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Editorial

EDITORIAL

Começamos este editorial com uma despedida e os votos de boas vindas aos novos editores que, a partir do próximo número, assumirão a responsabilidade por Educação em Revista. Desde o final de 2005, quando assumimos a editoria, procuramos intensificar o trabalho de qualificação da revista com o objetivo de recolocá-la entre os grandes periódicos científicos da área de educação. Para isso, contamos com a colaboração de todos os colegas que atuam na Pós-Graduação em Educação da UFMG, seja convidando seus colegas de outras universidades para submeterem seus artigos, seja divulgando Educação em Revista junto ao público de seu alcance.

Dentre as muitas ações que qualificaram este periódico, destacamos: o ingresso na base Scielo, o que garantiu maior visibilidade e assegurou parâmetros de qualidade; o aumento do número de edições publicadas por ano – passamos de uma periodicidade semestral para quadrimestral; a inserção formal da revista no Programa de Pós-Graduação em Educação: Conhecimento e Inclusão Social da FAE/UFMG. O resultado mais importante dessas ações foi o aumento do número de leitores e da submissão espontânea de trabalhos para publicação, permitindo o fluxo normal da revista. Outro resultado importante foi a melhoria de nossa classificação no Qualis Capes da área de educação. Buscamos também inovar com a publicação de dossiês temáticos, propondo chamadas que permitiram uma combinação de artigos com demanda induzida e espontânea. Inovamos também na comunicação com nossos pareceristas, que passaram a receber os pareceres enviados aos autores. Podem, agora, desse modo, acompanhar todo o processo para o qual deram uma contribuição tão importante. Tudo isso aumentou a transparência da avaliação dos trabalhos. É com satisfação, portanto, que nós, Eduardo Fleury Mortimer, Marlucy Alves Paraíso e Marildes Marinho, passamos a gestão para Antônio Augusto Gomes Batista, Luciano Mendes de Faria Filho e Sérgio Dias Cirino, desejandolhes sucesso para continuar a fazer de Educação em Revista um periódico de reconhecida importância, algo que já vem acontecendo nos últimos 26 anos. Dedicamos este número aos leitores que nos acompanharam nesse percurso, deixando o convite para que prossigam na leitura deste número e dos muitos que virão.

No artigo Para um outro arquétipo de escola: necessidade de mudar as políticas e as práticas curriculares, José Carlos Morgado discute as demandas que têm sido feitas às escolas contemporâneas de maior participação nas decisões educativas e de construção de um projeto pedagógico comum, capaz de conciliar os propósitos de âmbito nacional com os anseios e as necessidades de cada comunidade. O autor argumenta que as demandas feitas às escolas implicam que elas devem ter maior autonomia e um trabalho de (re)atualização constante e de inovação das práticas curriculares que se desenvolvem no seu interior. Tais demandas, no entanto, como mostra o autor, dependem tanto de um conjunto de decisões oriundas do seu exterior (algumas delas sucessivamente adiadas), quanto também daquilo que se passa no interior da instituição escolar, tornando o processo de efetivação das mudanças demandadas às escolas complexas e conflitivas.

Em Um centro de educação e formação de adultos que aprende, Armando Paulo Ferreira Loureiro apresenta os resultados de uma investigação etnográfica realizada junto à equipe técnica de educação de adultos de um centro de educação e formação de Portugal. Seu objetivo é analisar se e como uma equipe de educação de adultos pode, ela própria, aprender em seu local de trabalho. O que move o estudo é o desejo de verificar se a instituição que enquadra a sua atividade se constitui como uma organização que aprende. Com base nos resultados da investigação, o autor defende que a equipe aprende de diversas formas no desenrolar da sua ação, e que está presente, naquele contexto, uma forte dimensão coletiva da aprendizagem. Por isso, o autor conclui que o espaço investigado é uma comunidade de aprendizagem e uma organização que aprende.

Poemas na escola: análise de textos de alunos é o tema do trabalho de Maria da Graça Costa Val. Conforme indicado pelo próprio título, a autora analisa poemas elaborados por alunos de quarta e quinta séries do Ensino Fundamental, de escolas públicas de vários estados brasileiros, no contexto do Programa Escrevendo o Futuro. O artigo busca identificar como os textos de alunos submetidos a um processo sistemático de formação se apresentam quanto ao gênero em pauta. Para isso, a autora realiza uma discussão inicial a respeito da noção de gênero textual, examina o contexto em que as produções foram realizadas e, por fim, analisa os poemas dos alunos quanto à sua adequação ao gênero.

