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O plano de texto do artigo científico: caracterização e perspectivas didáticas

The research article’s text plan: characterization and didactic perspectives

RESUMO

Este artigo tem como objetivo explicitar as principais propriedades dos planos de texto de quatro artigos científicos produzidos em áreas disciplinares distintas (Ciências vs. Ciências Sociais e Humanas/Humanidades), com vista a uma aplicação ao ensino de gêneros, no âmbito da promoção do letramento acadêmico e, mais especificamente, da didática dos gêneros. Privilegia-se o quadro teórico do Interacionismo Sociodiscursivo (Bronckart [1997] 1999______. 1999. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. Trad. Anna Rachel Machado. São Paulo: EDUC (1a ed. Delachaux et Niestlé, 1997)., 2010BRONCKART, Jean-Paul. 2010. La vie des signes en questions: des textes aux langues et retour. In: Brito, A. M.; Silva, F.; Veloso, J.; Fiéis, A. (Eds.). Textos Seleccionados, XXV Encontro Nacional da Associação Portuguesa de Linguística. Porto: APL, p. 11-40.), as propostas da escola de língua francesa da Linguística Textual (Adam 2001ADAM, Jean-Michel. 2013. Problèmes du texte. Pré publications. Université d’Aarhus. Disponível em: <Disponível em: http://cc.au.dk/fileadmin/dac/Arrangementsfoto/Prepub_no_200_-_nov_2013.pdf > Acesso em: 11 dez. 2018.
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) e os princípios da Didática dos Gêneros (Schneuwly e Dolz 2004SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. 2004. Gêneros orais e escritos na escola. Trad. G. S. Cordeiro e R. Rojo. Campinas, SP: Mercado de Letras.; Dolz e Gagnon 2008______; GAGNON, Roxane. 2008. Le genre du texte, un outil didactique pour développer le langage oral et écrit. Pratiques: 179-198. Disponível em: <http://pratiques.revues.org/1159> Acesso em: 10 fev. 2019.
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; Dolz 2011DOLZ, Joaquim. 2011. A Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro: uma contribuição para o desenvolvimento da aprendizagem da escrita. Salto para o Futuro 21, (11), 4-9. Disponível em: <Disponível em: https://archive-ouverte.unige.ch/unige:23150 >. Acesso em: 15 fev. 2019.
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). Para tal, foi adotada uma abordagem descendente, partindo do social para os textos e privilegiando uma metodologia de análise qualitativa de cunho descritivo, de acordo com a qual se procedeu à análise comparativa das propriedades de quatro exemplares do gênero artigo científico, inscritos em diferentes áreas de investigação. Os dados obtidos mostram a grande flexibilidade do gênero artigo científico a nível do plano de texto, sendo evidenciadas diversas adaptações em função da área de investigação em que cada texto é produzido.

Palavras-chave:
Plano de texto; Artigo científico; Gêneros acadêmicos; Ensino dos gêneros

ABSTRACT

This paper’s goal is to describe the text plans’ main properties of four research articles produced within different areas (Sciences vs. Social and Human Sciences/Humanities), in order to apply the results in genre teaching, within the fields of academic literacy and genre pedagogy. The adopted theoretical framework includes Sociodiscoursive Interactionism main assumptions (Bronckart [1997] 1999______. 1999. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. Trad. Anna Rachel Machado. São Paulo: EDUC (1a ed. Delachaux et Niestlé, 1997)., 2010BRONCKART, Jean-Paul. 2010. La vie des signes en questions: des textes aux langues et retour. In: Brito, A. M.; Silva, F.; Veloso, J.; Fiéis, A. (Eds.). Textos Seleccionados, XXV Encontro Nacional da Associação Portuguesa de Linguística. Porto: APL, p. 11-40.), French language school Text Linguistics’ proposals (Adam 2001ADAM, Jean-Michel. 2013. Problèmes du texte. Pré publications. Université d’Aarhus. Disponível em: <Disponível em: http://cc.au.dk/fileadmin/dac/Arrangementsfoto/Prepub_no_200_-_nov_2013.pdf > Acesso em: 11 dez. 2018.
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), and Genre Didactic main principles (Schneuwly e Dolz 2004SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. 2004. Gêneros orais e escritos na escola. Trad. G. S. Cordeiro e R. Rojo. Campinas, SP: Mercado de Letras.; Dolz e Gagnon 2008______; GAGNON, Roxane. 2008. Le genre du texte, un outil didactique pour développer le langage oral et écrit. Pratiques: 179-198. Disponível em: <http://pratiques.revues.org/1159> Acesso em: 10 fev. 2019.
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; Dolz 2011DOLZ, Joaquim. 2011. A Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro: uma contribuição para o desenvolvimento da aprendizagem da escrita. Salto para o Futuro 21, (11), 4-9. Disponível em: <Disponível em: https://archive-ouverte.unige.ch/unige:23150 >. Acesso em: 15 fev. 2019.
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). A top-down approach was adopted, including a qualitative-descriptive analysis. It focused on four texts of the genre research article, which were produced within different disciplinary areas. Analyzed data show a significant flexibility of the research articles’ text plans. Several adaptations were identified, which seem to be due to the research field within which each text was produced, namely to their typical discourse practices.

Key-words:
Text plan; Research article; Academic genres; Genre teaching

1. Introdução

Nesta pesquisa, reflete-se acerca do plano de texto do gênero artigo científico, tendo como principais objetivos identificar e sistematizar as suas propriedades com vista a uma aplicação ao ensino. Nos últimos anos, têm sido sublinhadas, em Portugal, as dificuldades sentidas por estudantes dos diversos níveis de ensino, decorrentes, em parte, da falta de competências no que diz respeito ao domínio de gêneros escolares e acadêmicos (Gonçalves e Jorge 2018GONÇALVES, Matilde; JORGE, Noémia. (Orgs.). 2018. Literacia científica na escola. Lisboa: NOVA FCSH-UNL.). Essas constatações têm desembocado em estudos que destacam a necessidade de promover pesquisas acerca de gêneros usados nas instituições de ensino superior (cf. Silva e Santos 2013SILVA, Paulo Nunes da; SANTOS, Joana Vieira 2013. Contributos para a caracterização do género académico ‘Resposta de Desenvolvimento’. In SILVA, Roberval, et al. (Orgs.). Anais do III SIMELP (Simpósio Mundial de Estudos de Língua Portuguesa). Macau: Universidade de Macau, Simpósio n.º 39: 27-38., 2018SILVA, Paulo Nunes da; SANTOS, Joana Vieira. 2018. Do saber ao poder: estruturas retóricas e planos de texto nas Introduções de Teses de Doutoramento. In: AQUINO, Zilda; Paulo GONÇALVES-SEGUNDO, Paulo; PINTO, Alexandra Guedes. (Orgs.). Estudos do discurso. O poder do discurso e o discurso do poder, vol. 2. São Paulo: Editora Paulistana: 178-196.; Rosa 2018aROSA, Rute. 2018a. The Discursive Pattern of Academic Texts. In: COUTINHO, Maria Antónia, et al. (Eds.). Grammar and Text: Selected Papers from the 10th and 11th Fora for Linguistic Sharing. Newcastle upon Tyne: Cambridge Scholar Publishing: 42-57., 2018bROSA, Rute. 2018b. A noção de padrão discursivo: balanço e perspetivas. In: BROCARDO, Maria Teresa; CORREIA, Clara Nunes. Cadernos WGT. Balanços e perspetivas. Lisboa: Centro de Linguística da Universidade Nova: 1-6. Disponível em: <Disponível em: http://clunl.fcsh.unl.pt/wp-content/uploads/sites/12/2018/04/3_17WGT_Rosa.pdf > Acesso em: 8 de dez. 2018.
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).

O artigo científico tem sido objeto de múltiplas pesquisas e reflexões, com particular destaque para a área de Inglês para Fins Acadêmicos (Swales 1990______. 1990. Genre analysis. Cambridge: Cambridge University Press., 2004SWALES, J. 2004. Research genres. Cambridge: Cambridge University Press.). O modelo analítico e pedagógico baseado em movimentos e em passos que concretizam esses movimentos foi alargado a diversos gêneros acadêmicos (a tese de doutoramento, a dissertação de mestrado, o abstract, etc.), tendo gerado um vasto número de publicações no panorama internacional e obtendo um assinalável sucesso, independentemente da variedade dos contextos socioculturais em que é aplicado (Bunton 2002______. 2002. Generic moves in PhD Thesis Introductions. In : Flowerdew, J. (Ed.). Academic Discourse. London: Pearson Education, p. 57-75.; Motta-Roth e Hendges 2010MOTTA-ROTH, Désirée; HENDGES, Graciela Rabuske. 2010. Produção textual na universidade. São Paulo: Parábola Editorial.; Maswana, Kanamaro e Tajino 2015MASWANA, Sayako; KANAMARO, Toshiyuki; TAJINO, Akira. 2015. Move analysis of research articles across five engineering fields: what they share and what they do not. Ampersand 2: 1-11.; Adel e Moghadam 2015ADEL, Seyyed M. R.; MOGHADAN, Rokhsareh G. 2015. A Comparison of Moves in Conclusion Sections of Research Articles in Psychology, Persian Literature and Applied Linguistics. Teaching English Language 9 (2): 167-191.).

Em Portugal, todavia, são muito escassas as pesquisas que incidiram no artigo científico e, mais especificamente, nos planos de texto atestados em exemplares do gênero (Santos e Silva 2016SANTOS, Joana Vieira; SILVA, Paulo Nunes da 2016. Issues of textual hybridity in a major academic genre: PhD dissertations vs. research articles. Redis: Revista de Estudos do Discurso 5. Porto: CLUP-FLUP/FFLCH-USP: 171-193.). Tratando-se de um gênero maior do discurso acadêmico, é importante que as propriedades do artigo científico sejam conhecidas pelos estudantes do ensino superior quando são solicitados a ler e a escrever textos deste gênero. Entre essas propriedades, está o plano de texto, nomeadamente no que diz respeito à distribuição dos conteúdos e à divisão em seções. Aferir o grau de convencionalidade dos planos de texto de artigos de áreas disciplinares distintas constitui, de igual modo, um objetivo relevante (Adam 2002_____. 2002. Plan de texte. In: Charaudeau, Patrick; Maingueneau, Dominique. (Eds.). Dictionnaire d’analyse du discours. Paris: Seuil: 433-434.).

No âmbito do Interacionismo Sociodiscursivo (ISD), tem sido enfatizada a necessidade de se proceder a pesquisas sobre as características de gêneros, para os docentes poderem elaborar instrumentos didáticos. Entre esses instrumentos, contam-se os modelos didáticos e as sequências didáticas (Schneuwly e Dolz 2004SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. 2004. Gêneros orais e escritos na escola. Trad. G. S. Cordeiro e R. Rojo. Campinas, SP: Mercado de Letras.). A presente pesquisa constitui uma abordagem exploratória, que pretende testar a validade da análise efetuada, para possível aplicação posterior a um corpus mais representativo e a artigos científicos de outras áreas disciplinares.

