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DIFERENÇAS CONCEITUAIS E PEDAGÓGICAS ENTRE OS TERMOS “BRINCADEIRA” E “JOGO” NO BRASIL

DIFERENCIAS CONCEPTUALES Y PEDAGÓGICAS ENTRE LOS TÉRMINOS "BRINCADEIRA" Y "JOGO" EN BRASIL

RESUMO:

Este artigo é parte de tese produzida para concursopara o cargo de professora titular, cujo objetivo foi identificar as diferenças teóricas entre os conceitos de jogo e brincadeira, o papel de cada um deles nas aprendizagens das crianças e suas implicações nas práticas pedagógicas na Educação Infantil. A Teoria Histórico-Cultural fundamentou a pesquisa teórica por meio do método genético na metodologia, a partir do levantamento bibliográfico em livros e artigos científicos sobre “brincadeira” e “jogo”, e em autores russos apenas sobre o “jogo”. Os resultados apontaram a importância da diferenciação entre ambos os termos na Educação Infantil, bem como possibilitaram a proposição de que brincadeira seja a atividade principal de crianças de 0 a 3 anos, e o jogo, principalmente “jogo de papéis, como atividade principal de crianças de três a seis anos. A importância desses resultados para as aprendizagens das crianças corrobora a centralidade do aspecto lúdico nas atividades da Educação Infantil, distinguindo a brincadeira e o jogo em seus conteúdos, motivos, necessidades e especificidades para as crianças. Essa proposta de mudança da atividade principal na Educação Infantil indica, também, a necessidade de a brincadeira de 0 a 3 anos se desenvolver para jogos de papéis para crianças de 3 a 6 anos, uma vez que ambos são essenciais para que as atividades das crianças, também, se modifiquem de atividades involuntárias para voluntárias e volitivas. As implicações desta pesquisa para as práticas pedagógicas centram-se na necessidade de o corpo docente conhecer e passar a incluir os jogos de papéis nas atividades das crianças de 3 a 6 anos, auxiliando-as no desenvolvimento da autonomia, de atividades volitivas e autocontrole de suas atitudes.

Palavras-chave:
jogo; brincadeira; Teoria Histórico-Cultural; jogo de papéis; educação infantil

RESUMEN:

Este artículo forma parte de una tesis, cuyo objetivo fue identificar las diferencias teóricas entre los conceptos de “juego” y de “brincadeira”2 2 La decisión de mantener la palabrabrincadeiraen Portugués es porque en español los términos JOGO y BRINCADEIRA son traducidos por JUEGO y no indican la diferencia relevante para el texto ya que el objetivo de la investigación era exactamente apuntar las diferencias entendidas por los dos en el contexto brasileño. (A decisão de manter a palavrabrincadeiraem Português é porque, no espanhol, os termos JOGO e BRINCADEIRA são traduzidos por JUEGO e não indicam a diferença relevante para o texto, já que o objetivo da pesquisa foi exatamente apontar as diferenças assumidas por eles no contexto brasileiro). , el papel de cada uno de ellos en los aprendizajes de los niños y sus implicaciones para las prácticas pedagógicas en la Educación Infantil. La Teoría Histórico-Cultural basó la investigación teórica y a través del método genético en la metodología, a partir del levantamiento bibliográfico en libros y artículos científicos. Los resultados indicaron la importancia de la diferenciación entre ambos los términos en la Educación Infantil, bien como hizo posible la propuesta de que la “brincadeira” sea la principal actividad de los niños de cero a tres años, y el “juego”, principalmente el “juego de roles”, como actividad principal de los niños de tres a seis años. La importancia de estos resultados para el aprendizaje de los niños corrobora la centralidad del aspecto lúdico en las actividades de la Educación Infantil, distinguindo la “brincadeira” y el “juego” en sus contenidos, razones, necesidades y especificidades para los niños. Esta propuesta de cambio de la actividad principal en la Educación Infantil indica, también, la necesidad de la “brincadeira” de los niños de 0 a 3 años desarrollar para “juegos de roles” de niños de 3 a 6 años, ya que ambos son imprescindibles para que las actividades de los niños, también, evolucionen de actividades involuntarias a actividades voluntarias y volitivas. Las implicaciones para las prácticas pedagógicas se centran en la necesidad de que el profesorado conozca y comience a incluir juegos de roles en las actividades de los niños de 3 a 6 años, ayudándoles a desarrollar la autonomía, las actividades volitivas y el autocontrol de sus actitudes.

Palabras clave:
juego; brincadeira; Teoría Histórico-Cultural; juego de roles; educación infantil

ABSTRACT:

This article is part of a thesis produced for a competitive examination for the full professor position. Its objective was to identify the theoretical differences between the concepts of “brincadeira1 1 The decision to keep the word brincadeira in Portuguese is because in English the terms play and game are normally interchangeable and the aim of the research was exactly to point out the differences they assume in Brazilian context. (A decisão de manter a palavra brincadeira em Português é porque, no inglês, os termos play e game são normalmente intercambiáveis, e o objetivo da pesquisa foi exatamente apontar as diferencias assumidas por eles no contexto brasileiro). and “game,” the role of each one in children’s learning, and its implications in pedagogical practices in Early Childhood Education. The Cultural-Historical Theory was the basis for the theoretical research through the genetic method in the methodology from a bibliographic survey in books and scientific articles about “brincadeira” and “game,” and in Russian authors only about “game.” The results pointed out the importance of the differentiation between both terms in Early Childhood Education, as well as enabled the proposition that “brincadeira” is the main activity of children from 0 to 3 years old, and “game,” especially “role-play,” as the main activity of children from three to six years old. The importance of these results for children’s learning corroborates the centrality of the playful aspect in the activities of Early Childhood Education, distinguishing “brincadeira” and games in their contents, motives, needs, and specificities for children. This proposal to change the main activity in Early Childhood Education also indicates the need for “brincadeira” from 0 to 3 years old to develop into role-play games for children from 3 to 6 years old since both are essential for children’s activities to also change from involuntary to voluntary and volitional activities. The implications of this research for teaching practices are centered on the need for teachers to know and include role-play games in the activities of 3 to 6-year-old children, helping them develop autonomy, volitional activities, and self-control of their attitudes.

Keywords:
game; brincadeira; Cultural-Historical Theory; role play; early childhood education.

INTRODUÇÃO

Apesar de o assunto cultura estar muito presente em textos científicos e no ideário da sociedade em geral, ainda nos dias atuais, a educação escolar secundariza as questões culturais nos currículos e nas práticas pedagógicas. No caso do ensino na Educação Infantil, essa questão é muito preocupante, uma vez que a visão biológica de desenvolvimento é predominante e determinada por concepções que rotulam a criança, não contribuindo para o desenvolvimento de aprendizagens necessárias para sua vida. A escola ainda insiste em não conceber a criança como sujeito da atividade de ensino e da atividade de aprendizagem. A concepção de ensino que ainda permanece é a de que o conhecimento é algo que se aprende sentado, quieto e sozinho, com esforço exclusivamente individual, no mesmo tempo e espaço para todas as crianças, a partir apenas das “instruções da professora”. Os conteúdos denominados “escolares” são o foco das atividades de ensino, que, inúmeras vezes, não correspondem às necessidades de aprendizagens das crianças.

Na Teoria Histórico-Cultural, a cultura significa toda cultura humana, priorizando o desenvolvimento histórico humano e os movimentos das sociedades ao longos dos tempos. Segundo Vygotski (1995VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas del Desarrollo de la Psique. Tomo III. Madri: Visor Distribuiciones , 1995., p. 34), “[...] la cultura origina formas especiales de conducta, modifica la actividad de las funciones psíquicas, edifica nuevos niveles en el sistema del comportamiento humano en desarrollo.”

Nessa perspectiva, a etapa de Educação Infantil na Educação Básica é fundamental para que a criança se aproprie dessa cultura, uma vez que é o início de sua vivência escolar, por meio de conhecimentos sistematizados. Entretanto, as investigações de Vygotski (1993VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas de Psicología General. Tomo II. Madri: Visor Distribuiciones , 1993., p. 235) demonstraram que na escola “[...] nunca se manifiesta paralelismo entre el curso de la instrucción escolar y el desarrollo de las correspondientes funciones” (ele se refere ao desenvolvimento do psiquismo da criança). Esse descompasso acontece porque, ainda, a escola trabalha com base no produto pronto e pouco foco no processo de aprendizagem. Isso gera, para a professora, a perda da visão do todo e, também, de seu principal agente das aprendizagens, o aluno. No caso da Educação Infantil, a escolha de materiais, instrumentos, tecnologias, ferramentas, metodologias, atividades e tudo o que, normalmente, envolve a aprendizagem escolar, desde o mediador mais simples até o mais sofisticado, é realizada para uma criança idealizada e acrítica. Nesse contexto, a atividade, tanto de ensino como de aprendizagem, é desvinculada de sentido e de significado, gerando o desinteresse das crianças.

As investigações de Vygotski (1993VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas de Psicología General. Tomo II. Madri: Visor Distribuiciones , 1993.) demonstraram, ainda, que o desenvolvimento humano apresenta rupturas e avanços por saltos, em contraposição à ideia de linearidade, vinculada à concepção biológica de desenvolvimento, que não auxilia as professoras a compreenderem as atitudes das crianças frente ao conhecimento novo.

Nessa direção, Vygotski, (1991VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas Teóricos y Metodológicos de la Psicología. Tomo I. Madri: Visor Distribuiciones, 1991., 1993VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas de Psicología General. Tomo II. Madri: Visor Distribuiciones , 1993., 1995VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas del Desarrollo de la Psique. Tomo III. Madri: Visor Distribuiciones , 1995., 1996VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Psicología Infantill. Tomo IV. Madri: Visor Distribuiciones, 1996., 1997VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Fundamentos de Defectología. Tomo V. Madri: Visor Distribuiciones, 1997., entre outros) contribuiu muito para que os processos culturais fossem considerados imprescindíveis às aprendizagens e ao desenvolvimento humano, contrapondo-se, também, à concepção de que “cultura” se restringe à assimilação de hábitos sociais. Nessa direção, o desenvolvimento cultural humano só pode ser concebido como um processo vivo de desenvolvimento, de formação, de luta, em contraposição aos modelos estereotipados, padronizados e biologizantes de desenvolvimento. Esse processo de desenvolvimento vivo ocorre de acordo com a dialética, ou seja, em constantes contradições entre as formas primitivas de desenvolvimento dos seres humanos (primitivo no sentido de originais; primeiras) e as formas culturais (VYGOTSKI, 1995VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas del Desarrollo de la Psique. Tomo III. Madri: Visor Distribuiciones , 1995.).

Assis (2010ASSIS, Muriane S. S. de . Desenvolvimento Cultural da Criança na Educação Infantil: contribuições da Teoria Histórico-Cultural. Tese (Doutorado em Educação). São Carlos: PPGE/UFSCar, 2010. Disponível em: Disponível em: https://repositorio.ufscar.br/bitstream/handle/ufscar/2248/3009.pdf?sequence=1&isAllowed=y . Acesso em: 28 mar. 2018.
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) discute essa problemática ao se deparar em sua pesquisa com a existência dessas concepções em escolas de Educação Infantil, nas quais o desenvolvimento e a aprendizagem se configuram em processos naturais e lineares que seguem etapas predeterminadas.

O ensino deve fazer sentido para quem ensina e para quem aprende. O sentido de ensinar relaciona-se às vivências individuais do(a) professor(a), e o significado de ensinar é gerado socialmente, sobre o que as sociedades concebem como ensino em determinado momento histórico. Como as sociedades estão em constante movimento, o significado social de ensinar modifica-se, assim como o sentido de ensinar (nossas concepções) também deve acompanhar tais transformações sociais (LEONTIEV, 1978LEONTIEV, Alexis N. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978.). Esses dois processos no desenvolvimento cultural - inter e intrapsíquicos (VYGOTSKI, 1995VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas del Desarrollo de la Psique. Tomo III. Madri: Visor Distribuiciones , 1995.) - precisam estar conectados na atividade docente, de forma a não ocorrer alienação, tanto de quem ensina como de quem aprende, já que ambos os processos são indissociáveis (LEONTIEVLEONTIEV, Alexis N. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978., 1978a).

Para quem aprende é fundamental o desenvolvimento da intencionalidade em aprender por intermédio das relações que estabelece na escola e das atividades que lhe proporcionam a apropriação do conhecimento. No início do processo de aprendizagem, pode não haver intencionalidade por parte da criança que deve aprender, pois ela não sabe exatamente o porquê de ir à escola. Entretanto, essa baixa intencionalidade em aprender pode ser modificada dependendo da forma como a escola se apresenta a ela, a maneira como o corpo docente identifica suas necessidades de aprendizagens em relação às suas vivências, mesmo que sejam poucas, como por exemplo, a dos bebês, cujas necessidades estão mais perceptíveis no plano biológico (sucção, conforto térmico, sono, alimentação etc.). À medida que o bebê se relaciona com o outro, com diferentes ambientes, situações, objetos, sons etc., mesmo assim suas necessidades biológicas ainda precisam ser satisfeitas, porém tais contatos sociais criam outras necessidades, de cunho cultural, próprias dos seres humanos, que impulsionam seu desenvolvimento psíquico. Na Teoria Histórico-Cultural, o ensino insere-se nesse âmbito, na identificação desses tipos de necessidades de aprendizagens e na prática pedagógica intencional, vinculada à formulação de fins e subjacente a valores produzidos pela sociedade.

Na Educação Infantil, é fundamental que haja ensino intencional e sistematizado, uma vez que as crianças têm ainda pouca vivência em sociedade, e as intervenções sistematizadas pela professora mediante as necessidades do tipo culturais de aprendizagens das crianças são necessárias para o seu desenvolvimento psíquico. Assim, a intencionalidade (motivo) das crianças em aprender vai se desenvolvendo a partir da intencionalidade da professora em ensinar determinado conteúdo, com base no significado social deste para a sociedade e criando significado para as crianças.

