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ENSINO HÍBRIDO NA UNIVERSIDADE E O LUGAR DE ENUNCIAÇÃO DO PROFESSOR NA FORMAÇÃO ACADÊMICO-PROFISSIONAL 1 1 Editora-Chefe participante do processo de avaliação por pares aberta: Suzana dos Santos Gomes

LA ENSEÑANZA HÍBRIDA EN LA UNIVERSIDAD Y EL LUGAR DE ENUNCIACIAÓN DEL PROFESOR EN LA FORMACIÓN ACADÉMICA-PROFESIONAL

RESUMO:

O crescimento do mercado da formação universitária no ensino superior privado tornou-se um grande negócio lucrativo, a ponto de ignorar o critério da qualidade da formação. Neste artigo refletimos sobre as contradições que dizem respeito à implementação do ensino híbrido, em que atividades virtuais e parcialmente presenciais são conciliadas, mas adotadas estrategicamente seguindo o apetite de gozo do mercado. A partir do caso Moara, sob às coordenadas dos estudos de psicanálise, educação e formação docente, examinamos como o uso do ensino mediado pelas tecnologias precariza e pode prescindir-se do professor, ao passo que, ao objetificá-lo, expropria-o de seu lugar de enunciação. A incidência do discurso tecnológico na formação acadêmico-profissional, como desdobramento do discurso capitalista, cria enunciados que se tornam suporte discursivo e significantes mestres por meio dos quais o docente pode não somente alienar-se, mas também satisfazer-se. Veremos a que preço.

Palavras-chave:
Ensino Superior Privado; Professor; Discurso Tecnológico; Discurso Capitalista; Psicanálise

RESUMEN:

El crecimiento del mercado de la formación universitaria, en la enseñanza superior privada, se tornó un gran negocio lucrativo, a tal punto de ignorar el criterio de la calidad de la formación. En este artículo reflexionamos sobre las contradicciones que aparecen respecto a la implementación de la enseñanza híbrida, en la que las actividades virtuales y parcialmente presenciales son conciliadas, aunque adoptadas estratégicamente siguiendo el apetito de goce del mercado. A partir del caso Moara, sobre las coordenadas de los estudios de psicoanálisis, educación y formación docente, examinamos como el uso de la enseñanza mediada por las tecnologías precariza y puede prescindir del profesor, al paso que, al objetalizarlo, se expropiaría de su lugar de enunciación. La incidencia del discurso tecnológico en la formación académica-profesional, como desdoblado del discurso capitalista, crea enunciados que se tornan soporte discursivo y significantes universitarios mestres por medio de los cuales el docente puede no solamente alienarse, mas también satisfacerse. Veremos a qué precio.

Palabras clave:
Enseñanza Superior Privado; Profesor; Discurso Tecnológico; Discurso Capitalista; Psicoanálisis

ABSTRACT:

The growth of the university formation market, in private higher education, has become a big profitable business, to the point of ignoring the criterion of quality of training. In this article, we reflect on the contradictions regarding the implementation of hybrid education, in which virtual and partially face-to-face activities are reconciled, but strategically adopted following the market's appetite for jouissance. Based on the Moara case, under the coordinates of psychoanalysis, education and teacher training studies, we examine how the use of teaching mediated by technologies precarizes and can do without the teacher, while, when objectify the professors, expropriates them from their enunciation place. The incidence of technological discourse in academic-professional training, as an unfolded from capitalist discourse, creates statements that become discursive support and master signifiers through which the teacher can not only alienate himself, but also be satisfied. We'll see at what price.

Keywords:
Private Higher Education; Teacher; Technological Discourse; Capitalist Discourse; Psychoanalysis

INTRODUÇÃO

Um conjunto de fenômenos sociopolíticos, institucionais e relacionais tem atuado de modo a tornar o trabalho docente precário na universidade rendida ao modus operandide uma empresa. Tais fenômenos ocorrem, especialmente, em várias instituições de ensino superior privadas juridicamente reconhecidas pelo seu caráter lucrativo, as quais vêm produzindo, ao longo dos anos, a mercantilização da formação universitária supostamente voltada para a articulação de um ensino cujo objetivo estrito é preparar os jovens para o competitivo mundo do trabalho - muito embora os estudos demonstrem que muitos recém-formados têm os seus diplomas desvalorizados (SENA, 2020SENA, Isael de Jesus. A controversa democratização do acesso ao ensino superior privado: o que dizem os professores na berlinda. Estilos da Clinica,[S. l.], v. 25, n. 3, p. 423-438, 2020. DOI: 10.11606/issn.1981-1624.v25i3p423-438. Disponível em: <Disponível em: https://www.revistas.usp.br/estic/article/view/170999 >. Acesso em: 10 ago. 2022.
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).

É consenso que a vida na universidade, em diferentes latitudes, com versões mais ou menos particulares, tornou-se, para muitos, nas últimas três décadas, um lugar de fardo e um espaço de fastio, de tédio. Nela, inclusive, prescindiu-se bastante da autoridade da palavra dos professores, ao passo que, em razão da incidência dos laços virtualizados como efeito da cultura tecnológica, observa-se um enfraquecimento da relação do estudante com a alteridade (SENA, 2020SENA, Isael de Jesus. A controversa democratização do acesso ao ensino superior privado: o que dizem os professores na berlinda. Estilos da Clinica,[S. l.], v. 25, n. 3, p. 423-438, 2020. DOI: 10.11606/issn.1981-1624.v25i3p423-438. Disponível em: <Disponível em: https://www.revistas.usp.br/estic/article/view/170999 >. Acesso em: 10 ago. 2022.
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Vale destacar que a implementação de políticas públicas educativas de caráter inclusivo, fomentadas principalmente pelos governos de esquerda (2002-2016), vem contribuindo para o processo de acesso mais democrático ao ensino superior. Sabe-se que a universidade, no Brasil, fora considerada, desde a sua fundação, uma instituição elitista. Com as recentes transformações sociopolíticas, o setor privado, com o seu apetite de gozo, passou a lucrar com toda a transformação da educação concebida como uma mercadoria (SENA, 2020SENA, Isael de Jesus. A controversa democratização do acesso ao ensino superior privado: o que dizem os professores na berlinda. Estilos da Clinica,[S. l.], v. 25, n. 3, p. 423-438, 2020. DOI: 10.11606/issn.1981-1624.v25i3p423-438. Disponível em: <Disponível em: https://www.revistas.usp.br/estic/article/view/170999 >. Acesso em: 10 ago. 2022.
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). As regras do mercado são aplicadas sem suficiente criticidade à universidade que cede às armadilhas econômicas. Como previa Lacan (1969-70/1991LACAN, Jean-Jacques. O Seminário, livro 17: O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1991. (Trabalho original proferido em 1969-1970). , p. 189): “a mais-valia se junta ao capital... estamos aí nos valores. Aliás, todos nós nadamos nisso no abençoado tempo em que vivemos”. Ainda nesse mesmo contexto, Nóvoa (2014NÓVOA, António Sampaio. Os professores na virada do milênio: do excesso dos discursos à pobreza das práticas. In. SOUZA, Denise R. T; SARTI, Flávia M. Mercado de Formação docente: constituição, funcionamento e dispositivos. Belo Horizonte: Fino Traço , 2014, p. 23-35. , p. 23) observa que

nos programas de ação política ou nos discursos reformadores, nos documentos dos “especialistas”... ou na literatura produzida pelos investigadores, reencontramos sempre as mesmas palavras, repetidas umas e outra vez, sobre a importância dos professores nos “desafios do futuro”. Ou porque lhes cabe formar os recursos humanos necessários ao desenvolvimento econômico, ou porque lhes compete formar as gerações do século XXI, ou porque devem preparar os jovens para a sociedade da informação e da globalização, ou por qualquer outra razão, os professores voltam a estar no centro das preocupações políticas e sociais.

A universidade vem passando por transformações significativas, como a alteração de sua clientela, de suas formas tradicionais de ensino e de sua própria concepção de formação acadêmica. No universo do ensino mercantilizado, observamos também que o ensino presencial concorre frente ao crescimento do ensino híbrido. Este último combina atividades on-line assíncronas com presenciais, mediadas parcialmente pelo professor, o qual tende a ocupar, muitas vezes, a mera função burocrática de facilitador. Essa condição apaga a diferença implicada no trabalho de transmissão do professor: o mestre em que se suporia o “valor de enigma”, aquele que, na transferência, segundo Lacan (1960-61/1991LACAN, Jean-Jacques. O Seminário, livro 17: O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1991. (Trabalho original proferido em 1969-1970). ), possui a “agalma”. Em outras palavras: “um representante de um ideal do eu (o conhecimento) e de um eu ideal pelas qualidades de sua pessoa” (CORDIÉ, 1998, p. 313, tradução nossa).