O artigo de autoria de Maria de Fátima Aranha de Queiroz e Melo, intitulado Algumas das aprendizagens construídas durante a brincadeira de pipa: o que está em jogo, mostra os resultados de um estudo cujos dados foram coletados por meio do acompanhamento de grupos de brincantes durante as temporadas dos anos de 2005 e 2006 e da realização de entrevistas com pessoas que tiveram a pipa como objeto privilegiado em suas brincadeiras de infância. O estudo utiliza a Teoria Ator-Rede como suporte teóricometodológico e aponta as "atividades eliciadas pela brincadeira de pipa". O artigo focaliza as aprendizagens informais e os brinquedosponte como forma privilegiada de transmissão cultural. Esses brinquedos são analisados, no artigo, como potentes em sua capacidade de aglutinação e são compreendidos como possuindo traduções singulares para cada sujeito e com significativo impacto na bagagem vivencial de cada um.

Educar e cuidar do corpo: dispositivos no atendimento à pequena infância é o título do artigo de Ana Cristina Richter, que aborda dispositivos pedagógicos que transpassam o corpo nos momentos de higiene e nos demais tempos que compõem a rotina das instituições de educação infantil. O artigo apresenta os resultados de uma pesquisa de abordagem etnográfica realizada em um ambiente educacional de atendimento à pequena infância, e mostra que os momentos que conformam a rotina institucional são fortemente marcados pela presença de ações e estratégias vinculadas à higiene, à saúde e à "qualidade de vida". Mostra, ainda, que os discursos/práticas que ali circulam aparecem em meio a um conjunto de normas que funcionam como braço pedagógico de uma biopolítica que atua na constituição da vida nua.

A construção dos tempos escolares é o titulo do artigo de Claudia da Mota Darós Parente, que analisa a concepção de tempo, considerando sua construção sóciohistórica e cultural. O artigo apresenta algumas heranças dos tempos escolares, mostrando que estes são construções passíveis de transformações. Ao apresentar a abrangência da noção de tempos escolares, a autora discute possibilidades de busca de inovações políticas e escolares que produzam alternativas aos tempos escolares vigentes, e indica a necessidade de construir tempos escolares mais humanos, mais atentos às necessidades dos sujeitos da educação.

No artigo Uma análise crítica dos ideários pedagógicos contemporâneos à luz da teoria de A.N. Leontiev, Nadia Mara Eidt apresenta as principais premissas das "pedagogias do aprender a aprender" e discute o alcance das pedagogias que fundamentam as propostas educacionais no âmbito nacional e internacional da atualidade. A autora entende que dessa discussão é possível extrair subsídios para o enfrentamento do processo de esvaziamento do ensino escolar e do papel do professor engendrado pelas referidas pedagogias.

Em Capital e interior: manifestações em prol da instrução pública em Ouro Preto e Uberabinha (MG) nos anos iniciais da República Brasileira, Wenceslau Gonçalves Neto apresenta resultados de uma pesquisa histórica que utilizou como fontes Livros de Atas das Câmaras, livros de leis e documentação variada envolvendo o trabalho dos vereadores. O artigo mostra que as cidades mineiras promoveram debates sobre a instrução popular, principalmente a partir de março de 1892, quando foram reabertas as Câmaras Municipais. Mostra também que a preocupação com a instrução pública estava difundida entre os municípios mineiros, embora não de forma homogênea.

Fabiana de Oliveira e Anete Abramowicz, em Infância, raça e "paparicação", se propõem a discutir a questão racial nas práticas pedagógicas no contexto da educação de crianças de zero a três anos. As autoras chegaram à conclusão de que o tratamento diferenciado das crianças negras pelas professoras se revelava pela exclusão dessas crianças do tratamento a que elas denominam "paparicação". Essa exclusão se revela principalmente pela recusa do contato físico por parte das professoras. Oliveira e Abramowicz enfatizam também a necessidade de se pensar na especificidade de conhecimentos por parte dos profissionais da educação infantil, de modo a que estes possam refletir sobre a sua prática pedagógica, muitas vezes aprisionada por concepções hegemônicas e cristalizadas que reforçam o preconceito e impedem a aprendizagem e o acolhimento dessas crianças na escola.

O artigo de Márcio Costa – Famílias e acesso diferenciado a escolas públicas prestigiadas: um estudo de caso – nos oferece uma privilegiada oportunidade de discutir os processos de produção de desigualdades no interior de um sistema escolar supostamente homogêneo. Dialogando com Elias e Scotson, em Os estabelecidos e os outsiders, Costa aponta diferenças entre sua abordagem e a desses autores. Embora valorize a produção estrangeira em torno dessa temática, o autor concentra seus esforços na "problemática brasileira". Argumenta ele que, a partir da literatura internacional, já formulamos relevantes questões, mas aquilo que nomeamos como "hierarquias escolares" é bem diferente em relação a outros países.

