para como o inglês, em muitas partes do mundo, ainda funciona como uma língua missionária, nutrindo-se do interesse que esse idioma desperta globalmente: a crença é que o caminho para o bilingüismo é a conversão religiosa. Ressoam, nessa história, as missões cristãs que colonizaram e colonizam o mundo, levando a religião e interesses econômicos de nações imperiais para outras partes desde o século XVI.

Uma outra história tem como cenário um congresso internacional e interdisciplinar na Espanha, do qual participei em setembro de 2005, que só admitia o uso de inglês em todas as seções. Na reunião setorial dos cerca de 40 participantes brasileiros (professores universitários de várias partes do Brasil e de diversas áreas do conhecimento), uma das reclamações principais era que os organizadores do congresso deveriam aceitar também o uso de outras línguas, pois os brasileiros que não dominavam o inglês ficavam em desvantagem. Constata-se que a língua globalizada do conhecimento é o inglês ou mesmo a crença absurda, da parte dos organizadores do evento, que conhecimento, não formulado em inglês, não vale a pena, marginalizando vastos contingentes de pesquisadores no mundo. Esse fenômeno de silenciar algumas línguas é o que Phillipson (1992 e 2003) chama de lingüicismo. Faz lembrar também "as sociedades silenciadas" a que Mignolo (2000) se refere em sua perspectiva pós-colonial ou o que Canclini (2005: 229) chama de "o monolingüismo nas ciências e tecnologias".

Nessa mesma linha, a ânsia de fomentar publicações internacionais, em algumas universidades, pontua diferentemente e, na verdade, remunera, de forma distinta, pesquisadores que publicam em inglês e na língua nacional. Como indica Phillipson (2003), na Noruega, o estafe na universidade recebe bônus diferenciado com base na língua de publicação utilizada: um livro publicado em inglês é premiado com 15000 coroas, já um livro em norueguês com 7000 coroas; um artigo em inglês com 7000 coroas, mas em norueguês com 1000 coroas. Não há dúvida que o inglês é uma mercadoria como muitas outras na chamada sociedade de mercado ou no "horror econômico" (Forrester, 1997), no qual vivemos. Esse fato também indica que algumas línguas são subalternas no mundo da pesquisa (Mignolo, 2000).

A última história me remete ao filme iraniano de Bahman Ghobadi, intitulado "Tartarugas podem voar" (2004), que focaliza um grupo de crianças curdas no norte do Iraque, muitas mutiladas, vivendo entre os horrores da guerra. Necessitando saber o que acontecia no mundo em relação a uma guerra que iria literalmente desabar sobre suas cabeças, os anciões do povoado dependem da perícia de um menino, conhecedor de tecnologia e inglês, para tenta fazer funcionar a TV e entender as notícias sobre a guerra que chegam pelo monitor. Aqui nos deparamos com uma outra força na construção da relação entre inglês e globalização: tecnologia. Essa aumenta o poder da globalização e, com a colaboração do inglês, ajuda a construí-la. Ou, como um motorista de táxi peruano, citado em Niño-Murcia (2003: 131), diz: "O inglês hoje em dia é um mal necessário, não há dúvida de que necessitamos dele"1 1 . Tradução do original em espanhol: "El inglés en el mundo de hoy es un mal necesario, lo necesitamos si o si" (Niño-Murcia, 2003: 131). .

É dentro do enquadre interpretativo que essas três histórias possibilitam, ou seja, língua como lugar de conversão ideológica, como espaço de valoração do que conta como conhecimento e mercadoria, e como instrumento para sobrevivência no mundo contemporâneo - todos os três temas vinculados à relação entre inglês e globalização - que desejo contextualizar a construção de uma ideologia lingüística para tempos híbridos: a questão central deste artigo, em última análise.

Ideologia lingüística

A reflexão de natureza sócio-histórica sobre essa língua tem acompanhado toda a minha vida profissional, bem antes, na verdade, de tal temática ter constituído um dos grandes tópicos da Lingüística Aplicada contemporânea, notadamente, a partir de 1992, com o trabalho de Phillipson, em uma linha marxista, e, mais tarde, com os livros de Pennycook, em 1994, e de Canagarajah em 1999, em uma perspectiva pós-estruturalista ou pós-modernista. Meu primeiro artigo sobre a questão foi publicado, pela primeira vez, em Moita Lopes (1982). Entendo ser essencial a compreensão de tal problemática para que não sejamos tragados pelos muitos interesses que essa língua, particularmente, representa.

Naquele artigo, em plena Guerra Fria, procurava apresentar uma alternativa para o inglês no Brasil, me preocupando com o papel que essa língua desempenhava como força imperialista em um país sob a égide dos Estados Unidos. No entanto, em tempos de globalização, há de se compreender essa língua de forma diversa, historicizando-a nos horizontes de um outro mundo, ainda que não pretenda descartar a força imperialista de seus usos, como vou deixar claro posteriormente. Especificamente, o que desejo compreender é como a língua que a literatura especializada construiu como Inglês Antigo, Inglês Médio e Inglês Moderno (Baugh & Cable, 1978) passa agora a ser compreendida como Inglês Global.

Como o inglês, um idioma extremamente hibridizado, ou seja, forma-do por tantas outras línguas (línguas escandinavas, celta, latim, francês, grego, urdu etc.) é hoje entendido como língua franca, que hibridiza outras (e continua se hibridizando), possibilitando a comunicação através do globo, como língua do conhecimento, da mídia, da INTERNET, do mercado e do poder ? Ao tratar desse fenômeno, quero entender a ideologia lingüística (Kroskrity, 2004) que rege a relação entre inglês e globalização em um mundo no qual "... os grupos [de pessoas] não estão mais territorializados, limitados pelo espaço, inconscientes do processo histórico, nem são mais homogêneos do ponto de vista cultural" (Appadurai, 1991: 191)2 2 . No original em inglês: "...groups are no longer tightly territorialized, spatially bounded, historically unselfconscious, or culturally homogeneous" (Appadurai, 1991: 191). Cabe aqui questionar, todavia, se as pessoas foram algum dia, de fato, homogêneas do ponto de vista cultural. de modo a poder lidar com tal fenômeno na pragmática linguístico-discursiva de nossas vidas, que mudou de natureza devido à intensidade das relações sociais em nível mundial (Block & Cameron, 2002).

Assim, me apoio na definição de Kroskrity (2004: 498) que compreende ideologia lingüística como "crenças, ou sentimentos, sobre línguas, conforme são usados nos mundos sociais [dessas línguas]" (Kroskrity, 2004: 498)3 3 . No original em inglês: "beliefs, or feelings, about languages as used in their social worlds" (Kroskrity, 2004: 498) . Ao refletir sobre tal ideologia lingüística, meu objetivo é construir conhecimento que possa alimentar a formulação de uma política lingüística, pois ela pode explicitar a relação entre linguagem e identidade ou como a ubiqüidade no uso de uma determinada língua franca pode gerar identificação, resistência ou re-invenção social.

Línguas como instrumento imperial

O papel do inglês no mundo contemporâneo é explicado pela importância que o Império Britânico teve no século XIX e, no início do século XX, e pela predominância mundial da economia dos Estados Unidos a partir da Segunda Guerra Mundial, gerando um tipo de neo-colonialismo ou imperialismo. Esse momento histórico-econômico se estende até o final do século XX e toma novas direções no que se convencionou chamar de globalização, ainda que haja muitas maneiras de entender o significado desse termo, como vou discutir posteriormente. Conforme deixa claro a sentença muito conhecida do gramático espanhol Antonio de Nebrija, ao presentear Isabel de Castela, em 1492, com a Gramática Castellana, a primeira gramática da língua espanhola: "a língua sempre foi companheira do império" (Nebrija, 1946)4 4 . No original em espanhol: "siempre la lengua fue compañera del imperio" .