Nessa perspectiva, os processos de ensinar e de aprender tornam-se atividade social transformadora, a partir da “relação consciente entre a consciência e seu objeto” (VÁSQUEZ, 1977VÁSQUEZ, Adolfo S. Filosofia da Praxis. 3. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977., p. 10).

Especialmente nas áreas de aprendizagem e desenvolvimento infantis, a obra de Vygotski (1972VYGOTSKI, Liev S. Psicología del Arte. Barcelona: Barral Editores, 1972., 1987VYGOTSKI, Liev S. La Psicologia Evolutiva Y Pedagogica em La URSS. Antología. Tradução de Marta Shuare. Moscou: Editoral Progreso, 1987a., 1987aVYGOTSKI, Liev S. Prólogo a la traducción rusa del libro de K. Buhler “ensayo sobre el desarrollo espiritual del niños. In: VIGOTSKI, Liev S. La Psicologia Evolutiva Y Pedagogica en la URSS - Antología. Recopilación, comentários y traducción: Marta Shuare. Prólogo do Dr. em psicologia, professor Vasili Davídov e da candidata a Dra. e psicologia Marta Shuare. Moscou: Editoral Progreso, 1987a. p. 26-42., 1991VYGOTSKI, Liev S. Construção do Pensamento e da Linguagem. São Paulo: Martins Fontes , 2001., 1993VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas de Psicología General. Tomo II. Madri: Visor Distribuiciones , 1993., 1994VYGOTSKY, Lev. The Problem of the Environment. In: VAN DER VEER, René; VALSINER, Jaan. The Vygotsky Reader. Oxford⁄Cambridge: Blackwell Publishers, 1994, p. 338-354., 1995VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas del Desarrollo de la Psique. Tomo III. Madri: Visor Distribuiciones , 1995., 1996VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Psicología Infantill. Tomo IV. Madri: Visor Distribuiciones, 1996., 1997VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Fundamentos de Defectología. Tomo V. Madri: Visor Distribuiciones, 1997., 2001VYGOTSKI, Liev S. Construção do Pensamento e da Linguagem. São Paulo: Martins Fontes , 2001., 2004VYGOTSKI, Liev S. Teoría de las Emociones. Estudio histórico-psicológico. Tradução de Judith Viaplana. Madri: Ediciones Akal. S.A., 2004., 2005VYGOTSKI, Liev S. Psicología Pedagógica. Buenos Aires: Aique Grupo Editor, 2005., 2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. , 2007VYGOTSKI, Liev S. La Psicologia Evolutiva Y Pedagogica em La URSS. Antología. Tradução de Marta Shuare. Moscou: Editoral Progreso, 1987a.) trouxe significativo avanço na compreensão dos processos de aprendizagem das crianças normais e com deficiências, rompendo estigmas e concepções cristalizadas no conceito de hereditariedade e, consequentemente, vislumbrando possibilidades de práticas educativas, cujo eixo central é a criança e suas potenciais aprendizagens mediatizadas pelas ações das professoras.

Um traço fundamental da Teoria Histórico-Cultural é o desenvolvimento das Funções Psíquicas Superiores (FPS, explicadas a seguir), cuja base teórica lhe fornece longevidade, atrativo e possibilidades de desenvolvimento (MESHCHERYAKOV, 2006MESHCHERYAKOV, Boris G. Sciences at the Crossroads of Culture and Psychology: Cultural-Historical Psychology and Its Neighbours. Cultural-Historical Psychology. Moscou - Moscow State University of Psychology and Education, n. 1-3, 2006.). As funções psíquicas superiores são exclusivas dos seres humanos, são elas que nos tornam humanos. Elas não são desenvolvidas por nosso aparato biológico, apesar de fazerem parte dele. Elas se desenvolvem por intermédio da cultura, da vivência em sociedade, das mediações que nos fornecem possibilidades de acesso às aprendizagens ao longo de nossas vivências.

Vygotski (1995VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas del Desarrollo de la Psique. Tomo III. Madri: Visor Distribuiciones , 1995., p. 29) explica-nos a importância do desenvolvimento das Funções Psíquicas Superiores (FPS) e das Funções Psíquicas Superiores Especiais (PSE) para os seres humanos viverem em sociedade:

El concepto de “desarrollo de las funciones psíquicas superiores” y el objeto de nuestro estúdio abarcan dos grupos de fenómenos que a primera vista parecen completamente heterogéneos pero que de hecho son dos ramas fundamentales, dos cauces de desarrollo de las formas superiores de conducta que jamás se funden entre sí aunque están indisolublemente unidas. Se trata, en primer lugar, de procesos de domínio de los médios externos del desarrollo cultural y del pensamiento: el lenguaje, la escritura, el cálculo, el dibujo; y, en segundo, de los processos de desarrollo de las funciones psíquicas superiores especiales, no limitadas ni determinadas con exactitud, que en la psicologia tradicional se denominan atención voluntaria, memoria lógica, formación de conceptos, etc. Tanto unos como otros, tomados en conjunto, forman lo que calificamos convencionalmente como processos de desarrollo de las formas superiores de conducta del niño. (VYGOTSKI, 1995VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas del Desarrollo de la Psique. Tomo III. Madri: Visor Distribuiciones , 1995., p. 29, grifo do autor).

Contudo, nossa vivência nos últimos anos no Brasil nos leva a refletir sobre o tipo de ser humano que as sociedades estão produzindo. A incitação ao ódio, ao preconceito e à selvageria, por políticos, mídia, redes sociais, igrejas, escolas, ou seja, em diferentes instâncias sociais, tais situações nos mostram uma face sombria dos seres humanos, os quais estão presos no individualismo que gera desumanidade. Assim, as sociedades podem se transformar em verdadeiro caos, como a história da humanidade tem registrado, se as funções psíquicas superiores especiais não forem desenvolvidas de forma aprofundada, ou seja, em níveis altos de intencionalidade e de consciência individual e coletiva.

O desenvolvimento das Funções Psíquicas Superiores é o centro da Teoria Histórico-Cultural, e as pesquisas de Vygotski (1995VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas del Desarrollo de la Psique. Tomo III. Madri: Visor Distribuiciones , 1995., 2006, 2007, entre outros) demonstraram que o autodomínio das condutas humanas deve ser o elemento essencial em direção a sociedades mais justas, igualitárias, apesar das diferenças. “En el processo del desarrollo histórico, el hombre social modifica los modos y procedimientos de su conducta, transforma sus inclinaciones naturales e funciones, elabora y crea nuevas formas de comportamiento específicamente culturales.” (VYGOTSKI, 1995VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas del Desarrollo de la Psique. Tomo III. Madri: Visor Distribuiciones , 1995., p. 34).

Vygotski (1993VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas de Psicología General. Tomo II. Madri: Visor Distribuiciones , 1993.) investigou a relação entre as matérias escolares e as funções psíquicas superiores, utilizando a matemática, a leitura e a escrita. Os resultados demonstraram que o desenvolvimento mental da criança não se realiza de acordo com o sistema das matérias escolares, ou seja, a criança não desenvolve funções de forma isolada e independente, uma vez que tais matérias têm certo grau de base psíquica comum (a tomada de consciência e o domínio de cada um dos conteúdos), que se constituem, igualmente, no primeiro plano de desenvolvimento da aprendizagem, tanto na matemática como na leitura e na escrita. O pensamento da criança processa-se em todas as matérias, e seu desenvolvimento não se decompõe em trajetórias separadas em função das diferentes disciplinas escolares.

Da mesma forma que existe a influência recíproca do ensino no desenvolvimento das funções psíquicas superiores, que supera os limites do conteúdo específico de cada disciplina escolar, tal como se houvesse uma disciplina que agregasse e fosse inerente a todas as disciplinas escolares, também a criança, ao tomar consciência de um determinado conhecimento, passa a dominar uma estrutura que se transfere a outros campos de seu pensamento, não relacionados diretamente com aquele conhecimento específico. Aqui ocorrem, igualmente, a interdependência e a inter-relação entre as diferentes funções psíquicas que compõem a aprendizagem de um determinado conhecimento. Assim, por exemplo, o desenvolvimento das funções psíquicas superiores de atenção voluntária, da memória lógica, do pensamento abstrato e da imaginação científica produzem-se, intrinsecamente, como um processo complexo e único, mediante a tomada de consciência e o domínio do conhecimento em si, cujo desenvolvimento constitui o principal foco da educação escolar (VYGOTSKI, 1993VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas de Psicología General. Tomo II. Madri: Visor Distribuiciones , 1993.).

Por isso, a escola é a principal via de desenvolvimento humano, porque sistematiza os conhecimentos científicos produzidos pela humanidade e, por intermédio das relações entre os seus integrantes, deve proporcionar atividades que se pressuponham mediadoras das necessidades de aprendizagens de todos aqueles ali envolvidos. Além disso, sua função nas sociedades é disseminar esse conhecimento, com o objetivo de que todos os alunos dele se apropriem de maneira consciente, com vistas a dominá-lo para si e para os outros. Desse modo, se, na escola, crianças, jovens e adultos não estão aprendendo, então podemos afirmar que sua função não está sendo cumprida para o desenvolvimento dessa parcela da população, uma vez que a priorização está ocorrendo no conteúdo especificamente escolar (português, matemática etc.), subjugando as necessidades de aprendizagens dos alunos do tipo culturais, ao invés de inseri-las nesses conteúdos escolares, por meio de mediadores potentes que possam gerar a apropriação dos conhecimentos produzidos pela sociedade.

Assis (2010ASSIS, Muriane S. S. de . Desenvolvimento Cultural da Criança na Educação Infantil: contribuições da Teoria Histórico-Cultural. Tese (Doutorado em Educação). São Carlos: PPGE/UFSCar, 2010. Disponível em: Disponível em: https://repositorio.ufscar.br/bitstream/handle/ufscar/2248/3009.pdf?sequence=1&isAllowed=y . Acesso em: 28 mar. 2018.
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), ao pesquisar o desenvolvimento cultural de crianças de Educação Infantil, identificou que a função da escola para elas e para as famílias ratificam os argumentos de que a escola precisa modificar os tipos de atividades que desenvolve com os estudantes, uma vez que as crianças fazem a atividade porque a professora assim ensinou, mas não sabem para quê.

A escola deveria usar o tempo a seu favor, ou seja, ao invés de colocar ênfase do ensino no nível de desenvolvimento atual - NDA (aquilo que a criança já aprendeu) - deveria priorizar o ensino na zona de desenvolvimento proximal - ZDP (o que a criança pode aprender com colaboração em diferentes níveis de ajuda) (VYGOTSKI, 1995VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas del Desarrollo de la Psique. Tomo III. Madri: Visor Distribuiciones , 1995.).

A Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) tem como base a observação diagnóstica das crianças pelos docentes. Vigotski (1993, p. 238, Tomo II) auxilia-nos a entender que o desenvolvimento da criança não pode ser determinado apenas por meio daquilo que ela já aprendeu: “[...] el horticultor, que deseando determinar el estado de su huerto, no tendrá razón si se limita a valorar los manzanos que ya han madurado y han dado fruto, sino que debe tener también en cuenta los árboles en maduración.”

Assim, aquilo que Vygotski (1993VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas de Psicología General. Tomo II. Madri: Visor Distribuiciones , 1993.) denomina de nível de desenvolvimento atual (NDA) não é suficiente para o professor diagnosticar as necessidades de aprendizagens dos estudantes, mas, apenas, para comprovar o que eles já aprenderam. Os conhecimentos que estão na zona de desenvolvimento proximal são as diretrizes que os professores necessitam para saber quais conhecimentos e habilidades as crianças precisam desenvolver. Essas diretrizes são, efetivamente, as necessidades do tipo culturais de aprendizagens dos estudantes que estão em processo de se implementarem e, portanto, são elas que precisam ser mediadas intencionalmente pela docente. Se a professora concentrar sua observação nessas diretrizes de necessidades do tipo culturais de aprendizagens das crianças, estas poderão auxiliá-la a identificar os tipos de mediadores, as estratégias e as atividades que poderão motivar as crianças a realizarem as atividades propostas. As atividades podem ser propostas, inicialmente, pela professora, e as crianças, paulatinamente, vão assumindo a participação na estruturação da atividade, conforme vão se tornando autônomas. Para cada atividade, a mediação da professora na ZDP evolui de maneiras diferentes, a depender das necessidades culturais de aprendizagens das crianças e do seu desenvolvimento.

Serrano (2018), ao trabalhar com a categoria de zona de desenvolvimento proximal na Educação Infantil, evidenciou que, nessa etapa de educação, o desenvolvimento de atividades na ZDP das crianças é, ainda, insuficiente nas práticas pedagógicas.

A importância do conceito de zona de desenvolvimento proximal da Teoria Histórico-Cultural para os processos de ensino e de aprendizagem na escola do século XXI potencializa a necessidade de seu conhecimento pela comunidade escolar, no caso em questão, a professora de Educação Infantil, e de como utilizá-lo nas práticas pedagógicas por meio de instrumentos metodológicos que possibilitem às professoras fazerem a avaliação diagnóstica das necessidades culturais de aprendizagens das crianças, implementarem os mediadores necessários nas atividades para o desenvolvimento dessas aprendizagens e, por fim, avaliarem como ocorreu a atividade mediada no processo de apropriação ou não dessas aprendizagens.

Dessa forma, ao nos aprofundarmos nos pressupostos da Teoria Histórico-Cultural em direção à atividade social transformadora de ensinar e de aprender, não basta apenas a intencionalidade da professora, como elo entre a consciência e seu objeto. É preciso o uso de mediadores intencionais potentes na zona de desenvolvimento proximal das crianças. Ainda assim, não basta o conhecimento da importância da zona de desenvolvimento proximal para as aprendizagens das crianças, jovens e adultos se não entendermos o que, objetivamente, compõe uma atividade de ensino e de aprendizagem.

