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Teoria do texto e teoria do ensino: notas para um concerto interdisciplinar

Text theory and teaching theory: notes for an interdisciplinary concert

RESUMO

Este texto propõe articular dois conjuntos de aportes teóricos para a compreensão de um episódio de interação em uma turma de 1o. Ano do Ensino Fundamental de uma escola pública de São Paulo (Brasil): por um lado, uma teoria linguística - especialmente aquela desenvolvida no campo dos estudos do texto - e, por outro lado, uma teoria didática - especialmente aquela desenvolvida no campo das didáticas disciplinares. O exercício de confronto proposto permite, por hipótese, recolocar o problema das relações fronteiriças entre o linguístico e o didático no empreendimento de descrição e análise da interação em sala de aula.

Palavras-chave:
Interação; Perspectiva interdisciplinar; Teoria do ensino; Teoria do texto

ABSTRACT

This paper aims to articulate two sets of theoretical contributions to the understanding of an episode of interaction in a class of 1st. Year of Elementary School of a public school in São Paulo (Brazil): on the one hand, a linguistic theory - especially that developed in the field of textual studies - and, on the other hand, a didactic theory - especially that developed in the field of disciplinary didactics. The proposed confrontation exercise allows, by hypothesis, to re-address the problem of frontier relations between the linguistic and the didactic in the enterprise of description and analysis of classroom interaction.

Keywords:
Interaction; Interdisciplinary perspective; Teaching theory; Text theory

Introdução

Sempre pede a algum aluno para indicar o tempo verbal empregado no exemplo escrito com giz na lousa e solicita um novo exemplo, com a utilização de outro verbo. Ocorreu um fato inusitado: um dos alunos citou um verbo no imperativo (assunto da aula anterior) e a professora argumentou que nesse caso expressava ordem e, automaticamente, outro aluno completou: “... e progresso”. Todos riram, mas a professora ignorou e continuou o tema da aula, quando na minha opinião poderia explorar mais o raciocínio do aluno, de maneira a convidá-lo à participação na aula.

(R. F. Relatório de Estágio, 2009)

O excerto que serve de epígrafe a este texto - recuperado de relatório de estágio escrito por estudante de Curso de Licenciatura em Letras - auxilia, como mote inicial, o propósito deste estudo em problematizar as relações de diálogo possíveis entre uma teoria linguística - especialmente aquela desenvolvida no campo dos estudos do texto brasileiros2 2 Refiro-me, no caso em questão, ao amplo programa de pesquisas encaminhado, junto a gerações de alunos e colegas, por Ingedore G. V. Koch, na área de Linguística Textual e Análise da Conversação (incluído o Grupo de Trabalho homônimo no âmbito da Associação Nacional de Pós-Graduação em Letras e em Linguística - ANPOLL). Este texto é uma homenagem (in memoriam) a Ingedore, pela inspiração intelectual. - e uma teoria didática - especialmente aquela desenvolvida no campo das didáticas disciplinares. Para tanto, procuro, mais especificamente, em um primeiro momento, enfatizar a historicidade das relações de aproximação entre preocupações de ordem linguística e preocupações de ordem didática, na produção acadêmica brasileira, e, em seguida, discutir, pela consideração de um episódio de interação escolar, como tais relações de aproximação podem ser compreendidas com base em uma perspectiva interdisciplinar em que o linguístico e o didático são tomados como facetas imbricadas das relações sociais que ganham corpo na sala de aula, interdependentes e reciprocamente interferentes. Por fim, levanto alguns elementos de discussão para a reflexão sobre o lugar da linguagem e dos processos de subjetivação dos sujeitos na vida da escola pública, atualmente.

Um suposto da possibilidade de compreender as relações entre teoria linguística e teoria didática pode ser buscado no próprio sentido etimológico do termo ensinar - do latim insignare, “fazer conhecer pelos signos” (Rey 1992: 695 apudSchneuwly 2009_____; DOLZ, Joaquin. 2009. Des objets enseignés en classe de français - Le travail de l’enseignant sur la rédaction de texts argumentatifs et sur la subordonnée relative. Rennes, FR: Presses Universitaires de Rennes.: 32), o que supõe a linguagem como condição de possibilidade do ensino, como realidade semiótica em que as ações e a intencionalidade do ensino se materializam. A formulação de Boto (2003BOTO, Carlota. 2003. A civilização escolar como projeto político e pedagógico da modernidade: cultura em classes, por escrito. Cadernos Cedes, Campinas, v. 23, n. 61: 378-397.), quando de sua caracterização sócio-histórica dos processos de escolarização da sociedade ocidental moderna, qualifica tal suposto nos seguintes termos:

Ensinar é nomear, indicar, oferecer pistas e sinais - talvez indícios. Pelas palavras de Lauand, “o professor, tudo o que faz é en-signar (insegnire), apresentar sinais para que o aluno possa por si fazer a edução do ato de conhecimento” (Lauand, 2000, p. 21). Em uma palavra - ensinar é marcar a alma; e desta responsabilidade nenhum educador escapa... (Boto 2003BOTO, Carlota. 2003. A civilização escolar como projeto político e pedagógico da modernidade: cultura em classes, por escrito. Cadernos Cedes, Campinas, v. 23, n. 61: 378-397.: 395)