Nebrija foi "profético, no sentido de que durante toda a conquista das Américas e durante os séculos de colonialismo, a língua foi usada pelos espanhóis como um instrumento de conquista para consolidar o poder político, para divulgar a fé católica e para unificar o império" (La Rosa, 1995: 1)5 5 . No original em inglês: "prophetic, in that throughout the conquest of the Americas, and the centuries of colonialism, language was used by the Spanish as a tool for conquest to consolidate political power, to spread the Catholic faith, and to unify the empire" (La Rosa, 1995: 1) embora as línguas nativas tenham sido também usadas no exercício do poder imperial espanhol. Nebrija, porém, tinha a compreensão que uma língua única e padronizada, conforme os ditames de sua gramática, era essencial na construção e preservação do império. Tal política foi igualmente crucial na criação de estados-nação na Europa e em outras partes do mundo como comunidades imaginadas, conforme indica Anderson (1983), e ainda hoje alimenta projetos de integração nacional e de construção do que Hardt e Negri (2000) chamam de Império, como discutirei mais adiante.

Mas as relações entre as políticas lingüísticas e os impérios são anteriores às iniciativas de Nebrija: nos impérios romano, asteca e inca (La Rosa, 1995). De acordo com Brice Heath (1972), mais de 80 línguas eram faladas no império asteca, embora a língua franca fosse o náuatle, a língua dos Nahua, a tribo mais poderosa. O mesmo pode ser dito em relação ao mundo inca, no qual todas as pessoas eram obrigadas a aprender quéchua (Urban, 1991). No entanto, nenhuma língua experimentou o poder do inglês em termos de domínio planetário. A estimativa é que mais de 1 bilhão de pessoas aprendam inglês atualmente, de acordo com dados do Conselho Britânico de 2005 (www.weforum.org), sendo que 375 milhões falam inglês como primeira língua (ainda que esteja cada vez mais difícil definir exatamente esse tipo de inglês, como vou discutir posteriormente), e 750 milhões usem o inglês como segunda língua.

As projeções são que, se o ritmo de desenvolvimento do inglês global continuar, em 10 anos, mais 2 bilhões de pessoas vão falar esse idioma (Graddol, 2006), chegando ao total de 3 bilhões de falantes no mundo. Além disso, o inglês representa uma das grandes fontes de geração de divisas para a Inglaterra e para outros países. Só na Inglaterra, os ganhos diretos relacionados ao ensino de inglês alcançam quase 1bilhão e 300 milhões de libras e aqueles referentes a exportações de itens relacionados, no campo educacional, totalizam 10 bilhões de libras por ano (Kinock, 2006). Trata-se, portanto, não somente de uma língua que ajudou e ajuda a construir um império, mas que é, de fato, um império em si mesma, como já indiquei em Moita Lopes (2005).

As forças contraditórias em relação ao inglês

O avanço do inglês em várias partes do mundo tem sido fonte de preocupação da parte de governos e da mídia, embora, contraditoriamente, muitos governos, ao mesmo tempo, invistam cada vez mais no ensino dessa língua (Moita Lopes, 2005). Muitos países (por exemplo, França, Espanha e Brasil) têm procurado estabelecer normas ou leis que barrem o que entendem como a destruição de suas línguas nacionais pela invasão do inglês. Na França, todos os textos em inglês que aparecem na propaganda têm que ser obrigatoriamente traduzidos; nas Academias de Letras na França e na Espanha as batalhas para a preservação do francês e do espanhol são cotidianas; e no Brasil há uma lei em tramitação no Congresso que tem o objetivo de policiar o uso do inglês, pois teme-se que a hibridização do português brasileiro pelo inglês venha impossibilitar a comunicação entre pessoas que moram no campo e nas cidades (Rebelo, 2000). Uma das preocupações parece ser, desse modo, a preservação da integridade do estado-nação.

No Japão, por exemplo, a mídia cotidianamente discute o processo de corrupção que a língua japonesa enfrenta devido à invasão do inglês, encontrando também apoio na universidade (cf. Kubota, 1998) embora não haja, no Japão, nenhuma lei para impedir a penetração do inglês (Hoffer e Honna, 1999). Ao contrário, o próprio governo japonês faz uso de palavras em inglês em documentos oficiais e valoriza sobremodo o ensino de inglês na escola (Hoffer e Honna, 1999). As políticas lingüísticas recentes de vários países, da mesma forma, colocam grande ênfase no ensino de inglês, como é, por exemplo, o caso da Espanha, Portugal, Colômbia, Mongólia, Chile, Cingapura e China (Graddol, 2006; Zhenzua, 1999; e Chew, 1999), sendo que o inglês predomina como a língua franca no Mercado Comum Europeu, apesar de oficialmente está em vigor uma política de multilingüismo (Phillipson, 2003). É interessante que países, os quais, em princípio, teriam orientações políticas tão diversas, estejam igualmente voltados para políticas lingüísticas similares.

Graddol (2006) argumenta, porém, por meio de um modelo da teoria de difusão de inovação, usado na análise de mercado, que o declínio do inglês é iminente porque vai alcançar um estágio de saturação de interesse, da parte do contingente de pessoas que poderiam adotá-lo como língua global. Essa projeção é também decorrente da probabilidade de o uso de inglês passar a ser incluído como uma habilidade básica na escola, como discutirei a seguir. O autor ainda chama atenção, por outro lado, para o papel que outras línguas estrangeiras como o espanhol, o mandarim e o árabe vão desempenhar no futuro, não só em número de falantes, como também em termos de usuários da Internet. Segundo dados desse mesmo autor, o domínio do inglês na Internet está decrescendo em número de usuários, ou seja, a troca de informações está ficando mais multilíngüe assim como o mundo, embora o número de sites da WEB seja ainda maior em inglês (68%). Os cálculos são que, com o aumento do uso de outras línguas na Internet, a fatia do inglês ficou reduzida a 32%.

É com base nesses argumentos que Graddol (2006) aponta que é necessário rever os modelos de inglês como língua estrangeira com que operamos, pois a aprendizagem de inglês que era, normalmente, percebida como um índice emblemático de classe social, ou seja, como "uma realização elegante e símbolo de status social" (conforme inclusive o Conselho Britânico em 1976 compreendia o papel do inglês no Brasil - The British Council, 1976) passa a ser entendida, em muitas partes do mundo, como um dos conhecimentos constitutivos da educação básica, juntamente com letramento na língua materna ou oficial, habilidades matemáticas ou numeramento e letramento computacional. Isso coloca em xeque toda a concepção de inglês como língua estrangeira que rege a política de educação lingüística, em muitas partes do mundo, inclusive no Brasil, acarretando uma série de mudanças em relação ao próprio modelo a ser seguido no ensino do inglês global, à falta de importância do chamado falante nativo, bem como a um novo papel para o professor não-nativo, questões às quais vou me referir mais adiante.

A vulgarização do inglês vai fazer as classes médias procurarem outra mercadoria lingüística (outras línguas estrangeiras) para marcar seu diferencial no mercado, como, de fato, indica Graddol (2006). É assim que "as línguas estão sendo tratadas, cada vez mais, como mercadorias,... deslocando ideologias tradicionais nas quais as línguas eram fundamentalmente símbolos de identidade étnica e nacional" (Block & Cameron, 2002: 5)6 6 . No original em inglês: "languages are coming to be treated more and more as economic commodities, ... displacing traditional ideologies in which languages were primarily symbols of ethnic or national identity" (Block e Cameron, 2002: 5).