Após a apresentação da revisão da literatura (seção 2) e do enquadramento teórico (seções 3 e 4), refletir-se-á acerca do conceito de plano de texto e das propriedades que deverão ser consideradas na sua análise (seção 5). Segue-se a caracterização sumária do gênero artigo científico, a apresentação do corpus e da metodologia adotada, e o estudo efetuado (seção 6). Por fim, serão sistematizadas as conclusões (seção 7).

2. Revisão da literatura

Nesta seção, apresentam-se algumas propostas e reflexões que incidiram a atenção no plano de texto do artigo científico. A área do Inglês para Fins Acadêmicos (English for Academic Purposes ou EAP) tem sido particularmente prolífica na análise e na teorização acerca desse gênero. Swales (1990______. 1990. Genre analysis. Cambridge: Cambridge University Press.) propôs um modelo da introdução do artigo científico, a partir de uma metáfora ecológica, segundo a qual o autor deve procurar, sucessivamente: i) delimitar um território (o que equivale a balizar a área genérica de pesquisa, mencionando estudos prévios); ii) delimitar um nicho (isto é, demonstrar que há um tema relevante que ainda não foi estudado); e iii) ocupar esse nicho (ou seja, apresentar a especificidade da pesquisa que efetuou, sublinhando sua importância). Esse modelo, simultaneamente analítico e pedagógico, compreende os três movimentos indicados e um conjunto mais alargado de passos que servem para concretizar os diversos movimentos. Cada passo é perspetivado retoricamente, articulando um tópico e o ato de fala que o autor concretiza quando o inclui no texto que escreve.

Inicialmente concebido para dar conta do plano de texto da introdução do artigo científico, esse modelo inspirou a análise e a teorização acerca de outros gêneros acadêmicos, como a tese de doutoramento (Bunton 2002______. 2002. Generic moves in PhD Thesis Introductions. In : Flowerdew, J. (Ed.). Academic Discourse. London: Pearson Education, p. 57-75.) e a dissertação de mestrado (Loan e Pramoolsook 2016LOAN, Nguyen T. T.; PRAMOOLSOOK, Issra. 2016. Master’s Theses written by Vietnamese and international writers: rhetorical structure variations. The Asian ESP Journal 12 (1): 106-127.). Note-se, contudo, que o modelo aplica-se geralmente a seções desses gêneros acadêmicos - como a introdução (Feak e Swales 2011FEAK, Christine B.; SWALES, John. 2011. Creating contexts: writing introductions across genres. Ann Arbour: University of Michigan Press.; Chen e Kuo 2012CHEN, Tsai-Yu; KUO, Chih-Hua. 2012. A genre-based analysis of the information structure of master’s theses in applied linguistics. The Asian ESP Journal 8 (1): 24-52.), a revisão da literatura (Kwan 2006KWAN, Becky. 2006. The schematic structure of literature reviews in doctoral theses of applied linguistics. Journal of English for Specific Purposes 25: 30-55.), a discussão (Liu e Buckingham 2018LIU, Yali; BUCKINGHAM, Louisa. 2018. The schematic structure of discussion sections in applied linguistics and the distribution of metadiscourse markers. Journal of English for Academic Purposes 34: 97-109.) e a conclusão (Bunton 2005BUNTON, D. 2005. The structure of PhD conclusion structures. Journal of English for Academic Purposes 4: 207-224.; Maswana, Kanamaro e Tajino 2015MASWANA, Sayako; KANAMARO, Toshiyuki; TAJINO, Akira. 2015. Move analysis of research articles across five engineering fields: what they share and what they do not. Ampersand 2: 1-11.; Adel e Moghadam 2015ADEL, Seyyed M. R.; MOGHADAN, Rokhsareh G. 2015. A Comparison of Moves in Conclusion Sections of Research Articles in Psychology, Persian Literature and Applied Linguistics. Teaching English Language 9 (2): 167-191.) - e, mais raramente, à totalidade dos exemplares de cada um desses gêneros (Paltridge e Starfield 2007PALTRIDGE, Brian; STARFIELD, Sue. 2007. Thesis and dissertation writing in a second language. A handbook for supervisors. New York: Routledge.).

No contexto brasileiro, a obra de Motta-Roth e Hendges (2010MOTTA-ROTH, Désirée; HENDGES, Graciela Rabuske. 2010. Produção textual na universidade. São Paulo: Parábola Editorial.) constitui um exemplo da aplicação do modelo originalmente proposto por Swales. As autoras refletem sobre e explicitam os movimentos e passos que se espera que ocorram nas diversas seções do artigo acadêmico (introdução, revisão da literatura, metodologia, análise e discussão dos resultados). Por exemplo, no que diz respeito à análise e discussão dos resultados, entre os passos expectáveis, contam-se a recapitulação de informações relativas à metodologia, a explicitação dos resultados da pesquisa, a avaliação das descobertas promovidas pelo estudo, a comparação dessas descobertas com a literatura prévia sobre o tema e a conclusão.

Em outra perspetiva - a dos Letramentos Acadêmicos (Fischer e Pelandré 2010FISCHER, Adriana; PELANDRÉ, Nilcéa Lemos. 2010. Letramento acadêmico e a construção de sentidos na leitura de um gênero. Perspectiva 28 (2): 569-599.; Fritzen e Fischer 2015FRITZEN, Maristela Pereira; FISCHER, Adriana. 2015. O PIBID como possibilidade de inserção de professores em formação em práticas de letramento acadêmico. Atos de Pesquisa em Educação 10 (2): 530-560.) -, as pesquisas focalizaram o gerenciamento das vozes em artigos científicos (Fischer e Hochsprung 2018FISCHER, Adriana; HOCHSPRUNG, Vitor. 2018. Prática de escrita na universidade: perspetiva dos letramentos acadêmicos sobre produções de estudantes de letras. Miguilim 6 (3): 44-66.) e o plano de texto (Fuza 2015FUZA, Ângela Francine. 2015. A constituição dos discursos escritos em práticas de letramento acadêmico-científicas. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada). Campinas, Universidade Estadual de Campinas.). Na tese de doutoramento de Fuza (2015FUZA, Ângela Francine. 2015. A constituição dos discursos escritos em práticas de letramento acadêmico-científicas. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada). Campinas, Universidade Estadual de Campinas.), procede-se a uma análise contrastiva das seções típicas de quatro artigos científicos de diversas áreas disciplinares (Engenharia, Enfermagem, História, Letras/Linguística, Ensino, Serviço Social). As seções pesquisadas foram as seguintes: introdução, metodologia, resultados, discussão, fundamentação teórica e conclusões, além dos elementos pré-textuais (título, autor e afiliação, resumo e palavras-chave); e pós-textuais (referências bibliográficas, resumo e palavras-chave numa segunda língua). Os resultados sublinham diferenças importantes entre as diversas disciplinas, indiciando a flexibilidade e a adaptabilidade do gênero em função da área de investigação em que o artigo é produzido.

Embora, no contexto brasileiro, já tenham sido realizados vários trabalhos e promovidas diversas publicações sobre o artigo científico, em Portugal, os estudos dedicados à caracterização e à didatização desse gênero (e, em particular, do seu plano de texto) são quase inexistentes. Seguindo o modelo de Swales (1990______. 1990. Genre analysis. Cambridge: Cambridge University Press.), o plano de texto de gêneros acadêmicos foi objeto de escassas pesquisas, que incidiram na tese de doutoramento e no artigo científico (Santos e Silva 2016SANTOS, Joana Vieira; SILVA, Paulo Nunes da 2016. Issues of textual hybridity in a major academic genre: PhD dissertations vs. research articles. Redis: Revista de Estudos do Discurso 5. Porto: CLUP-FLUP/FFLCH-USP: 171-193.) e em seções específicas da tese de doutoramento, como a introdução (Silva e Santos 2018SILVA, Paulo Nunes da; SANTOS, Joana Vieira. 2018. Do saber ao poder: estruturas retóricas e planos de texto nas Introduções de Teses de Doutoramento. In: AQUINO, Zilda; Paulo GONÇALVES-SEGUNDO, Paulo; PINTO, Alexandra Guedes. (Orgs.). Estudos do discurso. O poder do discurso e o discurso do poder, vol. 2. São Paulo: Editora Paulistana: 178-196.).

Os modelos inspirados em Swales (1990______. 1990. Genre analysis. Cambridge: Cambridge University Press.) têm conhecido uma significativa adesão e os resultados da sua aplicação (do ponto de vista da investigação e da didática) são reconhecidos. Contudo, pode-se associar a eles uma limitação, que decorre de sua aplicação aos exemplares de gêneros acadêmicos com uma estrutura do tipo IMRDC, ou seja, que integram as seções Introdução, Metodologia, Resultados, Discussão e Conclusão. Note-se que, nesse tipo de plano de texto, fortemente convencional (Adam 2002_____. 2002. Plan de texte. In: Charaudeau, Patrick; Maingueneau, Dominique. (Eds.). Dictionnaire d’analyse du discours. Paris: Seuil: 433-434.; cf. seção 5), a segmentação em seções e as respectivas designações não são específicas de um dado exemplar, mas constituem uma forma estável e mais ou menos generalizada de estruturar a maneira como se comunica a investigação (e, num certo sentido, a maneira como se faz a investigação). O plano IMRDC encontra-se generalizado entre as áreas disciplinares de Ciências (como a Biologia, a Química, as Ciências Farmacêuticas, etc.), que são de natureza eminentemente experimental, mas é menos usado em diversas áreas das Ciências Sociais e Humanas e das Humanidades (como o Direito, a Sociologia, as Ciências da Educação, a História, a Filosofia, a Literatura, etc.) - aliás, em algumas delas, nunca é adotado. Nessas áreas, em que predominam as pesquisas de natureza reflexivo-ensaística, é mais frequentemente adotado um plano por tópicos, que consiste na divisão em seções cujos conteúdos e etiquetas variam de acordo com o tema tratado e com as opções do autor. Constituem exceção as seções que enquadram o estudo, muitas vezes designadas introdução e conclusão5 5 . Podem ser usadas outras etiquetas equivalentes, como apresentação, considerações preliminares, considerações finais, reflexões finais, etc. (Swales 2004SWALES, J. 2004. Research genres. Cambridge: Cambridge University Press.) e que integram conteúdos equivalentes aos dos artigos com plano de texto IMRDC.

O presente estudo pretende contribuir para colmatar essa limitação. Proceder a uma análise preliminar de planos de texto de exemplares do gênero artigo científico permitirá identificar áreas críticas que mereçam pesquisas mais desenvolvidas e aprofundadas baseadas em corpora mais abundantes e representativos. Entre os objetivos deste artigo, conta-se o de incidir a atenção em exemplares cujos planos sejam variados, e não apenas naqueles que incluem planos do tipo IMRDC. Analisar textos do gênero artigo científico de Ciências, mas também de Ciências Sociais e Humanas e Humanidades, e refletir acerca dos seus planos sem recorrer ao modelo de Swales, possivelmente permitirá identificar e sublinhar outros aspetos que uma análise retórica não destaca porque não cabe nos seus objetivos principais. Questões como a identificação dos parâmetros contextuais subjacentes à produção de cada exemplar, a segmentação em seções (não) estereotipadas, as etiquetas (fixas ou variáveis) dessas seções, a coocorrência de outros textos (como o abstract, as referências bibliográficas, ou o índice de seções), os organizadores textuais e aspetos materiais (como a inclusão de gráficos, esquemas ou imagens, a distribuição do texto em colunas, o uso de negrito e outras formas de destaque do texto) podem constituir-se como relevantes objetos de análise que contribuam para a caracterização do gênero artigo científico.