Retomemos a epígrafe e notemos que ela descreve e representa um episódio de ensino em uma aula de língua portuguesa. Trata-se de um episódio em que justamente se indicia um conjunto de determinantes do contexto didático suscetíveis de depreensão por diferentes lupas ou operações metodológicas. Assim, poder-se-ia abordar, por exemplo: i) o modo de manejo e a reiteração do instrumento de ensino (a exposição oral dialogada com apoio no uso de quadro e giz; “Sempre pede... e solicita...”); ii) a natureza do objeto de conhecimento em tela na interação entre professora e alunos (o tópico gramatical verbo - tempos e modos - e seu lugar de prestígio na tradição de ensino de língua portuguesa) ou, ainda, iii) a instanciação da relação pedagógica (os papeis assumidos e as posições ocupadas pelos participantes ou agentes - “Todos riram, mas a professora ignorou e continuou o tema da aula”)3 3 Entre essas determinantes, caberia certamente considerar o próprio modo de enunciação do autor do relatório quando da representação do episódio de ensino na condição de estagiário e futuro professor (as apreciações de valor evocadas ou formuladas - “... quando na minha opinião poderia explorar mais o raciocínio do aluno, de maneira a convidá-lo à participação na aula”). .

Esses três conjuntos de determinantes aparecem indiciados no episódio de ensino representado no relatório: na interação oral, no texto escrito na lousa, na gestualidade, no deslocamento espacial, nos artefatos materiais. É nesse campo de signos ou campo demonstrativo (Hanks 2008HANKS, Willian F. 2008. O que é contexto. In: Língua como prática social: das relações entre língua, cultura e sociedade a partir de Bourdieu e Bakhtin. São Paulo: Cortez Editora: 169-203.: 182) - em que objeto de conhecimento, instrumento de ensino e relação pedagógica constituem-se reciprocamente - que se criam as condições para a inscrição da língua na ação de ensino e para a indexação da ação didática na materialidade linguística. O indício mais contundente dessa relação de reciprocidade talvez esteja na construção sintática por justaposição, no jogo de pergunta-resposta da professora com o aluno: ou seja, na formulação distribuída do sintagma “ordem... e progresso” (evocação do lema da Bandeira Nacional brasileira em meio a uma aula sobre modo imperativo do verbo) e nos efeitos de sentido que sua assunção é suscetível de gerar.

1. Linguagem e ensino: um percurso de aproximações na academia brasileira

No contexto brasileiro, a reflexão sobre as relações entre temas e questões de linguagem e aqueles de ensino de língua adquire uma visibilidade particular na virada dos anos setenta para a década de oitenta do século passado: trata-se de um momento histórico de apropriação de um conjunto de saberes teórico-disciplinares na direção de constituição de um discurso sobre a linguagem e sobre seu lugar na prática educacional.

Na síntese que propõe em torno da produção acadêmica sobre ensino de língua portuguesa, Soares (1997) traça o percurso do interesse dos estudos linguísticos pelo ensino do português, a partir dos anos 1970 até meados dos anos 1980. Para a autora, tal interesse teria partido de uma postura prescritiva suposta na ênfase aos procedimentos técnicos de ensino para a postura diagnóstica suposta no discurso sobre a crise e o fracasso, e, dessa, para a postura propositiva suposta na elaboração conceitual e aplicada da compreensão e do enfrentamento dos desafios. Nos termos de Soares:

(...) transitáramos da prescrição à denúncia; esta, agora, encontra nas ciências linguísticas caminhos de entendimento e explicação da crise e do fracasso, e propostas de solução. (Soares 1997: XI)

Geraldi; Silva e Fiad (1996GERALDI, João W.; SILVA, Lilian L. M. da; FIAD, Raquel S. 1996. Linguística, ensino de língua materna e formação de professores. DELTA, vol. 12, no. 2: 307-326.), por sua vez, assinalam como o mesmo interesse da ciência linguística pelo ensino de língua aparece configurado em duas edições da Revista de Cultura da Editora Vozes, no final dos anos 1970: uma delas propondo um dossiê sobre Sociolinguística e outra um dossiê intitulado Teoria da Linguagem e Ensino. As relações de aproximação de que tratamos estão ainda supostas em dois volumes do Boletim da Associação de Linguística do Brasil (ABRALIN), no início dos anos 1980: i) ABRALIN (1982ABRALIN. 1982. Boletim da Associação Brasileira de Linguística. No. 3. Recife, PE: ABRALIN-UFPE.). Boletim da ABRALIN, no. 3 - O discurso nas formas institucionais da educação; e ii) ABRALIN (1983_____. 1983. Boletim da Associação Brasileira de Linguística. No. 4. Recife, PE: ABRALIN-UFPE.). Boletim da ABRALIN, no. 4 - A relevância pedagógica da Linguística no Brasil.