Leontiev (1978LEONTIEV, Alexis N. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978.) defende a tese de que a atividade psíquica interna tem sua origem na atividade externa (o trabalho e a transformação das coisas). Portanto, a atividade é social e se desenvolve por um processo de colaboração e de comunicação entre os homens, tendo por componente fundamental o “motivo”. Não existe atividade sem o motivo, ou seja, os principais componentes de uma atividade são as “ações” realizadas pelos homens para que consigam atingir o fim desejado e ver satisfeita sua necessidade. Se não houver motivo, não se configura uma atividade, daí a importância da identificação e mediação das necessidades do tipo culturais de aprendizagens.

O trabalho de Leontiev (1978LEONTIEV, Alexis N. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978.) sobre o desenvolvimento do psiquismo humano revela-nos a complexidade do processo de tomada de consciência, à medida que nos relacionamos com outros seres humanos e refletimos sobre nossas próprias concepções. Nessa perspectiva, a atividade objetivada é aquela mediatizada pelo reflexo psíquico (desenvolvimento em diferentes níveis e formas), que consiste em orientar o sujeito no mundo objetivo. Tal atividade não pode ser concebida fora das relações sociais da vida em sociedade e tem como premissa a categoria de “necessidade”, que a orienta e a regula. A criação de novas necessidades nos seres humanos impulsiona-os a aprenderem e a se desenvolverem. Esse aprendizado e desenvolvimento tem grande importância para o ensino da criança, com a intervenção da professora, justamente, na criação de novas necessidades de aprendizagens, em diferentes momentos, que geram novas zonas de desenvolvimento proximal.

Na área de Educação Infantil, a situação de aprendizagem das crianças fica comprometida perante as necessidades de aprendizagens que elas demonstram, às vezes silenciosamente, talvez por falta de estimulação, bem como de compreensão aprofundada sobre o desenvolvimento infantil por parte das professoras, devido às ações de formação continuada que não lhes proporcionam esse conhecimento, entre outros fatores referentes às condições objetivas do cotidiano escolar. Essa situação está agravada hoje com a pandemia mundial do coronavírus, uma vez que as crianças brasileiras ficaram dois anos sem contato presencial nas escolas, e essa falta de relações sociais ampliadas pelas escolas pode ter gerado nas crianças necessidades de aprendizagens 3 3 Para maiores informações, ver estudo realizado pelo Laboratório de Pesquisa em oportunidades educacionais - LaPopE - UFRJ: https://www.educacaoecovid.org/. que as professoras precisarão priorizar nas escolhas das atividades. Assim, a avaliação diagnóstica de qualidade será uma ferramenta importante nesse processo de aprendizagem, de forma a desenvolver atividades que atuem na ZDP das crianças. A formação de conceitos nas crianças, por exemplo, não ocorre como formação de imagens sensoriais genéricas, mas constitui o resultado de um processo de apropriação de significados, historicamente elaborados e que se desenvolvem na atividade da criança por intermédio de sua comunicação com os que a rodeiam. Assim, as relações internas da atividade envolvem o reflexo psíquico, os motivos, as ações e os fins conscientes (LEONTIEV, 1978aLEONTIEV, Alexis N. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978.).

Lazaretti (2013LAZARETTI, Lucinéia Maria. A Organização Didática do Ensino na Educação Infantil: Implicações da Teoria Histórico-Cultural. Tese (Doutorado em Educação). São Carlos: PPGE/UFSCar, 2013. Disponível em: Disponível em: https://repositorio.ufscar.br/bitstream/handle/ufscar/2312/5371.pdf?sequence=1&isAllowed=y . Acesso em: 28 mar. 2018.
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) discute a questão do ensino no período de 0 a 3 anos, revelando que a organização didática do ensino centraliza objetivos relacionados aos “cuidados de higiene, alimentação e descanso, com conteúdos procedimentais, não sistematizados e conscientizados pelo professor, e em metodologias nas quais prevalecem formas espontâneas e improvisadas de organizar o trabalho pedagógico.” (LAZARETTI, 2013LAZARETTI, Lucinéia Maria. A Organização Didática do Ensino na Educação Infantil: Implicações da Teoria Histórico-Cultural. Tese (Doutorado em Educação). São Carlos: PPGE/UFSCar, 2013. Disponível em: Disponível em: https://repositorio.ufscar.br/bitstream/handle/ufscar/2312/5371.pdf?sequence=1&isAllowed=y . Acesso em: 28 mar. 2018.
https://repositorio.ufscar.br/bitstream/...
, p. 140).

Garay González (2016GARAY GONZÁLEZ, Abel G. Fundamentos da Teoria Histórico-Cultural para a Compreensão do Desenvolvimento do Pensamento Conceitual de Crianças de 4 a 6 anos. 225 f. Tese (Doutorado em Educação). São Carlos: PPGE/UFSCar, 2016. Disponível em: Disponível em: https://repositorio.ufscar.br/bitstream/handle/ufscar/7834/TeseAGGG.pdf?sequence=1&isAllowed=y . Acesso em: 28 mar. 2018.
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), ao trabalhar com o desenvolvimento do pensamento conceitual de crianças de 4 a 6 anos, argumenta que é necessário que a criança se aproprie “da essência dos objetos e dos fenômenos da realidade por meio da internalização diante da realização de uma atividade desafiadora, com sentido e com significado.” (GARAY GONZÁLEZ, 2016GARAY GONZÁLEZ, Abel G. Fundamentos da Teoria Histórico-Cultural para a Compreensão do Desenvolvimento do Pensamento Conceitual de Crianças de 4 a 6 anos. 225 f. Tese (Doutorado em Educação). São Carlos: PPGE/UFSCar, 2016. Disponível em: Disponível em: https://repositorio.ufscar.br/bitstream/handle/ufscar/7834/TeseAGGG.pdf?sequence=1&isAllowed=y . Acesso em: 28 mar. 2018.
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, p. 172).

Assim, os conceitos de cultura, história, sociedade, mediação, necessidades, atividade, zona de desenvolvimento proximal, funções psíquicas superiores, significado, sentido, motivo, entre outros, engendram os processos de ensino e de aprendizagem na escola em todos os níveis de educação. Tais conceitos estão intrinsecamente relacionados nas relações sociais dentro da escola e, portanto, necessitam fazer parte das práticas pedagógicas; no nosso caso, na Educação Infantil, a ênfase é dada em atividades de brincadeira.

A "brincadeira/jogo" 4 5 Quando nos referirmos à Teoria Histórico-Cultural baseada em autores russos, utilizaremos o binômio “Jogo/brincadeira”, como são traduzidos para a língua portuguesa, apesar de considerarmos que não sejam sinônimos no Brasil. é um tipo de atividade em que o motivo está no próprio processo e é característica da etapa de Educação Infantil, apesar de ser importante nas demais etapas de ensino. Ela é o tipo principal de atividade na infância e é caracterizada por seu objetivo residir no próprio processo, e, não, no produto da ação (LEONTIEV, 1978LEONTIEV, Alexis N. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978.). A título de exemplo: para uma criança pequena que brinca com areia ou blocos de madeira, o alvo da brincadeira não está na construção de castelos ou estruturas, nem em contar ou anotar a quantidade de blocos vermelhos utilizados na sua construção, mas no fazer, ou seja, na própria ação, no processo de montar e desmontar, de deixar cair etc. (MELLO, 2007MELLO, Maria Aparecida. Aprendizagens Sem Dificuldades: A Perspectiva Histórico-Cultural.Aprender - Caderno de Filosofia e Psicologia da Educação, v. 1, p. 203-218, 2007.).

Entretanto, esse “fazer” como conteúdo intrínseco aos jogos e às brincadeiras não é suficiente nem para o ensino e tampouco às aprendizagens das crianças em direção ao autodomínio do comportamento humano e da transformação da sociedade. Na perspectiva Histórico-Cultural, o papel da professora de Educação Infantil como mediadora das aprendizagens da criança e do desenvolvimento infantil é imprescindível e central nas brincadeiras e nos jogos das crianças. Daí a necessidade de que a professora tenha clareza desse significado para a criança, ao propor, proporcionar e disponibilizar condições e brinquedos para as atividades de brincadeira e de jogo, bem como compreenda o sentido que essas atividades têm para sua própria prática pedagógica.

Contudo, como a professora pode ter clareza sobre o trabalho com brincadeira e jogo na Educação Infantil se a academia utiliza ambos os termos como sinônimos? Será que podemos realmente considerar jogo e brincadeira como sinônimos? Quais são as consequências dessa concepção nas aprendizagens das crianças? Podemos continuar afirmando que a diferença entre eles é apenas em relação às regras, à seriedade ou não da atividade? Qual seria o papel de cada um deles na Educação, caso pudéssemos diferenciá-los? Essas perguntas motivaram a realização de uma pesquisa teórica, abordando os principais autores e as produções científicas sobre ambos os termos.

Esta pesquisa teve como hipótese que jogo e brincadeira não são sinônimos, mas que ambos são fundamentais para as aprendizagens e o desenvolvimento da criança, apesar de, também, terem papéis e funções diferentes na educação escolar, principalmente na periodização da Educação Infantil no Brasil. A partir disso, a questão de pesquisa que guiou o estudo foi: será que jogo e brincadeira são sinônimos nos processos de ensino e de aprendizagem escolares, levando-se em consideração o papel de cada um deles nas aprendizagens das crianças? Para tanto, os objetivos foram: a) identificar as diferenças teóricas entre os conceitos de jogo e brincadeira, com base na Teoria Histórico-Cultural; e b) discutir o papel de cada um deles nas aprendizagens das crianças e nas práticas pedagógicas na Educação Infantil.

A QUESTÃO SOBRE A NÃO DIFERENCIAÇÃO ENTRE BRINCADEIRA E JOGO

Os conceitos de jogo e brincadeira são importantes na Teoria Histórico-Cultural para explicar as aprendizagens e o desenvolvimento humano. Na Rússia, há apenas a palavra “igra”, que significa jogo, mas, nas traduções para o português, encontramos a substituição da palavra jogo pela palavra brincadeira. Entretanto, no Brasil, temos as duas palavras utilizadas como sinônimas e antônimas, gerando conflito nas práticas pedagógicas.

Diferentes autores já demonstraram a importância do jogo 5 5 Todos esses autores citados, em seus textos originais, reportam-se à palavra jogo, e não, por exemplo, à brincadeira, diferenciando vários tipos de jogos. nas aprendizagens e no desenvolvimento humano: Piaget (1978PIAGET, Jean. A Formação do Símbolo na Criança. Rio de Janeiro: Zahar, 1978. ); Vygotski (1972VYGOTSKI, Liev S. Psicología del Arte. Barcelona: Barral Editores, 1972., 1987, 1991, 1993, 1995, 1996, 1997, 2001); Elkonin (1987ELKONIN, Daniil B. Problemas Psicológicos del Juego em la Edad Preescolar. In: DAVÍDOV, V.; SHUARE, M. (Orgs.). La Psicologia Evolutiva y Pedagogica en la URSS. Antología. Tradução de Marta Shuare. Moscou: Editorial Progreso, 1987., 1998); Leontiev (1978LEONTIEV, Alexis N. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978., 1978a); Brougére (1993BROUGÈRE, Giles. Jeu et Education: Le jeu dans a pédagogie prescolaire depuis le Romantisme. Thèse pour le doctorat d”Etat ès Lettres et Sciences Humaines. Paris: Université Paris V, 1993. V. I e II.); Huizinga (1951HUIZINGA, Johan. Homo Ludens: essai sur la fonction sociale du jeu. Paris: Gallimard, 1951. , 2005); Brunner (1983); Bettelheim (1988BETTELHEIM, Bruno. Uma Vida para seu Filho - Pais bons o bastante. Rio de Janeiro. Campus, 1988.), entre outros. O jogo é concebido como atividade com regras definidas e a brincadeira, como atividade espontânea, desmerecendo o brincar ao associá-lo à não seriedade. Contudo, a falta de clareza do papel deles na escola cria, também, a visão de jogo como passatempo, colocando-os opostos ao âmbito escolar e à maioria de seus conteúdos.

Kishimoto (1999KISHIMOTO, Tizuko Morchida (Org.) Jogo, Brinquedo, Brincadeira e a Educação. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1999.) elabora importante aprofundamento teórico sobre o assunto, subsidiada por Henriot (1983HENRIOT, Jacques. Le Jeu. Paris: Synonyme, SOR, 1983.), Wittgenstein (1975), Caillois (1967CAILLOIS, Roger. Les Jeux et les Homes. Paris: Gallimard, 1967. ), FromBerg (1987) e Christie (1991aCHRISTIE, James F. La Fonction de Jeu au Niveau des Enseignements Prescolaires et Primaires (1ère partie). L’éducation par le jeu et l’environnement, n. 43, p. 3-8, 3 ème trimestre, 1991a. ), embora não defina brincadeira.