O conhecimento prévio da diversidade de planos de texto atestada em exemplares reais é um pré-requisito para uma pedagogia adequada dos gêneros acadêmicos. Nesse sentido, uma análise comparativa entre textos do mesmo gênero produzidos no âmbito de diferentes áreas do conhecimento (cf. Fuza 2015FUZA, Ângela Francine. 2015. A constituição dos discursos escritos em práticas de letramento acadêmico-científicas. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada). Campinas, Universidade Estadual de Campinas.) parece ser produtiva e revelar-se enriquecedora do debate sobre o gênero artigo científico.

3. Gêneros de texto e perspetivas didáticas

No quadro do ISD, o texto é uma “unidade de produção de linguagem situada”, constituindo uma realização concreta do sistema linguístico numa situação comunicativa (Bronckart 2010BRONCKART, Jean-Paul. 2010. La vie des signes en questions: des textes aux langues et retour. In: Brito, A. M.; Silva, F.; Veloso, J.; Fiéis, A. (Eds.). Textos Seleccionados, XXV Encontro Nacional da Associação Portuguesa de Linguística. Porto: APL, p. 11-40.: 28). Além disso, qualquer texto inscreve-se em um gênero (ou em mais do que um), cujas propriedades dependem das atividades humanas a que esse gênero está associado. Nessa perspectiva, os gêneros são entendidos como “‘formas comunicativas’ elaboradas pela atividade de gerações precedentes e sincronicamente disponíveis, em termos de arquitexto, como instrumentos ou modelos” (Coutinho 2006COUTINHO, Maria Antónia. 2006. O texto como objeto empírico: consequências e desafios para a linguística. Veredas 13. Disponível em: <Disponível em: http://www.ufjf.br/revistaveredas/files/2009/12/artigo076.pdf > Acesso em: 10 dez. 2018.
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: 4). Assim, o agente, que se encontra numa situação de ação de linguagem singular, seleciona o modelo de gênero que considera ser mais adequado à situação comunicativa e produz um texto com o qual procura atingir seus objetivos comunicativos, respeitando, em maior ou menor grau, as propriedades desse modelo (Bronckart 2010BRONCKART, Jean-Paul. 2010. La vie des signes en questions: des textes aux langues et retour. In: Brito, A. M.; Silva, F.; Veloso, J.; Fiéis, A. (Eds.). Textos Seleccionados, XXV Encontro Nacional da Associação Portuguesa de Linguística. Porto: APL, p. 11-40.: 32). A adoção e a adaptação das propriedades do gênero à situação de comunicação efetua-se com base no conhecimento que o locutor tem do conjunto de gêneros arquitextual e interdiscursivamente disponíveis e de acordo com as representações que possui do contexto físico e sociossubjetivo em que se situa (Bronckart [1997] 1999______. 1999. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. Trad. Anna Rachel Machado. São Paulo: EDUC (1a ed. Delachaux et Niestlé, 1997).: 93).

Os docentes dos vários níveis de ensino (e, em particular, do ensino superior) frequentemente admitem que muitos estudantes não conhecem as propriedades dos gêneros que são solicitados a usar, nem as aplicam de forma adequada na produção textual (Gonçalves e Jorge 2018GONÇALVES, Matilde; JORGE, Noémia. (Orgs.). 2018. Literacia científica na escola. Lisboa: NOVA FCSH-UNL.). É expectável, portanto, que as instituições de ensino promovam a apropriação de diversos gêneros, considerando as necessidades comunicativas e as especificidades dos alunos de diferentes faixas etárias e de diferentes níveis de escolaridade.

De acordo com Dolz:

Se queremos que descubram as regularidades de um gênero textual qualquer (uma carta, um conto etc.), temos de fornecer-lhes ferramentas para que possam analisar os textos pertencentes a esse gênero e se conscientizarem de sua situação de produção e das diferentes marcas linguístico-discursivas que lhes são próprias Dolz (2011DOLZ, Joaquim. 2011. A Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro: uma contribuição para o desenvolvimento da aprendizagem da escrita. Salto para o Futuro 21, (11), 4-9. Disponível em: <Disponível em: https://archive-ouverte.unige.ch/unige:23150 >. Acesso em: 15 fev. 2019.
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: 5).

Entre essas ferramentas, destacam-se dois conceitos relevantes: o modelo didático e a sequência didática. O primeiro é um dispositivo teórico que evidencia as dimensões ensináveis, com base nas quais as diversas sequências didáticas podem ser concebidas (cf. Dolz e Gagnon 2008______; GAGNON, Roxane. 2008. Le genre du texte, un outil didactique pour développer le langage oral et écrit. Pratiques: 179-198. Disponível em: <http://pratiques.revues.org/1159> Acesso em: 10 fev. 2019.
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: 188-190). O segundo, a sequência didática, é um dispositivo prático constituído por módulos de ensino que integram um conjunto de atividades escolares organizadas em torno das diferentes dimensões de um gênero textual. Nessa perspectiva, o objetivo de cada sequência didática é ajudar o aluno a apropriar-se de um determinado gênero, “permitindo-lhe, assim, escrever ou falar de uma maneira mais adequada numa dada situação de comunicação” (Schneuwly e Dolz 2004SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. 2004. Gêneros orais e escritos na escola. Trad. G. S. Cordeiro e R. Rojo. Campinas, SP: Mercado de Letras.: 97).

Porém, como sublinha Bronckart, “para se elaborar uma conceituação dos gêneros, deve-se dispor preliminarmente de um conhecimento do que eles são, e não é possível escapar dessa circularidade metodológica” (Bronckart 2003______. 2003. Gêneros textuais, tipos de discursos, e operaçoes psicolingüisticas. Revista de Estudos da Linguagem 11: 49-69.: 54). Nesse sentido, para desenvolver instrumentos de ensino dos gêneros, é necessário reunir previamente um conjunto representativo de exemplares e efetuar estudos que identifiquem as características recorrentes dos gêneros a contemplar nos processos de ensino-aprendizagem.

4. Propriedades dos gêneros

Na perspectiva da escola de língua francesa da Linguística Textual, os gêneros são classes de textos definidas com base em critérios múltiplos e heterogêneos: cada gênero caracteriza-se por uma ou mais propriedades específicas - mas não exclusivas - dessa classe. Acresce que tais propriedades (ou parâmetros) são de natureza muito diversificada.

Segundo Adam (2001_____. 2001. En finir avec les types de texts. In: Ballabriga, Michel. (Org.). Analyse des discours. Types et genres: communication et interpretation. Toulouse: EUS: 25-43.: 40-41), os critérios que permitem caracterizar e delimitar os gêneros inserem-se em oito componentes distintos: enunciativo, pragmático, composicional, semântico, estilístico-fraseológico, material, peritextual e metatextual. Justifica-se explicitar abreviadamente a conceção do autor, para situar e sublinhar, de forma precisa, a questão do plano de texto e a sua relevância na descrição dos gêneros.

O componente enunciativo integra as propriedades dos gêneros que dizem respeito à área de atividade socioprofissional em que cada texto emerge, assim como aos papéis socioprofissionais que os interlocutores assumem. Já o componente pragmático inclui os objetivos comunicativos inerentes aos textos de um dado gênero. Desse modo, as propriedades relativas a esses dois componentes são externas, no sentido em que elas não são diretamente atestadas nos textos e é frequentemente necessário inferir ou reconstruir essas propriedades.

O componente composicional integra as propriedades relativas à estrutura ou organização dos textos de um dado gênero. O componente semântico diz respeito aos conteúdos tipicamente abordados nos textos de cada gênero. O componente estilístico-fraseológico inclui as propriedades de natureza microlinguística, em particular a seleção lexical e as construções sintáticas usadas.

Adam (2001_____. 2001. En finir avec les types de texts. In: Ballabriga, Michel. (Org.). Analyse des discours. Types et genres: communication et interpretation. Toulouse: EUS: 25-43.) também contempla, em sua proposta, o componente material, que se refere ao suporte e ao meio em que o texto é produzido e circula, a aspetos gráficos e à extensão. Prevê, também, um componente peritextual, no qual se inscrevem os elementos situados nas fronteiras dos textos do gênero em causa. E, por fim, considera o componente metatextual, que remete às reflexões acerca de um gênero produzidas no seio de uma dada área de atividade e para as autorreferências ao gênero em que o texto se insere.

O gênero artigo científico é associado a propriedades externas, como a área de atividade socioprofissional em que os textos são produzidos: a investigação científica, geralmente concretizada em centros de pesquisa ligados a instituições universitárias. Os indivíduos que redigem textos desse gênero assumem o papel de investigadores e têm como objetivo comunicar o processo e os resultados de uma pesquisa aos membros de sua comunidade profissional.

Com relação às propriedades internas do artigo científico, elas podem ser atestadas ao nível do tema, da composição e do estilo (Bakhtin 1986BAKHTIN, Mikhail. 1986. The problem of speech genres. Speech genres and other late essays. Austin: The University of Texas Press, p. 60-102.: 60). Os temas abordados nos artigos científicos decorrem das pesquisas realizadas e da sua relevância na área disciplinar em causa. Os estilos adotados nesses textos (enformados, de maneira mais evidente, na seleção lexical e nas construções sintáticas) refletem valores como a correção, a clareza e o rigor, e a voz autoral neles manifestada tendencialmente é pouco ou nada individualizada, o que se concretiza, por exemplo, na ausência de formas verbais e pronominais de 1ª pessoa (do singular e do plural). Em certas áreas disciplinares das Ciências Sociais e Humanas e das Humanidades, porém, a voz do autor pode ser mais individualizada (como na Filosofia ou na Literatura)6 6 . Outros aspetos relacionados ao estilo adotado, como a modalização e o metadiscurso, têm, também, sido objeto de pesquisa nos gêneros acadêmicos (Hyland 2017). .

A estrutura do artigo científico corresponde ao seu plano de texto, o qual se inscreve no componente composicional, segundo Adam (2001_____. 2001. En finir avec les types de texts. In: Ballabriga, Michel. (Org.). Analyse des discours. Types et genres: communication et interpretation. Toulouse: EUS: 25-43.), e constitui uma das propriedades centrais dos gêneros. Adiante, observar-se-á que também as propriedades dos componentes peritextual e material podem ser relevantes para sublinhar o plano de texto.