É claro que, no Brasil, a compreensão do inglês como habilidade básica só é perceptível em alguns colégios particulares de classe média embora já haja sinal dessa visão em um projeto recente da Secretaria Estadual de São Paulo, chamado de Escola de Tempo Integral, que inclui a implantação de inglês em escolas públicas a partir da primeira série do ensino fundamental. Se essa reviravolta no novo papel do inglês, como habilidade básica, realmente se concretizar, no Brasil, vai exigir, entre outras medidas, que o programa de material didático do MEC para escolas públicas passe a incluir a compra de livros para o ensino de línguas estrangeiras assim como um grande investimento na formação de professores dessa língua como outros países estão fazendo.

Estamos diante de uma língua que atravessa o globo de lado a lado, ajudando a difundir o que Milton Santos (2002) chamou de "pensamento único", os interesses do capital, que passa a ser compreendida como habilidade básica na escola, sendo fundamental no exercício de muitas profissões e útil na construção do conhecimento no mundo universitário e nas redes de comunicação, e que, ao mesmo tempo, ajuda a construir desigualdade. É, portanto, uma língua que envolve questões econômicas, políticas, culturais, sociais e éticas. Está claro, assim, que não podemos focalizar o inglês, ignorando o peso de sua sócio-história, em termos da colonização violenta que exerceu e exerce no mundo, e considerar somente os benefícios que seu acesso fornece em um planeta globalizado, como de fato se constata em Crystal (2005), por exemplo. Nas palavras de Rosaldo (1988: 87), "todos nós habitamos um mundo interdependente..., que é marcado por empréstimos que atravessam fronteiras culturais porosas, e saturado de desigualdade, poder e exploração"7 7 . No original em inglês: "all of us inhabit an interdependent world ... , which is marked by borrowing and lending across porous cultural boundaries, and saturated with inequality, power, and domination" (Rosaldo, 1988: 87) . É necessário, portanto, considerar como o inglês funciona em nossas sociedades e culturas híbridas e desiguais (Canclini, 1997 e 2005).

Se é verdade, porém, que somos participantes de "um mundo no qual nada de importante se faz sem discurso", como aponta Milton Santos (2000: 74), tendo em vista os avanços da tecnologia informacional nas redes midiáticas de comunicação (como tem indicado uma série de pesquisadores, por exemplo, Thompson, 1998; Fairclough e Chouliaraki, 1999; e Martín-Barbero, 2003), essa língua também é, devido ao seu alcance global, uma possibilidade de ter acesso a outros discursos sobre o mundo e sobre quem somos ou podemos ser, sendo, portanto, um veículo para construir uma outra globalização com base nos interesses de seus falantes. O uso do inglês pode ser um lugar de heterogeneidade discursiva (Moita Lopes, 2003) ou semiodiversidade (Pennycook, 2004) e de construir diálogo com a vida local. É a teorização dessa outra globalização que passo agora focalizar de modo a engendrar uma ideologia lingüística que explicite a relação entre inglês e globalização nas margens.

Teorizando nas margens

Imperialismo e Império

O projeto que muitos chamam de globalização tem tido, grosso modo, duas leituras. A primeira é subscrita por aqueles que entendem ser esse um processo, iniciado com as conquistas coloniais de Portugal e Espanha no final do século XV e no século XVI. Esse é o caso do historiador Robbie Robertson (2003) e do crítico cultural Couze Venn (2000). Venn (2000) se refere a tal processo como o de construção do ocidentalismo ou o da construção da Europa como ocidente, resultado de um grande movimento de colonização e subjugação do chamado mundo novo, no qual esteve envolvida a maioria das nações européias, tendo tido o Império Britânico papel especial como uma das maiores forças hegemônicas de colonização e imperialismo. Esse processo tem prosseguimento com a revolução industrial até a Segunda Guerra Mundial, quando o mundo, durante a chamada Guerra Fria, passa a ser dividido em dois grandes blocos de interesse, União Soviética e Estados Unidos, com a vitória do segundo, como grande força imperial, a partir do final do século XX.

Os Estados Unidos tomam as rédeas do mundo, na continuação desse grande processo de ocidentalização, principalmente com a criação de três instituições econômicas internacionais (o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e a Organização Mundial do Comércio), que ajudaram a construir uma economia global, seguindo, quase que, totalmente, os princípios de mercado da economia estado-unidense. Esse projeto atual de globalização é particularmente proporcionado pela tecnologia da informação, possibilitando que o dinheiro vá de um lado para o outro do globo ao se apertar uma tecla. Como Milton Santos (2000: 24) indica, "a cada evolução técnica, uma nova etapa histórica se torna possível", ou, como Jameson (1998: 55) ressalta, a globalização é "um conceito comunicacional, que alternativamente mascara e transmite significados culturais e econômicos"8 8 . No original em inglês: "a communicational concept, which alternately masks and transmits cultural and economic meanings" (Jameson, 1998: 55) .

Esse processo entendido como gerador de porosidade entre as fronteiras, volatilidade econômica, diminuição das distâncias temporais e espaciais, é também compreendido como uma globalização da exclusão ou globalização perversa, pois alguns têm condições de circular nesse mundo fluido, às vezes sem sair de casa, tendo acesso às benesses da globalização, mas um contingente muito maior de pessoas não passa de "refugo humano" (Bauman, 1999 e 2004) ou estão desconectados ou vivem um "tecno-apartheid" sobre o qual nos fala Canclini (2005: 92 e 236). É esse processo de globalização também que divulga, através das redes de comunicação midiática, "o pensamento único", a que já me referi. Outros autores, como Giddens (2000), porém, vêem forças contraditórias nessa via de mão dupla, uma vez que entendem que a porosidade das fronteiras permite que os discursos não hegemônicos, em contra-partida, também influenciem a vida em países hegemônicos.

A outra leitura para a globalização que experimentamos é radicalmente diferente daquela representada na visão do imperialismo. Hardt e Negri, em um livro publicado em 2000, argumentam que o processo que rege o planeta atualmente não tem nada a ver com o imperialismo, mas com Império (com letra maiúscula). Nessa versão da globalização, "os Estados Unidos não são, e nenhum outro estado-nação poderia ser, o centro de um novo projeto imperialista. O imperialismo acabou" (Hardt e Negri, 2000: 13-14). A compreensão da desterritorialização do poder, principalmente, depois dos anos 90, é também parte do pensamento de Mignolo (2000: 65), que chama atenção para o papel das corporações transnacionais na construção desse novo poder, o qual não se encontra em um território fixo, mas é orquestrado com as nações ricas e as instituições financeiras internacionais (Hardt e Negri, 2005: 10).

Hardt e Negri (2000) entendem que o Império pode ser caracterizado pela ausência de fronteiras territoriais que limitem seu espaço, pelo não envolvimento em conquista de um território, pelo exercício do poder sobre a vida das pessoas (ou seja, seu poder não está restrito somente ao espaço territorial, mas tem um raio de ação mais profundo: o biopoder), e pela dedicação à construção da paz, embora, contraditoriamente, seja uma paz gerada com base em sangue. Essa última característica ecoa os discurso da política estado-unidense, que, infelizmente, nos acostumamos a ouvir nos últimos anos.