Bomtempo (1999BOMTEMPO, Edda. A brincadeira de faz-de-conta: lugar do simbolismo, da representação, do imaginário. In: KISHIMOTO, Tizuko Morchida (Org.). Jogo, Brinquedo, Brincadeira e a Educação. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1999. p. 57-72.) e Santos (2001SANTOS, Vera Lúcia Bertoni dos. Promovendo o Desenvolvimento do Faz-de-conta na Educação Infantil. In: CRAIDY, Carmen Maria; KAERCHER, Gládis Elise P. da Silva (Orgs.). Educação Infantil: pra que te quero? Porto Alegre: Artmed Editora, 2001. ) abordam brincadeira e jogo sem diferenciá-los. Gonzalez-Mena (2015) relaciona a brincadeira à cognição e aprendizagem das crianças, mas não aprofunda essa relação. Ryngaert (2009RYNGAERT, Jean-Pierre. Jogar, Representar: Práticas Dramáticas e Formação. Tradução de Cássia Raquel da Silveira. São Paulo: Cosac Naify, 2009. 280 p., p. 35) trata o jogo como “terapia em si” e, ao mesmo, como algo assustador. Ide (1999IDE, Sahda Marta. O jogo e o fracasso escolar. In: KISHIMOTO, Tizuko Morchida (Org.). Jogo, Brinquedo, Brincadeira e a Educação. 3. ed. São Paulo: Cortez, 1999. p. 89-108. ) atribui ao jogo o desenvolvimento integral da criança, e à brincadeira apenas divertimento, o que corrobora para a concepção de que jogo é sério, e brincadeira é não séria. Para Oliveira (2002OLIVEIRA, Zilma Ramos de. Educação Infantil: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez Editora, 2002. (Coleção docência em formação)., p. 160), ora o jogo, ora a brincadeira tem papel de “recurso privilegiado de desenvolvimento da criança pequena.” Assim, a diferenciação entre eles parece se tornar impossível, permanecendo a lacuna nas pesquisas quanto ao papel de cada um para as aprendizagens escolares.

Pesquisas sobre jogo e brincadeira na Teoria Histórico-Cultural

A Teoria Histórico-Cultural abarca grande número de autores, ilustres desconhecidos, que desenvolveram pesquisas sobre a influência do jogo/brincadeira nas aprendizagens das crianças e que, a despeito de suas publicações terem ocorrido entre as décadas de 1940 e 1990, nos auxiliaram a analisar a necessária diferenciação entre jogo e brincadeira, apesar de eles não estabelecerem tais diferenças. Nessa teoria, jogo/brincadeira é intencional, consciente, voluntário e volitivo, por isso eles são importantes ferramentas para o desenvolvimento das funções psíquicas superiores, o que torna fundamental a diferenciação entre ambos.

Yadeshko e Sojin (1990YADESHKO, Valery Iosifovich; SOJIN, F. A. Pedagogía Preescolar. Tradução de Raquel Peña e Elvira Polanco. Havana: Editorial Pueblo Y Educación , 1990.), Krupskaia (1973KRUPSKAIA, Nadezhda K. Sobre la Educación Preescolar. Moscou, 1973. p. 208., apud YADESHKO; SOJIN, 1990YADESHKO, Valery Iosifovich; SOJIN, F. A. Pedagogía Preescolar. Tradução de Raquel Peña e Elvira Polanco. Havana: Editorial Pueblo Y Educación , 1990., p. 309), Makarenko (1957MAKARENKO, Anton Simionovitch. Obras. Tomo IV. Moscou, 1957. , apud YADESHKO; SOJIN, 1990, p. 310) afirmaram que a criança, ao imitar as ações dos adultos no jogo/brincadeira, tem a possibilidade de vivenciar o lado positivo e o negativo dessas ações. Jukovskaia (1978JUKOVSKAIA, Roza I. La Educación del Niño en el Juego. Tradução de Alfredo Pérez. Havana: Editorial Pueblo y Educación, 1978. ) discute a importância do jogo baseada em estudos científicos de pesquisadores russos de sua época e que sua dependência com relação à vida social se deve a Plejánov (1925, apud JUKOVSKAIA, 1978JUKOVSKAIA, Roza I. La Educación del Niño en el Juego. Tradução de Alfredo Pérez. Havana: Editorial Pueblo y Educación, 1978. , p. 12). Ushinski (1948USHINSKI, Konstantin. D. Obras Escogidas. Tomo 8. M. L. Moscou: Editorial de la ACP de la RSSFR, 1948, p. 439. ) e Gorbatenko (1957GORBATENKO, T. I. Particularidades de la Imitación del Psiquismo. M. Ed. De la ACP, de la RSSFR, 1957, p. 386. ), ambos citados por JukovskaiaJUKOVSKAIA, Roza I. La Educación del Niño en el Juego. Tradução de Alfredo Pérez. Havana: Editorial Pueblo y Educación, 1978. (1978, p. 4), defendem o desenvolvimento da autonomia da criança. JukovskaiaJUKOVSKAIA, Roza I. La Educación del Niño en el Juego. Tradução de Alfredo Pérez. Havana: Editorial Pueblo y Educación, 1978. (1978, p. 29 e 32) cita, ainda, Golitseva, Klindova e Berdyjova (1959GOLITSEVA, Olga; KLINDOVA, Lyuba; BERDYJOVA, Yana. El Juego en la Escuela de Madres. Bratislava, 1959. ), pois, nos jogos após os conteúdos escolares, as crianças utilizaram os conhecimentos aprendidos anteriormente, relacionando-os com os atuais, demonstrando a união entre significado e sentido, que potencializa o motivo para continuar aprendendo e a generalizar esse conhecimento (JUKOVSKAIAJUKOVSKAIA, Roza I. La Educación del Niño en el Juego. Tradução de Alfredo Pérez. Havana: Editorial Pueblo y Educación, 1978. , 1978).

Manuilenko (1947, apud ELKONIN, 1987ELKONIN, Daniil B. Problemas Psicológicos del Juego em la Edad Preescolar. In: DAVÍDOV, V.; SHUARE, M. (Orgs.). La Psicologia Evolutiva y Pedagogica en la URSS. Antología. Tradução de Marta Shuare. Moscou: Editorial Progreso, 1987., p. 83) demonstrou que as crianças pequenas controlam melhor os seus movimentos em um jogo do que em uma atividade escolar. Zaporózhets e Neveróvich (1965ZAPORÓZHETS, Alexander Vladimirovich; NEVERÓVICH, Ya. Desarollo de los processos cognoscitivos y voluntários en los pré-escolares. Moscou, 1965., apud ELKONIN, 1987, p. 83) relacionaram o jogo com a formação da motricidade da criança. Istómina (s/d, apud ELKONIN, 1987, p. 83) focalizou o surgimento da memória voluntária na idade pré-escolar.

Esse quadro teórico nos mostra que a brincadeira e o jogo são importantes na escola, mas a diferenciação de cada um quanto à sua especificidade nas aprendizagens torna-os somente uma atividade a mais na escola.

O CAMINHO METODOLÓGICO DA PESQUISA

A diferenciação teórica entre brincadeira e jogo surgiu do aprofundamento da Teoria Histórico-Cultural como docente e pesquisadora em Educação, da vivência quando professora de Educação Infantil e pela implicação de cada um deles nas práticas pedagógicas com crianças, especialmente se considerarmos o desenvolvimento das funções psíquicas superiores de todas e quaisquer crianças. Portanto, a unidade metodológica da pesquisa foi o caráter mediatizador que envolve a brincadeira e o jogo de papéis, a partir da potencialidade de diferentes instrumentos mediadores engendrados em cada um deles.

As primeiras ideias originaram-se no problema de pesquisa: será que jogo e brincadeira são sinônimos nos processos de ensino e de aprendizagem, levando-se em consideração o papel de cada um deles nas aprendizagens das crianças nos diferentes níveis de educação escolar? Assim, surgiu a hipótese: “jogo” e “brincadeira” não são sinônimos, entretanto, ambos são fundamentais para as aprendizagens e o desenvolvimento da criança, apesar de terem papéis e funções diferentes na educação escolar, principalmente nas diferentes faixas etárias da etapa de Educação Infantil.

O levantamento bibliográfico foi realizado em livros e artigos científicos em dois momentos: 1) escolha de autores clássicos do tema jogo e dos que discutem brincadeira na Educação Infantil; 2) levantamento de livros clássicos de autores russos desconhecidos, traduzidos para o espanhol, entre eles: Yadeshko e Sojin (1990YADESHKO, Valery Iosifovich; SOJIN, F. A. Pedagogía Preescolar. Tradução de Raquel Peña e Elvira Polanco. Havana: Editorial Pueblo Y Educación , 1990.); Krupskaia (1973KRUPSKAIA, Nadezhda K. Sobre la Educación Preescolar. Moscou, 1973. p. 208.); Jukovskaia (1978JUKOVSKAIA, Roza I. La Educación del Niño en el Juego. Tradução de Alfredo Pérez. Havana: Editorial Pueblo y Educación, 1978. ); Ushinski (1948USHINSKI, Konstantin. D. Obras Escogidas. Tomo 8. M. L. Moscou: Editorial de la ACP de la RSSFR, 1948, p. 439. ); Gorbatenko (1957GORBATENKO, T. I. Particularidades de la Imitación del Psiquismo. M. Ed. De la ACP, de la RSSFR, 1957, p. 386. ); Golitseva, Klindova e Berdyjova (1959GOLITSEVA, Olga; KLINDOVA, Lyuba; BERDYJOVA, Yana. El Juego en la Escuela de Madres. Bratislava, 1959. ); Manuilenko (1947); Zaporózhets e Neveróvich (1965ZAPORÓZHETS, Alexander Vladimirovich; NEVERÓVICH, Ya. Desarollo de los processos cognoscitivos y voluntários en los pré-escolares. Moscou, 1965.).

Os procedimentos metodológicos responderam à necessidade de compreender brincadeira e jogo para além do que já estava posto, teoricamente, nas diversas áreas de conhecimento (Pedagogia, Educação Física, Sociologia, Psicocinética etc.), de modo a estabelecer implicações de ambos nas práticas pedagógicas, especialmente na Educação Infantil. A hipótese guiou a pesquisa teórica, cuja análise do material bibliográfico coletado envolveu: 1) leitura de reconhecimento da organização interna das obras e artigos; 2) leitura exploratória para identificação das reais possibilidades das referências teóricas; 3) leitura seletiva para focalização das informações pertinentes ao problema de pesquisa; 4) leitura reflexiva ou crítica para elaboração de síntese que integrasse as ideias do autor, identificasse suas afirmações e o porquê delas, por meio do necessário estranhamento, imparcialidade e objetividade da pesquisadora; 5) leitura interpretativa com relação ao problema e objetivos da pesquisa (SALVADOR, 1973SALVADOR, Ângelo Domingos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Bibliográfica. 3. ed. revista e ampliada. Porto Alegre: Livraria Sulina Editora, 1973., p. 71-81).

A busca pela comprovação ou refutação da hipótese de pesquisa seguiu as orientações de Vygotski (1991VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas Teóricos y Metodológicos de la Psicología. Tomo I. Madri: Visor Distribuiciones, 1991., 1995) sobre as relações entre o contexto sociocultural, o conhecimento científico e o estado do objeto de estudo na atualidade. A metodologia baseada no método genético, de ir à busca da raiz do objeto de estudo, envolveu o aprofundamento teórico sobre ele, a identificação de suas contradições e abstrações, a aplicação da espiral dialética sobre o conhecimento ainda sincrético, a separação de suas características, a expansão da ideia abstrata para seu significado concreto, pela confrontação com a realidade, gerando modificação do objeto de estudo.

O processo de homogeneização (HELLER, 1977HELLER, Ágnes. Sociologia de la Vida Cotidiana. Barcelona: Ediciones Península, 1977. ) e o processo de desenvolvimento da atividade volitiva (PETROVSKY, 1980) nos auxiliaram a separar as características de jogo e brincadeira - e analisá-los, teoricamente. O aprofundamento teórico sobre ambos os termos gerou constructos e conexões com vivências que se confrontavam com as produções teóricas, porém continuamos na busca de avançá-las.

Assim, a ideia que originou a hipótese foi se expandindo e se tornando mais abstrata, uma vez que, na Teoria Histórico-Cultural, a palavra era apenas jogo. A palavra brincadeira era advinda das traduções do russo para o português, com base no significado social no Brasil. Nesse momento, a hipótese parecia ser refutada, e os caminhos para sua comprovação ficavam mais difíceis.

Nessa etapa do processo da pesquisa, foi necessário, novamente, fracionar o conhecimento sincrético daquele momento, para analisá-lo à luz das nossas vivências práticas anteriores, com suporte da Teoria Histórico-Cultural. Assim, nesse processo, que não foi simples e nem rápido, a formulação mais abstrata da ideia foi se expandindo em relação ao que ela significava inicialmente, ao que ela representava na realidade da atividade de ensino e na atividade de aprendizagem, modificando-a. A hipótese parecia se confirmar, na medida em que o conhecimento produzido já se diferenciava, de certa forma, da ideia original.

A partir daí, as respostas ao problema e à hipótese mostraram-se mais claras. Passamos a confrontar a ideia inicial com conhecimentos sobre desenvolvimento infantil, sobre as crianças, e a delimitar a diferenciação entre os termos, utilizando, para tanto, a extrapolação dos limites do conceito jogo, nas pesquisas dos russos, tomando o cuidado de não descaracterizá-lo; pelo contrário, prosseguindo na busca de desvendar a sua abrangência relacionada ao ensino e à aprendizagem, nos quais a brincadeira se tornava evidente, mediante as necessidades de avanço teórico e metodológico no Brasil, especialmente na Educação Infantil, de forma que o resultado fosse considerado produção de conhecimento científico fidedigno.

Com base nesses procedimentos de coleta dos dados teóricos em direção à análise do problema de pesquisa, procedemos às explicações genéticas (VYGOTSKI, 1995VYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas del Desarrollo de la Psique. Tomo III. Madri: Visor Distribuiciones , 1995.), tentando esclarecer o presente a partir do passado, tendo a hipótese explicativa como guia, identificando as evidências a favor ou contra envolvidas na sua afirmação. Além disso, tomamos o cuidado na análise dos dados: a) com ambiguidades no raciocínio das explicações; b) em mostrar as contradições; c) em verificar se as explicações do problema abordam todo o objeto de estudo; d) em “ler nas entrelinhas”, de forma a identificar os pressupostos científicos e filosóficos que subsidiam as explicações. Após análise e discussão dos resultados, procedemos à “síntese integradora”, ordenando as soluções do problema em um sistema orgânico (SALVADOR, 1973SALVADOR, Ângelo Domingos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Bibliográfica. 3. ed. revista e ampliada. Porto Alegre: Livraria Sulina Editora, 1973., p. 138-145).