Ora, se supomos que a função do docente se sustenta através da transferência, como condição necessária para estabelecer a transmissão; a universidade, como guardiã do saber, deveria privilegiar a manutenção desse lugar. Porém, rendida ao discurso tecnológico, consente que o saber deixe de ser suposto ao outro e o professor se torne objeto, instrumento do conhecimento pasteurizado. Ao escutarmos docentes que atuam em instituições privadas, sobretudo, nas orientadas pela lógica do mercado2 2 No Brasil, existem diferentes modalidades de instituições educacionais privadas. Dentre elas, destacam-se de longa data as instituições filantrópicas, vinculadas geralmente a entidade religiosas, assim como as empresas limitadas e as sociedades anônimas de capital fechado e de capital aberto. Nesta discussão estamos privilegiando as instituições que atuam como empresas que têm capital aberto, e nesse sentido negociam seus títulos de propriedade na bolsa de valores. (Front, 2020). , podemos registrar os diversos desafios enfrentados por eles no cotidiano do trabalho, dentre os quais destacamos a falta de garantias de um lugar em que possam se enunciar e transmitir a própria experiência. O saber reduzido ao consumo próprio da lógica do mercado incide sobre o imaginário do aluno e do professor, cuja dimensão do enigma e do desejo se apaga frente à ideia de que o ensino equivale a um produto, uma mercadoria, em semelhança ao que está disponível em um “guichê”. Assim, o que se veicula é a promessa de uma satisfação do aluno/cliente poder gozar (SENA, 2020SENA, Isael de Jesus. A controversa democratização do acesso ao ensino superior privado: o que dizem os professores na berlinda. Estilos da Clinica,[S. l.], v. 25, n. 3, p. 423-438, 2020. DOI: 10.11606/issn.1981-1624.v25i3p423-438. Disponível em: <Disponível em: https://www.revistas.usp.br/estic/article/view/170999 >. Acesso em: 10 ago. 2022.
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), ou seja, “bastaria pedir o que se quer. Pedir, encomendar, dispor, consumir, consumar. Uma situação presidida por uma espécie pós-moderna de ‘gênio da lâmpada’. ‘O que você quer? Fornecemos’”. (GONÇALVES, 2000GONÇALVES, Luisa H. P. O discurso do capitalista: Uma montagem em curto-circuito. São Paulo: Via Lettera, 2000. , p. 66).

Hoje, a lógica financeira e especulativa que rege o comércio de títulos é marcada pela amplitude econômica global e pela volatilidade. Os investidores que aplicam seu capital nas bolsas não estão preocupados com a origem nacional das empresas com o tipo de produtos ou serviços que estas geram. Não estão interessados tampouco com os efeitos que estas empresas têm sobre o desenvolvimento ou o atraso do país. A única coisa que importa, independente da índole individual de cada investidor, é o grau de rentabilidade que aquele título de propriedade oferece. Esta é alógica que rege a esfera financeira (FRONT, 2020, p. 4).

A universidade hodierna, nesse sentido, ao distanciar-se de sua vocação, encontra-se submetida à prescrição do mercado. Ao desvirtuar-se de poder no mínimo “tocar o desejo”, como afirma Miller (1997MILLER, Jacques-Alain. Lacan elucidado: Palestras no Brasil. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997. , p. 113), a instituição encontra-se imersa em seus fins instrumentais, de tal sorte que o discurso da virtualidade na educação transformou os modos de ensino e aprendizagem em um saber que só tem valor se for utilitarista, afetando de modo substancial a dinâmica do trabalho docente, produzindo, assim, mudanças substanciais no lugar e na representação do professor (SENA, 2020SENA, Isael de Jesus. A controversa democratização do acesso ao ensino superior privado: o que dizem os professores na berlinda. Estilos da Clinica,[S. l.], v. 25, n. 3, p. 423-438, 2020. DOI: 10.11606/issn.1981-1624.v25i3p423-438. Disponível em: <Disponível em: https://www.revistas.usp.br/estic/article/view/170999 >. Acesso em: 10 ago. 2022.
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).

Neste artigo buscamos refletir sobre o ensino híbrido como suporte discursivo nos quais os docentes se apoiam diante da incidência do discurso tecnológico na formação acadêmico-profissional. Nesse debate dispensamos o enfoque reducionista e as paixões ativistas, bem como a saída maniqueísta, para introduzir os impasses de curto-circuito do laço formativo, cujas condições engendradas pela política, no próprio laço social, exigem do mestre a adesão, em nome da sobrevivência, ao programa institucional de massificação do conhecimento. Isso sem contar com a condição de ser expropriado de seu lugar de enunciação. Para percorrermos este debate, lançamos mão de estudos críticos sobre a profissão docente, sobre a mercantilização da educação, bem como da orientação lacanaiana da psicanálise para o entendimento da educação e da política. Primeiramente, abordamos o ensino híbrido cujo fundamento é o paradigma autoinstrucional. Em seguida, discutimos sobre a incidência do discurso tecnológico no mercado da formação universitária e o rechaço da qualidade da experiência como um dos seus diversos efeitos. Por fim, analisamos os impasses vivenciados pela professora Moara, segundo os regulamentos do ensino híbrido.

O ENSINO HÍBRIDO SEGUNDO A LÓGICA DO “PARADIGMA AUTOINSTRUCIONAL”

Surpreende em nossos dias que o progresso prometido pela revolução tecnológica, na educação, produziu à contramão uma ruptura nas condições imanentes ao laço formativo, no que se refere precisamente à referência ao lugar do professor, na relação mestre e discípulo, como um “depositário da palavra” (CORDIÉ,1998, p. 310). Nessa mesma direção, Pereira (2016PEREIRA, Marcelo Ricardo. O nome atual do mal-estar docente. Belo Horizonte: Fino Traço , 2016. , p. 205) afirmou: “sabemos hoje que o poder (e a autoridade) está posto em questão, que quem o exerce perdeu muito de sua legitimidade social”. Portanto, cabe perguntar: se o professor declina de se enunciar, quem o representa como significante mestre a outro significante, quando pensamos que um discípulo é forjado a partir de uma transmissão? Examinemos os impasses.

Em tempos de sedução do discurso da tecnologia na educação - da escola à universidade - prometendo não criar fronteiras nem obstáculos3 3 Em recente reportagem, cerca de 90 professores foram demitidos de uma instituição. Para ocupar o lugar dos docentes, robôs passaram a ser utilizados. O texto, na íntegra, pode ser consultado em: https://apublica.org/2020/05/apos-uso-de-robos-laureate-agora-demite-professores-de-ead/ , pode-se reconhecer, nesse ato desbravador, a incidência do objeto sobre o sujeito, produzindo um completo pacto de satisfação, pois a resposta à demanda assemelha-se a um “guichê”. Além disso, endossada pela força discursiva do paradigma cognitivista, na atualidade, o qual difunde que a aprendizagem se reduz apenas a um mecanismo de operação de processamento de dados (input e output), submetida à percepção e à informação, tal ato se processa como uma máquina. Nesse sentido, as promessas anunciadas pela dita revolução tecnológica, guiadas pelas premissas de uma orientação cognitivista, transformaram as formas de ensino e aprendizagem além da dinâmica do trabalho docente nas instituições educativas. Tal perspectiva, de modo similar, aplica-se também às psicoterapias (SENA, 2020SENA, Isael de Jesus. A controversa democratização do acesso ao ensino superior privado: o que dizem os professores na berlinda. Estilos da Clinica,[S. l.], v. 25, n. 3, p. 423-438, 2020. DOI: 10.11606/issn.1981-1624.v25i3p423-438. Disponível em: <Disponível em: https://www.revistas.usp.br/estic/article/view/170999 >. Acesso em: 10 ago. 2022.
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).

Esta abordagem é intelectualmente sedutora, pois ela faz apelo à razão, à reflexão e à vontade. Haveria erro na apreensão da realidade, e este erro gerador dos transtornos psicológicos (depressão, fobia, etc) poderia ser corrigido por uma aprendizagem adequada. O sistema (consciente) de crenças erradas seria assim revisado e reelaborado mais ou menos como “gestão de si”. Esta concepção do psiquismo, que faz apelo ao raciocínio e ao conhecimento classificado de uma confiança sem falha na prescrição (quando se refere à psicoterapia), é certamente mais atraente que a concepção analítica de um sujeito submisso à castração (CORDIÉ, 2000, p. 94, tradução nossa).

Para Laurent (2007LAURENT, Éric. A sociedade do sintoma. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2007. ), que analisa a sociedade do sintoma, o paradigma modular se impôs em nossa época. Trata-se do paradigma da cognição que não cessa de propor a pluralização de suas estratégias. Nesse modelo, tudo parece funcionar de modo quase autista. Isso implica uma dificuldade do Outro exercer alguma influência de sugestão.

