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MARTIN, J.R. 2013. Systemic functional grammar: a next step into the theory - axial relations. Beijing: Higher Education Press

Systemic Functional Grammar; Axial Relations; Systems

Gramática Sistêmico-Funcional; Relações Axiais; Sistemas

As duas reações imediatas do leitor ao vislumbrar o título da obra de J. R. Martin talvez sejam: (1) Por que "um próximo" passo em relação à teoria e (2) Por que "relações axiais"?

"Um próximo" passo porque o "primeiro" foi dado na obra de Christian Matthiessen e Michael Halliday publicada em 2009 pela mesma editora1 1 Matthiessen, C.M.I.M.; Halliday, M.A.K. 2009. Systemic Functional Grammar: a first step into the theory. Beijing: Higher Education Press. , também em edição bilíngue inglês/chinês. As "relações axiais" se devem ao fato de o autor partir do pressuposto indicado por Saussure de que a língua é um sistema de relações e que essas relações são estabelecidas em duas dimensões, ou "eixos": o paradigmático e o sintagmático.

As relações axiais, portanto, são a base sobre a qual o próximo passo na obra de Martin se fundamenta, além de seguir uma concepção crucial na Linguística Sistêmico-Funcional (LSF): a ideia de desdobramento, de expansão, de desenvolvimento, isto é, os textos se desdobram, se expandem, se desenvolvem para que os sentidos sejam construídos.

Assim, com base no fluxo de desdobramento seguido pelos textos para construir sentidos, no capítulo 1 (Axis), Martin expõe a proposta de eixo a partir dos conceitos teóricos de Saussure sobre signo, significante/significado e valor e, daí, para os desenvolvimentos propostos por Hjelmslev a partir da teoria saussureana e a relação entre os planos conteúdo/expressão e forma/substância. De Hjelmslev, Martin nos guia para Firth e deste para Halliday, para chegarmos às relações sintagmáticas e paradigmáticas na LSF.

Estabelecido o arcabouço teórico, no capítulo 2 - Basic systems (for words) - são apresentadas as maneiras como são representados os sistemas na gramática e como são realizadas as notações sistêmicofuncionais para representação desses sistemas, bem como as noções de tipologia e de topologia. Para ilustrar o funcionamento dos sistemas e de como estes são constituídos, são apresentadas e discutidas as representações de um sistema simples de pronomes (o da língua inglesa) e de um sistema complexo (o do tagalo, idioma falado na República das Filipinas).

A partir dos sistemas para palavras, o capítulo 3 - More Systems (for strucutres) - aborda o nível mais amplo das estruturas, compostas por mais de uma unidade, tomando por base os conceitos de análise componencial, classe, sintagma, função e estrutura e, como ilustração de como se estruturam, são apresentados os sistemas de MODO2 2 Sigo aqui o mesmo procedimento usado pelo autor na obra de representar os sistemas em versalete (small caps), isto é, letras maiúsculas nas dimensões dos minúsculas. para o inglês e para o tagalo.

A forma como os sistemas são organizados na LSF é o foco do capítulo 4 (System networks: metafunction and rank), com ênfase nas ideias de metafunção e de nível. O conceito de metafunção está relacionado aos tipos de significados por meio dos quais a língua constrói sentidos para compor o discurso e são organizados em três tipos: ideacionais, interpessoais e textuais. A noção de nível está relacionada à relação das partes (fonema, letra, sílaba, palavra, frase, oração, período, texto, discurso, gênero) com o todo da língua. O capítulo objetiva levar o leitor a compreender como os conceitos de metafunção e de nível estão, na verdade, relacionados a conceitos mais fundamentais das relações entre sistema/estrutura na LSF.

Descritos esses sistemas e estruturas, no capítulo 5 (System networks: stratification) Martin explora os meios pelos quais os sistemas se organizam na LSF com base na proposta de estratificação. Na teoria sistêmico-funcional, a estratiicação está relacionada aos níveis de abstração por meio dos quais a língua constrói sentidos simultaneamente em três estratos: grafo-fonológico, léxico-gramatical e semântico-discursivo. A relação entre esses níveis é denominada realização, isto é, o estrato grafo-fonológico realiza o estrato léxico-gramatical que, por sua vez, realiza o estrato semântico-discursivo. Para ilustração desses sistemas, Martin utiliza os sistemas de MODO e TAGGING3 3 TAGGING é uma estrutura típica da língua inglesa que, grosso modo, tem por função confirmar uma informação anteriormente dada pelo enunciador. Por analogia, seria a maneira como confirmamos em português com o "não é/né?", ou como em francês utilizam o "n'est pas?". para a língua inglesa e a ligação entre estratificação e metáfora gramatical, relacionando-as aos sistemas de MODO e de MODALIDADE.

Por fim, o capítulo 6 (Beyond grammar: axial perspectives) foca em aspectos "além da gramática", ou seja, aqueles relacionados ao contexto e a questões de discurso. O autor considera o modo pelo qual os sistemas são usados para analisar o léxico como um nível de delicadeza4 4 Delicadeza (delicacy) é o princípio da LSF em que o sistema linguístico é ordenado do ponto de visto do eixo paradigmático. da gramática, o que conduz à exploração tanto intra quanto entre-estratos, além de possibilitar a interpretação do contexto a partir de uma perspectiva probabilística sobre os sistemas linguísticos.

Esses seis capítulos são complementados por dois apêndices. O primeiro com um glossário dos termos utilizados no livro e o segundo com as convenções sistêmicas para a notação dos sistemas. Conforme nota do autor, esse apêndice é praticamente uma reprodução das notações sistêmicas apresentadas por Matthiessen e Halliday no texto de 2009.

A relevância da obra na (e para a) LSF é apontada por Michael Halliday na Introdução ao trabalho de Martin. Halliday (p. vii) afirma que muito tem sido ensinado sobre os princípios e sobre a prática de usar os sistemas, mas ninguém havia produzido um manual para isso, isto é, uma introdução sistematizada e projetada exclusivamente para esse fim.

Por essa razão, o trabalho de Martin representa uma contribuição essencial para professores, alunos, pesquisadores e estudiosos em LSF - assim como para aqueles interessados em Linguística e em gramática, em sentido mais amplo - interessados tanto em aprofundar seus conhecimentos sobre os aspectos sistêmicos da teoria quanto em esboçar seus próprios modelos de sistemas de acordo com os fenômenos linguísticos que estudam. Uma obra mais do que bem-vinda!

  • * Esta resenha foi produzida durante meu estágio pós-doutoral realizado na Universidade de Sydney, Austrália, com bolsa CAPES (processo BEX-9427/13-9), instituição a quem sou grato.
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    Matthiessen, C.M.I.M.; Halliday, M.A.K. 2009. Systemic Functional Grammar: a first step into the theory. Beijing: Higher Education Press.
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    Sigo aqui o mesmo procedimento usado pelo autor na obra de representar os sistemas em versalete (small caps), isto é, letras maiúsculas nas dimensões dos minúsculas.
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    TAGGING é uma estrutura típica da língua inglesa que, grosso modo, tem por função confirmar uma informação anteriormente dada pelo enunciador. Por analogia, seria a maneira como confirmamos em português com o "não é/né?", ou como em francês utilizam o "n'est pas?".
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    Delicadeza (delicacy) é o princípio da LSF em que o sistema linguístico é ordenado do ponto de visto do eixo paradigmático.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    Maio 2014
  • Aceito
    Maio 2014
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