DIFERENCIAÇÃO ENTRE OS CONCEITOS DE JOGO E BRINCADEIRA

Elaboramos três diretrizes de análises que nos guiaram a responder o problema de pesquisa e que se configuram, também, em unidades de análise do objeto de estudo: 1) A diferença entre jogo e brincadeira como sendo apenas em relação às regras e à seriedade ou não da atividade; 2) Consideração ou não de jogo e brincadeira como sinônimos e suas consequências nas aprendizagens das crianças; e 3) O papel da distinção entre jogo e brincadeira na Educação Infantil.

A discussão dessas três diretrizes/unidades de análise foi baseada na periodização de Mukhina (1995MUKHINA; Valeria. Psicologia da Idade Pré-Escolar. Tradução de Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 1995. (Psicologia e Pedagogia). , p. 58,) na qual o desenvolvimento da criança é dividido da seguinte maneira: nascimento (bebês); primeiro ano de vida, primeira infância (1 a 3 anos); infância pré-escolar (3 a 7 anos).

A diferença entre jogo e brincadeira como sendo apenas em relação às regras e à seriedade ou não da atividade.

A questão da regra é aparente no jogo, mas a pouca aparência não quer dizer que na brincadeira ela não exista. Ambas são atividades culturais dependentes das vivências em sociedade, e seus conteúdos podem se modificar, dependendo da cultura. Contudo, na Teoria Histórico-Cultural, ainda que se concebam, também, as especificidades das diferentes culturas, a sua base principal sempre é a cultura humana. Então, se jogo e brincadeira são culturais e sociais, a diferença entre eles não pode ser apenas em relação às regras, porque a vivência em qualquer sociedade pressupõe regras.

No jogo, a regra está sempre bem definida e já construída, apesar de todo jogo ter a possibilidade de modificação de suas regras, dependendo do contexto e da intenção dos jogadores. Na brincadeira, as regras não são aparentes porque sempre são intrínsecas às relações sociais, bem como à imaginação e, principalmente, são definidas por quem brinca, a partir do seu repertório de vivências em relação às pessoas, aos objetos, aos espaços e à situação social de desenvolvimento (VYGOTSKIVYGOTSKI, Liev S. Obras Escogidas: Problemas del Desarrollo de la Psique. Tomo III. Madri: Visor Distribuiciones , 1995., 1994 apud BOZHOVICH, 1981BOZHOVICH, Lídia Ilinitchna. La Personalidad y su Formación en la Edad Infantil. Havana: Editorial Pueblo y Educación, 1981. , p. 122).

O conceito de situação social de desenvolvimento está relacionado à vivência da criança em função das influências do meio social, mas, principalmente, à variação dessas influências, dependendo do desenvolvimento psicológico da criança. Uma mesma situação de relação social pode ter diferentes significados para duas crianças. Assim, esse conceito da Teoria Histórico-Cultural pode ser identificado, analisado e trabalhado nas atividades de jogo de papéis, bem como nas atividades de brincadeira. Entretanto, a atividade de jogo de papéis, por exigir que a criança já tenha maior repertório de palavras compreensíveis pela professora, pode auxiliar esta última a ampliar a sua compreensão daquilo que as crianças já se apropriaram sobre as relações entre as pessoas na sociedade e, assim, modificá-las ou expandi-las.

Elkonin (1998ELKONIN, Daniil B. Psicologia do Jogo. Tradução de Álvaro Cabral. São Paulo: Martins Fontes, 1998.) explica que a forma mais evoluída de jogo é o jogo de papéis, que assume diferentes níveis, dependendo das necessidades da criança; à medida que se torna mais independente dos adultos, aumenta o nível do jogo de papéis.

A brincadeira e o jogo têm importância fulcral no desenvolvimento psíquico da criança, portanto, ambos devem ser considerados como atividade séria - a brincadeira para a criança é sua vida, é verdadeira, é real, é a atividade que a insere nas relações humanas. A criança tem dúvidas sobre o que está vendo e sentindo, pensa sobre o que está vivendo, mesmo que não esteja entendendo completamente a situação. Esse processo, muitas vezes, é silencioso. Quem a observa com atenção quando ela está brincando, quem procura entender o que ela está pensando quando brinca e quem se questiona sobre suas necessidades de conhecimento naquele momento, consegue perceber esse processo silencioso.

Assim, não podemos persistir na afirmação de que a diferença entre brincadeira e jogo é apenas em relação às regras e à seriedade ou não da atividade, porque tal concepção não direciona as práticas pedagógicas para a realização de mediações na zona de desenvolvimento proximal das crianças e não cria nelas novas necessidades de aprendizagens.

Consideração ou não de jogo e brincadeira como sinônimos e suas consequências nas aprendizagens das crianças

Esta unidade de análise foi o foco principal da pesquisa, uma vez que tem relação com um dos conteúdos principais da Educação Infantil: o brincar. Um dos problemas de conceber esses termos como sinônimos na Educação está relacionado à sua utilização com o único objetivo de aprender outros conteúdos, por exemplo, utilizar jogos na matemática para aprender operações; na língua portuguesa, para aprender palavras novas; na Educação Infantil, utilizar o brincar para aprender cores etc. Assim, o brincar e o jogo ficam reduzidos aos conteúdos do tipo escolar (matemática, português), perdendo seu foco principal, que é o desenvolvimento das funções psíquicas superiores especiais. Essa problemática gera limitação das aprendizagens e do desenvolvimento das funções psíquicas superiores especiais das crianças, principalmente a função de voluntariedade, que será fundamental para estabelecermos a diferença entre brincadeira e jogo.

Na Teoria Histórico-Cultural, o conceito de voluntariedade (contrapõe-se ao sentido de espontaneidade) indica intencionalidade, motivos conscientes, cujos significados e sentidos são imbricados, de forma a impulsionar a ação e o desenvolvimento da atividade. Petrovsky (1980) define-o como a atividade motivada por necessidades humanas que transformam o mundo. Assim, o autor diferencia dois tipos de ações: as involuntárias e as voluntárias. As ações involuntárias são relacionadas ao aparato biológico e têm o caráter impulsivo, reflexivo, não consciente dos objetivos e fins e não têm um plano preciso e refletido, podendo ser originadas a partir de estados emocionais em situações de susto, medo, perplexidade etc. As ações voluntárias são relacionadas ao aspecto cultural e desenvolvimento da consciência. Assim, ao contrário das involuntárias, elas são dirigidas por um objetivo consciente, a partir do estabelecimento prévio de operações para atingir um fim específico. Dentre as ações voluntárias, há um grupo especial que o autor denomina ações volitivas, que são aquelas em que o nível de consciência e dos motivos para realizar a atividade são mais aprofundados, uma vez que exigem perseverança e esforço para atingir o objetivo proposto, mesmo que a atividade em si não seja prazerosa. Na atividade volitiva, a pessoa se subordina perante os objetivos mais importantes para ela. Por exemplo: se em um dia chuvoso e frio uma pessoa quer dormir mais, entretanto, logo cedo ela tem que fazer uma atividade mais importante para si mesma, então ela secundariza seu conforto e sono em relação àquela atividade prioritária para ela. Assim, a atividade volitiva gera nos indivíduos a independência, a decisão, a perseverança e a habilidade de domínio sobre si mesmo (, PETROVSKY PETROVSKI, Arthur. Psicologia General: Manual Didáctico para los Institutos de Pedagogía. Moscou: Editorial Progreso, 1980.1980, p. 361). Nas palavras do autor:

La ejecución sistemática de actos y acciones volitivas de diferente carácter representa tal tipo de actividad del individuo que está relacionada con la participación em ella de la consciência. La actividad volitiva pressupone necessariamente una serie de actos que prevén alto grado de consciência de los esfuerzos y el carácter de los processos psíquicos realizados. Se incluye también apreciar la situación creada, elegir las vías para la acción futura, selecionar los médios necessários para los fines, decidir, etc. (PETROVSKY, 1980, p. 363, grifo do autor).

Assim, chegamos a uma importante diferenciação entre brincadeira e jogo: o caráter voluntário, que, por seu princípio de ser consciente e intencional, é uma característica que pode se aproximar ou se distanciar da brincadeira, dependendo do conteúdo que a criança atribui à brincadeira (mesmo que ela ainda tenha uma intencionalidade não aprofundada e não consciente); mas ele está sempre relacionado ao jogo. E o princípio intrínseco à sua característica (caráter voluntário) nos auxilia a afirmar que jogo e brincadeira não são sinônimos, pois a principal diferença entre eles está no tipo de atividade: involuntária, voluntária e volitiva, bem como na relação entre elas: entre a atividade involuntária e voluntária e entre a atividade voluntária e volitiva.

Na brincadeira, a intencionalidade de quem brinca pode não ser consciente: o próprio objeto ou brinquedo pode eliciar a brincadeira. Assim, no processo de brincadeira, a atividade da criança (bebês até aproximadamente 2 anos de idade) desenvolve-se da atividade involuntária para a atividade voluntária (aproximadamente 3 anos em diante), mas com uma condição: se a brincadeira for mediada intencionalmente pelas professoras para que essa evolução se objetive na criança.

Em contrapartida, no jogo deve haver sempre um alto grau de intencionalidade, de consciência de quem joga. Assim, o processo de desenvolvimento do jogo evolui da atividade voluntária para a atividade volitiva.

A partir da diferenciação entre os termos brincadeira e jogo a respeito do caráter voluntário ou não em relação aos motivos, necessidades e especificidades das crianças de Educação Infantil, no período de 0 a 3 anos, não podemos afirmar que sua atividade é de jogo, mas, sim, de brincadeira, porque, inicialmente, a intencionalidade da brincadeira não está na criança propriamente dita, devido à sua pouca vivência com os objetos de sua brincadeira; situa-se, sim, no papel da professora, que faz a mediação necessária para que a criança desenvolva essa intencionalidade que desencadeie as aprendizagens e o desenvolvimento do psiquismo da criança. A intencionalidade da criança na brincadeira vai se desenvolvendo para o jogo à medida que ela brinca com diferentes mediadores e avança em criar situações imaginárias que lhe auxiliem a compreender as relações sociais. Assim, o bebê, inicialmente, não tem intencionalidade ao brincar com o corpo da mãe, com o seu próprio corpo, com os objetos que o rodeiam; sua atividade de brincar é involuntária e necessária para o seu desenvolvimento. As crianças de 1 a 3 anos já possuem certo grau de intencionalidade ao brincar e, à medida que essas crianças se relacionam na brincadeira entre si, com diferentes objetos, espaços e pessoas, essa atividade involuntária tende a ser voluntária, a partir da intencionalidade de quem organiza os mediadores necessários para tal desenvolvimento.

Bozhovich (1981BOZHOVICH, Lídia Ilinitchna. La Personalidad y su Formación en la Edad Infantil. Havana: Editorial Pueblo y Educación, 1981. ) explica que, o êxito da atividade e a conduta da criança de 1 a 3 nos depende da aprovação do adulto, e isso é o “fator essencial que impulsiona seu desenvolvimento psíquico” (BOZHOVICH, 1981BOZHOVICH, Lídia Ilinitchna. La Personalidad y su Formación en la Edad Infantil. Havana: Editorial Pueblo y Educación, 1981. , p. 165).

A atividade de brincadeira, também, está relacionada à atividade principal (LEONTIEV, 1978LEONTIEV, Alexis N. O desenvolvimento do psiquismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1978.) da criança de 1 a 3 anos, que se modifica muito rapidamente. Para o bebê, a atividade principal é a relação com quem cuida dele, suas brincadeiras estão direcionadas a isso, e as sensações com o entorno são focos de desenvolvimento do seu psiquismo. À medida que suas relações se ampliam nessas brincadeiras, seus interesses mudam e, então, os objetos começam a lhe chamar a atenção e a imprimir certa intenção à sua atividade de brincadeira, mesmo que, ainda, esta não tenha significado social para ele. Sua independência fica maior com a habilidade de andar, ampliando-se a sua relação com os objetos. Assim, a satisfação de suas necessidades de desenvolvimento ocorre por meio de sua relação com os adultos, com os objetos, com outras crianças, com o entorno, com as aprendizagens que as brincadeiras lhe promovem.

Bozhovich (1981BOZHOVICH, Lídia Ilinitchna. La Personalidad y su Formación en la Edad Infantil. Havana: Editorial Pueblo y Educación, 1981. , p. 157) discute que, no processo de desenvolvimento de “novas impressões” na criança, o papel das relações com os adultos e com os objetos são determinantes para as aprendizagens. Da mesma forma, Quintanar Rojas e Solovieva (2009, p. 56) argumentam que a “imagem psicológica” orienta o desenvolvimento da criança por meio dos objetos.

Assim, no início, aproximadamente até um ano de vida, na brincadeira, o seu conteúdo nem sempre é o de a criança imitar os papéis do adulto, muitas vezes ela se relaciona apenas com os objetos. As manipulações com os objetos, proporcionadas intencionalmente pela professora durante as brincadeiras, são realizadas pela criança apenas com base nas “propriedades externas - a criança manipula a colher da mesma maneira que o pau, o lápis ou a pá.” (MUKHINA, 1995MUKHINA; Valeria. Psicologia da Idade Pré-Escolar. Tradução de Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 1995. (Psicologia e Pedagogia). , p. 107).