O “empuxo tecnológico” tem se firmado como um recurso que visa viabilizar o processo educativo. Assim, as tecnologias avançam em relação aos processos anteriores de comunicação a distância com a chegada da voz e da imagem do professor, que introduzem os elementos de sua corporeidade (VOLTOLINI, 2009VOLTOLINI, Rinaldo. Educação a distância: algumas questões. Educação Temática Digital, Campinas, v. 10, n. 2, p. 123-139, 2009. Disponpivel em : <Disponpivel em : https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/etd/article/view/981 >. Acesso em: 24/08/2019
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).

Lacan (1954-55/1985LACAN, Jean-Jacques. O Seminário: livro 2: O eu na teoria de Freud e na técnica da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985. (Trabalho original proferido em 1954-1955). , p. 46), ao criticar a redução que se fazia do corpo e dos fenômenos da consciência ao modelo mecanicista, na tentativa de explicar o efeito da cibernética na sociedade, colocou uma pergunta que ainda parece pertinente para a nossa época:

A primeira questão que se coloca para nós, analistas, e talvez possamos aí sair da controvérsia que se entabula entre vitalismo e mecanicismo, é a seguinte - por que será que somos levados a pensar a vida em termos de mecanismos?

O autor, ao colocar em evidência o que estava em jogo, à época, nas máquinas, mostrou-nos que elas dizem, como toda transformação, sobre o espírito de um tempo. Ele concluiu:

A máquina está ligada a funções radicalmente humanas. Não é um simples artifício, como poderíamos dizê-lo das cadeiras, das mesas, e dos outros objetos mais ou menos simbólicos em meio nos quais moramos sem nos darmos conta de que são o nosso retrato. As máquinas são outra coisa. Isso vai muito longe à direção daquilo que realmente somos, do que as próprias pessoas que as constroem suspeitam [...]. A máquina encarna a mais radical atividade simbólica no homem, e ela era necessária para que as questões se colocassem - talvez não dê para vocês notarem no meio disto tudo - no nível em que a colocamos para nós (LACAN, 1954-55/1985LACAN, Jean-Jacques. O Seminário: livro 2: O eu na teoria de Freud e na técnica da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985. (Trabalho original proferido em 1954-1955). , p. 99).

As premissas da concepção cognitiva, cada vez estabelecida como o melhor parâmetro para corrigir problemas emocionais, quando aplicada ao campo educacional, tende a ratificar a ideia de um homem liberal, individualizado e empreendedor de si. Essa ideia vem se disseminando também como objeto da formação acadêmico-profissional, principalmente nas universidades privadas mercantis. O uso massivo do ensino híbrido nessas instituições, sobretudo, com a adesão ao ensino a distância - EaD, tem despertado a nossa atenção pelo modo acrítico e instrumental como vem sendo implementado.

No que se refere ao ensino híbrido, este consiste em combinar atividades virtuais e presenciais com a ajuda de tutores. Por exemplo, a sala de aula invertida - flipped classroom - prevê a circulação de um determinado assunto não transmitido pelo professor em sala de aula. O aluno acessa o material disponibilizado de forma on-line para estudá-lo antes de frequentar a sala de aula. Geralmente são problemas, projetos, discussões, atividades de laboratório. As atividades são apoiadas e supervisionadas pelo professor e colaborativamente pelos colegas. Valorizam-se as interações interpessoais e as atividades on-line visam tornar o processo de ensino e aprendizagem mais eficiente, interessante e personalizado (VALENTE, 2014VALENTE, Jorge A. (2014). Blended learning e as mudanças no ensino superior: a proposta da sala de aula invertida. Educar em Revista, v. 4, p. 79-97. Disponível em: <Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/er/nspe4/0101-4358-er-esp-04-00079.pdf >. Acesso em: 12/09/2021
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). Um ampla literatura nacional (Bacich, Tanzi Neto, Trevisani 2015BACICH, Lilian; TANZI NETO, Adolfo; TREVISANI, Fernando de Mello. Ensino Hibrido: Personalização e tecnologia na educação. Porto Alegre: Grupo A, 2015. ) e internacional (Christensen, Horn e Staker, 2013CHRISTENSEN, Clayton M. ; HORN, Michael B ; STAKER, Heather. Ensino Híbrido: uma Inovação Disruptiva? Uma introdução à teoria dos híbridos. Maio de 2013. Disponível em: Disponível em: https://s3.amazonaws.com/porvir/wp-content/uploads/2014/08/PT_Is-K-12-blended-learning-disruptive-Final.pdf . Acesso em: 10 jul. 2023
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; Stacey, Gerbic, 2009STACEY, Elizabeth; GERBIC, Philippa. Effective Blended Learning Practices: Evidence-Based Perspectives in ICT-Facilited Education.Nex York : Information Science Reference, 2009. ; Garrison, Vaughan, 2008GARRISON, D. Randy, VAUGHAN, Norman D. Blended Learning in Higher Education: Framework, Principles, and Guidelines. Academy of Management Learning & Education. vol. 7, n. 1, p. 135-137, 2008. Disponível em: <Disponível em: https://www.jstor.org/stable/40214508 >. Acesso: 10/07/2023
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) tem destacado, sob diferentes perspectivas, a relevância do ensino hibrido em uma sociedade tecnológica, a diversidade de práticas e reflexões sobre o papel do professor nesse contexto.

A cultura tecnológica, através dos diversos aparelhos que nos conectam ao mundo virtual, transmite a todos, independentemente de suas localizações geográficas, a impressão de que somos onipresentes. Os muros da universidade já não estabelecem limites, na medida em que as redes que nos conectam virtualmente atravessam barreiras, mostrando a sua potência. Tudo isso parece estabelecer um único parâmetro a seguir, cuja onipotência exclui qualquer possibilidade de recusa, além de se mostrar sedutora.

A revolução digital, segundo Blais; Gauchet; Ottavi (2014BLAIS, Marie-Claude.; GAUCHET, Marcel ; OTTAVI, Dominique. Transmetrre, aprrendre. Paris: Stock, 2014. ), produziu várias mutações políticas, epistemológicas, sociais e pedagógicas, a ponto de interrogarmos se ainda precisamos de professores quando as máquinas se colocam à disposição de cada um, com os saberes dos quais cada um pode ter necessidade.

Outro argumento bastante disseminado pelas propagandas diz respeito ao aluno encontrar no ensino híbrido uma forma de expandir os seus horizontes educacionais e favorecer o treinamento em habilidades sociais e comportamentais, além da nova demanda de habilidades socioemocionais. De acordo com essa visão, o aluno tem a chance de praticar o uso e as aquisições dessas habilidades nos seus respectivos cursos formais (ASSUMPÇÃO, 2017ASSUMPÇÃO, Cristiana Mattos. O papel dos cursos livres na formação continuada. In. CENSO EAD. BR: relatório analítico da aprendizagem a distância no Brasil. Curitiba: InterSaberes, 2016, p. 7-8.). Como reforça Lajonquière (2011LAJONQUIÈRE, Leandro. A maestria da palavra: isso duro de roer na formação de professores. In. MRECH, Leny Magalhães; PEREIRA, Marcelo Ricardo. Psicanálise, transmissão e formação de professores. Belo Horizonte: Fino Traço, 2011, p. 115-135. ), esses mecanismos pretendem impor o autodidatismo às grandes massas populacionais.

Nesse modelo de formação acadêmico-profissional, o aluno se torna o agente e o centro do processo - eis aqui a face primária da “sua majestade, o bebê!”, cujas atenções e demandas estão todas voltadas para o “cliente”, preferencialmente evitando contratempos e sua insatisfação (SENA, 2020SENA, Isael de Jesus. A controversa democratização do acesso ao ensino superior privado: o que dizem os professores na berlinda. Estilos da Clinica,[S. l.], v. 25, n. 3, p. 423-438, 2020. DOI: 10.11606/issn.1981-1624.v25i3p423-438. Disponível em: <Disponível em: https://www.revistas.usp.br/estic/article/view/170999 >. Acesso em: 10 ago. 2022.
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). Nesse sentido, Voltolini (2019) aponta que, ao priorizarmos o aluno empoderado, o professor fica privado de seu ensino e de sua enunciação. No entanto, essa equação é benéfica para a lógica neoliberal, pois tornou-se o sonho de consumo do poder instituído. Temos aqui a universidade consumida e consumada. Dito de outro modo, o “empenho” em democratizar o ensino universitário, sob o lema de tornar a educação universalizada para todos, mas sem qualquer índice de qualidade, torna a atual educação em um objeto a ser consumido e a ser aniquilado.