Nessa ordem do Império, têm poder central as corporações transnacionais e a linguagem, a qual, por meio das indústrias de comunicação, dá legitimidade ao Império. "A linguagem, à medida que comunica, produz mercadorias, mas, além disso, cria subjetividades, põe umas em relação às outras, e ordena-as" (Hardt e Negri, 2000: 52), ao produzir grandes narrativas em benefício de seu poder imperial de universalizar ou de criar um projeto de globalizar, provocando exclusão não só em países pobres, mas também nos ricos. Ao conceito de Império, Hardt e Negri (2000) contrapõem o de Multidão que entendem como resultado "dos fluxos e intercâmbios globais" entre pessoas pelas fronteiras espaciais e virtuais, cada vez maiores, que poderão construir alternativas democráticas para enfrentar o Império, pensando a Multidão como uma força para além das divisões de classe social, ou seja, envolvendo etnias, sexualidades, gêneros e raças. A teorização que Hardt e Negri (2000) oferecem explica de forma inovadora o mundo em que vivemos, possibilitando uma saída democrática e otimista por meio do conceito de Multidão. Mas essa visão tem sido corretamente criticada (por exemplo, por Kumaravadivelu, 2006), por não dar conta do modo como os Estados Unidos ocuparam o Iraque de forma avassaladora, o que coloca dúvidas sobre se estamos realmente diante do Império ou do velho imperialismo.

Em um livro mais recente de 2005, dedicado exclusivamente ao construto teórico de Multidão (Hardt e Negri, 2005), escrito após o evento de 11 de setembro e após a guerra no Iraque, Hardt e Negri explicitam, porém, o fato de os Estados Unidos constituírem, na ordem do Império, uma exceção "como a única superpotência restante" (Hardt e Negri, 2005: 27), o que chamam, de modo crítico, de "o excepcionalismo americano", ao qual prefiro me referir como o excepcionalismo estado-unidense, que qualificam como tirania ao não se submeterem às leis internacionais, dominando a ordem global. Esses autores (2005: 92) argumentam claramente que "há indicações de que, pelo menos, no nível ideológico, as forças armadas americanas vêm ocupando nas últimas décadas uma posição ambivalente, a meio caminho entre o imperialismo e o Império".

Por outro lado, temos que considerar também que, embora a maioria das corporações tenha grande aporte de capital norte-americano, é interessante constatar como, na América Latina, as multinacionais de base espanhola têm dominado o mercado editorial, a indústria de telecomunicações e os bancos. Canclini (s/d) deixa claro que "no Brasil, os espanhóis ocuparam em 1999 o segundo lugar com 28% dos investimentos estrangeiros; na Argentina passaram ao primeiro posto, deslocando os Estados Unidos no mesmo ano"9 9 . No original em espanhol: "En Brasil, los españoles ocuparon en 1999 el segundo lugar con el 28 por ciento de las inversiones extranjeras; en Argentina pasaron al primero puesto, desplazando a Estados Unidos el mismo año" . Além disso, apesar de a guerra do Iraque ter sido comandada pelos Estados Unidos, teve o apoio direto dos países hegemônicos, caracterizando, de certa forma, um Império descentrado, como Hardt e Negri (2000 e 2005) afirmam. Esses dados mostram que o insight possibilitado pelo construto teórico Império faz sentido, tornando possível ver a ordem sob a qual vivemos de uma outra perspectiva.

Mas, de fato, o que mais me interessa no trabalho desses dois autores é a possibilidade que aventam de ver as redes, conexões e fluxos das quais a globalização se alimenta e pela qual é alimentada como um espaço para construir outros discursos de oposição ao Império, em que as pessoas deixam de ser dirigidas e passam a dirigir seus mundos e se lançam à inovação de ações, discursos e sociabilidades. É isso que constitui o conceito de Multidão, que entendem como um modo de criar uma sociedade alternativa no mundo do Império, baseada na solidariedade daqueles que desejam lutar contra a exploração globalmente, se apoiando nos meios tecno-informacionais contemporâneos. Tendo em vista os designs globais que nos são impingidos, ou a que somos levados acreditar que são nossos, como podemos construir um outro mundo com base nas conexões entre as ações das pessoas em suas histórias locais, para usar uma terminologia de Mignolo (2000)?

Histórias locais

No meu entender, uma das questões que tem atravessado o pensamento de vários cientistas sociais no mundo atual (por exemplo, o geógrafo brasileiro Milton Santos (2000), o sociólogo japonês Kinhide Mushakoji (1999), o sociólogo português Boaventura de Souza Santos (2004), o filósofo esloveno Slavoj Zizek (2004), o crítico cultural argentino-estado-unidense Walter Mignolo (2000) e o crítico cultural caribenho, David Scott (1999) reside na idéia de que as alternativas para a vida contemporânea não estão nas histórias globais universais que fazem a globalização, mas, ao contrário, estão, de fato, nas narrativas daqueles que são excluídos ou no seu conhecimento local, historicamente marginalizado na tentativa do ideal modernista de universalizar (Canagarajah, 2002). Como enfatizo em Moita Lopes (2006: 86), "as alternativas sociais ... [estão] [n]as vozes daqueles colocados à margem: os favelados, os negros, os indígenas, homens e mulheres homoeróticos, mulheres e homens em situação de dificuldades sociais e outros, ainda que eu os entenda como amálgamas identitários e não de forma essencializada". São essas epistemes das margens que podem abrir nossos horizontes. Mushakoji (1999) fala de uma coligação anti-hegemônica com base na visão daqueles que sofrem para criar desafios à globalização ou para gerar uma pluri-versalidade, como diz Mignolo (2003), ou de certa forma, uma Multidão (de que nos falam Hardt e Negri, 2005).

Da mesma forma, Milton Santos (2000) e Boaventura de Souza Santos (2004) deixam claro que as alternativas estão no sul (ou nas Vozes do Sul, em termos de Boaventura de Souza Santos 2004). Especificamente, Milton Santos (2000) observa a importânca da cultura popular que "põe em relevo o cotidiano dos pobres, das minorias, dos excluídos, por meio da exaltação da vida de todos os dias". Igualmente, seguindo uma visão pós-colonial, os críticos culturais Venn (2000), Mignolo (2000) e Scott (1999) querem colocar em destaque uma outra lógica, que questione o ocidentalismo universalista que persiste no Império, o que nos faz recordar Edward Said (1976), uma vez que, como adequadamente aponta Mignolo (2000: 58), "sem Ocidentalismo não existe nenhum Orientalismo"10 10 . No original em inglês: " without Occidentalism there is no Orientalism" (Mignolo, 2000: 58) e nem "latino-americanismo", como indica Gutiérrez Estevez (1997).

Mignolo (2000) sugere então um modo de produzir conhecimento que constitua uma episteme das margens ou o que ele chama de pensamento nas margens ("border thinking"), que põe em xeque uma epistemologia territorializada, ou seja, uma epistemologia fundada em uma língua nacional e, portanto, em um estado-nação, que não parece fazer sentido no mundo constituído por fronteiras porosas em que vivemos. Essa teorização, portanto, escapa da visão tradicional de periferias e centros, já que margens são entre-lugares onde o que é crucial são as incertezas da fronteira e o que aí é vivido, possibilitando "pensar de forma diferente, mover-se na direção de 'uma outra lógica'" (Mignolo: 2000: 69-70)11 11 . No original em inglês: "to think otherwise, to move toward 'an other logic'" (Mignolo: 2000: 69-70) .