Outro problema decorrente do uso de ambos os termos como sinônimos é a confusão entre o jogo de papéis das crianças maiores e a brincadeira de “casinha”, pelo fato de a criança fazer o papel da mamãe, junto à boneca. Entretanto, essa situação não se configura como jogo de papéis propriamente dito, porque a intencionalidade e o conceito sobre o papel da mãe e da filha (boneca) podem, ainda nesse período da primeira infância, estar relacionados à imitação do comportamento da mãe e da filha, necessário para a formação de hábitos sociais na criança, para que ela vá estabelecendo relações de compreensão e de intencionalidade com o conhecimento histórico cultural.

Assim, para que seja jogo de papéis, a brincadeira de “casinha” tem que, necessariamente, evoluir para o nível de intencionalidade e de consciência sobre os papéis sociais de mãe e filha, de forma a serem ampliados e abstraídos do comportamento observável de ambas. O jogo de papéis envolve muitas relações e emoções implícitas e explícitas nos papéis representados. Portanto, o exemplo da atividade de “casinha” que as crianças desenvolvem sozinhas ou em conjunto pode ser inserido no conceito de “brincadeira”, e não no conceito de “jogo de papéis”.

Contudo, como a dialética envolve contradições, não podemos esquecer que a própria atividade de brincadeira traz, também, contradições em si. E, como não poderia deixar de ser, as transições entre a brincadeira e o jogo de papéis são importantes para esclarecermos a diferença entre ambos, pois nessas transições estão presentes as mudanças do próprio desenvolvimento.

A brincadeira de “casinha” pode nos dizer muito sobre o momento de desenvolvimento psíquico das crianças e as formas de mediação necessárias para avançarem. A atividade de observação da professora enquanto as crianças brincam é fundamental para desenvolver seu olhar sobre os momentos de aprendizagem e de desenvolvimento psíquico dessas crianças. Aquelas que estão próximas do fim da primeira infância podem iniciar o jogo de papéis, com a mediação da professora, uma vez que suas vivências sociais se ampliaram e suas percepções sobre as relações humanas evoluíram com elas. Essa aproximação do jogo de papéis também depende da qualidade de mediação e mediadores organizados pela professora. Em uma sala em que os bebês e as crianças são incentivados com diferentes mediadores nas brincadeiras, a tendência é que o jogo de papéis se desenvolva, por intermédio da professora, na mesma proporção em que eles aprendem e se desenvolvem. Se as crianças apenas ficam brincando com os objetos, em brinquedotecas sem intervenção mediatizada, organizada e sistemática da professora em função das necessidades das crianças e dos bebês, as funções psíquicas superiores não irão se desenvolver com a qualidade necessária para avanço ao jogo de papéis.

Até aqui podemos afirmar a principal diferença entre os conceitos de brincadeira e jogo: a brincadeira tem especificidades fundamentais para as aprendizagens e para o desenvolvimento psíquico da criança de 0 a 3 anos; o jogo, especialmente o de papéis, guarda especificidades para as aprendizagens e o desenvolvimento psíquico da criança de 4 anos em diante.

A brincadeira pode assumir semelhanças com o conceito de jogo e, também, diferenças cruciais relativas a esse conceito. Portanto, minimizar o papel da brincadeira de crianças de 0 a 3 anos e do jogo de papéis entre 4 e 6 anos é impedir a criança de se apropriar de funções psíquicas superiores fundamentais para suas aprendizagens e seu desenvolvimento psíquico. O papel mediador da professora que trabalha na Educação Infantil é central nesse processo; isso quer dizer que tanto a brincadeira quanto o jogo exigem a intervenção da professora na transição da atividade involuntária para a voluntária e da atividade voluntária para a volitiva.

Vygotski (2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. , p. 179) discute que, no processo de jogo/brincadeira, as crianças executam as atividades com “significados separados de sus objetos y aciones” sem saber o que está fazendo. Para nós, no Brasil, isso ocorre durante a atividade de brincadeira com crianças menores, porque elas, ainda, estão se apropriando dos conceitos e não dominam essas atividades de modo voluntário. Entretanto, por meio das brincadeiras, a criança aprende a definição dos conceitos, objetos e, ainda, as palavras atribuem significado para as coisas (VYGOTSKI, 2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. , p. 179). Novoselova (1987NOVOSELOVA, Svetlana L. El desarrollo del pensamento en la edad temprana. 1ª Reimpressão. Tradução de Elsa Skrypiel. Havana: Editorial Pueblo Y Educación, 1987. , p. 1) também corrobora que “El pensamiento del niño en las etapas tempranas del desarrollo es concreto e inseparable de su actividad práctica.”

Outra diferença importante entre jogo e brincadeira que nos impede de considerá-los sinônimos é com relação à imaginação que, segundo Vygotski (2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. , p. 172), “[...] no está presente en la consciência de los niños pequenos y es totalmente ajeno a los animales [...]”. Portanto, se a imaginação depende da atividade voluntária, consciente, e dos tipos de vivências, então, na brincadeira, a criança de 0 a 3 anos não opera com base na imaginação, mas nos fatos concretos que ela vê, sente e vivencia.

Todavia, por meio da brincadeira, a criança pode desenvolver cada vez mais o seu psiquismo; Mukhina (1995MUKHINA; Valeria. Psicologia da Idade Pré-Escolar. Tradução de Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 1995. (Psicologia e Pedagogia). , p. 84) demonstra que no processo de brincadeira a atividade principal da criança é a sua relação com os objetos:

Peço a kiriusha: Mostre-me outro Aimedói”, (bonecos que representam o doutor Aimedói), aponta o primeiro. “Mostre-me o outro”, procura e me mostra o primeiro. “Esse é um, onde está o outro?”, procura com os olhos. Dirige o olhar para o segundo, mas não o reconhece. Deixe-o em paz. Kiriusha engatinha, senta e, de reprente, começa a sorrir e a mostrar o segundo Aimedói. Agora o boneco está com o pé para ele; reconhece-o, lembra de meu pedido e aponta. Pergunto de novo: “onde está o outro Aimedói?”, Kirill procura e encontra o segundo que, agora está de cabeça virada para ele, aponta-o com o dedo. Aponta o primeiro, depois o segundo e outra vez o primeiro. Mostra-se satisfeito. (Do diário de V. S. Mukhina) (MUKHINA, 1995MUKHINA; Valeria. Psicologia da Idade Pré-Escolar. Tradução de Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 1995. (Psicologia e Pedagogia). , p. 87).

Assim, tanto a brincadeira quanto os objetos e a relação emocional com a mãe (ou adulto que cuida da criança) são atividades principais de desenvolvimento psíquico da criança de 0 a 3 anos, dependendo dos tipos de atividades mediadoras a que ela tem acesso.

O jogo de papéis diferencia-se das brincadeiras porque ele sempre pressupõe a comunicação com o outro, a imaginação, a consciência e atividade voluntária em direção à atividade volitiva. O jogo, necessário na escola, que pode desenvolver as funções psíquicas superiores especiais da criança, não é apenas individual, mas, principalmente, grupal, coletivo. A criança precisará do outro para poder realizar o objetivo que o jogo concerne: gerar aprendizagens e desenvolvimento psíquico.

Na pré-escola - denominada por Mukhina (1995MUKHINA; Valeria. Psicologia da Idade Pré-Escolar. Tradução de Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 1995. (Psicologia e Pedagogia). ) dos 3 aos 7 anos e, no Brasil, de 4 a 5 anos e 11 meses -, a atividade principal da criança é o jogo de papéis ou jogo protagonizado (ELKONIN, 1987ELKONIN, Daniil B. Problemas Psicológicos del Juego em la Edad Preescolar. In: DAVÍDOV, V.; SHUARE, M. (Orgs.). La Psicologia Evolutiva y Pedagogica en la URSS. Antología. Tradução de Marta Shuare. Moscou: Editorial Progreso, 1987., 1998). Ressaltamos que utilizaremos o termo “jogo de papéis” por considerarmos que, nesse tipo de jogo, a criança assume personagens, conscientemente escolhidos por ela, em situações coletivas, ou seja, dentro de um tema de jogo escolhido por todos os participantes, em que cada personagem tem sua importância no desenrolar do jogo e, ainda, todos os participantes entram em relação intrínseca, não devendo ser incentivado que haja um protagonista, como acontece em dramatizações, peças teatrais e outras atuações do gênero. Apesar de que, no sistema capitalista, cada vez mais o individualismo esteja em evidência em diferentes situações sociais, a escola, ao utilizar o jogo de papéis para o desenvolvimento psíquico dos alunos, precisará contrapor-se a essa tendência, priorizando ações solidárias e coletivas das crianças ao vivenciarem seus personagens.

Uma característica importante do jogo é que a diversidade de temas sobre a realidade se converte em argumento do jogo, ou seja: cenas da vida familiar, de profissões, de trabalho individual e coletivo etc. “Quanto mais ampla for a realidade que as crianças conhecem, tanto mais amplos e variados serão os argumentos de seus jogos” (MUKHINA, 1995MUKHINA; Valeria. Psicologia da Idade Pré-Escolar. Tradução de Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 1995. (Psicologia e Pedagogia). , p. 157). Por sua vez, as vivências das crianças não apenas diversificam os argumentos dos jogos de papéis, mas, também, a duração deles. “Com o aumento da variedade de argumentos incrementa-se a duração dos jogos. Os jogos das crianças de 3 a 4 anos duram 10 ou 15 minutos; os jogos das crianças de 4 a 5 anos duram 40 a 50 minutos; e as de 6 a 7 prorrogam o jogo por horas e até dias” (MUKHINAMUKHINA; Valeria. Psicologia da Idade Pré-Escolar. Tradução de Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 1995. (Psicologia e Pedagogia). , 1995, p. 157). Todavia, a caracterização do jogo de papéis não é suficiente apenas por seu argumento. Outro aspecto fundamental que o complementa é o seu conteúdo: “O conteúdo do jogo é o que a criança destaca como aspecto principal nas atividades do adulto” (MUKHINAMUKHINA; Valeria. Psicologia da Idade Pré-Escolar. Tradução de Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 1995. (Psicologia e Pedagogia). , 1995, p. 157, grifo da autora). Assim, um único tema pode ter conteúdos distintos, mas o foco principal são as relações humanas.

Yadeshko e Sojin (1990YADESHKO, Valery Iosifovich; SOJIN, F. A. Pedagogía Preescolar. Tradução de Raquel Peña e Elvira Polanco. Havana: Editorial Pueblo Y Educación , 1990., p. 312) também discutem que no jogo são importantes o argumento e o conteúdo: “El argumento del juego determina el desarollo, la variedad e interrelación de las acciones lúdicras, las inter-relaciones de los niños. El contenido del juego lo hace atractivo, despierta el interés y el deseo de jugar.” Da mesma maneira, Mujina, Cherkes-Zade e Rechetnikov (1981MUJINA, Traviata K.; CHERKES-ZADE, Nadieshda; RECHETNIKOV, Vasili. Conferencias sobre Psicología Pedagógica. 2. ed. Havana: Editorial de Libros para la Educación, 1981. , p. 117) afirmam que “el juego tiene carácter-coletivo.” Além disso, as crianças organizam o espaço para o jogo, conforme suas próprias decisões, baseadas na realidade.

Yadeshko e Sojin (1990YADESHKO, Valery Iosifovich; SOJIN, F. A. Pedagogía Preescolar. Tradução de Raquel Peña e Elvira Polanco. Havana: Editorial Pueblo Y Educación , 1990., p. 312) explicam a importância da comunicação oral no jogo de papéis para o desenvolvimento das crianças, pois, no processo de intercâmbio de ideias e vivências, elas estabelecem o conteúdo do jogo: “El acuerdo verbal en el juego, establece una función organizativa, contribuye al desarrollo y fortalecimiento de las interrelaciones y de la amistad entre los niños, así como su relación con unos u otros hechos y fenómenos de la vida circundante.”

Apesar de todos esses importantes aspectos do jogo de papéis, Vygotski (2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. , p. 171) evidencia outro que, a priori, se contrapõe ao que estamos destacando no jogo: o fato de nem sempre ele ser prazeroso para a criança:

La definición del juego como una actividad placentera para el niño resulta inadecuada por dos razones. Primero, porque existen muchas atividades que proporcionan al pequeno mayores experiências de placer que el juego, por ejemplo, el succionar um chupete aunque ello no lo sacie. Segundo, porque hay juegos en los que la actividad no es placentera em sí misma, por ejemplo, juegos que unicamente producen placer si el niño encuentra interesante el resultado; esto suelen predominar al final de la edad prescolar y al principio, de la etapa escolar. Los juegos desportivos (no solamente los deportes atléticos, sino también otros juegos en los que uno puede ganhar o perder) a menudo van acompanhados de disgusto si el resultado es desfavorable para el niño (VYGOTSKI, 2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. , p. 171).

O jogo tem, no entanto, outros aspectos contraditórios importantes que o formam, os quais o próprio Vygotski (2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. ) nos explica. O primeiro deles é que, ao mesmo tempo que o jogo pode não ser prazeroso, ele fornece à criança a possibilidade de satisfazer seus desejos e necessidades quando joga, por intermédio da imaginação. VygotskiVYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. (2006, p. 172) explica seu ponto de vista:

Por mi parte, estoy convencido de que si las necesidades que no pudieron realizarse inmediatamente en su tiempo no surgieran durante los años escolares, no existiría el juego, ya que este parece emerger en el momento en que el niño comienza a experimentar tendencias irrealizables. [...] Para resolver esta tensión, el niño en edad prescolar entra en un mundo ilusório e imaginario, en el que aquellos deseos irrealizables encuentran cabida:este mundo es lo que llamamos juego (VYGOTSKI, 2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. , p. 172, grifo do autor).

Outro ponto contraditório é que, apesar da característica de imaginação possuir elementos simbólicos, Vygotski (2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. ) adverte que o jogo não é exatamente uma ação simbólica porque senão poderia ser comparado à álgebra, mas há um elemento diferente que une a imaginação e os elementos simbólicos que tem papel fundamental no jogo: a motivação.