No entanto, ao considerar as diferentes realidades das instituições de ensino superior, o paradoxo consiste em propor abordagens baseadas no ensino híbrido, adequadas para a resolução do problema e de acordo com o currículo a ser trabalhado, considerando o nível de conhecimento dos alunos. Em se tratando dos projetos, observa-se que o aluno é quem faz a escolha, baseado no próprio interesse ou no do grupo de alunos. Outro problema: a diversidade de temas torna bastante difícil para o professor mediar o próprio ensino e a aprendizagem. Essas abordagens são difíceis de ser implementadas em salas com um grande número de alunos (VALENTE, 2014VALENTE, Jorge A. (2014). Blended learning e as mudanças no ensino superior: a proposta da sala de aula invertida. Educar em Revista, v. 4, p. 79-97. Disponível em: <Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/er/nspe4/0101-4358-er-esp-04-00079.pdf >. Acesso em: 12/09/2021
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). Contudo, o que se pode verificar nas realidades concretas das instituições privadas, que pouco contam com a fiscalização, é que essa abordagem costuma ser aplicada em espaços com excedentes de alunos com trajetórias acadêmicas marcadas por percalços e déficits variados (SENA, 2020SENA, Isael de Jesus. A controversa democratização do acesso ao ensino superior privado: o que dizem os professores na berlinda. Estilos da Clinica,[S. l.], v. 25, n. 3, p. 423-438, 2020. DOI: 10.11606/issn.1981-1624.v25i3p423-438. Disponível em: <Disponível em: https://www.revistas.usp.br/estic/article/view/170999 >. Acesso em: 10 ago. 2022.
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).

Embora existam controvérsias, o discurso pedagógico contemporâneo, sobreposto ao discurso da tecnologia, dissemina os benefícios dessa modalidade de ensino que estimula a autonomia individual, a motivação, ao passo que o “saber” não está mais sob a tutela de uma expertise. O professor encontra-se, portanto, em “descentração”. Logo, o ato de aprender se dá por um consumo de informações reforçado pela seguinte observação: aprenda sem o mestre, sem medo e sem risco. Nesses contextos de massificação do ensino, o professor tornou-se um executor de instruções pré-formatadas.

A universidade hodierna, comprometida com a mercantilização da formação, está implicada na transmissão de um conhecimento que prescinde ou denega os lugares de enunciação do professor. Nesse contexto, o mestre, por sua vez, passa a ocupar posições diversas, como destaca Segenreich (2015SEGENREICH, Stelle. C. D. A invasão silenciosa da ead nos cursos de graduação presenciais no Brasil: questões de gestão e avaliação. Cadernos ANPAE, v. 1, p. 1-15, 2014. ): tornam-se conteudistas, aulistas, tarefeiros, além de também desempenharem o papel de instructional designers. Alguns são convocados a integrar a equipe responsável pela produção e distribuição, enquanto outros docentes se tornam tutores, pois acompanham o aluno tanto em plataforma virtual como presencialmente. O que se pode notar é que o acompanhamento do professor torna-se, quase sempre, um trabalho burocrático. Sabemos que, como destaca Costa (1991COSTA, Jurandir Freire. Psiquiatria Burocrática: Duas ou três coisas que sei dela. In. ARAGÃO, Luiz Tarlei; CALLIGARIS, Contardo; COSTA, Jurandir Freire (Org.). Clínica do social: ensaios. São Paulo: Escuta, 1991. ), a burocracia tem o aspecto de “desencantamento do mundo” frente à “racionalidade” exigida pelo aparato tecnológico, implicando no outro certa obediência. Laurent (2007LAURENT, Éric. A sociedade do sintoma. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2007. ), ao citar Heidegger, em resposta à sua visão científica do mundo, mostra que a sociedade da técnica “ataca a substância mais íntima do homem contemporâneo”.

Além da estratégia mercantilista adotada pelas instituições particulares de ensino como meio de obter cada vez mais lucro, pode-se também contar atualmente com a conivência do Ministério da Educação, pois parte do curso pode ser disponibilizado na forma de ensino a distância: 40%4 4 O Ministério da Educação publicou a Portaria nº 2.117, de 6 de dezembro de 2019, que dispõe sobre a oferta de carga horária na modalidade de Ensino a Distância - EaD em cursos presenciais de graduação. As IES poderão introduzir a oferta de carga horária na modalidade EaD na organização pedagógica e curricular de seus cursos de graduação presenciais, até o limite de 40% da carga horária total do curso. . A justificativa para tamanha incidência do ensino híbrido recai sobre o seguinte fato: “graças à Internet, o saber não está mais monopolizado por aqueles que a instituição selecionou, formados e certificados. O saber se compartilha” (BLAIS; GAUCHET; OTTAVI, 2014BLAIS, Marie-Claude.; GAUCHET, Marcel ; OTTAVI, Dominique. Transmetrre, aprrendre. Paris: Stock, 2014. , p. 241, tradução nossa).

Observamos, assim, a emergência de uma nova concepção naturalista e evolucionista de aprender. Diante disso, concebe-se que aprender deve ser espontâneo, indutivo, imediato e, sobretudo, ligado à utilidade ou à eficácia (“pertinência”). A aquisição dos conhecimentos é destinada à adaptação do sujeito ao seu ambiente, tem que ser útil. A aprendizagem não pode ser outra coisa que responder a uma questão, procurar a solução de um problema (BLAIS; GAUCHET; OTTAVI, 2014BLAIS, Marie-Claude.; GAUCHET, Marcel ; OTTAVI, Dominique. Transmetrre, aprrendre. Paris: Stock, 2014. ).

Sobre essas transformações, há quem as examine apenas apontando os aspectos positivos, pois parece destacar o mesmo fascínio daqueles que descobrem uma espécie de pílula dourada ou um Éden intacto, quando acentuam as evidências, por meio das estatísticas, de que a forma hegemônica de transmissão, além de condizente com a época - zeitgeist, deveria atender também ao espírito da juventude volátil e hiperconectada, que pode aprender sem sanção, implicando em valores, tais como: “interatividade, eficácia, rapidez, conexão com o mundo inteiro, esquecendo-se do passado” (BLAIS; GAUCHET; OTTAVI, 2014BLAIS, Marie-Claude.; GAUCHET, Marcel ; OTTAVI, Dominique. Transmetrre, aprrendre. Paris: Stock, 2014. , p. 225, tradução nossa). Dito de outra maneira, caberia a cada um customizar o saber ao sabor do gosto pessoal, do tempo e das prioridades. Eis a face contemporânea da universidade rendida à “hipnose pedagógica”5 5 Ferenczi criticava o fato de que a hipnose aplicada na análise exercia influência extrema do analista em relação ao seu paciente. Ao estabelecer um paralelo com os aspectos pedagógicos no que se refere à educação das crianças, o autor faz alusão de que os adultos, ao buscarem implantar a sua autoridade sobre a criança, acabam exercendo-a de forma violenta (PECHBERTY, 2019). da hora.

Frente a esse conjunto de certezas e possíveis garantias, casado com ideias desenvolvimentistas, ainda restam dúvidas e suspeitas relacionadas à “sedução totalitária”. Por exemplo, pode-se considerar que esse mesmo tipo de argumento foi apropriado como tática para ser expropriado e explorado, de modo perverso, pelas instituições privadas, mas de maneira irrestrita e também inconsequente. Presume-se, assim, que

a ideia de que certas descobertas da ciência caíram em mãos erradas, por exemplo, não faz senão retomar este velho preconceito liberal, típico da ilusão de liberdade acalentada pelo imperialismo americano, de que tudo se resolveria corretamente bastando que os objetos estivessem em boas mãos. Quer dizer, seja em mãos boas ou más, tratar-se-iam de mãos de todo modo livres para manipular o objeto na direção que bem lhes aprouver, sem que nada deste objeto lhe impusesse um limite, um impossível (VOLTOLINI, 2009VOLTOLINI, Rinaldo. Educação a distância: algumas questões. Educação Temática Digital, Campinas, v. 10, n. 2, p. 123-139, 2009. Disponpivel em : <Disponpivel em : https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/etd/article/view/981 >. Acesso em: 24/08/2019
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, p. 129).

A ideia da eficácia e do imediatismo disseminados pelas instituições universitárias guiadas pela lógica do mercado e pouco comprometidas com princípios éticos balizadores da formação acadêmico-profissional transmitem o gozo como promessa de uma educação utilitarista. Esse gozo está vinculado àquela posição do sujeito no discurso do capitalista, em que o objeto (tecnológico) é produto da ciência (ou do saber, S2) e deve estar em condição de atender à demanda do sujeito ($ ↔ a) em uma relação de fusão “ofertando-lhe, de modo monótono e repetitivo, objetos de consumo curtos, rápidos e descartáveis - ainda que isso gere tédio, tristeza e falta de sentido na velocidade em que são consumidos” (PEREIRA, 2016PEREIRA, Marcelo Ricardo. O nome atual do mal-estar docente. Belo Horizonte: Fino Traço , 2016. , p. 210).