Na percepção dessas relações de aproximação, Rojo (2007ROJO, Roxane H. R. 2007. Práticas de ensino em língua materna: Interação em sala de aula ou aula como cadeia enunciativa? In: KLEIMAN, Angela; CAVALCANTE, Marilda C. (Orgs.). Linguística Aplicada: suas faces e interfaces. Campinas, SP: Mercado de Letras , p. 339-360.) assinala certo dualismo entre as instâncias linguística e didática na pesquisa sobre a interação em sala de aula. Para a autora,

A aula tem sido mais frequentemente tratada, em pesquisas e descrições, ou como atividade didática - pelas disciplinas ligadas à área de Educação (Sociologia da Educação, Psicologia da Aprendizagem etc.) -, ou como um tipo específico de interação face a face ou conversação, por certas áreas de investigação, como a Sociolinguística Interacional e a Micro-Etnografia da Fala. No primeiro caso, dá-se atenção aos objetos e métodos de ensino e sua organização e ao seu impacto na aprendizagem. No segundo, às pautas de interação, à estrutura de participação, às trocas conversacionais em sala de aula. Assim, nas pesquisas, a tendência é que as análises dos temas e da organização formal (conversacional) da aula mantenham-se separadas. (...) Isso tem dificultado a interpretação das análises que tomam como pressuposto que é a linguagem e o discurso que dão materialidade ao processo de ensino-aprendizagem de sala de aula (Rojo 2007ROJO, Roxane H. R. 2007. Práticas de ensino em língua materna: Interação em sala de aula ou aula como cadeia enunciativa? In: KLEIMAN, Angela; CAVALCANTE, Marilda C. (Orgs.). Linguística Aplicada: suas faces e interfaces. Campinas, SP: Mercado de Letras , p. 339-360.: 339).

Na síntese que formula das tradições disciplinares voltadas à investigação da interação em sala de aula, a autora distingue e qualifica cinco abordagens:

  • i) aula como interação - estudo do “fluxo de conversa e de interação em sala de aula” (Rojo 2007ROJO, Roxane H. R. 2007. Práticas de ensino em língua materna: Interação em sala de aula ou aula como cadeia enunciativa? In: KLEIMAN, Angela; CAVALCANTE, Marilda C. (Orgs.). Linguística Aplicada: suas faces e interfaces. Campinas, SP: Mercado de Letras , p. 339-360.: 340-341) - abordagem predominante entre as décadas de 1970 e 1980;

  • ii) aula como discurso e gênero - caracterização da aula em sua organização composicional global e em seu funcionamento discursivo, considerando sua “faceta didática”;

  • iii) aula como processo de ensino e aprendizagem - caracterização da aula sob a perspectiva sócio-cultural de base vygotskiana e a perspectiva enunciativa de base bakhtiniana, com presença na década de 90.

Ao qualificar essas três abordagens, a autora localiza seu limite na ausência de consideração ou no pouco aprofundamento de determinações relativas seja às particularidades do campo social (escolar) em que a interação ganha corpo, seja aos “processos de ensino-aprendizagem presentes” (Rojo 2007ROJO, Roxane H. R. 2007. Práticas de ensino em língua materna: Interação em sala de aula ou aula como cadeia enunciativa? In: KLEIMAN, Angela; CAVALCANTE, Marilda C. (Orgs.). Linguística Aplicada: suas faces e interfaces. Campinas, SP: Mercado de Letras , p. 339-360.: 342), seja, ainda, à “constituição do objeto de ensino” (Rojo 2007ROJO, Roxane H. R. 2007. Práticas de ensino em língua materna: Interação em sala de aula ou aula como cadeia enunciativa? In: KLEIMAN, Angela; CAVALCANTE, Marilda C. (Orgs.). Linguística Aplicada: suas faces e interfaces. Campinas, SP: Mercado de Letras , p. 339-360.: 344). É nesse limite que a autora apresenta outras duas abordagens da aula, a saber:

  • iv) aula como circulação dos objetos de conhecimento - constituídos em objetos de ensino - nas práticas didáticas efetivas: abordagem que concebe a aula pelo foco nos “objetos ensinados” pela mediação do trabalho docente, e

  • v) aula como “sistema de atividades/sistema de gêneros”, conforme a perspectiva acional que incorpora os processos de produção de textos ao “sistema de gêneros textuais” em que adquirem existência material e, esses últimos, ao “sistema de atividades humanas” em uma esfera social particular.

Na exposição de uma abordagem alternativa às qualificadas, a autora propõe um confronto interdisciplinar: “uma ferramenta descritiva e interpretativa que pudesse dar conta tanto dos movimentos discursivos da aula como dos objetos ensinados e do processos de ensino aprendizagem” (Rojo 2007ROJO, Roxane H. R. 2007. Práticas de ensino em língua materna: Interação em sala de aula ou aula como cadeia enunciativa? In: KLEIMAN, Angela; CAVALCANTE, Marilda C. (Orgs.). Linguística Aplicada: suas faces e interfaces. Campinas, SP: Mercado de Letras , p. 339-360.: 355).

Esse conjunto de referências aponta para a historicidade do interesse pela aproximação e pelo confronto de uma teoria da linguagem com outra do ensino. Pode-se dizer que permitem criar inteligibilidade sobre a natureza diversa dos fenômenos sociais que ocorrem em sala de aula, embora restem ainda suscetíveis de aprofundamento - como observa Rojo - as relações de imbricação entre o linguístico e o didático.