Quando Vygotski (2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. , p. 174) afirma que “Podríamos ir incluso más lejos y assegurar que no existe juego sin reglas. La situación imaginaria de cualquier tipo de juego contiene ya en sí ciertas reglas de conducta, aunque estas no se formulen explicitamente ni por adelantado”, está se referindo ao jogo de papéis, principalmente, mas, também, à brincadeira de crianças na primeira infância, cuja atividade principal é a sua relação com os objetos, especificamente na 3ª fase (MUKHINA, 1995MUKHINA; Valeria. Psicologia da Idade Pré-Escolar. Tradução de Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 1995. (Psicologia e Pedagogia). , p. 109), a última da atividade objetal, em que a criança utiliza os objetos, “livremente”, para satisfação de sua imaginação, mas consciente de suas funções na sociedade.

Outro aspecto que não é diferenciado, aparentemente, no jogo/brincadeira, nos livros traduzidos do russo, são as características dos jogos, que, apenas por intermédio do aprofundamento da Teoria Histórico-Cultural nesta unidade de análise, tivemos condições de identificar.

Há semelhanças entre jogo e brincadeira no que concerne às características de argumento e conteúdo de ambos. Assim, tanto a brincadeira como o jogo possuem essa mesma característica de argumento, relacionada aos temas e aos conteúdos, que diz respeito aos aspectos destacados dos temas pelas crianças. Contudo, na primeira infância, as crianças utilizam-se dos objetos para reproduzir as ações dos adultos. Se retomarmos o exemplo da brincadeira de “casinha” nesse período, o conteúdo principal deste tema estará relacionado aos objetos utilizados, principalmente, pela mãe, em suas atividades diárias em casa. “Ao brincar de comer, as crianças dessa idade cortam o pão, cozinham a sopa, reproduzindo várias vezes a mesma ação. Mas não põem o pão na mesa nem servem a sopa. Nessa idade, o conteúdo dos jogos (brincadeira) se reduz exclusivamente a ações com objetos.” (MUKHINA, 1995MUKHINA; Valeria. Psicologia da Idade Pré-Escolar. Tradução de Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 1995. (Psicologia e Pedagogia). , p. 157).

Quando a autora se refere às ações de “servir a sopa e colocar o pão na mesa” está apontando para um tipo de desenvolvimento psíquico no qual a criança já consegue entender as relações entre as pessoas e suas ações. Assim, se com a criança pequena a brincadeira se limita a cortar o pão, fazer o bolo na areia, misturar os ingredientes, conforme ela vai ampliando suas vivências, ao mesmo tempo, ela começa a extrair outros conteúdos que se tornam mais importantes, no mesmo tema. Servir o bolo, a sopa, o pão, portanto, indica-nos que a criança já teve a percepção de que a ação da mãe, do pai ou de quem ela está representando, envolve o outro. Assim, na Educação Infantil, há diferença entre a brincadeira da criança menor de imitação do adulto e o jogo de papéis das crianças maiores, no qual elas assumem o papel do adulto.

Quando a criança está na primeira infância, ela imita o papel de mamãe da forma como ela a percebe. Por isso, na brincadeira de casinha, a “filhinha” pode ter mais de uma mãe e um único pai ou somente várias mães, dependendo das necessidades das crianças que estarão naquela brincadeira em relação às escolhas dos objetos para fazerem a imitação do adulto. No jogo de papéis, a situação é outra, porque a criança, ao representar o papel de mãe, não se baseia apenas em sua própria mãe, mas em qual é a relação da mãe com os outros integrantes do jogo, que não são necessariamente apenas seus filhos. O conceito de mãe é mais amplo e pode expandir-se mais com a mediação da professora.

Assim, jogo e brincadeira têm diferenças e consequências muito importantes para o desenvolvimento das funções psíquicas superiores especiais das crianças e suas aprendizagens. Ressaltamos, porém, que não se trata apenas da diferenciação entre ambos para contrapô-los nas práticas pedagógicas de forma mecânica e acrítica - por exemplo, a brincadeira é relacionada à criança de Educação Infantil, e o jogo, às demais crianças e jovens. De forma alguma sugerimos essa polarização, pelo contrário. A partir da fundamentação da Teoria Histórico-Cultural, essa diferenciação entre ambos os conceitos torna claro que eles são fundamentais na educação escolar, especialmente na Educação Infantil, e que, por isso, é preciso compreender o papel de cada um deles nas aprendizagens das crianças, ou seja, suas funções e consequências.

O papel da distinção entre jogo e brincadeira na Educação Infantil.

Ao mesmo tempo que discutimos a função e necessidade de diferenciação entre jogo e brincadeira nas práticas pedagógicas em Educação Infantil, também reafirmamos a indissociabilidade entre eles, nesta última unidade de análise. Entretanto, sob a concepção de jogo/brincadeira advinda da Teoria Histórico-Cultural, qual seria o papel das brincadeiras para bebês e crianças da primeira infância, bem como do jogo de papéis para crianças da pré-escola, na Educação Infantil?

Para responder a essa pergunta, precisaremos retornar ao conceito de situação social do desenvolvimento de Vygotski (1994, apud BOZHOVICH, 1981BOZHOVICH, Lídia Ilinitchna. La Personalidad y su Formación en la Edad Infantil. Havana: Editorial Pueblo y Educación, 1981. , p. 122), que depende do tipo de vivências do indivíduo no meio social e de como ele se apropria dos conhecimentos nessas vivências. Portanto, como já dissemos, uma mesma situação de relação social pode ter diferentes significados para duas pessoas, e reside aí a importância do papel da professora com relação ao diagnótisco dessa influência do meio social nas aprendizagens e no desenvolvimento infantil, bem como à seleção, organização e implementação de mediadores potentes que possam atender às necessidades culturais das crianças.

Vygotski (2005VYGOTSKI, Liev S. Psicología Pedagógica. Buenos Aires: Aique Grupo Editor, 2005. p. 114) afirma que “el critério psicológico exige reconocer que en el processo educativo la experiencia personal del alumno no es todo. La educación debe estar organizada de tal modo que no se eduque al alumno, sino que éste se eduque así mismo.” Nessa passagem, o autor não está se referindo a deixar a criança aprender sozinha, porque, senão, não haveria necessidade de dois conceitos fundamentais de sua teoria para a educação: a atividade mediada e a zona de desenvolvimento proximal. Ao contrário, ele está se contrapondo à educação escolar europeia da época (que não se diferencia, totalmente, dos dias atuais) de redução das aprendizagens escolares à assimilação passiva dos conhecimentos científicos pelos alunos, na qual tal situação pode não desencadear desenvolvimento. Assim, o autor explica que o ambiente social é a alavanca dos processos de ensino e de aprendizagem e que o papel dos professores consiste em como manejar essa alavanca (VYGOTSKI, 2005VYGOTSKI, Liev S. Psicología Pedagógica. Buenos Aires: Aique Grupo Editor, 2005.). Direcionar exageradamente as atividades das crianças, assim como deixá-las totalmente livres e sem direção, são duas formas inadequadas de exercer o manejo dessa alavanca de aprendizagens das crianças e que não contribuem para o desenvolvimento das funções psíquicas superiores especiais em níveis aprofundados de consciência, que podem levar as pessoas a autocontrolarem seu comportamento, a se autoeducarem em um futuro bem próximo.

Vygotski (1994) defende a necessidade de reiterar o papel que o meio social exerce no desenvolvimento das crianças, como medida relativa e não absoluta. Ele explica que a influência do meio varia de acordo com a idade das crianças; isso quer dizer, por exemplo, o modo como as pessoas se expressam quando estão com as crianças. Tal influência não está relacionada somente ao diálogo em si, mas também ao modo como a criança se relaciona com essa experiência. Por exemplo: os tipos de palavras, quantidade de vocabulários etc. podem ser os mesmos para todas as crianças em diferentes momentos de seu desenvolvimento (bebês, primeira infância...); entretanto, a qualidade do papel dessas expressões no desenvolvimento das crianças depende de como a própria criança se relaciona com elas nesses momentos de interrelações, de quais associações elas estão fazendo ao ouvir essas palavras.

Assim, manejar, adequadamente, a alavanca significa que, à medida que a professora identifica como a criança está se relacionando com o meio social, ela também desenvolve conhecimentos de como modificar esse meio em função das necessidades do tipo culturais de aprendizagens de cada criança, de forma que ela possa instrumentalizar cada uma a aprender a assimilar, conscientemente, com sentido para ela e para os outros, os conhecimentos científicos.

Nessa perspectiva, o objetivo final da educação escolar não está relacionado apenas à apropriação dos conteúdos escolares. A apropriação dos conhecimentos científicos produzidos pela humanidade, que geralmente está nas funções da escola, vai além dos conteúdos dos currículos escolares. Envolve a transformação dos seres humanos, a educação da habilidade de se autocontrolar e se educar, por intermédio de atividades e ações volitivas, a partir do desenvolvimento das funções psíquicas superiores especiais.

Na Educação Infantil, especialmente com crianças de 0 a 3 anos, a brincadeira assume papel importante porque, por meio dela, a professora poderá conhecer a “situação social de desenvolvimento” de cada criança, suas necessidades de aprendizagens e como modificar o meio social escolar para que cada criança possa aprender e se desenvolver.

Nessa direção, a periodização do desenvolvimento infantil realizada por Mukhina (1995MUKHINA; Valeria. Psicologia da Idade Pré-Escolar. Tradução de Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 1995. (Psicologia e Pedagogia). ) auxilia-nos a identificar o papel e a função da brincadeira e do jogo de papéis, bem como a diferença entre esses papéis para a aprendizagem das crianças.

A brincadeira assume diferentes funções/papéis, dependendo da atividade principal da criança. Para os bebês, a atividade principal é a relação emocional com o adulto que cuida deles, portanto, as brincadeiras com o corpo da mãe, do pai, do próprio corpo, são fundamentais para que eles progridam no desenvolvimento psíquico, nas relações sociais, ao mesmo tempo que se desenvolvem biologicamente e vão se apropriando da cultura humana.

Na primeira infância (1 a 3 anos, aproximadamente), as crianças desenvolvem-se, principalmente, por meio das brincadeiras focalizadas - a atividade principal é a atividade objetal -, as quais precisam ser mediadas pela professora para que elas aprendam os conceitos e as funções dos objetos que as rodeiam, ao mesmo tempo que vão compreendo as relações humanas e desenvolvendo qualidades psíquicas que não surgirão sem os processos de ensino e de aprendizagem sistematizados. Assim, o papel fundamental da brincadeira com objetos é exercer a função desencadeadora do desenvolvimento psíquico de bebês, no primeiro ano de vida e na primeira infância na escola. Dessa forma, o termo brincadeira amplia-se e integra-se nas duas atividades principais de 0 a 3 anos - relação emocional com o adulto e atividade objetal -, transformando-se, também, como atividade principal, que, por apresentar aspecto lúdico, se torna desencadeadora e geradora do motivo, do sentido e do significado das atividades da criança. A partir disso, o termo brincadeira no Brasil precisa deixar de ser traduzido dos textos russos como a atividade principal das crianças pré-escolares (4 a 6 anos), para então focalizar as crianças de 0 a 3 anos.

O jogo, especialmente o jogo de papéis, assume a atividade principal de crianças pré-escolares (no Brasil, crianças de 3 a 5 anos e 11 meses), correspondendo exatamente aos textos russos.

Isso não quer dizer, de forma alguma, que estamos modificando a Teoria Histórico-Cultural sobre o jogo como atividade principal das crianças. Pelo contrário, estamos reafirmando, por intermédio da discussão e análise das unidades que integram o nosso objeto de estudo, que a falta de diferenciação entre os termos brincadeira e jogo, no Brasil, causou muitos prejuízos à compreensão da importância do que a Teoria Histórico-Cultural denomina de jogo, bem como de ambos os termos para as práticas pedagógicas, gerando consequências, como a utilização das brincadeiras de forma pouco mediada e a desconsideração do jogo de papéis em todas as suas etapas: o objeto, a ação, a palavra (simbolismo), regras do jogo, conforme Elkonin (1998ELKONIN, Daniil B. Psicologia do Jogo. Tradução de Álvaro Cabral. São Paulo: Martins Fontes, 1998.), confundindo-o com dramatização decorada de textos prontos em festas de formatura no final da pré-escola.

Em contrapartida, a brincadeira como conteúdo principal de 0 a 3 anos ressalta sua importância como via auxiliar das professoras para a identificação de que a aparente limitação da criança revela sua dependência do conhecimento da professora sobre as suas necessidades em desenvolver novas aprendizagens; sobre a necessidade de mudança dos diferentes ambientes de forma que supere as limitações relacionadas principalmente a “la fusión de los impulsos y la percepción. [...] Toda percepción es un estímulo para la actividad.” (VYGOTSKI, 2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. , p. 176).

Então, se as professoras apenas dispõem brinquedos e objetos para as crianças manipularem “livremente”, mas não proporcionam brincadeiras com eles que tenham objetivos de ampliar a percepção das crianças, por intermédio da linguagem oral, da aquisição de conceitos, do movimento da criança nos espaços com os objetos etc., então essas crianças estão fadadas a permanecerem apenas no limiar do desenvolvimento da percepção. As professoras precisam saber utilizar a característica perceptiva das crianças de 0 a 3 anos, que é a atividade delas no momento, para motivá-las a realizar atividades motoras, atividades musicais, atividades manipulatórias etc. Por exemplo: para que o bebê possa aprender a engatinhar, é preciso que o ambiente em que ele esteja lhe dê segurança e motivação para desafiar-se a sair do conforto da posição sentada. Novoselova (1987NOVOSELOVA, Svetlana L. El desarrollo del pensamento en la edad temprana. 1ª Reimpressão. Tradução de Elsa Skrypiel. Havana: Editorial Pueblo Y Educación, 1987. ) relaciona o desenvolvimento qualitativo do pensamento visual de bebês às atividades de manipulação com os objetos.