Para esse autor, tal epistemologia de fronteira só é possível da perspectiva da subalternidade, ecoando, dessa forma, Milton Santos, Boaventura de Souza Santos, Mushakoji e Zizek, como já apontei. A tarefa para o pensamento nas margens é recriar ou reconstruir os designs globais por meio das histórias locais. Ou, como aponta Mignolo (2000: 39), uma tare-fa que envolve "a rearticulação e apropriação dos designs globais pelas e da perspectiva das histórias locais" (Mignolo, 2000: 39)12 12 . No original em inglês: "the rearticulation and appropriation of global designs by and from the perspective of local histories" (Mignolo, 2000: 39). . Isso significa colocar em jogo uma outra forma de conhecimento, que desautoriza lógicas universais da modernidade, e prestigia o entrelaçamento de múltiplas histórias locais ou o que já chamei de heterogeneidade discursiva ou semiodiscursividade, possibilitando performances de identidades sociais alternativas para enfrentar o mundo como se apresenta.

O posicionamento nas margens traz para a discussão a necessidade de re-teorizar o conceito de língua como também o de língua nacional, uma vez que focaliza a língua em uso na fronteira ou nas margens. Essa não coincide com o projeto de fazer uma língua corresponder a um estadonação e a seus limites territoriais: uma experiência que tem aumentado em um mundo híbrido de fronteiras porosas como o nosso. Conforme ressalta Mignolo (2000: 229), "o estado atual da globalização questiona cotidianamente - através da expansão do capital, novos circuitos financeiros, tecnoglobalismo e migrações massivas - ideais nacionais e princípios sobre a pureza da língua" (Mignolo, 2000: 229)13 13 . No original em ingles: "the current stage of globalization is daily questioning - through the expansion of capital, new financial circuits, technoglobalism, and massive migrations - national ideals and principles about the purity of language" (Mignolo, 2000: 229). , tornando possível viver na transição ou no movimento entre culturas e línguas. Um fenômeno que se relaciona de perto com o chamado Inglês Global ou Ingleses Mundiais, aos quais vou me referir mais adiante.

É verdade, porém, que essa experiência já fazia e faz parte da vida de muitas populações multilíngües, que não operam com as noções de língua que a academia e as instituições governamentais usam (Makoni e Meinhoff, 2006 e Pennycook e Makoni, 2005). Da perspectiva desses dois últimos pesquisadores, "as línguas não pré-existem seus usos como se fossem objetos no mundo" (Pennycook e Makoni, 2005: 152)14 14 . No original em ingles: "languages do not pre-exist their use as if they were objects in the world" (Pennycook e Makoni, 2005: 152) , sendo necessário, portanto, desinventar o conceito de língua a que estamos acostumados (Pennycook, 2004: 6). Essa questão que nos introduz a uma visão performativa das línguas também remete aos usos criativos que as pessoas, cada vez mais, fazem de outras línguas e outros discursos e culturas, sem prestar contas de tais usos a quem quer que seja, a não ser a seus próprios projetos identitários e suas performances em suas ações cotidianas, à luz dos outros que as circundam e, claro, orientadas por contingências macro-sociais.

Performatividade

O último construto que desejo incluir nessa epistemologia de fronteira é o de performatividade. Tal construto é derivado do pensamento de Austin (1962), em sua teoria dos atos da fala, que mostra, ecoando o próprio título de seu livro: como fazemos coisas no mundo, ou seja, performances, por meio das palavras. Essa teoria teve uma grande influência nos ajudando a ver a linguagem como ação no aqui e no agora ou o caráter performativo da linguagem em uso. Ao elaborar uma compreensão desessencializada do gênero, Butler (1990 e 2004) faz uso dessa mesma teoria, para mostrar a natureza performativa do gênero, ao argumentar que "o gênero mostra-se performativo - constitui a identidade que pretende ser. Assim, o gênero é sempre um fazer, embora não seja um fazer realizado por um sujeito de quem se possa dizer que pré-exista à ação" (Butler, 1990: 25)15 15 . No original em inglês: "gender proves to be performative - that is constituting the identity it is purported to be. In this sense, gender is always a doing, though not a doing by a subject who might be said to preexist the deed" (Butler, 1990: 25) , ou seja, nós não possuímos as características de um gênero que exista antes da performance, mas produzimos nosso gênero por meio das coisas que fazemos. Ou, como Cameron (1997: 49) ressalta, "o gênero não tem a ver com características que temos, mas são efeitos que produzimos por meio das coisas específicas que fazemos" (Cameron, 1997: 49)16 16 . No original em inglês: "gender is not traits we have, but effects we produce by way of particular things we do" (Cameron, 1997: 49). . Essas idéias têm alimentado teorias feministas e queer mais recentes (cf.: Jagose, 1996 e Moita Lopes, 2006), que têm colocado em xeque idéias naturalizadas e normalizadoras sobre gênero e sexualidade.

Há nessa tradição a influência clara de Foucault em relação à natureza discursiva das identidades (uma visão que tem sido de muita relevância em minha pesquisa - veja , por exemplo, meu livro Identidades Fragmentadas de 2002), mas Butler (1990) vai além ao advogar como as repetições de performances de gênero, reguladas por normas cuidadosamente determinadas, acabam por gerar uma "aparência de substância" para o que é dado no aqui e no agora. Como esclarece Butler ainda mais (1990: 33), "o gênero é a estilização repetida do corpo, um conjunto de atos repetidos dentro de um enquadre altamente regulador que congela com o passar do tempo para produzir a aparência de substância, de um modo natural de ser" (Butler, 1990: 33)17 17 . No original em inglês: "gender is the repeated stylization of the body, a set of repeated acts within a rigid regulatory frame which congeals over time to produce the appearance of substance, of a natural kind of being" (Butler, 1990: 33). , necessitando ser continuamente reafirmado.

A relevância desse insight se prende ao fato de que possibilita ver a linguagem como um lugar de ação no mundo e, principalmente, como performativa (Pennycook, 2003 e 2004), já que construímos o gênero e outras identidades sociais por meio de performances, ou seja, as identidades não são dadas antecipadamente. É uma visão radicalmente diferente de outras que entendem que a linguagem só reflete a vida social (confira, igualmente, autores que seguem esse posicionamento crítico, tais como Cameron, 1997; Fairclough, 2003; Moita Lopes, 2002 e 2003 e Fabrício, 2004). Como diz Pennycook (2004: 13), "precisamos, portanto, ter uma teoria de como a transformação social opera através dos usos lingüísticos em vez de entender todo uso da linguagem como um modo de espelhar o social"18 18 . No original em ingles: "we need therefore to have a theory of how social transformation operates through linguistic use rather than seeing all language use as mirroring the social" (Pennycook, 2004: 13). Essa visão torna possível ver a linguagem não de forma essencializada, como um sistema dado anteriormente ao uso, "atado à etnia, território, nascimento e nação" (Pennycook, 2004: 7), mas sim como emergindo da interação social, abrindo, assim, a possibilidade de agência e resistência no mundo.

O que é útil dessa teorização, para meu argumento, é a idéia de que ver a linguagem como performativa possibilita entender que estar no mundo social é um ato de operar com as línguas, discursos e culturas disponíveis no aqui e no agora para construí-lo, não somente com base em significados já dados, mas também com base naqueles que nós mesmos podemos gerar, à luz de quem somos ou podemos ser em nossas histórias locais, portanto, em nossas performances. Ou seja, uma visão performativa de linguagem como parte de uma teorização nas margens constitui uma alternativa para lidar com os designs globais em termos de quem somos em nossas históricas locais, não no sentido de manter uma essência identitária, mas de re-inventar a vida social de modo a "imaginar e construir o que poderíamos ser" (Foucault, 1995: 239).