5. Plano de texto

O plano de texto é das propriedades que mais contribui para a identificação e a caracterização de um dado gênero (Adam 2002_____. 2002. Plan de texte. In: Charaudeau, Patrick; Maingueneau, Dominique. (Eds.). Dictionnaire d’analyse du discours. Paris: Seuil: 433-434.; Silva 2016SILVA, Paulo Nunes da. 2016. Género, conteúdos e segmentação: em busca do plano de texto. Diacrítica. 30/1: 181-224.). Embora a noção seja utilizada num sentido “fraco e não técnico” (Bronckart [1997] 1999______. 1999. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. Trad. Anna Rachel Machado. São Paulo: EDUC (1a ed. Delachaux et Niestlé, 1997).: 248), o plano de texto integra a infraestrutura geral - a camada mais profunda de um dos instrumentos de análise do ISD, o modelo da arquitetura interna dos textos: é responsável pela organização global do texto, corresponde à “organização de conjunto do conteúdo temático”, é visível na leitura e pode ser reconstruído na escrita (ou na oralidade) (Bronckart [1997] 1999______. 1999. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. Trad. Anna Rachel Machado. São Paulo: EDUC (1a ed. Delachaux et Niestlé, 1997).: 120).

De acordo com Adam, o plano de texto é o principal fator unificador da estrutura composicional, desempenhando um papel decisivo na composição macrotextual de sentido (Adam 2002_____. 2002. Plan de texte. In: Charaudeau, Patrick; Maingueneau, Dominique. (Eds.). Dictionnaire d’analyse du discours. Paris: Seuil: 433-434.: 433-434; 2008_____. 2008. La linguistique textuelle. Introduction à l’analyse textuelle des discours. Paris: Armand Colin.: 255-256). Corresponde, segundo o autor, ao que a Retórica Clássica designava por dispositio. Adam distingue os planos convencionais dos planos ocasionais, consoante a maior ou menor fixação dos gêneros numa dada sincronia. De fato, em alguns gêneros, o plano de texto é tipicamente muito estável (como na ata e no requerimento), enquanto em outros são atestados diversos graus de flexibilidade (como na tese de doutoramento e na notícia). Para tal, concorrem múltiplos fatores, como a área de atividade socioprofissional em que o gênero é usado, os objetivos que se pretende atingir, o grau de cristalização na sincronia atual, entre outros. O conceito de plano de texto é, então, aplicável a qualquer texto de qualquer gênero, em contraste com o dispositio da Retórica Clássica, que incidia em textos da tríade de gêneros argumentativos - deliberativo, judicial e epidítico.

Segundo Gonçalves (2011GONÇALVES, Matilde. 2011. Espécie de texto: contributo para a caraterização do sítio web. Hipertextus: 1-12. Disponível em: <Disponível em: http://www.clunl.edu.pt/resources/docs/grupos/gramatica/publicacoes/02_hipertextus_vol7_matilde_goncalves.pdf > Acesso em: 7 dez. 2018.
http://www.clunl.edu.pt/resources/docs/g...
: 9), “para analisar o plano de texto, é preciso identificar as diversas seções que organizam o texto e que fazem parte da composição textual, descrever como se interrelacionam e como são segmentadas no espaço textual”. Desse modo, a autora confere destaque quer à ordenação dos conteúdos, que é explícita ou implicitamente assinalada pela segmentação em seções, quer à maneira como os conteúdos e as seções articulam-se no texto.

Silva (2016SILVA, Paulo Nunes da. 2016. Género, conteúdos e segmentação: em busca do plano de texto. Diacrítica. 30/1: 181-224.), por seu lado, sublinha que o plano de texto “consiste na distribuição dos conteúdos manifestados e, em suporte escrito, na segmentação formal atestada num texto”. A distribuição diz respeito à articulação e à ordenação dos conteúdos e a segmentação corresponde à divisão formal do texto quando é produzido em suporte escrito.

A distribuição dos conteúdos depende da sua seleção prévia. Já a segmentação textual é uma parte integrante do conceito de plano de texto e não apenas um fator que está ao serviço da distribuição, como nota Adam ([1992] 2011_____. 2011. Les textes: types et prototypes. 3.e éd. Paris: Armand Colin (1a éd. Éditions Nathan, 1992).: 33), a propósito do soneto. Porém, na maioria dos gêneros, os mecanismos de segmentação dependem dos conteúdos tematizados e do grau de convencionalidade do gênero (Silva 2016SILVA, Paulo Nunes da. 2016. Género, conteúdos e segmentação: em busca do plano de texto. Diacrítica. 30/1: 181-224.). Desse ponto de vista, os temas contemplados e/ou admitidos pelo gênero condicionam a segmentação atestada nos textos. Por isso, os temas são determinados por e, simultaneamente, refletem a maior ou menor convencionalidade do plano de texto do gênero em causa.

Segundo Adam (2013ADAM, Jean-Michel. 2013. Problèmes du texte. Pré publications. Université d’Aarhus. Disponível em: <Disponível em: http://cc.au.dk/fileadmin/dac/Arrangementsfoto/Prepub_no_200_-_nov_2013.pdf > Acesso em: 11 dez. 2018.
http://cc.au.dk/fileadmin/dac/Arrangemen...
: 25), “tout texte est en équilibre entre les nécessités de la répétition-reprise d’éléments antérieurs et la progression de l’information textuelle”. Esse equilíbrio entre continuidade e descontinuidade é assegurado por três níveis de operações de ligação e segmentação: um nível microtextual, um nível mesotextual e um nível macrotextual.

Os três grandes tipos de ligações configuram um continuum, desde o nível microtextual (que assegura a textura) ao nível macrotextual (responsável pela estrutura do texto). A principal novidade dessa proposta é o nível mesotextual, nível intermédio que incorpora os períodos e as sequências.

Relativamente à divisão das unidades atestadas no texto, a microssegmentação decorre da divisão do texto em frases e em palavras. A segmentação intermédia corresponde a divisões em períodos e sequências, em parágrafos (na prosa) e em estrofes (na poesia). A macrossegmentação deve-se à delimitação em partes, em seções e às fronteiras inicial e final do texto (Adam 2013ADAM, Jean-Michel. 2013. Problèmes du texte. Pré publications. Université d’Aarhus. Disponível em: <Disponível em: http://cc.au.dk/fileadmin/dac/Arrangementsfoto/Prepub_no_200_-_nov_2013.pdf > Acesso em: 11 dez. 2018.
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: 28-29).

Assim, as operações que sinalizam e articulam as partes de um plano de texto estão situadas nos níveis macrotextual e mesotextual. Para além desses níveis, Adam também associa ao plano de texto os componentes peritextuais e elementos não verbais:

Je propose d’intégrer dans le concept de plan de texte les composantes péritextuelles verbales (titre et sous-titre, mais aussi intertitres, dédicaces, signatures, systèmes de notes) et éventuellement iconiques (vignette, illustrations), en particulier dans les iconotextes plurisémiotiques de type recettes de cuisine, articles de presse écrite, publicités, affiches, etc.

Adam (2013ADAM, Jean-Michel. 2013. Problèmes du texte. Pré publications. Université d’Aarhus. Disponível em: <Disponível em: http://cc.au.dk/fileadmin/dac/Arrangementsfoto/Prepub_no_200_-_nov_2013.pdf > Acesso em: 11 dez. 2018.
http://cc.au.dk/fileadmin/dac/Arrangemen...
: 37)

Desse ponto de vista, para caracterizar o plano de texto, é necessário identificar os elementos peritextuais. No caso do artigo científico, por exemplo, incluem-se no peritexto a indicação do título e do autor, a ocorrência do resumo e das palavras-chave (no início) e a listagem das referências bibliográficas (no final).

Além disso, é relevante explicitar os mecanismos de segmentação e de ligação que assinalam e unem as partes do texto. Os elementos que segmentam, delimitam e agrupam as unidades textuais desempenham a função de organizadores textuais. Essa noção foi proposta por Schneuwly, Rosat e Dolz (1989______; ROSAT, Marie-Claude; DOLZ, Joaquim. 1989. Les organisateurs textuels dans quatre types de textes écrits (élèves de 10, 12 et 14 ans). Langue Française 81: 40-58. Disponível em: <http://www.persee.fr/doc/lfr_0023-8368_1989_num_81_1_4768> Acesso em: 7 dez. 2018.
http://www.persee.fr/doc/lfr_0023-8368_1...
) para evidenciar as diferentes operações de planificação textual que o termo conector não considerava. Para os autores, os organizadores textuais constituem “trace[s] privilégiée[s] de certaines opérations langagières dépendant de la planification textuel” (Schneuwly, Rosat e Dolz 1989______; ROSAT, Marie-Claude; DOLZ, Joaquim. 1989. Les organisateurs textuels dans quatre types de textes écrits (élèves de 10, 12 et 14 ans). Langue Française 81: 40-58. Disponível em: <http://www.persee.fr/doc/lfr_0023-8368_1989_num_81_1_4768> Acesso em: 7 dez. 2018.
http://www.persee.fr/doc/lfr_0023-8368_1...
: 40).

De acordo com Coutinho (2004_____. 2004. Sobre organizadores textuais. Gramática Textual do Português. Disponível em: <http://www2.fcsh.unl.pt/cadeiras/texto/Sobre%20OTs.pdf> Acesso em: 8 dez. 2018.
http://www2.fcsh.unl.pt/cadeiras/texto/S...
: 1),

Segmentando unidades textuais e/ou indicando o tipo de relação a estabelecer entre diferentes unidades textuais, os organizadores textuais assinalam, de forma mais ou menos ostensiva, a organização global, ou plano do texto (que pode ser mais ou menos convencional).

Segundo Adam (1999_____. 1999. Linguistique textuelle: des genres de discours aux textes. Paris: Nathan.), os organizadores textuais fazem parte da categoria geral dos conectores e aparecem distribuídos por subcategorias, consoante o tipo de função assumida: conexão, marcação da(s) responsabilidade(s) enunciativa(s) e orientação argumentativa. Embora Adam distinga os conectores dos organizadores textuais, considerando a função específica de orientação argumentativa dos primeiros, ambos têm uma função em comum: segmentar e ligar as partes do texto.

Quanto aos organizadores textuais, Adam distingue “ceux qui ordonnent les parties de la représentation discursive sur le axes majeurs du temps et de l’espace et ceux qui structurent essentiellement la progression du texte et l’indication de ses différentes parties”. (Adam 2008_____. 2008. La linguistique textuelle. Introduction à l’analyse textuelle des discours. Paris: Armand Colin.: 115; sublinhado nosso). Relativamente a esses últimos, o autor propõe a seguinte classificação: organizadores enumerativos aditivos, marcadores de integração linear, marcadores de mudança de topicalização e marcadores de ilustração e de exemplificação (Adam 2008_____. 2008. La linguistique textuelle. Introduction à l’analyse textuelle des discours. Paris: Armand Colin.: 116-118)7 7 . Em trabalhos anteriores, constatou-se que a função dos organizadores textuais é revelada textualmente, ou seja, uma forma linguística pode assumir diferentes funções no plano de texto (cf. Rosa et al. 2018). .