O problema que proponho enfocar, a seguir, retoma e busca adensar a discussão de tais relações para a compreensão da interação em sala de aula4 4 Nessa direção, identifica-se com o exercício interdisciplinar proposto por Rojo (2007). . Como operacionalizar, do ponto de vista metodológico, esse interesse? Um procedimento possível é este de delimitar e qualificar um conjunto específico de aportes teóricos que opere como posto de observação na investigação da questão em tela. No caso deste estudo, a operação interdisciplinar proposta busca articular uma teoria linguística - especialmente aquela desenvolvida no campo dos estudos do texto brasileiros - e uma teoria didática - especialmente aquela desenvolvida no campo dos estudos em didática das disciplinas escolares, na academia genebrina. A contribuição particular de cada uma dessas tradições pode ser assim enunciada:

  1. uma teoria do texto fornece aportes para a caracterização da materialidade da interação didática considerada um texto complexo, comportando temas recorrentes, tópicos discursivos (Fávero 2001FÁVERO, Leonor Lopes. 2001. O tópico discursivo. In: Preti, D. (org). Análise de textos orais. São Paulo: Humanitas, p. 33-54.; Jubran; Urbano; Fávero; Koch; Risso et al 1992JUBRAN, Clélia; URBANO, Hudnilson; FÁVERO, Leonor L.; KOCH, Ingedore G. V.; RISSO, Mercedes S. et al. 1992. Organização tópica da conversação. In: ILARI, Rodolfo (Org.). Gramática do Português Falado, 2: Níveis de Análise Linguística. Campinas: Edunicamp/FAPESP, p. 357-479.; Koch; Bentes e Rezende 2006KOCH, Ingedore G. V.; BENTES, Anna Christina; REZENDE, Renato C. (orgs.). 2006. Cadernos de Estudos Linguísticos. Campinas: Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, No. 48.), modos de organização e funcionamento particulares (Marcuschi 2005_____. 2005. O diálogo no contexto da aula expositiva: continuidade, ruptura e integração. In: PRETI, Dino (org.). Diálogos na fala e na escrita. São Paulo: Humanitas, p. 45-83.; Silva 2003_____. 2003. Estruturas de participação e interação na sala de aula. In: PRETI, Dino (Org.). Diálogos na fala e na escrita. São Paulo: Humanitas, p. 179-203.; 2005SILVA, Luiz A. da. 2005. O diálogo professor/aluno na aula expositiva. In: PRETI, D. (Org.). Diálogos na fala e na escrita. São Paulo: Humanitas , p. 45-83.);

  2. uma teoria do ensino fornece aportes para a interpretação dos efeitos de determinações didáticas nos modos de circulação dos objetos de conhecimento na interação em sala de aula, enfocando especialmente o trabalho docente, os instrumentos e gestos didáticos em que ele se conforma (Aeby Daghé; Dolz 2008AEBY DAGHÉ, Sandrine; DOLZ, Joaquin. 2008. Des gestes didactiques fondateurs aux gestes spécifiques à l’enseignement/apprentissage du texte d’opinion. In: BUCHETON, Dominique; DEZUTTER, Olivier (Org.). Le développement des gestes professionnels dans l’enseignement du français: un défi pour la recherche et la formation. Bruxelles: De Boeck, p. 83-105.; Schneuwly; Dolz 2009_____; DOLZ, Joaquin. 2009. Des objets enseignés en classe de français - Le travail de l’enseignant sur la rédaction de texts argumentatifs et sur la subordonnée relative. Rennes, FR: Presses Universitaires de Rennes.).

A operação teórica e metodológica de confronto desses aportes na descrição e análise de episódios de ensino em aula de língua portuguesa encontra-se desenvolvida, entre outros, em Gomes-Santos; Almeida (2009GOMES-SANTOS, Sandoval Nonato; ALMEIDA, Patrícia Sousa. 2009. Pergunta-resposta: como o par dialógico constrói uma aula na alfabetização. In: Revista Brasileira de Linguística Aplicada. Belo Horizonte: Associação Brasileira de Linguística Aplicada - Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais, volume 9, no. 1: 133-149.) e Gomes-Santos; Jordão (2014_____; JORDÃO, Heloísa G. 2014. Interação e trabalho docente em aula de alfabetização. Trabalhos em Linguística Aplicada (UNICAMP), v. 53, p. 33-54.), ambos voltados a contextos de alfabetização nos anos iniciais do Ensino Fundamental. No primeiro estudo, os autores enfocam o papel do par conversacional Pergunta-Resposta como instrumento didático que estrutura a interação entre professora e alunos, ordenando as participações e operando a topicalização de elementos temáticos de um texto em uma atividade de leitura. No outro estudo, os autores ocupam-se dos diferentes modos com que o gesto da professora de emprego de instrumentos didáticos vai variando ao longo de um período integral de atividades escolares em uma mesma turma. Em ambos, qualifica-se um dos achados da pesquisa sobre a interação em sala de aula apontado na síntese de Rojo (2007ROJO, Roxane H. R. 2007. Práticas de ensino em língua materna: Interação em sala de aula ou aula como cadeia enunciativa? In: KLEIMAN, Angela; CAVALCANTE, Marilda C. (Orgs.). Linguística Aplicada: suas faces e interfaces. Campinas, SP: Mercado de Letras , p. 339-360.), a saber: o texto falado ou a interação oral é sensível à natureza dos objetos de conhecimento e dos instrumentos didáticos acionados (cf. Batista 1997BATISTA, Antonio Augusto G. 1997. Aula de português - discurso e saberes escolares. São Paulo: Martins Fontes.; Matêncio 2001MATÊNCIO, Maria de Lourdes M. 2001. Estudo da Língua Falada e Aula de Língua Materna. Campinas, SP: Mercado de Letras.).