Essa visão de re-estruturação dos designs globais não quer dizer, porém, que desconsidero seus interesses imperialistas, ideológicos e mercadológicos, mas que, me colocando nas margens, contemplo a possibilidade de lidar com tais interesses de outras formas, ou em outras performances. Por exemplo, como as pessoas em suas vidas locais agem ou podem agir em relação aos designs globais do inglês ao re-escrevê-los nas margens? Está claro que não concordo com a idéia que as pessoas necessariamente se entregam passivamente aos desígnios ideológicos da globalização, pois essa posição não contempla conflito, agência e resistência (Canagarajah, 1999). É uma alternativa para essa posição determinista que passo então a focalizar na construção de uma ideologia lingüística para os nossos tempos.

Re-escrevendo a relação entre inglês e globalização em um epistemologia de fronteira

A contribuição primeira sobre a re-escritura do inglês nas margens, na minha compreensão, vem do trabalho de Kachru (1985), normalmente conhecido como o paradigma dos Ingleses Mundiais, inaugurando uma perspectiva que, ao focalizar as variedades por meio das quais essa língua é usada no mundo, começa a construir uma língua descentrada. Embora uma série de críticas tenham sido formuladas a essa teoria (por exemplo, Krishnaswamy e Burde (1998) e Pennycook, 2003)19 19 . Krishnaswamy e Burde (1998) e Pennycook (2003) argumentam, por exemplo, que a teoria de Kachru (1985) constrói as identidades dos falantes como base nos estados-nação em que variedades do inglês são usadas, o que é bastante difícil de compreender uma vez que as próprias nações são contextos complexos do ponto de vista lingüístico, o que não possibilitaria a existência de uma variedade única em um contexto de inglês como segundo língua. Uma outra crítica diz respeito ao fato de que, ao quebrar a hegemonia da norma do falante nativo, a teoria criou outras normas, como a das elites de países no qual o inglês é usado como segunda língua, , é interessante recuperar esse paradigma por trazer à tona a existência de vários ingleses no mundo, quebrando a hegemonia da norma, representada pelo inglês do chamado falante nativo.

Kachru (1985) introduz um modelo composto por três círculos cocêntricos: o primeiro é o menor onde o inglês é a língua nativa e onde a norma é produzida (na Inglaterra, Estados Unidos, Austrália, por exemplo); o círculo seguinte é aquele um pouco maior que o primeiro onde o inglês é usado como segunda língua (na Índia, Nigéria, Cingapura, por exemplo); e o terceiro é o círculo em expansão onde o inglês é usado como língua estrangeira (como no caso do Brasil, Espanha, Chile, por exemplo). A dificuldade de compreender esse modelo é cada vez maior tendo em vista o modo como o inglês é atualmente falado no mundo como língua franca, tornando o círculo em expansão o principal, bem diferente do que está implícito no modelo inicial de Kachru, que prestigia o primeiro círculo como gerador da norma. Além disso, o fluxo entre as fronteiras permite que um brasileiro, por exemplo, fale inglês como segunda língua e, até mesmo, como primeira, dependendo de seu nível educacional ou de sua exposição à língua. A questão diz respeito, portanto, a quem o falante é e ao nível de proficiência na língua, e não a seu status como membro de um círculo ou de outro (como apontam Canagarajah, 1999, Pennycook, 2003, e Graddol, 2006, por exemplo). Assim, Kachru (2004) propôs a releitura desse modelo em termos de nível de proficiência.

Mas o que é interessante nessa discussão é que ela desequilibra o status do falante nativo e de sua norma, se ajustando bem a nossa posição teórica, que situa o inglês nas margens. É assim, por exemplo, que Mignolo (2000: 252) ressalta que "os valores nacionais colocados nas línguas... não mais correspondem à experiência transnacional de uma parte significativa da população, como também [a sua] experiência translingüística" 20 20 . No original em inglês: "the national values placed on languages ... no longer correspond with the transnational experience of a significant part of the population as well as with [their] translanguage experience" (Mignolo, 2000: 252) , chamando atenção para a enorme força que, por exemplo, o inglês tem fora dos Estados Unidos e Inglaterra assim como o espanhol fora da Espanha e o francês no mundo francófono (Mignolo, 2000: 239). Nesse sentido, deve ser lembrado o projeto de lingüística de corpus, coordenado por Barbara Seidlhoffer, na Universidade de Vienna, VOICE - Vienna-Oxford International Corpus of English (http://www.univie.ac.at/voice), que tem, como objetivo, o estudo do inglês usado em interações orais como língua franca, envolvendo até agora aproximadamente 800 falantes de 50 primeiras línguas diferentes. Ou seja, interessa saber nesse projeto como os chamados falantes não-nativos usam o inglês entre eles mesmos, construindo uma língua intrinsecamente híbrida e instável (como diz Rajagopalan, 2006). Vai ser curioso ver o que os resultados desse projeto vão poder demonstrar em relação a esses ingleses, principalmente, devido a sua instabilidade.

O corolário dessa problematização do inglês é a perda do status dos chamados falantes nativos, sobre a qual Rajagopalan (no prelo, 2004 e 2006) tem escrito continuamente. Em um artigo recente, o referido autor (no prelo) resenha o livro de Alan Davies (2003), intitulado The native speaker: myth or reality, deixando claro que o falante nativo é o produto da imaginação teórica, não existindo na vida cotidiana. Afirma que "o 'Inglês Mundial' é influenciado principalmente pela necessidade e capacidade dos falantes se virarem em situações majoritariamente multilíngües" (Rajagopalan, no prelo: 7)21 21 . No original em inglês: "'World English' is influenced to a considerable extent by its speakers' need and capacity to manoeuvre their ways through mostly multilingual situations" (Rajagopalan, no prelo: 7) . Rajagopalan (2004: 112) entende ainda que o Inglês Mundial "pertence a todos que o falam, mas não é a língua materna de ninguém"22 22 . No original em inglês: "belongs to everybody who speaks it, but is noboby's mother tongue" (Rajagopalan, 2004: 112) , ou ainda, provocativamente, argumenta, em 2006, que "em nosso mundo globalizado, os chamados nativos (de qualquer língua, mas especialmente de línguas que se espalharam pelo globo por qualquer razão que seja) são uma espécie em extinção" (Rajagopalan, 2006: 99)23 23 . No original em inglês: "in our globalized world, the so-called natives (of any language, but especially of languages that have spread across the globe for whatever reason) are a species in extinction" (Rajagopalan, 2006: 99). .

Tendo em vista a preponderância do Inglês Global em número de falantes e em situações de uso, no mundo, como já apontei anteriormente, Graddol (2006) chega a afirmar que, em breve, os falantes da Inglaterra, Estados Unidos e Austrália, por exemplo (os países do chamado primeiro círculo de Kachru, 1985), necessitarão aprender a usar um inglês compreendido internacionalmente, que é falado fluentemente por bilíngües com o sotaque original de sua primeira língua. Graddol (2006) recomenda inclusive que se incluam características do ensino de inglês global no currículo de inglês nas escolas desses países. O chamado falante nativo foi, portanto, destronado. Decorre, assim, desse novo posicionamento, uma valorização do professor não-nativo de inglês, um dos pontos mais problemáticos na formação de professores, devido ao ideal inatingível de competência nativa para muitos professores estrangeiros com os quais ainda se opera. Creio que estamos novamente caminhando em um pensamento nas margens. E é assim que Mignolo (2000: 220) nos exorta a contemplar as línguas de outra forma, isto é, de modo transnacional e transimperial.