Apesar de Adam não integrar a pontuação nem os mecanismos gráficos na categorização dos organizadores textuais, o autor sublinha a importância desses elementos, dado que também asseguram operações de segmentação e ligação a diferentes níveis do texto, intervindo, assim, na configuração do plano de texto. Além disso, distingue os sinais de pontuação convencionais (ponctuation noire) dos mecanismos de segmentação gráficos (ponctuation blanche), que correspondem aos espaços em branco que ocorrem entre unidades de diferentes tipos e dimensões, como as palavras, os parágrafos, as seções, as margens das páginas e as fronteiras dos textos (cf. Adam 2013ADAM, Jean-Michel. 2013. Problèmes du texte. Pré publications. Université d’Aarhus. Disponível em: <Disponível em: http://cc.au.dk/fileadmin/dac/Arrangementsfoto/Prepub_no_200_-_nov_2013.pdf > Acesso em: 11 dez. 2018.
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: 29).

6. Para a caracterização do plano de texto do artigo científico

O artigo científico é um gênero acadêmico associado à atividade de investigação em diferentes áreas disciplinares. Nesse sentido, embora o objetivo comunicativo de partilhar e difundir resultados de investigações seja comum a todos os textos que se inscrevem no gênero, o artigo científico pode ser mobilizado em áreas muito diversificadas, admitindo um leque de temas bastante heterogêneo e concretizando objetivos específicos díspares. É relativamente consensual distinguir disciplinas que se inserem em três grandes áreas: nas Ciências (Física, Geologia, Química, etc.), nas Ciências Sociais e Humanas (Sociologia, Economia, Psicologia, etc.) e nas Artes e Humanidades (Literatura, História, Belas Artes, etc.), de acordo com os temas abordados e com as metodologias adotadas (Hyland 2009______. 2009. Academic discourse. London/New York: Continuum.: 129). Essas diferenças na forma como se faz ciência refletem-se na maneira como se comunica ciência: “university writing tasks differ in terms of the type of sources used, prescribed length of texts, cognitive demands, patterns of exposition, and so on” (Hyland 2009______. 2009. Academic discourse. London/New York: Continuum.: 128).

No panorama português, os alunos geralmente só têm contato com exemplares desse gênero quando ingressam no ensino superior, desconhecendo as propriedades dos seus contextos de uso, assim como as suas características estruturais e, mais especificamente, a configuração do plano de texto. O fato de os estudantes não se depararem, regra geral, com textos do gênero artigo científico ao longo da escolaridade obrigatória pode configurar uma limitação, entre outros aspectos, no que diz respeito ao “horizonte de expectativas” que lhe está associado. Essa limitação é suscetível de gerar dificuldades na interpretação e na produção de textos desse gênero, bem como de outros gêneros da esfera acadêmica.

Desse modo, refletir sobre as propriedades do plano de texto do gênero artigo científico no ensino superior, promove, nos alunos, o desenvolvimento de competências necessárias à aprendizagem do gênero, mas também competências transversais à aquisição de outros gêneros acadêmicos. Na presente pesquisa, assume-se que é fundamental os dispositivos de ensino do gênero artigo científico contemplarem essa dimensão composicional. E, para que os modelos didáticos e as sequências didáticas incidam adequadamente sobre o artigo científico, é necessário analisar, previamente, textos empíricos que se inscrevam no gênero, identificando e sistematizando suas principais propriedades.

6.1. Corpus e metodologia

Foi anteriormente referido que as propriedades do plano de texto dependem, entre outros fatores, da área de atividade socioprofissional em que o gênero é usado, dos objetivos comunicativos que se pretende atingir, bem como do grau de cristalização de um dado gênero na sincronia atual. Numa perspetiva teórico-metodológica, isso significa que a análise das propriedades do plano de texto deverá ser articulada à identificação das atividades em que o gênero é mobilizado e das propriedades dos contextos de produção e de circulação dos textos.

O corpus selecionado no âmbito da presente pesquisa é constituído por quatro exemplares do gênero artigo científico que se inscrevem em duas grandes áreas de investigação, Ciências vs. Ciências Sociais e Humanas/Humanidades (C vs. CSHH) e em quatro domínios científicos distintos.

Quadro 1
Identificação do corpus.

Para esta análise exploratória, foram selecionados quatro textos, escritos em português europeu, de duas áreas que, tipicamente, contrastam nos objetos estudados e nas metodologias adotadas: a área das Ciências (C) - em que se inserem os artigos de Ciências Farmacêuticas e de Engenharia Civil - e a das Ciências Sociais e Humanas/Humanidades (CSHH) - em que se integram os artigos de Direito e de Literatura. Dado que se procura identificar as principais propriedades associadas ao gênero artigo científico, assumiu-se que seria vantajoso, nessa fase, focar a atenção em exemplares que permitissem recobrir áreas distintas, porquanto se assume que diferentes modos de fazer ciência se refletem, inevitavelmente, em diferentes modos de comunicar ciência. Os exemplares selecionados foram produzidos entre 2006 e 2014, tendo sido recolhidos em 2018.

Em termos metodológicos, em uma primeira etapa, para dar conta do funcionamento social do gênero, a análise contemplou a interação atividades/gênero e os parâmetros contextuais (físicos, sociossubjetivos) em que os textos são produzidos e em que circulam, incluindo identificação dos autores e dos potenciais destinatários, respectivos papéis socioprofissionais, assim como os objetivos dos textos (seção 6.2). Seguiu-se uma análise textual descritiva (qualitativa), em que foram identificadas as propriedades do plano de texto dos exemplares. Para tal, foram analisados os seguintes aspetos: i) seções atestadas no peritexto e no corpo de texto (títulos dos artigos, identificação dos autores e sua afiliação, palavras-chave; seções em que cada artigo se encontra dividido); ii) mecanismos de organização textual mobilizados (linguísticos e gráficos); iii) organização dos conteúdos tematizados. Após essa identificação preliminar, procedeu-se à análise comparativa das propriedades dos quatro exemplares (seção 6.3).

Os textos são referidos com recurso às siglas identificativas (AC1, AC2, AC3, AC4) que constam do quadro 1.

6.2. Atividades e parâmetros contextuais

De acordo com o ISD, é nos gêneros que se manifestam as relações de interdependência entre as propriedades das atividades sociais e as propriedades dos textos (Miranda 2012MIRANDA, Florencia. 2012. Os géneros de texto na dinâmica das práticas da linguagem. Cadernos Cenpec 2 (1): 121-139. Disponível em: <Disponível em: http://cadernos.cenpec.org.br/cadernos/index.php/cadernos/article/viewFile/96/119 > Acesso em: 11 dez. 2018.
http://cadernos.cenpec.org.br/cadernos/i...
: 123). Todavia, nem sempre existe uma relação clara e biunívoca entre os gêneros e as atividades sociais, porquanto um gênero pode ser mobilizado em diferentes esferas de atividade e interagir de forma distinta com as atividades a que se associa. No caso do artigo científico, o gênero está associado à investigação em contexto acadêmico. Trata-se de um gênero privilegiado na divulgação de estudos de diferentes áreas científicas e disciplinares, socioculturalmente reconhecidas no seio de uma dada comunidade, com o qual se comunica os processos e os resultados de pesquisas. Neste estudo, foram analisados artigos de Ciências Farmacêuticas e de Engenharia Civil (na área das C), de Direito e de Literatura (na área das CSHH).

Por outro lado, a produção e a circulação dos textos estão associadas à atividade editorial que, por sua vez, também é regulada, numa relação de condicionamento mútuo, pela atividade de investigação e, mais especificamente, pela área científica com a qual se articula. Compreende-se, assim, que textos de diferentes áreas científicas sejam publicados de acordo com diferentes normas e apresentem características distintas, como adiante se verá.

O quadro 2 sistematiza os parâmetros contextuais dos exemplares analisados.

Quadro 2
Parâmetros contextuais.

Relativamente aos parâmetros contextuais físicos, os quatro exemplares apresentam parâmetros específicos, embora não sejam totalmente recuperáveis. Enquanto, no texto AC1, os autores aparecem parcialmente identificados (os apelidos são explicitados mas ocorre apenas a inicial dos nomes próprios), não sendo possível apurar a identidade de gênero de três dos quatro autores, nos textos AC2, AC3 e AC4 os nomes dos autores permitem a sua identificação inequívoca. Só o artigo AC4 foi redigido por uma única autora; todos os restantes foram escritos por dois (AC3), três (AC2) ou quatro autores (AC1).

Quanto aos receptores, é possível inferir que os textos destinam-se a um número indeterminado de pessoas pertencentes a esferas socioprofissionais específicas, nomeadamente às comunidades acadêmico-científicas que se dedicam às duas áreas disciplinares em causa. No que diz respeito ao lugar e ao momento de produção, apesar de serem indicados o ano e o local de publicação, essas informações podem não ser totalmente exatas, uma vez que remetem à publicação do texto, e não à sua produção8 8 . No final do texto AC3, ocorre a indicação de que foi produzido no Porto, em maio de 2005, mas a sua publicação data de 2006. .

Já no que concerne ao contexto sociossubjetivo, constata-se que o artigo científico é um gênero associado a parâmetros relativamente estáveis. Como atrás se indicou, os quatro artigos foram produzidos no quadro social de instituições acadêmicas. Assim, os enunciadores assumem o papel social de investigadores/docentes que têm como principal objetivo apresentar um contributo para a área científica em causa, sob a forma de processo de investigação e reflexão, em que são expostos resultados que se caracterizam pela relevância e pela originalidade no seio das respectivas áreas disciplinares. Os destinatários, como já foi referido, são os indivíduos que constituem as respectivas comunidades acadêmico-científicas. Quanto ao contexto de circulação, apesar de os quatro textos circularem no mesmo tipo de publicação, as quatro revistas de divulgação científica9 9 . A Acta Farmacêutica Portuguesa, a Revista de Engenharia Civil da Universidade do Porto, a Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Porto (RFDUP) e a Revista do Instituto de Literatura Comparada de Margarida Losa são publicações periódicas de caráter científico. A primeira, de Ciências Farmacêuticas, contempla artigos relacionados com as Ciências da Saúde, Ciências e Cuidados Farmacêuticos. A segunda, a de Engenharia Civil, publica investigações originais nas áreas de Construção Civil, Estruturas, Geotecnia, Hidráulica, Materiais, Planeamento e Transportes. A terceira, de Direito, publica artigos doutrinais no domínio das Ciências Jurídicas e da Criminologia. A quarta, a de Literatura, publica trabalhos sobre poesia e prosa moderna e contemporânea que privilegiem análises e instrumentos teóricos comparatistas e perspectivas interartísticas. estão associadas a diferentes entidades (à Ordem dos Farmacêuticos, AC1; ao Departamento de Engenharia Civil da Universidade do Porto, AC2; ao Centro de Investigação Jurídico-Econômica, AC3; ao Instituto de Literatura Comparada Margarida Losa, AC4) e inserem-se em áreas de investigação distintas.

Tendo em consideração que os parâmetros contextuais influenciam a produção textual, no próximo ponto, procurar-se-á proceder à análise textual, evidenciando de que maneiras aqueles fatores determinam e regulam as propriedades dos planos dos textos analisados.