A articulação proposta nesses estudos é a base em que se ancora o breve exercício interdisciplinar de descrição e análise de um episódio de interação em um evento de letramento escolar, proposto na seção logo a seguir.

2. Um episódio de interação no Ciclo de Alfabetização: a Sondagem

O episódio de interação considerado, a seguir, integra o estudo de Torini (2012TORINI, Natalie A. B. 2012. O gesto didático de regulação da aprendizagem: a sondagem em uma turma de alfabetização. Dissertação (Mestrado em Educação). São Paulo: Universidade de São Paulo, Faculdade de Educação.). Nele, a autora analisa um conjunto amplo de episódios de interação que ganham corpo em uma turma de 1o. Ano do Ciclo de Alfabetização de uma escola da rede pública de ensino da cidade de São Paulo (Brasil). Tais episódios definem-se no interior de um procedimento prescrito no âmbito das políticas de elaboração e implementação curricular da Secretaria Municipal de Educação (SME-SP) - a chamada Sondagem. Como um dispositivo institucional5 5 Em sua discussão em torno do conceito de dispositivo, Agamben (2009) assim formula sua definição: “(…) chamarei literalmente de dispositivo qualquer coisa que tenha de algum modo a capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar, modelar, controlar e assegurar os gestos, as condutas, as opiniões e os discursos dos seres viventes. Não somente, portanto, as prisões, os manicômios, o Panóptico, as escolas, a confissão, as fábricas, as disciplinas, as medidas jurídicas etc., cuja conexão com o poder é num certo sentido evidente, mas também a caneta, a escritura, a literatura, a filosofia, a agricultura, o cigarro, a navegação, os computadores, os telefones celulares e - por que não - a própria linguagem, que talvez é o mais antigo dos dispositivos, em que há milhares e milhares de anos um primata - provavelmente sem se dar conta das consequências que se seguiriam - teve a inconsciência de se deixar capturar” (Agamben 2009: 41). Em outra passagem do estudo, o autor afirma que “o dispositivo é, antes de tudo, uma máquina que produz subjetivações e somente enquanto tal é também uma máquina de governo” (Agamben 2009: 46). de regulação da aprendizagem, a sondagem tem o objetivo, segundo Torini, para a SME-SP, de avaliar os níveis de alfabetização das crianças e o trabalho docente; para a professora, o objetivo é diagnosticar as aprendizagens, planejar e intervir.

Trata-se de uma avaliação diagnóstica dos níveis de aquisição da linguagem escrita pelo aluno6 6 A incorporação da Sondagem no currículo oficial do Ciclo de Alfabetização da SME-SP inspira-se nos estudos em psicogênese da língua escrita de Emília Ferreiro e Ana Teberosky, no âmbito dos quais é um procedimento experimental de investigação designado interrogatório (cf. Torini 2012: 84). , realizada pela professora com cada aluno individualmente, no tempo e no espaço de aula, podendo perdurar por um intervalo de semanas a depender do número de alunos por sala (aproximadamente 25 alunos). Do ponto de vista de sua organização composicional global, esse evento de letramento estrutura-se na base do par Pergunta-Resposta. Há um tópico discursivo particular construído na troca interacional: a sondagem ocorre com base em listas de palavras/frase ordenadas por campos semânticos, como aparece no modelo, a seguir, em torno dos “ingredientes para o preparo de uma pizza”:

Lista de palavras e frase da Sondagem

AZEITONA

PRESUNTO

QUEIJO

SAL

EU GOSTO DE QUEIJO

Fonte: Torini (2012TORINI, Natalie A. B. 2012. O gesto didático de regulação da aprendizagem: a sondagem em uma turma de alfabetização. Dissertação (Mestrado em Educação). São Paulo: Universidade de São Paulo, Faculdade de Educação.: 66)

Entre os traços do evento de Sondagem qualificados por Torini encontra-se a multiplicidade de participações nele ensejadas, uma vez que se trata de um tipo de “interação bilateral em contexto de interações multilaterais” (Torini 2012TORINI, Natalie A. B. 2012. O gesto didático de regulação da aprendizagem: a sondagem em uma turma de alfabetização. Dissertação (Mestrado em Educação). São Paulo: Universidade de São Paulo, Faculdade de Educação.: 74). Nos termos da autora,

Apesar de a sondagem ser prevista, na rotina escolar este momento não está isento de múltiplas participações e de interferências, tais como: interrupções dos próprios alunos da turma ou mesmo de funcionários da escola; interrupções da professora quando necessita gerir a turma; barulhos externos etc. Isto decorre do fato de que mesmo sendo realizada com um aluno por vez, a sondagem ocorre dentro do espaço da sala de aula com os demais alunos presentes.

Assim, enquanto a professora interage com um único aluno em um canto da sala, estabelecendo uma interação bilateral, os demais realizam uma tarefa previamente formulada que, em geral, consiste numa atividade de entretenimento, como a pintura de desenhos, a confecção da decoração para uma festa ou qualquer outra atividade facilmente realizada pelas crianças sem o auxílio constante da professora. (Torini 2012TORINI, Natalie A. B. 2012. O gesto didático de regulação da aprendizagem: a sondagem em uma turma de alfabetização. Dissertação (Mestrado em Educação). São Paulo: Universidade de São Paulo, Faculdade de Educação.: 74)

No evento transcrito, a seguir, a professora (P) realiza a atividade com o aluno Paulo (Pa):

Excerto de transcrição de episódio de Sondagem

Pa agora você vai chamar outra pessoa?