É também um pensamento nas margens que possibilita o trabalho de Gloria Anzaldúa (1999), Borderlands/La frontera: the new mestiza, no qual ela continuamente atravessa o inglês com o seu espanhol chicano e vice-versa. Não estaria Anzaldúa usando essas línguas na fronteira de modo transnacional e transimperial, como argumenta Mignolo (2000)? Veja, a seguir, uma parte de um poema da autora como ilustração:

I write the myth in me, the myths I am, the myths I want to become. The word, the image and the feeling have a palpable energy, a kind of power. Con imágenes domo mi miedo, cruzo los abismos que tengo por dentro. Con palabras me hago piedra, pájaro, puente de serpientes arrastrando a ras del suelo todo lo que soy, todo lo que algún día seré. (Anzaldúa, 1999: 93)

O texto bilíngüe de Anzaldúa (1999) evidencia a performance de um modo de estar no mundo, ou seja, de estar na fronteira, para além dos limites de uma língua nacional específica, desarticulando esses marcos impostos pela ideologia do estado-nação, com magníficos efeitos discursivos. Tal performance é possibilitada pelas palavras no aqui e no agora, ou seja, a performance de uma identidade que não é dada anteriormente e que é construída no atravessamento de fronteiras, o que, aliás, Anzaldúa (1999) ressalta nesses versos: "Con palabras me hago piedra, pájaro, puente de serpientes ..."

E o que dizer de usos translingüísticos parecidos no mundo multilíngüe da Internet? Focalizo agora duas mensagens de e-mail entre um brasileiro e um espanhol:

Que língua é essa? É português? Espanhol? Inglês? Não seria uma língua de fronteira, que parece estar ficando cada vez mais comum, principalmente por causa do papel do Inglês Global, que não está restrito a nenhum território? Isso não seria também reflexo de um mundo que está se tornando mais multilíngüe, como, de fato, já comentei em relação a tais usos na Internet? As performances identitárias construídas aqui têm a ver com uma língua específica? São pré-existentes, atadas a uma nacionalidade? As normas do chamado inglês padrão são obedecidas? Vejam, nesse sentido, a primeira sentença do primeiro e-mail: "That will be wonderful to meet you ..." em vez de "It will be wonderful to meet you ... ." Pode-se dizer que se trata de evidencia do uso imperial do inglês e dos designs globais? Ou estariam as pessoas criando o seu próprio mundo lingüístico-identitário e expressando um modo de estar na vida social por meio dessas performances que não pré-existiam a seus usos?

Na música popular, percebe-se, internacionalmente, também, cada vez mais, a interpenetração de línguas. Isso é principalmente notado no rap global, que é parte dos fluxos culturais que hibridizam o mundo. Pennycook (2003) se refere a esse fenômeno como raplish, ao analisar raps em japonês e inglês ou em japinglês. O que me parece relevante é observar como um fenômeno musical, iniciado em um bairro nova-iorquino, com negros norte-americanos, tem seus discursos (modos de cantar, ritmo, língua e visões do mundo), apropriados, criativamente, em outras partes do mundo, no interesse de resistir à situação de miséria que muitas pessoas nas favelas e nos guetos vivem. Ou seja, os fluxos culturais nas fronteiras possibilitam performances identitárias cujos objetivos estão bem distantes de usos imperiais do inglês e que, portanto, não podem ser compreendidos com base em definições pré-existentes de quem as pessoas são antes dos usos performativos no rap (Pennycook, 2003).

Mais do que interpenetração do inglês e do português, no rap brasileiro, pelo pouco que pude perceber na pesquisa que estou iniciando, constata-se, muitas vezes, a retomada de temas do mundo estado-unidense ou a apropriação de discursos globais, ou seja, hibridização discursiva, em performances identitárias locais de resistência. Isso quer dizer que as pessoas podem dar outros destinos aos designs globais (ao inglês e aos discursos que essa língua faz circular), colocando em questionamento as distinções entre centro e periferia, ao mostrar que o centro pode estar na periferia assim como a periferia no centro, como de fato indicam Hardt e Negri (2005: 214): "hoje em dia é preciso ser geógrafo para mapear a topografia da exploração".

Vejam, por exemplo, o rap de Marcelo D2, "Eu tiro é onda" (http://marcelo-d2.terra.com.br.letras) que é cantado em conjunto com Shabazz, um artista dos Estados Unidos, que usa inglês, sendo que um cantor menciona o outro no diálogo que constroem:

Eu vim do Rio de Janeiro a Nova York levado pelo som

No Andaraí, no Brooklin, só tem sangue bom

(....)

É isso aí, eu também sobrevivi

À essa guerra, Marcelo D2, Rio de Janeiro,

Eu tiro onda porque eu contrario a estatística, entendeu?

Então é melhor andar na linha

(....)

Em português ou inglês

A luta é a mesma: matenha-se vivo e paz

Em outro rap, "Viajando na balada" (http://somos-nós-ajustiça.letras.terra.com.br/), de um grupo chamado "Somos nós a justiça", percebe-se o mesmo fenômeno, com referências aos designs globais (tecnologia, Hollywood, Estados Unidos etc.), mas com a apropriação desses discursos em performances locais, com um uso criativo em inglês que copia a ordem do sintagma em português para Estados Unidos da América: "State United of America".

Viajando na balada

(...)

Falo a realidade verdade

Para que no futuro haja necessidade

Pra discutir com precisão de mais assuntos

Há se o caso num vier à tona

à tona UUUU OOOAAAIIOO Silver

Só lá em Hollywood

Onde os cineastas ganham bem e não se iludem

Viajei pela internet

Ponto com ponto br

State United of America

Pentágono, xerife do morro

(...)

É desse modo que o inglês e seus discursos são apropriados em performances identitárias, criadas e re-inventadas nas margens.

Uma palavra final: ideologia lingüística para tempos híbridos

Na ideologia lingüística que proponho, o inglês deixa de ser visto simplesmente como uma língua internacional, envolvida em imperialismo e na homogeneização do mundo, e passa a ser compreendido também como uma língua de fronteira da qual as pessoas se apropriam para agir na vida social (para viver, amar, aprender, trabalhar, resistir e ser humano, em fim), fazendo essa língua funcionar com base em histórias locais, não como mímica de designs globais, mas na expressão de performances identitárias, que não existiam anteriormente. Ao mostrar como as pessoas se apropriam de usos do inglês por meio de contato com outros grupos não hegemônicos, o rap, por exemplo, como uma parte importante da cultura popular contemporânea, situada como lugar de re-imaginação da política por Scott (1999), nos remete também à importância dada por uma série de estudiosos que já mencionei (Milton Santos, Boaventura de Souza Santos, Slavoj Zizek) às chamadas Vozes do Sul (os pobres e os deserdados) e à necessidade de pensar uma coligação anti-hegemônica (como diz Kinhide Mushakoji), ou até mesmo na força da Multidão (o construto de Hardt e Negri), para criar soluções para o mundo como se apresenta, com base nas negociações entre vida local e designs globais. Como aponta Canagarajah (2002: 257), falar de uma posição que enfatiza só o conhecimento local, fora da fronteira, universaliza, e, eu diria ainda, essencializa, não encorajando trocas que, ao atravessarem localidades diferentes, re-inventem a vida social.