6.3. Propriedades dos planos de texto analisados

Nesta seção, serão apresentados os resultados da análise efetuada, de acordo com os níveis macrotextual e mesotextual propostos por Adam (2013ADAM, Jean-Michel. 2013. Problèmes du texte. Pré publications. Université d’Aarhus. Disponível em: <Disponível em: http://cc.au.dk/fileadmin/dac/Arrangementsfoto/Prepub_no_200_-_nov_2013.pdf > Acesso em: 11 dez. 2018.
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). Os dados identificados e recolhidos dizem respeito a diversos componentes previstos pelo mesmo autor: composicional, peritextual e material (Adam 2001_____. 2001. En finir avec les types de texts. In: Ballabriga, Michel. (Org.). Analyse des discours. Types et genres: communication et interpretation. Toulouse: EUS: 25-43.).

No nível macrotextual, nos quatro exemplares, os conteúdos tematizados são distribuídos por várias seções, tanto no peritexto, como no corpo do texto. No peritexto de AC1, ocorrem, por esta ordem, as seguintes seções: nome/ano da publicação, título do artigo e nome dos autores. Esses elementos informativos cumprem uma função identificadora, servindo de bilhete de identidade do artigo. As notas de rodapé, enquanto procedimento de reenvio intratextual, complementam essas informações, indicando a formação e a afiliação acadêmica dos autores, os contatos e o endereço postal para onde os potenciais interessados podem enviar correspondência. No peritexto de AC2, AC3 e AC4, verifica-se, de igual modo, a presença do título e do nome dos autores, mas, ao contrário do que sucede em AC1, os nomes próprios dos autores não são abreviados, sendo, por isso, possível efetuar uma identificação mais personalizada. Em AC1, AC2 e AC3, também se observa a ocorrência de notas de rodapé que remetem para informações adicionais, nomeadamente a contextualização relativa à conceção e à publicação do artigo, assim como a afiliação acadêmica (AC2) e o grau acadêmico/cargo ocupado na instituição (AC3).

Quadro 3
Notas de rodapé iniciais; extraídas de AC1, AC2, AC3

Como mostra o quadro acima, a diferença é que se remete para essas notas usando asteriscos (AC3), e não a numeração árabe, como em AC1 e AC2. Se, por um lado, são manifestados conteúdos semelhantes, por outro, os mecanismos de organização textual que sublinham as seções onde estes ocorrem são diferenciados. Em AC1, o título aparece em negrito, seguindo-se a respectiva tradução em inglês (destacada em itálico), mantendo os termos científicos em latim. Em AC3, para além do recurso do negrito, o título aparece em caixa alta. Enquanto em AC2, o título ocorre em negrito, em AC4, não há uso desse mecanismo gráfico, estando o título alinhado à esquerda com um asterisco que remete para uma nota de fim. Essas diferenças decorrem das normas específicas de cada uma das publicações em que ocorrem os textos selecionados.

Em AC4, foram selecionadas outras indicações que ocorrem não em nota de rodapé (na página inicial do artigo), mas em nota de fim de texto:

Quadro 4
Nota de fim de texto; extraída de AC4.

Ainda no peritexto, em AC1, ocorrem as seções de identificação do gênero de texto (um marcador de gênero autorreferencial − cf. Miranda 2010______. 2010. Textos e géneros em diálogo: uma abordagem linguística da intertextualização. Lisboa: FCT/FCG.: 155) e a indicação de que se trata de um texto inédito (“artigo original”), além do resumo, das palavras-chave, do abstract e das keywords. Já em AC3, não ocorre o marcador de gênero, mas é atestada a seção sumário. Essa seção corresponde, em rigor, a um verdadeiro índice do artigo, pois são mencionados os títulos das seções e subseções, ordenados com recurso à numeração árabe, ao alfabeto e à numeração romana em caixa baixa, como se apresenta em seguida.

Quadro 5
Seção sumário; extraída de AC3.

A seção anuncia, portanto, a configuração do plano de texto, fornecendo ao leitor uma orientação prévia em relação aos conteúdos tematizados e à sua disposição no espaço textual. Tal como em AC1, em AC2 e AC4, ocorre a secção resumo. No entanto, em AC2, não ocorrem palavras-chave e abstract e, em AC4, são atestadas as seções résumé e mots-clés, constituindo, dessa forma, uma particularidade do exemplar da área da Literatura. Nas seções resumo/abstract de AC1, resumo de AC2 e resumo/résumé de AC4, são apresentados, de forma concisa, os objetivos, a metodologia e os resultados alcançados, enquanto as palavras-chave/keywords/mots-clés têm como função explicitar os principais termos diretamente relacionados ao tema do artigo.

Face ao exposto, constata-se que existem oscilações decorrentes de diferentes normas e critérios de publicação das revistas de divulgação científica, em particular, no que diz respeito à seleção de conteúdos tematizados numa posição prévia ao texto do artigo e aos aspetos gráficos. Contudo, também se observam propriedades comuns, nomeadamente, e como seria expectável, seções dedicadas à identificação do artigo e dos autores. Nesse âmbito, destaca-se o papel da “pontuação branca” (Adam 2013ADAM, Jean-Michel. 2013. Problèmes du texte. Pré publications. Université d’Aarhus. Disponível em: <Disponível em: http://cc.au.dk/fileadmin/dac/Arrangementsfoto/Prepub_no_200_-_nov_2013.pdf > Acesso em: 11 dez. 2018.
http://cc.au.dk/fileadmin/dac/Arrangemen...
: 29) como mecanismo de organização textual que delimita as seções, evidenciando-as no espaço textual e, simultaneamente, ligando-as com outras seções que as antecedem e as sucedem.

Além disso, foram identificadas divergências que decorrem do fato de os quatro exemplares serem mobilizados em diferentes domínios científicos. Nesse âmbito, é muito evidente o funcionamento diferenciado das seções resumo/abstract/résumé (AC1, AC2, AC4), por um lado, e sumário (AC2), por outro lado: o resumo/abstract/résumé tipicamente anuncia os aspectos mais relevantes da pesquisa exposta no artigo (tema, objetivos, enquadramento teórico, metodologia, resultados, referências, entre outros), enquanto o sumário desempenha uma função equivalente ao índice. Essas diferenças, simultaneamente, refletem e reforçam uma organização global distinta do peritexto dos exemplares: mais típica/convencional em AC1, AC2 e AC4 e mais atípica/ocasional em AC3. Adam (2002_____. 2002. Plan de texte. In: Charaudeau, Patrick; Maingueneau, Dominique. (Eds.). Dictionnaire d’analyse du discours. Paris: Seuil: 433-434.: 434) sublinha que um plano de texto ocasional (como é o caso de AC3) deve ser explicitamente assinalado, o que, no exemplar analisado, concretiza-se recorrendo ao sumário, localizado em posição inicial, previamente ao texto do artigo. Porque os planos de texto de AC1, AC2 e AC4 são mais convencionais (possuindo uma estrutura mais ritualizada e previsível, sobretudo em AC1 e AC2, pelo menos para os membros das comunidades a que prioritariamente se dirigem), não se torna necessária a sua explicitação, uma vez que o público-alvo (re)conhece o plano que é tipicamente adotado em textos desse gênero (e da respetiva área disciplinar).

Relativamente à fronteira final dos textos, também foram notadas divergências. Em AC1, ocorre apenas a seção de referências bibliográficas, as quais se encontram numeradas de acordo com a ordem pela qual são mencionadas no corpo do texto. No fecho do plano de AC2, ocorre a seção referências, que é anunciada por um intertítulo numerado, à semelhança dos intertítulos que delimitam as seções do corpo do texto.

Já em AC3 a seção bibliografia inclui uma lista de referências ordenadas alfabeticamente. Além disso, foi atestada a seção principais abreviaturas utilizadas. As abreviaturas usadas ao longo do texto remetem a obras (“Código Civil”), instituições (“Supremo Tribunal de Justiça”) ou a conceitos relevantes no âmbito do sistema judicial (“Organização Tutelar de Menores”). Antes dessas seções e imediatamente após o final do texto, é indicado o local, o mês e o ano de produção do texto (“Porto, Maio de 2005”). Em AC4, para além da seção bibliografia, ocorrem, previamente, notas numeradas e uma nota relativa ao título, na qual são explicitados aspectos relacionados ao artigo em causa (como atrás se citou).

Essas diferenças atestadas nos textos analisados relevam diferenças nas práticas discursivas típicas das áreas disciplinares em causa e evidenciam que o plano de texto do gênero artigo científico admite uma significativa flexibilidade. É particularmente relevante a diferença na organização das entradas na lista de referências bibliográficas: segundo a ordem de ocorrência no corpo do texto (em AC1) e de tipo alfabético (em AC2, AC3 e AC4).

Passando ao corpo do texto, em AC1, ele está disposto em duas colunas10 10 . Essa disposição gráfica é um mecanismo de orientação da leitura comum em revistas da área das Ciências, bem como em gêneros associados a essa esfera de atividade, como, por exemplo, na bula de medicamento (cf. Rosa 2018b). , e os conteúdos estão distribuídos pelas seguintes seções: introdução; objetivos; material e métodos; resultados e discussão; conclusão. Verifica-se, assim, que os títulos das seções são previsíveis e correspondem a seções em que, convencionalmente, se dividem os artigos científicos na área disciplinar em causa. Essa estruturação do plano de texto é comum em áreas nas quais a investigação é predominantemente de tipo experimental. Além disso, a seção introdução encontra-se subdividida em três subseções, que correspondem à explicitação e caracterização do problema em que a pesquisa experimental incide, evidenciando, dessa forma, dois níveis hierárquicos de seções. Apesar dessas subseções não terem a previsibilidade das seções de primeiro nível, os conteúdos são anunciados por meio de intertítulos em negrito, sendo possível identificar três etapas: uma caracterização geral, que inclui a definição da patologia e o agente que a causa (taxonomia, morfologia e ciclo de vida); e três caracterizações mais específicas (fisiopatologia; epidemiologia; fatores desecadeantes). Nessa perspectiva, enquanto os intertítulos em negrito das seções principais explicitam o processo de investigação, dividido em seções convencionais próprias de uma pesquisa de natureza experimental, os intertítulos das subseções apontam para diversos aspetos específicos do objeto de investigação tematizado.

Outras características das seções do corpo do texto, tanto de AC1 como de AC2, incluem a presença de elementos não-verbais, designadamente seis figuras e uma tabela em AC1, e nove tabelas e seis figuras em AC2. Em AC1, as figuras têm como função ilustrar aquilo que é manifestado linguisticamente e, por outro, a tabela também sistematiza e sintetiza dados qualitativos e quantitativos (descrição de estudos efetuados e resultados obtidos).