Eliana Oligurki e Graziela Pachane acreditam na possibilidade de incorporar a pesquisa na prática cotidiana do professor do ensino fundamental. Apoiadas em Freire, Demo e Giroux, as autoras acompanham o diaadia de uma escola municipal de Campinas e relatam uma experiência bem sucedida de articulação entre ensino e pesquisa envolvendo professores e comunidade na busca de solução para os problemas estruturais da escola, de aprendizagem e de conflitos sociais. Esse envolvimento com a pesquisa fez despertar nos professores a possibilidade de um exercício criativo e crítico sobre sua prática, além de uma sintonia com a comunidade.

Tomando como objeto a importância atribuída pela mídia à questão ambiental, Rosana Silva analisa capas de revista de grande circulação e os modos como professores em formação se apropriam dessas imagens. A autora acredita na importância do desenvolvimento das habilidades de leitura de imagens. Esse trabalho instala um profícuo debate sobre a mídia e a necessidade de leituras críticas daquilo que ela veicula, especialmente através da imagem, apoiadas no ideário de Horkheimer e Adorno, entre outros.

Também num diálogo com a Teoria Crítica de Adorno e Horkheimer, voltado especialmente para a relação entre Educação, paranóia e semiformação, Sinésio Ferraz Bueno se propõe a fazer uma análise crítica dos "pressupostos epistemológicos atualmente hegemônicos no campo dos estudos da educação e conhecimento". Para o autor, essa relação nos oferece a possibilidade de compreender questões importantes sobre conhecimento e sociedade.

O artigo A classe hospitalar como instrumento de participação política na construção da Associação de pais e pacientes da Hemato-Oncologia reúne um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de Santa Maria, no Hospital Universitário dessa mesma universidade. Ouvindo e observando pais de pacientes em tratamento nesse hospital, esses pesquisadores investem em um projeto de escuta de cidadãos que necessitam ter garantidos os seus direitos. Essa escuta se traduz em uma metodologia da pesquisaação, através da qual é possível registrar "os sonhos, a coragem, o desejo de crescimento e a participação tecida coletivamente de informantesaprendizes". Além dos efeitos reivindicatórios da proposta, o trabalho nos apresenta uma concepção de pesquisa numa "abordagem nãoconvencional", cuja marca é a dinamicidade, a possibilidade de transformação e o processo de negociação.

Daniele Cruz nos convida a nos interrogarmos como poderemos enfrentar o desafio das influências do empresariado sobre a educação, uma vez que, a partir das transformações na base da produção, o mundo do trabalho e as políticas para a educação estão cada vez mais entrelaçados. Essa indagação é o eixo norteador do artigo Educação Corporativa: a proposta empresarial no discurso e na prática. Rastreando uma rica bibliografia que aborda essa temática, uma das conclusões apresentadas pela autora é a de que a educação corporativa não leva em conta os interesses dos funcionários. Esses, por sua vez, não a conhecem nem a reconhecem como um modelo de educação, mas como ações pontuais pouco significativas para os trabalhadores.

Em História, regulação e poder disciplinar da supervisão escolar, Ana Henning desafia o leitor a um percurso crítico sobre a supervisão escolar, segundo a autora, "por ângulos diferentes daqueles recorrentemente anunciados nas bibliografias específicas e até então raramente colocados sob suspeita". Na companhia de Foucault e outros, Henning desconstrói a narrativa linear com que se construiu a história da supervisão, com vistas a regular o trabalho docente, através da vigilância hierárquica, da sanção normalizadora e do exame. Para ela, é possível e importante interromper o curso "natural" dessa história.

Foucault está presente também no artigo de Rodrigo Pelloso Gelamo, na reflexão Experiência no ensino de Filosofia: um problema contemporâneo. À luz das reflexões desse filósofo, Gelamo discute relações de poder e de resistência, trabalhando especialmente com a noção de biopoder. Numa interlocução também com Walter Benjamin, o propósito desse artigo é situar o papel da experiência na discussão atual sobre a cultura e a política.

Fechando este volume, temos a resenha Irán Guadalupe Guerrero Tejero, que oferece ao leitor a possibilidade de novas questões que envolvem a cultura escrita, as práticas de letramento e de numeramento na América Latina, no livro Lectura, Escritura y Matemáticas como Prácticas Sociales. Diálogos con América Latina. Essa obra é coordenada por Judith Kalman (Centro de Investisgatión y Estudios Avanzados en Mexico) e Brian Street (London University), tendo sido publicada em 2009 pela editora Siglo XXI e CREFAL (Centro de Cooperación Regional para la educación de Adultos en América Latina y el Caribe). Em 19 capítulos, 21 autores da Argentina, Bolívia, Brasil, Estados Unidos, Inglaterra, México e Nova Zelândia interrogam o campo das práticas sociais, os Novos Estudos sobre o Letramento (New Literacy Studies - NLS) e a sociolingüística.

Boa leitura.

Eduardo Fleury Mortimer (Editor)

Marildes Marinho

Marlucy Alves Paraíso

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Set 2010
  • Data do Fascículo
    Ago 2010
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