Zaporózhets (1987) apresenta outro tipo de desenvolvimento relacionado à atividade objetal, que é a formação de novos movimentos que evoluem para o domínio consciente do novo movimento.

Assim, o papel da brincadeira no período de 0 a 3 anos vai se complexificando mediante as necessidades do tipo culturais de aprendizagens das crianças. Por intermédio das mediações da professora no meio social escolar, com base na situação social de desenvolvimento individual e coletivo, as crianças transitam das atividades involuntárias para as voluntárias, que serão as bases para o desenvolvimento de atividades volitivas, conforme, também, as brincadeiras evoluem para os jogos dos papéis.

Se invertermos o vetor que normalmente qualifica o brincar como meio de aprendizagem das crianças, veremos que a brincadeira não é o meio de aprendizagem das crianças, mas a própria fonte e essência de conhecimento e desenvolvimento para as crianças. Em contrapartida, para a professora, a brincadeira é o meio de conhecimento de cada criança (situação social de desenvolvimento) e de proporcionar formas diferentes de aprendizagens para todas as crianças - não ao mesmo tempo e nem nas mesmas atividades, mas à medida que a professora vai se apropriando do modo de cada criança brincar e de lhe mostrar que está aprendendo e se desenvolvendo.

O papel social que a criança desenvolve durante o jogo de papéis é a estrutura e o centro do jogo, porque a criança não apenas representa o papel, mas transforma-se nele, vive a personagem, acredita que é verdadeira e, ainda, retira o essencial da personagem para que possa representá-la. Yadeshko e Sojin (1983, p. 313) exemplificam a situação do jogo de papéis: “Cuando por ejemplo, representa al capitán de una nave, no refleja toda su actividad, sino solamente aquellos rasgos que son necessários al desarrollo del juego: el capitán da una orden, mira por los binoculares, se preocupa por los pasajeros y por los marineros.”

É importante as crianças estabelecerem as regras, no início, com a colaboração da professora. À medida que vão compreendendo e ficando mais autônomas, a colaboração da professora tende a se esvanecer no processo de jogo, dependendo, também, do grau de vivência delas nos jogos de papéis. As crianças de 4 anos, por exemplo, precisarão de mais ajuda da professora que as crianças de 5, 6, 7 anos em diante, que poderão fazê-lo sem nenhuma ajuda específica da professora, à medida que vão jogando. Por fim, esse é o objetivo essencial dos jogos de papéis: que a criança, ao vivenciar os papéis sociais, possa aprender a autocontrolar seu comportamento nas vivências coletivas e, também, individualmente.

É nos jogos de papéis, ao contrário da brincadeira, que a criança tem infinitas possibilidades de criar, imaginar, de ser o que ela não pode ser na vida real. Nele, as regras estão determinadas pelas ideias, então, é a ação que se subordinará às regras e não aos objetos em si. Isso representa um salto enorme no desenvolvimento da criança, no que diz respeito à sua relação com as situações que vivencia, uma vez que deve renunciar aos seus desejos, impulsos, e se submeter às regras. (VYGOTSKI, 2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. ).

O jogo está relacionado à imaginação e ao desempenho de papéis conscientemente escolhidos por quem joga, por isso ele é a atividade principal das crianças a partir dos 4 anos de idade, aproximadamente, porque estas já têm um repertório conceitual mais amplo, necessário ao desenvolvimento dos motivos, do sentido e do significado em participar da atividade de jogo.

Entendemos que as divisões por idade não são rígidas, mas flexíveis, porque elas dependem do tipo de mediação e mediadores na atividade de brincadeira e de jogos de papéis das crianças. Assim, as crianças de 3 anos podem começar a desempenhar a atividade inicial de jogos de papéis em situações mais simples e com mais mediações das professoras em sua zona de desenvolvimento proximal, o que, também, pode desencadear, mais rapidamente, o desenvolvimento da habilidade de relação coletiva no jogo de papéis.

Assim, situações de jogo auxiliam a criança a controlar sua impulsividade, a partir das regras, ao mesmo tempo que ela satisfaz seus desejos por intermédio das atividades de experimentar, explorar, interpretar, imaginar, decidir, tentar etc. Dessa forma, o jogo assume importância no desenvolvimento psíquico da criança no que diz respeito, também, ao desenvolvimento da relação entre as ações internas e externas que integram os motivos presentes na atividade de jogar em direção, ainda, ao desenvolvimento da atividade voluntária na criança.

Se, por intermédio da brincadeira, a criança demonstra seu desenvolvimento psíquico ao separar o significado do objeto real em uma relação de transição da atividade involuntária à atividade voluntária, por meio do jogo de papéis as ações da criança também evoluem da ação-significado para significado-ação, segundo Vygotski (2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. , p. 181, grifo nosso). Por exemplo: quando a criança bate os pés no chão ou movimenta os braços, levemente dobrados, para cima e para baixo, para representar nos jogos de papéis que está montada a cavalo e segurando as rédeas, já demonstra ter se apropriado do significado da ação que quer representar.

Mujina, Cherkes-Zade e Rechetnikov (1981MUJINA, Traviata K.; CHERKES-ZADE, Nadieshda; RECHETNIKOV, Vasili. Conferencias sobre Psicología Pedagógica. 2. ed. Havana: Editorial de Libros para la Educación, 1981. , p. 117) afirmam que no jogo todos os participantes se relacionam e têm espaços para colocarem suas opiniões, impressões, fantasias, ao mesmo tempo que o papel assumido por cada um envolve um comportamento, uma regra. Assim, no jogo “se aportan condiciones para desarrollar sentimentos colectivistas, solo en el juego se pone manifiesto el principio del humanismo infantil: “todos para uno y uno para todos.”

Contudo, a criança, quando entra nos jogos de papéis, não está se comportando de modo estritamente simbólico, imaginário, mas está baseando-se nas suas experiências já adquiridas. Em sua pouca vivência, ela produz desejos que são realizados no momento em que ela está representando os papéis, ao mesmo tempo que seus conhecimentos sobre tais vivências são ampliados nas relações com os outros integrantes do jogo. Assim, ela vai se desenvolvendo em direção às ações volitivas, por meio da atividade voluntária, inicial, dos jogos de papéis. As ações externas e internas são inseparáveis (VYGOTSKI, 2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. ).

O adolescente, ao aprender a organizar-se e controlar-se nas atividades diárias, pode potencializar o desenvolvimento da atenção voluntária e da atividade volitiva frente aos desafios que encontra, não necessitando de controles externos a ele. Daí a importância do trabalho com jogos de papéis na Educação Infantil. Promover a atividade volitiva ao longo do desenvolvimento humano, desde a infância, significa apropriar-se da consciência de liberdade de ação e responsabilizar-se por seus atos (PETROVSKY, 1980).

Para Vygotski (2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. ), o jogo não é próprio e predominante na infância e nem sua característica principal, mas, sim, o fator primordial do desenvolvimento da criança pela qualidade das transformações internas que ele desencadeia no psiquismo humano ao criar zonas de desenvolvimento proximal das aprendizagens das crianças. Assim, a função dos jogos de papéis na educação escolar é proporcionar que a criança desenvolva o pensamento conceitual teórico sobre as relações sociais que vivencia no cotidiano em direção à autonomia intelectual, sempre com a mediação necessária da professora.

Vygotski (2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. , p. 183) expressa claramente o papel do jogo nos processos de ensino e de aprendizagens para crianças de 4 a 6 anos na Educação Infantil: “La acción en la esfera imaginativa, en una situación imaginaria, la creación de propósitos voluntários y la formación de planes de vida reales e impulsos volitivos aparecen a lo largo del juego, haciendo de él el punto más elevado del desarrollo prescolar.” (VYGOTSKI, 2006VYGOTSKI, Liev. El papel del juego en el desarrollo del niño. In: IZNAGA, Ana Luisa Segarte; CAMPOS, C. Fraciela Martínez; PÉREZ, María Emilia Rodríguez (Orgs.). Psicología del Desarrollo del Escolar. Selección de Lecturas. Tomo I. 1ª Reimpressão. Havana: Editorial Félix Varela, 2006. , p. 183).

Assim, a hipótese que levantamos no início desta pesquisa se confirma, pois, apesar de as atividades de brincadeira e de jogo serem fundamentais para o desenvolvimento psíquico das crianças da Educação Infantil, elas são diferentes e, também, têm papéis e funções diferentes nos processos de ensino e de aprendizagens nessa etapa de Educação Básica. Do mesmo modo, respondemos à questão de pesquisa de que brincadeira e jogo não são sinônimos se levarmos em consideração o papel de cada um deles no desenvolvimento das crianças.

Em contraposição à forma como conteúdos escolares são inseridos nas escolas de Educação Infantil, mediante processos de ensino e de aprendizagens das crianças, de maneira muito similar aos conteúdos do Ensino Fundamental, mesmo que por intermédio da brincadeira, esta pesquisa demonstrou que a brincadeira não é um meio de aprendizagem da criança, mas o próprio processo de aprendizagem e desenvolvimento psíquico das crianças de 0 a 3 anos. Entretanto, devemos enfatizar não apenas a brincadeira, mas também o jogo de papéis com função fundamental para o avanço do pensamento das crianças de 3 a 6 anos, em direção ao pensamento teórico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa confirmou que as atividades nessa etapa de Educação Básica precisam ser sistematizadas, programadas com intencionalidade, a partir de um currículo que integre as atividades de brincadeira para crianças de 0 a 3 anos e as atividades de jogo de papéis para as crianças de 3 a 6 anos, de forma que ela cumpra a função para a qual lutamos por sua integração à Educação Básica, ou seja, deixar de ser apenas assistência à criança para ser, principalmente, educação.

Nessa perspectiva, a brincadeira e o jogo de papéis têm função priomordial nos processos de ensino e de aprendizagem, e nossa pesquisa envolveu a diferenciação entre eles, evidenciando os critérios para o momento de as professoras utilizarem brincadeiras ou jogos na Educação Infantil com base na identificação dos motivos, das necessidades e das especificidades das crianças.

Nossa proposta, com base nos resultados da pesquisa, é a de que a brincadeira seja a atividade principal das crianças de 0 a 3 anos, juntamente com a atividade objetal e relação emocional com o adulto, e, portanto, elas não podem ser realizadas na escola sem nenhuma intervenção da professora.

O desenvolvimento da autonomia na Educação Infantil geralmente é confundido nas práticas pedagógicas por deixar a criança fazer a atividade sozinha ou fazer aquilo de que mais gosta. Entretanto, a apropriação da autonomia pela criança exige a passagem das atividades involuntárias para as voluntárias, como desenvolvimento dessa função psíquica superior. A brincadeira e o jogo de papéis são peças-chave para a transição entre uma e outra atividade. O desenvolvimento de ambas as atividades na criança deve transformar-se em atividades volitivas, que significam a liberdade de pensamento e ação, com responsabilidade e consciência, ou seja, a apropriação da autonomia.

Outro aspecto importante que os resultados revelaram se refere à fonte dos conteúdos a serem trabalhados na Educação Infantil, ou seja, as necessidades culturais de aprendizagens das crianças, que podem ser diagnosticadas por intermédio de seus sentimentos, suas emoções, suas percepções, experimentações e vivências sociais. E, ainda, que tais necessidades culturais de aprendizagem se relacionam com o conceito de situação social de desenvolvimento, ou seja, a forma como cada um de nós se apropria dos conhecimentos vivenciados. Então, a brincadeira e o jogo como atividades principais na Educação Infantil são fundamentais para a identificação pela professora da situação social das crianças e, também, são conteúdos importantes para o desenvolvimento cultural de todas as crianças.

Assim, esta pesquisa contribuiu para preencher a lacuna teórica que havia no Brasil, a respeito do entendimento da Teoria Histórico-Cultural sobre o papel dos jogos na educação de crianças, confundindo nas práticas e nas pesquisas acadêmicas a relação deles com a brincadeira.

Para futuras pesquisas, será importante investigar a objetivação desses conceitos nas práticas pedagógicas, aprofundando a distinção entre eles, a partir das aprendizagens e do desenvolvimento das funções psíquicas superiores das crianças da Educação Infantil.

Preprint

DOI: https://preprints.scielo.org/index.php/scielo/preprint/view/2803

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  • 3
    Para maiores informações, ver estudo realizado pelo Laboratório de Pesquisa em oportunidades educacionais - LaPopE - UFRJ: https://www.educacaoecovid.org/.
  • 5
    Quando nos referirmos à Teoria Histórico-Cultural baseada em autores russos, utilizaremos o binômio “Jogo/brincadeira”, como são traduzidos para a língua portuguesa, apesar de considerarmos que não sejam sinônimos no Brasil.
  • 5
    Todos esses autores citados, em seus textos originais, reportam-se à palavra jogo, e não, por exemplo, à brincadeira, diferenciando vários tipos de jogos.
  • 2
    La decisión de mantener la palabrabrincadeiraen Portugués es porque en español los términos JOGO y BRINCADEIRA son traducidos por JUEGO y no indican la diferencia relevante para el texto ya que el objetivo de la investigación era exactamente apuntar las diferencias entendidas por los dos en el contexto brasileño. (A decisão de manter a palavrabrincadeiraem Português é porque, no espanhol, os termos JOGO e BRINCADEIRA são traduzidos por JUEGO e não indicam a diferença relevante para o texto, já que o objetivo da pesquisa foi exatamente apontar as diferenças assumidas por eles no contexto brasileiro).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    06 Out 2021
  • Aceito
    28 Mar 2022
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