Comparando com o exemplar de Engenharia (AC2), observa-se que este apresenta uma estrutura semelhante à de AC1, ou seja, tipicamente IMRDC (Introdução, Metodologia, Resultados/Discussão e Conclusão11 11 . Muitas vezes, as seções relativas aos Resultados e à Discussão ocorrem amalgamadas (como se observa em AC1 e na seção 3 de AC2). Além disso, as conclusões nem sempre são integradas numa seção autônoma; nesses casos, os conteúdos que ela geralmente contempla são incluídos na última seção do artigo (como sucede em AC1 que condensa, na seção final, os conteúdos relativos aos Resultados, à Discussão e à Conclusão). Assim, apesar de não se apresentar dividido em cinco seções autônomas etiquetadas da maneira mais recorrente e previsível, o artigo AC1 (e também o AC2) está formatado de acordo com o plano de texto IMRDC, dado que inclui os conteúdos tipicamente associados a cada uma das seções previstas nesse modelo. ). No entanto, conforme o quadro seguinte, os Resultados e a Discussão estão amalgamadas numa mesma seção e as etiquetas são ligeiramente diferentes, em particular na seção 2, na qual é tematizada a metodologia. Em AC1, ocorre a etiqueta Material e Métodos e, em AC2, Materiais, composições e procedimentos de ensaio. Desse ponto de vista, observa-se variação na etiquetagem, mas não na estruturação do artigo e no tipo de conteúdos que cada seção inclui.

Quadro 6
Seções do corpo do texto; elaborado a partir de AC1 e AC2.

No nível macrotextual, nos exemplares AC1 e AC2, os intertítulos em negrito e os espaços em branco entre os blocos textuais são os mecanismos de organização textual que delimitam as seções, agrupando os conteúdos e sublinhando a configuração do plano de texto. No entanto, como ilustra o quadro 5, no exemplar de Engenharia (AC2), os intertítulos aparecem numerados, o que pode ter decorrido das diretrizes das revistas científicas, mas também do fato de o texto estar distribuído por um número significativo de seções, comparando com AC1. Já no nível mesotextual, nos exemplares AC1 e AC2, destaca-se, por um lado, o papel da paragrafação e da pontuação na mudança de topicalização e, por outro, as figuras, as tabelas, as respectivas legendas e os mecanismos de reenvio intratextual que remetem para esses elementos (como, por exemplo, as indicações fig. 1 e fig. 2), bem como a numeração que remete para a seção peritextual das referências no final do plano, no caso do exemplar AC1.

Embora a ocorrência de organizadores textuais linguísticos não tenha um papel significativo, ocorrem, pontualmente, organizadores enumerativos aditivos com função de marcadores de integração linear (além disso, AC1, p. 97) e marcadores de mudança de topicalização (relativamente, AC2, p. 10). Assim, na maioria dos casos, a mudança de topicalização, a integração linear e a ilustração/exemplificação são asseguradas pelos mecanismos gráficos e pela pontuação.

Quanto ao corpo do texto de AC3, ele encontra-se disposto numa única coluna e os conteúdos estão distribuídos por três seções que correspondem a três fases cronologicamente motivadas: formação (projeto) de vida em comum; vida em comum; crise da vida em comum. Desse modo, ao contrário do que se observou em AC1, os nomes das seções explicitam os conteúdos tematizados em cada uma delas, mas de tal maneira que dificilmente eles podem ser replicados em outros textos do mesmo gênero. A propósito de patologias diversas, outros artigos da área das Ciências Farmacêuticas plausivelmente incluem (sub)seções intituladas “taxonomia”, “fisiopatologia” e “epidemiologia”, como foi atestado em AC1. Em outros artigos de Direito, porém, será menos comum (e mesmo pouco plausível) as respectivas seções reproduzirem os títulos exatos que constam de AC3. Acresce que, em AC3, os intertítulos em negrito, delimitadores das seções, são numerados, sublinhando, assim, a ordem cronológica das três fases tematizadas.

Cada uma dessas seções aparece subdividida em dois níveis hierárquicos que correspondem a subtópicos do tema de cada seção. No primeiro nível, ocorrem alíneas representadas por letras minúsculas ordenadas alfabeticamente, que, por sua vez, são subdivididas em alíneas representadas pelo sistema de numeração romano. Nesse sentido, no texto AC3, há três níveis hierárquicos de seções, delimitados por diferentes mecanismos de organização textual gráficos, sublinhando, assim, a configuração do plano de texto.

Embora o plano de texto seja menos previsível em AC3 (em comparação com AC1 e com AC2), tendo em conta que os títulos e intertítulos das seções e das subseções são escolhidos em função dos temas abordados, a seção sumário, que antecede o corpo do texto, explicita claramente a hierarquização. Esse tipo de organização textual é recorrente em gêneros de caráter normativo, nomeadamente nos que estão associados à atividade jurídica/legislativa, como, por exemplo, o projeto de lei12 12 . Essa constatação parece indiciar que há hibridismo nos textos dos gêneros usados numa dada área disciplinar. O caráter normativo e fortemente hierarquizado de muitos gêneros recorrentes na área da Justiça parece “contaminar” e refletir-se na estruturação e no estilo adotado em textos de outros gêneros usados no seio dessa área, tipicamente menos normativos. Mantynen e Shore (2014: 747-749) designam por “apropriação de gênero” o fenômeno de hibridismo em que textos de um dado gênero adotam a esquematização geral de textos de um outro gênero. . Assim, tal como foi referido a propósito de AC1 e AC2, em AC3, o plano de texto é sublinhado em nível macrotextual, por mecanismos gráficos de organização textual. Distingue-se, porém, dos exemplares de Ciências Farmacêuticas (AC1), de Engenharia (AC2) e de Literatura (AC4), como veremos adiante, pela marcada hierarquização dos conteúdos e pelos mecanismos de organização textual gráficos específicos que a evidenciam (como é o caso das alíneas). Desse modo, a estruturação do texto AC3 parece evidenciar propriedades específicas da área disciplinar em que é produzido.

Por outro lado, enquanto os textos AC1 e AC2 apresentam várias seções mistas (blocos verbais, figuras e uma tabela), nos textos AC3 e AC4 ocorrem apenas seções verbais, não sendo mobilizados mecanismos de outros sistemas semióticos. Essas divergências decorrem, sobretudo, dos diferentes temas contemplados, mas podem, também, ser indexadas a práticas discursivas específicas das áreas de investigação em causa. Em AC1 e AC2, os conteúdos tematizados implicam a necessidade de ilustrar aquilo que é linguisticamente descrito. Em AC3 e AC4, há conteúdos que requerem informação complementar, função que é assumida pelas notas de rodapé (em AC3) e de fim de texto (em AC4). As notas, além de constituírem um procedimento de reenvio intertextual, evocando e remetendo para outras obras e autores, esclarecem e aprofundam conteúdos tematizados no corpo do texto, não comprometendo, assim, a mancha gráfica e a legibilidade linear do artigo.

Ao nível mesotextual, em AC3, para além dos parágrafos, pontuação, espaços em branco e alíneas, verifica-se que são mobilizados organizadores textuais linguísticos, nomeadamente enumerativos aditivos, com função de mudança de topicalização (também, p. 292); organizadores temporais (então, p. 298; depois, p. 300) de integração linear (por um lado/por outro, p. 296; assim, p. 296, p. 297, p. 299); introdutores de exemplos (por exemplo, p. 296), entre outros, presentes nos exemplares atestados.

Quanto ao exemplar da área da Literatura (AC4), apresenta particularidades quer no nível das seções peritextuais (como o resumo e as palavras-chave em francês), quer no corpo do texto. Ao contrário de AC1, AC2 e AC3, em AC4, os conteúdos não são distribuídos por seções graficamente delimitadas, tendo, por isso, uma organização menos previsível para o gênero. Essa estruturação é mais próxima da que se associa ao ensaio, em que predomina o caráter reflexivo usual nas práticas da área disciplinar em causa.

A ausência de divisão explícita, todavia, não equivale à ausência de estruturação minimamente previsível dos conteúdos. É possível reconhecer que os conteúdos estão organizados, sequencialmente, em três blocos textuais: introdução, desenvolvimento e conclusão. Além disso, embora não sejam explicitadas as seções, como nos restantes exemplares, sua abertura e fechamento são linguisticamente evidenciados. Como se ilustra no quadro seguinte, são sobretudo os conteúdos tematizados que indiciam a abertura e o fechamento das seções: apenas o fechamento da seção desenvolvimento e a abertura da conclusão são explicitamente marcados por marcadores de integração linear.

Quadro 7
Organização dos conteúdos no corpo do texto do exemplar AC4

O mecanismo usado para sublinhar o início da introdução (que corresponde ao início do artigo) consiste em localizar, temporalmente, o tema abordado, destacando sua relevância e atualidade. Trata-se de uma forma comum de iniciar artigos, concretizando um passo específico, previsto no movimento 1 (“Delimitar um território”) do modelo de Swales (1990______. 1990. Genre analysis. Cambridge: Cambridge University Press.): salienta-se a relevância do tema, pelo fato de ter sido abundantemente tratado, e menciona-se estudos realizados, assim como as principais ideias que eles veiculam.

Menos evidente é o mecanismo que prenuncia a seção de desenvolvimento. Porém, a seleção do verbo “começar” sublinha que terminou o enquadramento e a contextualização do artigo, e se inicia, nessa frase, o desenvolvimento e, por conseguinte, a parte mais substancial do artigo (em termos da quantidade de informação nova a comunicar).

A parte final é também destacada pela ocorrência de uma forma lexical, neste caso, da forma verbal “finalizar”. Note-se que, em todos os casos, como seria previsível, o início das várias “partes” do artigo (e, em especial, no caso do desenvolvimento e da conclusão) é, concomitantemente, assinalado pela mudança de parágrafo.

Assim, também desse ponto de vista, embora os quatro textos inscrevam-se no mesmo gênero, os respectivos planos de texto manifestam propriedades específicas que parecem ser determinadas, por um lado, pelas diferentes diretrizes das revistas de divulgação científica e, por outro, pelas práticas discursivas distintas dos diferentes domínios científicos em que os textos foram produzidos.

7. Considerações finais

Ao longo deste trabalho, refletiu-se sobre o plano de texto do gênero artigo científico e procedeu-se ao levantamento preliminar das suas principais características, com vista a uma aplicação ao ensino. A partir da análise efetuada, constatou-se que os planos dos quatro exemplares apresentam propriedades comuns e outras específicas, que decorrem dos modos particulares de fazer e divulgar ciência, em uso nas quatro áreas científicas.

Relativamente aos aspectos divergentes, em AC1 (exemplar da área das Ciências Farmacêuticas) e AC2 (exemplar da área da Engenharia Civil), os conteúdos tematizados são ordenados de acordo com uma distribuição típica de áreas de investigação de tipo experimental, que reflete as diversas etapas do processo de investigação: Introdução, Metodologia, Resultados, Discussão e Conclusão (IMRDC). Essa ordenação previsível é evidenciada pelos intertítulos em negrito, que explicitam seções convencionais, bem como pelos mecanismos gráficos de organização textual que ilustram o processo experimental de pesquisa. Em AC3 (exemplar da área do Direito), todavia, os conteúdos são distribuídos de acordo com os temas selecionados, e não segundo seções cujos títulos (e respectivos conteúdos) são convencionados e previsíveis no seio da área disciplinar em causa. Nestes três exemplares, AC1, AC2 e AC3, o texto está segmentado em diversas seções.