O DISCURSO TECNOLÓGICO NO MERCADO DA FORMAÇÃO UNIVERSITÁRIA: O RECHAÇO DA QUALIDADE DA EXPERIÊNCIA

Os estudos sobre o ensino superior (SANTOS, 2021; ALCADIPANI, 2011ALCADIPANI, Rafael. Academia e a fábrica de sardinhas. O&S Salvador, v. 18, n. 57, p. 345-348, 2011.; SAMPAIO, 2014SAMPAIO, Helena. O setor privado de ensino superior no Brasil: continuidades e transformações. RBCS, v. 29, n. 84, p. 28-43, 2014. Disponível em: <Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v29n84/02.pdf >. Acesso: 14/11/2019
https://www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v29n84/...
; SENA, 2020SENA, Isael de Jesus. A controversa democratização do acesso ao ensino superior privado: o que dizem os professores na berlinda. Estilos da Clinica,[S. l.], v. 25, n. 3, p. 423-438, 2020. DOI: 10.11606/issn.1981-1624.v25i3p423-438. Disponível em: <Disponível em: https://www.revistas.usp.br/estic/article/view/170999 >. Acesso em: 10 ago. 2022.
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) destacam os impasses concernentes à instrumentalização do trabalho docente como resultado da cultura tecnológica, hegemônica e tendenciosa a uma homogeneização à medida que se massificam as estratégias de mediação da transmissão nas diferentes formas qualificadas de “ensino”. Segundo esse modelo, a ação do professor, ainda que parcialmente necessária, torna-se descentrada, enquanto a relação com o conhecimento é disseminada de forma utilitária, organizado de forma dispersa, ainda que sob o controle de programas. Notamos que nem sempre a formalização da informação, supostamente chamada de conhecimento, traduz-se em saber.

À luz do debate sociológico, Bauman (2017BAUMAN, Zygmunt. Educação do imediatismo. Disponível em Disponível em https://www.pensarcontemporaneo.com/1867-2/ Aceso em: 10/12/2021
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, s/p.) adverte-nos acerca da incompatibilidade entre “educação e imediatismo”, considerados “termos contraditórios”. Essa contradição se estabelece a partir do seguinte paradoxo: “Ou se tem uma educação de qualidade, ou se tem o imediatismo. Não dá para ter os dois ao mesmo tempo”. De acordo com essa observação, em ambos os enunciados há a possibilidade de realizar a educação, mas com resultados opostos, uma vez que os fins e os objetivos não são os mesmos.

Partindo dessas premissas, pode-se pensar que a educação, segundo os pressupostos da qualidade, contribui para que cada um encontre um lugar no pacto social. No entanto, a educação para os resultados imediatos supõe negar a castração6 6 Referente ao “complexo de castração” que, para Freud, é o conjunto das consequências subjetivas e inconscientes que determina a submissão do sujeito às normas sociais. Sua função normalizante representa a imposição de limites por meio dos quais cada um deve regular seu gozo ou suas satisfações pulsionais (CHEMAMA, 1995). , opondo-se à transmissão das marcas simbólicas de tal modo que aquilo que se veicula é a promessa do sujeito poder gozar, ainda que surjam obstáculos, de forma ilimitada.

Ao examinarmos essas questões à luz do debate psicanalítico, observamos que a contradição entre educação versus imediatismo, levando em consideração a crítica de Bauman, são perfeitamente compatíveis com as formas contemporâneas que organizam o laço social e determinam modos de subjetividades nos quais o sujeito é determinado por um saber. Nessa configuração a formação acadêmico-profissional se inscreve em um imaginário que transmite não a construção de um desejo por meio do qual cada um pode vir a tecer a sua filiação subjetiva em nome de um ideal, mas, pelo contrário, a promessa de poder gozar a qualquer preço. Desse modo, a relação com o conhecimento segue a lógica do consumo segundo a qual, independente das circunstâncias, o aluno-consumidor, ao final, será sempre aprovado pelas múltiplas possibilidades criadas pelas instituições privadas para preservar o cliente ante a ampla concorrência entre instituições similares.

Para compreendermos os desdobramentos da incidência do efeito discursivo produzido pela tecnologia, recorremos ao matema ou algoritmo do discurso da tecnologia, desenvolvido por Lesourd (2010). Esse artifício discursivo parece-nos apropriado como operador de leitura para refletirmos como as instituições de ensino privadas articulam e pensam hoje a formação profissional e o lugar do professor.

É preciso ainda levar em consideração que, na psicanálise, o laço social se define, em termos, como discurso instaurador de certos modos de relações por meio das quais o gozo pode ser regulado. Essa noção foi desenvolvida por Lacan (1969-70/1991), em seu seminário 17 - O avesso da psicanálise, e vem sendo articulada ao campo educacional por diversos autores (VOTOLINI, 2007; PONNOU, 2014PONNOU, Sébastien. Lacan et l’éducation: manifeste pour une cliniue lacanienne de l’éducation. Paris: L’Harmattan, 2014. ; PEREIRA, 2016PEREIRA, Marcelo Ricardo. O nome atual do mal-estar docente. Belo Horizonte: Fino Traço , 2016. ).

Em relação à teoria dos discursos, devemos identificar o elemento específico que domina tal laço social. Isso significa que devemos procurar aquilo que determina o agir do sujeito. Implica verificar como o sujeito age de acordo com a dominante do discurso em que está inserido (QUINET, 2009QUINET, Antonio. Psicose e laço social: esquizofrenia, paranoia e melancolia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar , 2009. ). Para Lacan (1969-70/1991LACAN, Jean-Jacques. O Seminário, livro 17: O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1991. (Trabalho original proferido em 1969-1970). , p. 13), “pouco importa, é claro, a forma das letras7 7 “Significante-mestre (S1), significante do saber (S2), sujeito barrado ($) e objeto pequeno a (autre, em francês): como causa de desejo ou mais-gozar” (PEREIRA, 2008, p. 128). onde inscrevemos essa cadeia simbólica. Isso basta para que algo das relações constantes se manifeste.”.

Retomando o discurso da tecnologia, de Lesourd, apresentamos o matema:


Discurso da tecnologia

Pode-se observar, a partir desse matema do discurso da tecnologia, que quem ocupa o lugar de agente do discurso é o saber (S2). O saber técnico é o que determina e ordena o lugar do sujeito. Esse tipo de laço social constitui, por exemplo, o discurso médico: “Em nome de um saber técnico prescreve ao sujeito qual deve ser seu uso do gozo - não pode fumar, não pode beber, faça esporte etc.” (LESOURD, 2010LESOURD, Serge. Comment taire le sujet? Des discours aux parlottes libérales. Paris: Éres, 2010. , p. 147, tradução nossa).

Examinando o discurso da tecnologia, seu agente se dirige ao objeto como se este último fosse determinado pelo significante mestre (S1), aquele que ordena simbolicamente o mundo. Como evidencia Lacan (1969-70/1991LACAN, Jean-Jacques. O Seminário, livro 17: O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1991. (Trabalho original proferido em 1969-1970). , p. 11): “S1, aquele de onde parte nossa definição do discurso... [é] o campo do grande Outro”. Assim, a proliferação das técnicas de comunicação demonstra o desejo desse lugar do outro no discurso que tem o objeto e que intima o sujeito a ser representado por um outro objeto. Este, por sua vez, ocupará um lugar, qualquer que seja, daquele que aliena o sujeito. Dito de outro modo, aquele para quem, como um outro, é dirigido o enunciado. Pode-se, então, observar que o desenvolvimento tecnológico só tem ampliado a preponderância do objeto de gozo em lugar do outro. Lesourd (2010LESOURD, Serge. Comment taire le sujet? Des discours aux parlottes libérales. Paris: Éres, 2010. , p. 149, tradução nossa) avança:

Neste discurso tecnológico o saber da realidade da ciência tecnológica eficaz interpela não o sujeito como o faz o discurso da Universidade, mas o objeto em lugar do outro no discurso. O saber tecnológico, segundo o algoritmo S2/$ quer determinar o sujeito, demanda ao objeto para que ele produza o sentido ao mundo, que produza uma nominação ordenando o mundo. Esta ideia de um saber que poderia produzir uma verdade do mundo pela intermediação dos objetos de conhecimento é historicamente datado, como o programa das Luzes, dos enciclopedistas, e em seguida da religião e da Razão revolucionária. Neste processo de discurso de um saber tecnológico universal encarregado de produzir uma ordem do mundo, o sujeito desaparece.