P não... você vai escrever pra mim uma lista de ingredientes que vão numa pizza... você sabe o que é pizza? ((o aluno concorda gesticulando com a cabeça))... você gosta de pizza de quê?

Ju de frango

Pa de queijo

P ah... muito bem... então escreve pra mim primeiro AZEItona

[...]

Pa qual é o zê?

P a última letra do alfabeto ((após as interrupções de outros alunos e aparentando ter pressa em concluir a avaliação, a professora fornece a resposta ao aluno rapidamente))

Pa a última... entendi ((o aluno registra a letra Z))

P A-ZÊ... assim já tá ZÊ?

Pa não

P quem que precisa dar a mãozinha pra ele pra fazer zê?

Pa qual é?

P então... quero que você pensa ó... a-zê ((aluno e professora lêem juntos))... assim já tá zê?

Pa não...a-zei-to

P então... como é o to?

Pa deve colocar o a de novo

P o A? no TO?

Pa sabia que o apelido do meu pai é toco?

P e como que é o to?

Pa to... o o O

P o?... então põe ((o aluno registra a letra O na folha))... então vamos ver... A-ZEI-TO-NA ((professora e aluno leem juntos))

Fonte: Torini (2012TORINI, Natalie A. B. 2012. O gesto didático de regulação da aprendizagem: a sondagem em uma turma de alfabetização. Dissertação (Mestrado em Educação). São Paulo: Universidade de São Paulo, Faculdade de Educação., p. 81-87, itálico acrescentado)

Entre outros aspectos, o que chama a atenção nesse evento é a emergência, no fluxo da interação, de um desvio, de uma “perturbação”7 7 O uso do termo “perturbação” inspira-se em Signorini (2002) quando de sua reflexão sobre o desafio dos estudos contemporâneos da linguagem voltados à compreensão de práticas comunicativas em contextos polilinguísticos, no que respeita ao redirecionamento do olhar para fenômenos localizados nas margens das evidências recobertas pela noção de “língua nacional”. Para a autora, “(…) como a questão do processual está necessariamente vinculada à dos mecanismos e condições locais de estabilização/transformação das normas de uso, é preciso deslocar o posto de observação para que apareçam as zonas de instabilidade, as flutuações, os deslocamentos. E também os modos de regulação ou calibragem nas ações dos falantes. (...) O objeto visado não é mais a organização sustentada do todo e de suas partes, e sim o movimento de formação e deformação dos modos de organização desses elementos numa dada ordem, suas divisões, desnivelamentos e sobreposições. Do ponto de vista teórico-metodológico, ao invés de uma simples passagem do nível macro ao micro, é a sobreposição dos dois níveis nas práticas comunicativas o que vai ser focalizado” (Signorini 2002: 94-95). : o aluno estabelece um laço metonímico entre o segmento fônico e o nome de seu pai, rememorando no fio intradiscursivo um componente (de natureza afetiva) da memória discursiva. Com isso, é a cadeia de enunciados da interação que se rompe, sendo imediatamente restituída pela professora.

Nessa direção, poderíamos falar da Sondagem como um gesto profissional8 8 O gesto didático de regulação da aprendizagem, tal como qualificado em Aeby Daghé; Dolz (2007) e Schneuwly (2009), implica tomada de informações dos efeitos do trabalho de ensino na aprendizagem do aluno, podendo captar os aportes e obstáculos com relação à apropriação do conhecimento. que sinaliza, assinala, indexa a dimensão didática do trabalho docente em sua natureza complexa, no que respeita:

  1. ao campo institucional em que a Sondagem encontra-se incorporada (a política oficial de avaliação externa do desempenho dos alunos com finalidade de orientação das políticas públicas para a educação e de seu financiamento);

  2. às formas de trabalho sedimentadas na cultura escolar (a ação de decodificação da escrita em seu plano fonológico-morfológico e em seu nível lexical, nas práticas de alfabetização);

  3. ao cenário mais imediato (a interação oral) em que ganha corpo a relação didática.

Qual o interesse de eventos de letramento como esse (ou como aquele representado na epígrafe deste estudo) para a compreensão das relações entre teoria do texto e teoria do ensino na abordagem da interação em sala de aula? Essa é a questão que proponho enfatizar, a título de conclusão, na seção a seguir.

Considerações finais

O concerto interdisciplinar aqui proposto permite, por hipótese, não apenas adensar a caracterização da interação em sala de aula sob uma perspectiva, a um só tempo, linguística e didática, como também recolocar o problema das relações fronteiriças entre uma teoria do texto e uma teoria do ensino no empreendimento de descrição e análise de práticas de sala de aula.

Entre outras questões, a qualificação da Sondagem como um entre os gestos didáticos do trabalho docente permite pôr em questão, por exemplo, o problema da natureza do contexto em que se constituem as ações de linguagem ou práticas comunicativas dos sujeitos em interação. Mais especificamente, permite qualificar o contexto didático não como moldura (fixa) exterior dos processos de interação pela linguagem ou como “lócus onde a linguagem acontece como espetáculo” (Morato 2004MORATO, Edwiges M. 2004. O interacionismo no campo linguístico. In: BENTES, Anna C.; MUSSALIN, Fernanda (org.). Introdução à linguística: domínios e fronteiras. São Paulo: Cortez, p. 311-351.: 315), nem ainda como entidade cujas propriedades encontram-se definidas plenamente e a priori, mas como co-construção situada. Assim considerando, seria possível admitir que a emergência do nome do pai na fala do filho constitui-se, entre outras razões, pelo fato de o contexto em questão ser justamente de natureza didática (e não um contexto qualquer de interação pela linguagem).