O que estou sugerindo, portanto, é uma ideologia lingüística que entende o inglês global, uma língua descentrada, e seus usos em performances locais, como lugares de re-criação de uma anti-hegemonia, nos fluxos da fronteira, tornando possível contemplar outros futuros em outros discursos, construindo, assim, "uma outra globalização" (para lembrar mais uma vez Milton Santos). Considerando a sua natureza plural, os vários ingleses falados no mundo são lugares de muitos discursos, de contradições, de conflitos, de luta, de heterogeneidade discursiva ou de semiodiversidade, tornando possível aventar essa outra globalização. Os donos desses ingleses são, dessa forma, aqueles que os usam e fazem deles o que desejam, se re-inventando em novas performances identitárias e recriando o mundo. As margens são lugares que conduzem a essa inspiração e seus limites devem ser ainda mais ampliados com políticas de multilíngüismo por meio das quais possamos circular em outras línguas para além dos ingleses: um fato cada vez mais compreendido como típico do mundo em que vivemos, como, anteriormente, já frisei.

Nessa teorização nas margens, não estaria o inglês atualmente, viabilizando, de uma forma ainda mais profunda, a famosa praga de Caliban, um dos personagens mais instigantes de A Tempestade de Shakespeare?

You gave me language, and my profit on't

Is I know how to curse. The red plague rid you

For learning me your language! (The Tempest, William Shakespeare, I, ii, 363-368)

A lógica que estou usando aqui não descarta a necessidade de ter consciência crítica do fenômeno da globalização como um modo descentrado e, muitas vezes, centrado, de orientar o mundo através do Império, nos alertando para seus interesses imperiais, inclusive aqueles de natureza lingüístico-discursiva. Tal lógica não me impede, porém, de refletir sobre o inglês e o mundo contemporâneo, em uma teorização, que, das margens, considera as relações entre os designs globais e as histórias locais, vislumbrando como proporcionam performances que reformulam tais designs por meio de agenciamento e resistência.

Não se trata, portanto, de uma lógica disso ou daquilo, mas sim de uma lógica tanto disso como daquilo, como prefere articular Scott (1999), em outro contexto teórico: uma lógica que me parece adequada para nossos tempos híbridos. Pela força que os muitos ingleses que nos circundam têm, eles podem nos dar algumas das palavras de que precisamos para recriar nossos futuros ou imaginar futuros alternativos. Ou, para finalizar, citando o poeta caribenho Kamau Braithwaite:

I

must be given words to shape my name

to the syllables of trees

I

must be given words to refashion futures

like a healer's hand. (Kamau Braithwaite, Negus, The Arrivants)

Recebido em outubro de 2007

Aprovado em maio de 2008

E-mail: moitalopes@oi.com.br

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  • *
    Sou grato ao CNPq (306756/2006-4 e 400340/2007-0) e à FAPERJ (E-26/100.575/2007 - Programa Cientistas do Nosso Estado) pelos auxílios à pesquisa que possibilitaram a investigação relatada aqui.
  • 1
    . Tradução do original em espanhol: "El inglés en el mundo de hoy es un mal necesario, lo necesitamos si o si" (Niño-Murcia, 2003: 131).
  • 2
    . No original em inglês: "...groups are no longer tightly territorialized, spatially bounded, historically unselfconscious, or culturally homogeneous" (Appadurai, 1991: 191). Cabe aqui questionar, todavia, se as pessoas foram algum dia, de fato, homogêneas do ponto de vista cultural.
  • 3
    . No original em inglês: "beliefs, or feelings, about languages as used in their social worlds" (Kroskrity, 2004: 498)
  • 4
    . No original em espanhol: "siempre la lengua fue compañera del imperio"
  • 5
    . No original em inglês: "prophetic, in that throughout the conquest of the Americas, and the centuries of colonialism, language was used by the Spanish as a tool for conquest to consolidate political power, to spread the Catholic faith, and to unify the empire" (La Rosa, 1995: 1)
  • 6
    . No original em inglês: "languages are coming to be treated more and more as economic commodities, ... displacing traditional ideologies in which languages were primarily symbols of ethnic or national identity" (Block e Cameron, 2002: 5).
  • 7
    . No original em inglês: "all of us inhabit an interdependent world ... , which is marked by borrowing and lending across porous cultural boundaries, and saturated with inequality, power, and domination" (Rosaldo, 1988: 87)
  • 8
    . No original em inglês: "a communicational concept, which alternately masks and transmits cultural and economic meanings" (Jameson, 1998: 55)
  • 9
    . No original em espanhol: "En Brasil, los españoles ocuparon en 1999 el segundo lugar con el 28 por ciento de las inversiones extranjeras; en Argentina pasaron al primero puesto, desplazando a Estados Unidos el mismo año"
  • 10
    . No original em inglês: " without Occidentalism there is no Orientalism" (Mignolo, 2000: 58)
  • 11
    . No original em inglês: "to think otherwise, to move toward 'an other logic'" (Mignolo: 2000: 69-70)
  • 12
    . No original em inglês: "the rearticulation and appropriation of global designs by and from the perspective of local histories" (Mignolo, 2000: 39).
  • 13
    . No original em ingles: "the current stage of globalization is daily questioning - through the expansion of capital, new financial circuits, technoglobalism, and massive migrations - national ideals and principles about the purity of language" (Mignolo, 2000: 229).
  • 14
    . No original em ingles: "languages do not pre-exist their use as if they were objects in the world" (Pennycook e Makoni, 2005: 152)
  • 15
    . No original em inglês: "gender proves to be performative - that is constituting the identity it is purported to be. In this sense, gender is always a doing, though not a doing by a subject who might be said to preexist the deed" (Butler, 1990: 25)
  • 16
    . No original em inglês: "gender is not traits we have, but effects we produce by way of particular things we do" (Cameron, 1997: 49).
  • 17
    . No original em inglês: "gender is the repeated stylization of the body, a set of repeated acts within a rigid regulatory frame which congeals over time to produce the appearance of substance, of a natural kind of being" (Butler, 1990: 33).
  • 18
    . No original em ingles: "we need therefore to have a theory of how social transformation operates through linguistic use rather than seeing all language use as mirroring the social" (Pennycook, 2004: 13).
  • 19
    . Krishnaswamy e Burde (1998) e Pennycook (2003) argumentam, por exemplo, que a teoria de Kachru (1985) constrói as identidades dos falantes como base nos estados-nação em que variedades do inglês são usadas, o que é bastante difícil de compreender uma vez que as próprias nações são contextos complexos do ponto de vista lingüístico, o que não possibilitaria a existência de uma variedade única em um contexto de inglês como segundo língua. Uma outra crítica diz respeito ao fato de que, ao quebrar a hegemonia da norma do falante nativo, a teoria criou outras normas, como a das elites de países no qual o inglês é usado como segunda língua,
  • 20
    . No original em inglês: "the national values placed on languages ... no longer correspond with the transnational experience of a significant part of the population as well as with [their] translanguage experience" (Mignolo, 2000: 252)
  • 21
    . No original em inglês: "'World English' is influenced to a considerable extent by its speakers' need and capacity to manoeuvre their ways through mostly multilingual situations" (Rajagopalan, no prelo: 7)
  • 22
    . No original em inglês: "belongs to everybody who speaks it, but is noboby's mother tongue" (Rajagopalan, 2004: 112)
  • 23
    . No original em inglês: "in our globalized world, the so-called natives (of any language, but especially of languages that have spread across the globe for whatever reason) are a species in extinction" (Rajagopalan, 2006: 99).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Set 2009
    • Data do Fascículo
      2008

    Histórico

    • Recebido
      Out 2007
    • Aceito
      Maio 2008
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