A circularidade e o efeito “irônico” produzidos pelo discurso da tecnologia implicam o fato de que, ao observá-lo, exteriormente, percebemos tratar-se de um discurso que se torna para aquele que o enuncia suporte de sua posição subjetiva, conclui Lesourd (2010LESOURD, Serge. Comment taire le sujet? Des discours aux parlottes libérales. Paris: Éres, 2010. ). De acordo com essa perspectiva, o sujeito não se representa por um significante mestre (S1). Essa forma discursiva pressupõe o rechaço à qualidade da experiência, que funda a própria educação, uma vez que o professor não se enuncia, mas é enunciado pelos saberes produzidos em série.

A supressão da qualidade da experiência inerente ao ensino, do qual mestres e discípulos são convocados a assumirem um lugar de enunciação, vem sendo pervertida pela mercantilização da formação universitária (SENA, 2020SENA, Isael de Jesus. A controversa democratização do acesso ao ensino superior privado: o que dizem os professores na berlinda. Estilos da Clinica,[S. l.], v. 25, n. 3, p. 423-438, 2020. DOI: 10.11606/issn.1981-1624.v25i3p423-438. Disponível em: <Disponível em: https://www.revistas.usp.br/estic/article/view/170999 >. Acesso em: 10 ago. 2022.
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). Nessa direção, Agamben (1978/2008AGAMBEN, Giorgio. Infância e História: Destruição da experiência e origem da história. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008. (Trabalho original publicado em 1978).) soube precisar um diagnóstico ao mostrar o desaparecimento da máxima e do provérbio. Logo, o slogan substitui os dois e torna-se, desde então, o provérbio da humanidade, que perdeu a experiência. Embora isso não signifique que não existam experiências, o fato é que elas se efetuam fora do homem. Parece curioso que o homem olhe para ela com alívio. Nesse sentido, podemos observar que tanto os professores como os alunos, podem ser comparados com

aqueles personagens de quadrinhos da nossa infância, que podem caminhar no vazio desde que não se deem conta: no instante em que se dão conta, em que têm a experiência disso, despencam irremediavelmente (AGAMBEN, 1978/2008AGAMBEN, Giorgio. Infância e História: Destruição da experiência e origem da história. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008. (Trabalho original publicado em 1978)., p. 24).

Agamben ainda conclui que

todo o discurso sobre a experiência deve partir atualmente da constatação de que ela não é mais algo que ainda os seja dado fazer. Pois, assim como foi privado de sua biografia, o homem contemporâneo foi expropriado de sua experiência: aliás, a incapacidade de fazer transmitir experiências talvez seja um dos poucos dados certos de que disponha sobre si mesmo (AGAMBEN, 1978AGAMBEN, Giorgio. Infância e História: Destruição da experiência e origem da história. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008. (Trabalho original publicado em 1978)./2008, p. 21).

Se o discurso da tecnologia rechaça a possibilidade de o professor poder se enunciar, pois ele está objetificado, a oferta de uma formação sem o bastão da qualidade da experiência não pode suscitar nenhuma demanda ou desejo dos alunos. Contraditoriamente, o professor, como o outro desse discurso, é “quem sempre trabalha para fazer a verdade brotar, pois é este o sentido do trabalho” (LACAN, 1969-70/1991LACAN, Jean-Jacques. O Seminário, livro 17: O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1991. (Trabalho original proferido em 1969-1970). , p. 110). Dito de outra maneira, sem o outro, o discurso não se produziria. Então, não é simplesmente aquele a quem o discurso se dirige, mas aquele que interroga o discurso que advém como resposta significante a esse outro, como lugar de questão.

A PROFESSORA MOARA SEGUNDO OS REGULAMENTOS DO ENSINO HÍBRIDO

Os excertos de um caso emblemático que vamos discorrer é resultado de uma das temáticas de pesquisa8 8 Essa pesquisa seguiu os trâmites das diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas que envolvem seres humanos, segundo orientações da Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, aprovada pelo Comitê de Ética na Pesquisa (COEP)/UFMG, sob o número CAEE - 66241417.0.0000.5149. Durante as entrevistas, os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido. Agradecemos à CAPES pelo financiamento da pesquisa. , realizada com professores do ensino superior privado, os quais se queixavam, sobretudo, acerca da incidência brutal das novas tecnologias da comunicação e informação - NTIC, que vem, de modo significativo, alterando as formas de ensino e transmissão e consequentemente substituindo as relações de transferências entre professor e aluno.

A professora Moara9 9 Nome fictício de origem indígena que significa “ajudar a nascer, aquela que auxilia no parto”. Utilizamos em analogia ao lugar ocupado pelo professor no discurso tecnológico, o lugar do outro, quem trabalha para fazer a verdade do discurso brotar. , 49 anos na ocasião, mostrou-se bastante interessada em participar da pesquisa10 10 Durante o trabalho de campo, fizemos uso do diário de bordo no qual registrávamos impressões decorrentes da entrevista e relatos feitos após o término da conversa registrada em gravador. . Graduada em Fisioterapia há 25 anos, é casada e tem um casal de filhos (uma menina de 12 anos e um menino de 16 anos). Exerce a docência há dezoito anos. Possui mestrado e doutorado na área de saúde coletiva, em instituições públicas. Os relatos feitos por ela parecem divididos em dois momentos de sua trajetória como docente da instituição privada na qual realizamos o trabalho de campo. No primeiro momento, lecionava em todos os cursos da área de saúde: enfermagem, fisioterapia, odontologia, nutrição, farmácia e fonoaudiologia. Posteriormente, foi convidada para dedicação exclusiva ao curso de medicina. Assim, tornou-se inevitável estabelecer alguns contrastes entre os cursos e a heterogeneidade dos alunos.

Os desafios surgiram quando Moara teve que se dedicar à tutoria para atender aos requisitos das disciplinas implementadas pela modalidade do ensino híbrido. O uso das metodologias ativas transformou-se em um impasse diante das realidades socioculturais dos alunos, bastante perceptíveis no turno noturno. A docente traçou um perfil, fazendo uso de comparações:

“O aluno que vem estudar à noite tem teoricamente pouco tempo para estudar, às vezes, o tempo de estudo dele é o tempo da aula. Então, as propostas que a gente faz para trabalhar com o aluno diurno do mesmo curso, a gente não consegue aplicar com o curso noturno, porque é preciso que ele estude, que ele leia, que ele venha preparado, a história da pré-aula [acessar as orientações prévias no site da universidade], de vir para usar uma metodologia mais ativa. Então, sempre foi um impasse muito grande conseguir trabalhar com as mesmas metodologias, os mesmos materiais. Mesmo que sejam alunos distintos, mas a mesma metodologia a gente não conseguia. Aula prática, nem sempre a gente tem os mesmos resultados com alunos da noite e alunos do dia. Então, trabalhar como a gente trabalha hoje na Medicina, com as metodologias ativas, com os outros cursos, eu não consegui, não tive sucesso” (Professora Moara, informação verbal, 2018).

Nesse excerto acerca das condições do ensino, duas questões parecem se destacar: primeiramente, os alunos que frequentam os cursos em turnos opostos - vespertino e noturno - apresentam desempenhos diferentes e vivem realidades diversas; em segundo, a homogeneização da metodologia requer a sua aplicação para todos, indistintamente. O impasse maior para o professor consiste no modus operandi das metodologias ativas, pois implica um enrijecimento, o ato de cumprir com o prescrito, com a formação estandardizada.

Para Gonçalves (2000GONÇALVES, Luisa H. P. O discurso do capitalista: Uma montagem em curto-circuito. São Paulo: Via Lettera, 2000. ), o discurso do capitalista, segundo as regras do tecnomercado, parte da ideia segundo a qual o maior atrativo da mercadoria é sua fluente disponibilidade sob a forma de entrega rápida e sob medida. Trata-se do imaginário de um puro oferecimento sob as padronizações da mercadoria e da massa.

No entanto, o paradoxo do oferecimento das metodologias ativas, na instituição em destaque, deve-se ao fato de que o aluno deveria se tornar o centro da aprendizagem, ter autonomia e poder gerenciar o seu percurso formativo. O professor, por sua vez, seguindo o programa, trabalharia como tutor, hipoteticamente, auxiliando o estudante. Esse seria o modelo ideal do “paradigma autoinstrucional” (SEGENREICH, 2015SEGENREICH, Stelle. C. D. A invasão silenciosa da ead nos cursos de graduação presenciais no Brasil: questões de gestão e avaliação. Cadernos ANPAE, v. 1, p. 1-15, 2014. ). Não obstante, o ingresso nos cursos também não é homogêneo, pois existem cursos historicamente mais privilegiados, como medicina e odontologia, cujo critério de seleção exige a aprovação em um exame vestibular, estabelecendo, desse modo, uma distinção muito clara entre os cursos citados e outros para os quais basta a realização de uma redação para que se alcance um desempenho considerado satisfatório. Assim, a “clientela diferenciada” vai exigir do professor um tratamento desigual. O docente precisa, portanto, estimular o aluno - trabalhador noturno - para que ele permaneça “acordado” e seja “mais participativo”. Assim,

a oferta do saber sucede raramente a uma demanda ou a uma necessidade, e, se há problema, é porque o professor foi capaz de criar a situação que permitiu colocá-lo (nós chamamos isso de “situação-problema” justamente porque ele é fictício) (BLAIS; GAUCHET; OTTAVI, 2014BLAIS, Marie-Claude.; GAUCHET, Marcel ; OTTAVI, Dominique. Transmetrre, aprrendre. Paris: Stock, 2014. , p. 238, tradução nossa).