Nessa direção, o gesto didático de regulação da aprendizagem materializado na Sondagem, ao estruturar as participações dos agentes em uma prática sedimentada na forma escolar (Lahire 2008LAHIRE, Bernard. 2008. La raison scolaire - école e pratiques d’ecriture, entre savoir et pouvoir. Rennes, FR: Presses Universitaires de Rennes.), é igualmente estruturado pelas vicissitudes e instabilidades das ações comunicativas desses agentes. Em termos metafóricos, dir-se-ia do didático afetando o linguístico e vice-versa.

Para a teoria do ensino, tais relações recolocam no centro do debate a possibilidade de redefinição do didático como práxis (e a recusa ao didático como conjunto de normas impessoais e procedimentos fixos ditados pela tradição de ensino), o que supõe, por sua vez, a operação epistemológica de redirecionar o olhar para as “situações existenciais” em que se inserem as ações de linguagem dos sujeitos na prática educativa e para a natureza dialógica constitutiva dessas ações, como defende o mestre Paulo Freire (Freire 1967FREIRE, Paulo. 1967. Educação como prática de liberdade. Rio de Janeiro: Paz & Terra.).

Para a teoria do texto, as relações de reciprocidade mencionadas permitem reencontrar e incrementar o postulado de que a construção da linguagem nas práticas comunicativas é função das ações distribuídas dos interactantes, não preexistindo absolutamente a elas - sendo a instabilidade dos sentidos o traço sobre-determinante do funcionamento da linguagem, e a estabilidade desses sentidos considerada, poder-se-ia dizer, efeito de estabilidade9 9 A esse propósito, conferir Mondada; Dubois (1995) e sua qualificação da noção de objetos-de-discurso. . A cadeia de metáforas evocadas por Marcuschi (2007MARCUSCHI, Luiz Antonio. 2007. Coerência e cognição contingenciada. In Cognição, linguagem e práticas interacionais. Rio de janeiro: Lucerna, p. 13-30.: 108) em sua definição de língua ilustra esse postulado:

Uma concepção dinâmica de língua, não essencialista nem formalista, é decisiva para as análises que pretendo fazer aqui. Neste sentido, concebo a língua muito mais pela metáfora da “lâmpada” que do “espelho”, pois ela não é uma representação especular do mundo e sim uma apresentação; a língua não é um retrato e sim um trato do mundo, isto é, uma forma de agir sobre ele. Mais do que capital, a língua é uma moeda, servindo para trocas; mais do que um almoxarifado de mercadorias disponíveis (num estoque de itens lexicais) a língua é uma carpintaria (uma espécie de heurística). A língua não é uma dupla de trilhos a ligar dois polos - o mundo e a mente -, mas um conjunto de trilhas que decidimos seguir mesmo que dê em aporias. Com isto perguntamos muito mais pelos processos de construção de sentido na interlocução e muito menos pelos sentidos eventualmente construídos nessa interlocução. (Marcuschi 2007MARCUSCHI, Luiz Antonio. 2007. Coerência e cognição contingenciada. In Cognição, linguagem e práticas interacionais. Rio de janeiro: Lucerna, p. 13-30.: 108)

Para ambas (teoria do texto e teoria do ensino), refinar a postura propositiva preconizada no interesse de aproximação entre o linguístico e o didático na compreensão da interação em sala de aula parece implicar pensar como essas relações de aproximação - como busquei brevemente ilustrar pelo episódio de Sondagem - podem fundamentalmente tornar inteligíveis os processos (de natureza linguística, didática e constitutivamente política) de subjetivação dos sujeitos no espaço escolar.