Já em AC4 (exemplar da área da Literatura), embora as seções do corpo do texto não sejam graficamente delimitadas por meio de intertítulos, identificam-se três grandes blocos temáticos (introdução, desenvolvimento e conclusão), evidenciados por mecanismos linguísticos, estando, dessa forma, distribuídos, tal como em AC3, de acordo com a progressão do tema objeto de reflexão. A ordenação dos conteúdos não é previsível, como sucede nos artigos AC1 e AC2, de áreas disciplinares das Ciências (C), mas depende quer dos temas tratados, quer das opções dos autores.

Essas distinções provavelmente ficam a dever-se ao fato de, nos artigos em causa (de áreas disciplinares das Ciências Sociais e Humanas e das Humanidades: CSHH), não se proceder à exposição de um processo experimental, mas, em vez disso, à tematização de um objeto de estudo que depende mais da reflexão e não tanto da experimentação. Assim, parece plausível dizer que, em AC1 e AC2, os conteúdos são sequencialmente distribuídos (numa disposição predominantemente horizontal), enquanto, em AC3, os conteúdos ocorrem hierarquicamente organizados (sublinhando uma ordenação tendencialmente vertical). Em AC4, eles ocorrem sequencialmente delimitados em três blocos temáticos. Essas divergências demonstram que as propriedades do plano de texto do artigo científico parecem depender, em parte pelo menos, das especificidades das áreas científicas, nomeadamente no que diz respeito aos processos de investigação adotados (de natureza mais experimental ou de natureza mais especulativo-reflexiva). Isso significa que, quando se comunica o processo de pesquisa, os diversos domínios científicos regulam de modos diversos não só os conteúdos contemplados e admitidos, mas, de igual modo, a forma como eles são tematizados e organizados no espaço textual.

Contudo, também se observaram convergências, por exemplo, na presença de seções que explicitam a autoria dos textos e a sua organização, ainda que sejam atualizadas a partir de diferentes mecanismos de organização textual. Assim, embora os elementos peritextuais sejam maioritariamente comuns e previsíveis, é necessário observar e considerar as práticas em uso dos domínios científicos e as diretrizes específicas das revistas de divulgação científica. Além disso, três dos quatro exemplares caracterizam-se pela distribuição dos conteúdos tematizados em seções graficamente delimitadas. Trata-se, portanto, de uma propriedade composicional relevante deste gênero (o que não significa necessariamente que esteja generalizada a todos os exemplares do gênero, como atesta AC4). Porém, como foi já sublinhado, a sequencialização e a hierarquização dos conteúdos são fortemente reguladas pelos domínios científicos.

Em suma, as propriedades do plano de texto são determinadas por múltiplos fatores: i) pela área científica/disciplinar em que o gênero é mobilizado, ii) pelas características do gênero (e o seu maior ou menor grau de cristalização numa dada sincronia), iii) pelos conteúdos admitidos/contemplados nos diferentes domínios científicos, iv) pelas diretrizes específicas decorrentes da atividade editorial (que diferem de revista para revista) e, por último, v) pelo modo singular como cada produtor textual atualiza essas propriedades, simultaneamente adotando-as e adaptando-as. Parece, então, evidente que o plano de texto do gênero artigo científico admite variações, caracterizando-se por uma significativa flexibilidade, associável a áreas disciplinares distintas (ou seja, decorrentes de práticas sociodiscursivas diferentes, em consonância com as respectivas comunidades acadêmico-científicas). A estruturação fortemente hierarquizada de AC3 e a estruturação particular de AC4 (de acordo com a progressão do tema objeto de reflexão e sem divisão em seções) demonstram que é possível introduzir, nesse gênero, características inerentes a uma área disciplinar específica. E essa constatação sublinha a flexibilidade do gênero artigo científico.

Desse ponto de vista, a maleabilidade do gênero é um aspecto que deve ser equacionado na leitura e na interpretação de artigos científicos, bem como na planificação da produção textual. Consequentemente, a transposição didática das propriedades do plano de texto deverá, por um lado, considerar os múltiplos fatores que as determinam e, por outro, adaptá-las às especificidades do contexto de ensino, como, por exemplo, o nível de escolaridade ou a área científica do curso. Nesse sentido, a reflexão sobre o ensino das propriedades do plano de texto do artigo científico deverá ser articulada às seguintes questões: Quem escreve e para quem se escreve? Qual a finalidade do texto? Em que área científica se inscreve e quais as práticas em uso? O que é que se pretende tematizar e como é que os conteúdos deverão estar organizados no espaço textual? Quais são as diretrizes e os critérios das revistas de divulgação científica?

Além disso, importa salientar que o plano de texto é apenas uma das propriedades do gênero e, por isso, sua aplicação ao ensino deverá ser complementada com o estudo de outras dimensões, como, por exemplo, os mecanismos enunciativos mobilizados. De qualquer modo, a pesquisa realizada com base nas propostas teórico-metodológicas selecionadas e que incidiu em quatro exemplares do gênero artigo científico permitiu identificar algumas das principais propriedades dos respectivos planos de textos, quer as que são convergentes, quer as que se revelaram divergentes. Nesse sentido, o processo e as conclusões desta pesquisa podem ser considerados validados.

Contudo, deve ser sublinhado que os resultados alcançados não permitem extrair conclusões definitivas e inequívocas. Como foi anteriormente mencionado, esta reflexão de caráter exploratório teve como objetivo fornecer pistas pertinentes, devendo, por isso, ser desenvolvida e aprofundada em trabalhos futuros que contemplem mais exemplares do gênero artigo científico, bem como de muitas outras áreas disciplinares.

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Referências do corpus analisado

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  • 2
    Trabalho desenvolvido no âmbito do Projeto Estratégico do CELGA-ILTEC, Centro de Estudos de Linguística Geral e Aplicada da Universidade de Coimbra (POCI-01-0145-FEDER-006986), cofinanciado pelo Governo de Portugal, através da Fundação para a Ciência e Tecnologia, e pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) da União Europeia, através do COMPETE - Programa Operacional Conhecimento e Inovação (POCI).
  • 4
    Bolseira de investigação do Programa de Doutoramento FCT “KRUse-Knowledge, Representation & Use”, bolsa de investigação com a referência PD/BD/113974/2015. O trabalho é financiado por fundos nacionais portugueses, através da FCT Fundação para a Ciência e Tecnologia, como parte do projeto do Centro de Linguística da Universidade Nova de Lisboa - UID/LIN/03213/2013.
  • 5
    . Podem ser usadas outras etiquetas equivalentes, como apresentação, considerações preliminares, considerações finais, reflexões finais, etc.
  • 6
    . Outros aspetos relacionados ao estilo adotado, como a modalização e o metadiscurso, têm, também, sido objeto de pesquisa nos gêneros acadêmicos (Hyland 2017HYLAND, Ken. 2017. Metadiscourse: what is it and where is it going? Journal of Pragmatics 113: 16-29.).
  • 7
    . Em trabalhos anteriores, constatou-se que a função dos organizadores textuais é revelada textualmente, ou seja, uma forma linguística pode assumir diferentes funções no plano de texto (cf. Rosa et al. 2018ROSA, Rute, et al. 2018. Organizadores textuais e plano de texto: a forma “e”. Revista da Associação Portuguesa de Linguística 4: 240-253. Disponível em: <Disponível em: https://ojs.apl.pt/index.php/rapl/article/view/43 > Acesso em: 6 dez. 2018. DOI https://doi.org/10.26334/2183-9077/rapln4ano2018a43
    https://ojs.apl.pt/index.php/rapl/articl...
    ).
  • 8
    . No final do texto AC3, ocorre a indicação de que foi produzido no Porto, em maio de 2005, mas a sua publicação data de 2006.
  • 9
    . A Acta Farmacêutica Portuguesa, a Revista de Engenharia Civil da Universidade do Porto, a Revista da Faculdade de Direito da Universidade do Porto (RFDUP) e a Revista do Instituto de Literatura Comparada de Margarida Losa são publicações periódicas de caráter científico. A primeira, de Ciências Farmacêuticas, contempla artigos relacionados com as Ciências da Saúde, Ciências e Cuidados Farmacêuticos. A segunda, a de Engenharia Civil, publica investigações originais nas áreas de Construção Civil, Estruturas, Geotecnia, Hidráulica, Materiais, Planeamento e Transportes. A terceira, de Direito, publica artigos doutrinais no domínio das Ciências Jurídicas e da Criminologia. A quarta, a de Literatura, publica trabalhos sobre poesia e prosa moderna e contemporânea que privilegiem análises e instrumentos teóricos comparatistas e perspectivas interartísticas.
  • 10
    . Essa disposição gráfica é um mecanismo de orientação da leitura comum em revistas da área das Ciências, bem como em gêneros associados a essa esfera de atividade, como, por exemplo, na bula de medicamento (cf. Rosa 2018bROSA, Rute. 2018b. A noção de padrão discursivo: balanço e perspetivas. In: BROCARDO, Maria Teresa; CORREIA, Clara Nunes. Cadernos WGT. Balanços e perspetivas. Lisboa: Centro de Linguística da Universidade Nova: 1-6. Disponível em: <Disponível em: http://clunl.fcsh.unl.pt/wp-content/uploads/sites/12/2018/04/3_17WGT_Rosa.pdf > Acesso em: 8 de dez. 2018.
    http://clunl.fcsh.unl.pt/wp-content/uplo...
    ).
  • 11
    . Muitas vezes, as seções relativas aos Resultados e à Discussão ocorrem amalgamadas (como se observa em AC1 e na seção 3 de AC2). Além disso, as conclusões nem sempre são integradas numa seção autônoma; nesses casos, os conteúdos que ela geralmente contempla são incluídos na última seção do artigo (como sucede em AC1 que condensa, na seção final, os conteúdos relativos aos Resultados, à Discussão e à Conclusão). Assim, apesar de não se apresentar dividido em cinco seções autônomas etiquetadas da maneira mais recorrente e previsível, o artigo AC1 (e também o AC2) está formatado de acordo com o plano de texto IMRDC, dado que inclui os conteúdos tipicamente associados a cada uma das seções previstas nesse modelo.
  • 12
    . Essa constatação parece indiciar que há hibridismo nos textos dos gêneros usados numa dada área disciplinar. O caráter normativo e fortemente hierarquizado de muitos gêneros recorrentes na área da Justiça parece “contaminar” e refletir-se na estruturação e no estilo adotado em textos de outros gêneros usados no seio dessa área, tipicamente menos normativos. Mantynen e Shore (2014MANTYNEN, Anne; SHORE, Susana. 2014. What is meant by hybridity? An investigation of hybridity and related terms in Genre Studies. Text and talk 34 (6): 737-758.: 747-749) designam por “apropriação de gênero” o fenômeno de hibridismo em que textos de um dado gênero adotam a esquematização geral de textos de um outro gênero.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    18 Dez 2018
  • Aceito
    27 Jun 2019
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