Acrescentamos ainda que, apesar do avanço tecnológico e diante do fato de que um vasto conjunto de informações está disponível para download, os apetites da juventude parecem moderados. Além disso, observa-se uma apatia diante da necessidade de densidade de pensamento. Isso implica o fato de que o professor, em uma versão mais popular, precisar oferecer “tudo pronto e mastigado”. Lacan (1969-70/1991LACAN, Jean-Jacques. O Seminário, livro 17: O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1991. (Trabalho original proferido em 1969-1970). , p. 172) mostrou que, como estamos governados pela ciência, proliferam-se as latusas, ou seja, “objetos feitos para causar o desejo” do sujeito, que estão povoando o mundo. “A latusa não tem razão alguma para se limitar em sua multiplicação”.

Sob o imperativo de aplicar a metodologia de forma linear, a professora Moara relata a sua dificuldade frente à incompatibilidade do modelo de ensino híbrido adotado pela instituição e da realidade concreta das salas de aulas. Ao mencionar a quantidade expressiva dos alunos, fica explícito o seu mal-estar:

“O professor tem que dar conta e aplicar uma técnica de qualquer jeito. Aí, pensa: numa turma de cento e trinta, cento e quarenta alunos, como é que vai aplicar uma metodologia ativa? É inviável, porque eu não consigo atender todos, porque numa situação dessas, a gente tem que ajudar o outro, não basta propor e ‘se vire’. Então, não era fácil, não” (Professora Moara, informação verbal, 2018).

Impressiona o efeito de massificação produzido pela generalização do ensino híbrido, metodologia mais adequada para os pequenos grupos. A professora demonstra guardar ressentimentos ao deparar-se com a imperativo de uso da referida técnica para cento e quarenta alunos. Além do excesso, há nitidamente uma queixa relacionada ao modelo perverso da mercantilização da formação universitária, que não segue a critérios pedagógicos, mas mercantis. Lesourd (2010LESOURD, Serge. Comment taire le sujet? Des discours aux parlottes libérales. Paris: Éres, 2010. , p. 162 tradução nossa) observa que

além da virtualização do Outro que constrói o mundo pós-moderno, é a relação às figuras mesmas do Outro que mudaram. As encarnações imaginárias do Outro não são mais figuras tutelares mais ou menos boas, mais ou menos protetoras como eram as imagens de Deus ou do Pai. O Outro virtual se torna um simples persecutor anônimo... total, inteiro e totalmente gozador.

A ambição da lógica do mercado, segundo “o apetite do ganho”, aplica-se indiscriminadamente à educação, sob o ímpeto da virtualização determinado pelos significantes mestres que assujeitam os docentes. Para Estacolchic (1999), as leis do mercado funcionam como uma rede sórdida, ela é tecida exclusivamente com apetites pessoais e taxas de lucro. Assim, o mercado é o lugar dos ganhadores. Lacan (1969-70/1991LACAN, Jean-Jacques. O Seminário, livro 17: O avesso da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1991. (Trabalho original proferido em 1969-1970). ) foi visionário em sua crítica ao neoliberalismo e, por isso, a sua premissa parece correta acerca dos “políticos sábios”, referindo-se àqueles que detêm a métrica da arte de governar e que sabem exatamente tudo o que se deve ser feito para alcançar os seus ideais.

Como anunciamos anteriormente, Maora deixou de lecionar nos demais cursos da área de saúde e migrou para dedicar-se exclusivamente ao curso de medicina desde 2012, como ela mesma sintetiza:

“De um ano para cá, eu trabalhei com Medicina desde a primeira turma e me tornei exclusiva: a realidade é completamente distinta, a gente tem alunos com tempo, a gente consegue ter alunos que vêm preparados... Então mudamos da água para o vinho e isso é muito bom, porque me dá vontade. Vontade de estudar mais, para trabalhar para eles, porque até então estava muito cômodo para mim” (Professora Moara, informação verbal, 2018).

Se por um lado, a heterogeneidade cultural dos alunos dos demais cursos provocava mal-estar na professora, por outro lado, o novo perfil dos alunos de medicina, em razão do processo seletivo, representava um prodígio para Maora. Ademais, tornou-se fonte de sua motivação para o seu trabalho. Ainda que não fosse objetivo de nossa pesquisa, podemos observar, de modo geral, a partir das entrevistas realizadas, que os professores que ensinavam no curso de medicina enunciavam com certa satisfação o fato de constituírem o corpo docente do referido curso. Curiosamente, a mensalidade desse curso pode custar até doze mil reais. Os alunos são altamente exigentes como clientes, geralmente, oriundos de famílias com alto poder aquisitivo e estudaram em escolas com padrão de excelência acadêmica. Portanto, os professores são cobrados intensamente. Mas, no que refere à reprodução programática dos conteúdos segundo o formato do ensino híbrido, a professora expressa a seguinte queixa:

“A metodologia ainda está em construção. Mas a gente recebeu tudo muito pronto da instituição. Então, a princípio, era ‘aplica-se’. Receba e aplica. Depois, a gente começou a adaptar, a realidade não era essa, então, a gente começou a fazer pequenas adaptações. Porém, ao entramos nos módulos que são mais médicos, mais clínicos, nos deparamos com uma dificuldade muito grande de trabalhar com pessoas que são especialistas na sua área, mas que, talvez, não sejam especificamente docentes” (Professora Moara, informação verbal 2018).

O impasse se refere ao fato de que a faculdade decide arbitrariamente qual método deve ser aplicado - “aplica-se”, ressalta Maora. O professor, então, reproduz os enunciados, mas com pouca flexibilidade para realizar ajustes estruturais. Isso significa que há pouco espaço para o professor enunciar-se. Outro aspecto igualmente relevante diz respeito aos especialistas contratados como tutores, que não necessariamente têm experiência como docentes e que apenas devem cumprir o programa. Nesse caso, a função de docente reduzida a uma instrumentalização não deixa de ser problemática. De acordo com Voltolini (2019, p. 30),

[...] desapropriado de sua maestria, o professor fica reduzido a ser um chefe, ‘pequeno chefe’, ainda de seu poder não advir de sua competência e de seu valor, mas, antes, da legalidade estabelecida pela instituição. Por outro lado, desapropriado da dimensão de mistério, em prol de uma versão de resolução de problemas, o saber fica anódino, sem gosto, desligado das grandes questões da vida.

Lacan (1972-73/1985LACAN, Jean-Jacques O Seminário: livro 20: Mais, ainda, livro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985. (Trabalho original proferido em 1972-1973)., p. 132) constatou que tudo será resumido, de acordo com a visão de Marx, em um valor de troca. Na versão do discurso do capitalista, rejeita-se o ser, despreza-o, há um “despreço” pelo sujeito. Embora seja aquele “o que faz preço-único”. Assim, conclui: “Estamos nos tempos dos Supermarkets, então, temos que saber o que somos capazes de produzir mesmo em matéria de ser”.

Embora lecionar no curso de medicina seja fonte de prazer, o modelo de ensino adotado expropria o professor de poder transmitir a sua experiência, ele não pode se enunciar ou fá-lo como bastante limitação, como destaca Moara em relação à sua identificação com a docência: “Eu escuto com frequência alguns colegas dizerem hoje assim: ‘Eu não sou professor. Eu estou professor’”. (Professora Moara, informação verbal, 2018).