Referências

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  • TORINI, Natalie A. B. 2012. O gesto didático de regulação da aprendizagem: a sondagem em uma turma de alfabetização. Dissertação (Mestrado em Educação). São Paulo: Universidade de São Paulo, Faculdade de Educação.
  • 2
    Refiro-me, no caso em questão, ao amplo programa de pesquisas encaminhado, junto a gerações de alunos e colegas, por Ingedore G. V. Koch, na área de Linguística Textual e Análise da Conversação (incluído o Grupo de Trabalho homônimo no âmbito da Associação Nacional de Pós-Graduação em Letras e em Linguística - ANPOLL). Este texto é uma homenagem (in memoriam) a Ingedore, pela inspiração intelectual.
  • 3
    Entre essas determinantes, caberia certamente considerar o próprio modo de enunciação do autor do relatório quando da representação do episódio de ensino na condição de estagiário e futuro professor (as apreciações de valor evocadas ou formuladas - “... quando na minha opinião poderia explorar mais o raciocínio do aluno, de maneira a convidá-lo à participação na aula”).
  • 4
    Nessa direção, identifica-se com o exercício interdisciplinar proposto por Rojo (2007ROJO, Roxane H. R. 2007. Práticas de ensino em língua materna: Interação em sala de aula ou aula como cadeia enunciativa? In: KLEIMAN, Angela; CAVALCANTE, Marilda C. (Orgs.). Linguística Aplicada: suas faces e interfaces. Campinas, SP: Mercado de Letras , p. 339-360.).
  • 5
    Em sua discussão em torno do conceito de dispositivo, Agamben (2009AGAMBEN, Giorgio. 2009. O que é um dispositivo? In: O que é o contemporâneo? e outros ensaios. Chapecó, SC: Argos, p. 25-51.) assim formula sua definição: “(…) chamarei literalmente de dispositivo qualquer coisa que tenha de algum modo a capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar, modelar, controlar e assegurar os gestos, as condutas, as opiniões e os discursos dos seres viventes. Não somente, portanto, as prisões, os manicômios, o Panóptico, as escolas, a confissão, as fábricas, as disciplinas, as medidas jurídicas etc., cuja conexão com o poder é num certo sentido evidente, mas também a caneta, a escritura, a literatura, a filosofia, a agricultura, o cigarro, a navegação, os computadores, os telefones celulares e - por que não - a própria linguagem, que talvez é o mais antigo dos dispositivos, em que há milhares e milhares de anos um primata - provavelmente sem se dar conta das consequências que se seguiriam - teve a inconsciência de se deixar capturar” (Agamben 2009AGAMBEN, Giorgio. 2009. O que é um dispositivo? In: O que é o contemporâneo? e outros ensaios. Chapecó, SC: Argos, p. 25-51.: 41). Em outra passagem do estudo, o autor afirma que “o dispositivo é, antes de tudo, uma máquina que produz subjetivações e somente enquanto tal é também uma máquina de governo” (Agamben 2009AGAMBEN, Giorgio. 2009. O que é um dispositivo? In: O que é o contemporâneo? e outros ensaios. Chapecó, SC: Argos, p. 25-51.: 46).
  • 6
    A incorporação da Sondagem no currículo oficial do Ciclo de Alfabetização da SME-SP inspira-se nos estudos em psicogênese da língua escrita de Emília Ferreiro e Ana Teberosky, no âmbito dos quais é um procedimento experimental de investigação designado interrogatório (cf. Torini 2012TORINI, Natalie A. B. 2012. O gesto didático de regulação da aprendizagem: a sondagem em uma turma de alfabetização. Dissertação (Mestrado em Educação). São Paulo: Universidade de São Paulo, Faculdade de Educação.: 84).
  • 7
    O uso do termo “perturbação” inspira-se em Signorini (2002SIGNORINI, Inês. 2002. Por uma teoria da desregulamentação linguística. In: BAGNO, M. (org.). Linguística da Norma. São Paulo: Edições Loyola, p. 93-125.) quando de sua reflexão sobre o desafio dos estudos contemporâneos da linguagem voltados à compreensão de práticas comunicativas em contextos polilinguísticos, no que respeita ao redirecionamento do olhar para fenômenos localizados nas margens das evidências recobertas pela noção de “língua nacional”. Para a autora, “(…) como a questão do processual está necessariamente vinculada à dos mecanismos e condições locais de estabilização/transformação das normas de uso, é preciso deslocar o posto de observação para que apareçam as zonas de instabilidade, as flutuações, os deslocamentos. E também os modos de regulação ou calibragem nas ações dos falantes. (...) O objeto visado não é mais a organização sustentada do todo e de suas partes, e sim o movimento de formação e deformação dos modos de organização desses elementos numa dada ordem, suas divisões, desnivelamentos e sobreposições. Do ponto de vista teórico-metodológico, ao invés de uma simples passagem do nível macro ao micro, é a sobreposição dos dois níveis nas práticas comunicativas o que vai ser focalizado” (Signorini 2002SIGNORINI, Inês. 2002. Por uma teoria da desregulamentação linguística. In: BAGNO, M. (org.). Linguística da Norma. São Paulo: Edições Loyola, p. 93-125.: 94-95).
  • 8
    O gesto didático de regulação da aprendizagem, tal como qualificado em Aeby Daghé; Dolz (2007AEBY DAGHÉ, Sandrine; DOLZ, Joaquin. 2008. Des gestes didactiques fondateurs aux gestes spécifiques à l’enseignement/apprentissage du texte d’opinion. In: BUCHETON, Dominique; DEZUTTER, Olivier (Org.). Le développement des gestes professionnels dans l’enseignement du français: un défi pour la recherche et la formation. Bruxelles: De Boeck, p. 83-105.) e Schneuwly (2009SCHNEUWLY, Bernard. 2009. Le travail enseignant. In: SCHNEUWLY, B.; DOLZ, J. (Orgs). Des objets enseignés en classe de français - Le travail de l’enseignant sur la rédaction de texts argumentatifs et sur la subordonnée relative. Rennes, FR: Presses Universitaires de Rennes , p. 29-43.), implica tomada de informações dos efeitos do trabalho de ensino na aprendizagem do aluno, podendo captar os aportes e obstáculos com relação à apropriação do conhecimento.
  • 9
    A esse propósito, conferir Mondada; Dubois (1995MONDADA, Lorenza; DUBOIS, Danièle. 1995. Construction des objets de discours et catégorisation: une approche des processus de référentiation. Tranel 23: 273-302.) e sua qualificação da noção de objetos-de-discurso.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    06 Abr 2019
  • Aceito
    12 Nov 2019
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