Essa reflexão é seguida, em forma de síntese, por alguns enunciados, a partir dos quais a professora, diante da avalanche da tecnologia e das formas de submissão ao modus operandi, fala de sua anulação: “Ah, eu sou índia, eu não sou cacique, ? Então, a gente é empurrado goela abaixo. Ah! O cacique manda e o índio tem que cumprir. E é imposição mesmo”, conclui Moara. Podemos destacar, diante da oposição índia versus cacique, que há o tom de obediência, insinuada pela professora e determinada por um saber programado que estrutura a discursividade da tecnologia. Essa posição,

do lado do oprimido a obediência vem como último recurso para dar sentido a uma existência que parece testemunhar o impossível [...]. Fazendo parte da “máquina”, o indivíduo encontra seu mundo, sob a figura do destino ou de qualquer outra ideia similar (COSTA, 1991COSTA, Jurandir Freire. Psiquiatria Burocrática: Duas ou três coisas que sei dela. In. ARAGÃO, Luiz Tarlei; CALLIGARIS, Contardo; COSTA, Jurandir Freire (Org.). Clínica do social: ensaios. São Paulo: Escuta, 1991. , p. 44-45).

Afinal, ela é índia, seu nome é Moara. E, como índia, não nomeia a si mesma como cacique! O cacique, assim, será sempre outro

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando os limites deste artigo, exploramos os efeitos da incidência do discurso tecnológico na formação acadêmico-profissional, como desdobramento do discurso capitalista cria enunciados que se tornam suporte discursivo e significantes mestres por meio dos quais o docente pode não somente alienar-se, mas também satisfazer-se, levando em consideração o tipo de instituição voltada aos grandes grupos educacionais dedicadas ao ensino em massa, vinculados às instituições financeiras, com qual trabalhamos em nossa pesquisa. Nesse sentido, não aprofundamos o modo como ensino hibrido é desenvolvido em outras instituições de ensino superior públicas, mas reconhecemos o seu potencial e a possibilidade de sê-lo desenvolvido de forma diferenciada tanto para a pós-graduação quanto para a graduação. Esse modelo de ensino combina elementos presenciais e virtuais, proporcionando uma experiência mais dinâmica, enriquecedora e adaptativa para os alunos, que serão capazes de desenvolver habilidades essenciais, como trabalho em equipe, pensamento crítico e resolução de problemas complexos, estando desse modo mais adaptados e alinhados às demandas da vida contemporânea.

É importante ressaltar que a implementação de um ensino híbrido diferenciado requer sobretudo planejamento adequado, formação dos professores e infraestrutura tecnológica. É necessário garantir que os estudantes tenham acesso aos recursos necessários e possam também receber o suporte adequado para aproveitar ao máximo essa modalidade de ensino.

Porém, diante das condições postas pelas instituições de ensino superior estritamente mercadológicas, a nossa análise é que, às voltas com a sua função deslocada, o mestre complacente, como um instrumento de todo o processo, também pode se sentir aliviado em poder responder às demandas que lhe conferem um lugar semelhante ao de um assessor. Embora ele padeça nesse sistema, no exercício dessa assessoria, ele também sabe reconhecer a inconsistência do Outro, apesar de mostrar-se consistente, do ponto de vista da avalanche dos métodos, do controle e da busca da homogeneização. Assim, se há um alívio da responsabilidade de um fracasso, o qual pode ser compartilhado entre alunos e professores, todos não podem se livrar do peso e das implicações de suas relações com o gozo.

Esse gozo será, de alguma forma, (re)embolsado pelas instituições, pois oferecem ao professores múltiplas possibilidades - embora precárias - de exercício da docência na universidade mercantilista. Finalmente, o mestre participa da linha de produção ao ocupar múltiplos lugares. O que nos chama a atenção, como discutimos anteriormente, é a promessa de profissionalização disseminada pelo acesso mais democrático à universidade que estimula os jovens à procura de “estabilidade profissional”. O professor, inicialmente, adquire um comportamento técnico e é expropriado de seu pensamento crítico.

A exemplo de Moara, acreditamos que muitos professores forçosamente ao aderir a instituições privadas de ensino superior, até por questões de sobrevivência profissional e pessoal, tendem a fazer uso do cabedal tecnológico e híbrido imposto por tais instituições. Isso lhes permite negar ou camuflar suas próprias faltas, deficiências, tiranias, más-formações, fragilidades conceituais, políticas e sociais, apoiando-se em significantes mestres que tal cabedal lhes oferta: plataformas virtuais, atividades síncronas e assíncronas, conteúdos apostilados, módulos facilitadores, metodologias ativas, avaliações mediadas, tutorias etc. Ao apoiarem-se nesses significantes, eles passam a demandar do outro - seus alunos - os saberes não apenas de domínio dos conteúdos, mas, sobretudo, dos usos da maquinaria tecnológica que lhes permita acessar tais conteúdos. Os alunos devem, então, converter tais saberes e adesões à maquinaria em produtos (muitas vezes, sob a forma de rankings) que devem ser consumidos por todos: alunos, professores, instituições e sistemas em geral. Ilustram, isso, as próprias avaliações internas das instituições, o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), o Conceito Preliminar de Curso (CPC) e o próprio Índice Geral de Cursos Avaliados da Instituição (IGC).

Obviamente, os produtos constituídos como rankings, em uma espécie singular de brilho fálico, fazem todos gozar. Todos usufruem pulsionalmente dessa inequívoca satisfação: Moara, certamente, ao ascender ao corpo docente de medicina e ter melhores resultados, mas não diferente de tantos outros, cada um a seu modo. Só não sabem que, ao proceder assim, ao aderir ao imperativo tecnológico, ranqueado e, por isso, gozoso, eles se fixam na condição de objetos, coisificam-se e igualam-se a eles. Uma vez alienados, como suspeitamos, tornam-se objetos de consumo, objetos manejáveis tanto quanto descartáveis. “Seu ato de educar se declina. Não há laço social, nem pedagógico suficientes, pois o docente tenderá a se objetificar ao se emparelhar aos objetos que consome” (PEREIRA, 2016PEREIRA, Marcelo Ricardo. O nome atual do mal-estar docente. Belo Horizonte: Fino Traço , 2016. , p. 195).

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  • 2
    No Brasil, existem diferentes modalidades de instituições educacionais privadas. Dentre elas, destacam-se de longa data as instituições filantrópicas, vinculadas geralmente a entidade religiosas, assim como as empresas limitadas e as sociedades anônimas de capital fechado e de capital aberto. Nesta discussão estamos privilegiando as instituições que atuam como empresas que têm capital aberto, e nesse sentido negociam seus títulos de propriedade na bolsa de valores. (Front, 2020).
  • 3
    Em recente reportagem, cerca de 90 professores foram demitidos de uma instituição. Para ocupar o lugar dos docentes, robôs passaram a ser utilizados. O texto, na íntegra, pode ser consultado em: https://apublica.org/2020/05/apos-uso-de-robos-laureate-agora-demite-professores-de-ead/
  • 4
    O Ministério da Educação publicou a Portaria nº 2.117, de 6 de dezembro de 2019, que dispõe sobre a oferta de carga horária na modalidade de Ensino a Distância - EaD em cursos presenciais de graduação. As IES poderão introduzir a oferta de carga horária na modalidade EaD na organização pedagógica e curricular de seus cursos de graduação presenciais, até o limite de 40% da carga horária total do curso.
  • 5
    Ferenczi criticava o fato de que a hipnose aplicada na análise exercia influência extrema do analista em relação ao seu paciente. Ao estabelecer um paralelo com os aspectos pedagógicos no que se refere à educação das crianças, o autor faz alusão de que os adultos, ao buscarem implantar a sua autoridade sobre a criança, acabam exercendo-a de forma violenta (PECHBERTY, 2019).
  • 6
    Referente ao “complexo de castração” que, para Freud, é o conjunto das consequências subjetivas e inconscientes que determina a submissão do sujeito às normas sociais. Sua função normalizante representa a imposição de limites por meio dos quais cada um deve regular seu gozo ou suas satisfações pulsionais (CHEMAMA, 1995).
  • 7
    “Significante-mestre (S1), significante do saber (S2), sujeito barrado ($) e objeto pequeno a (autre, em francês): como causa de desejo ou mais-gozar” (PEREIRA, 2008, p. 128).
  • 8
    Essa pesquisa seguiu os trâmites das diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas que envolvem seres humanos, segundo orientações da Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, aprovada pelo Comitê de Ética na Pesquisa (COEP)/UFMG, sob o número CAEE - 66241417.0.0000.5149. Durante as entrevistas, os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido. Agradecemos à CAPES pelo financiamento da pesquisa.
  • 9
    Nome fictício de origem indígena que significa “ajudar a nascer, aquela que auxilia no parto”. Utilizamos em analogia ao lugar ocupado pelo professor no discurso tecnológico, o lugar do outro, quem trabalha para fazer a verdade do discurso brotar.
  • 10
    Durante o trabalho de campo, fizemos uso do diário de bordo no qual registrávamos impressões decorrentes da entrevista e relatos feitos após o término da conversa registrada em gravador.

Editado por

1
Editora-Chefe participante do processo de avaliação por pares aberta: Suzana dos Santos Gomes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    01 Mar 2022
  • Aceito
    01 Nov 2023
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