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Não é oportuno agora

CONTRA

Não é oportuno agora

Vladimir Palmeira

Militante do PT e foi candidato a senador pelo PT-RJ, nas últimas eleições

Vivemos o ocaso da ditadura militar. Infelizmente, o movimento dos trabalhadores é ainda muito fraco. A questão do assalto ao poder não está colocada para nós. A tendência atual é de que, no lugar da ditadura militar, venha um regime democrático autoritário, o que quer dizer que mesmo algumas reivindicações democráticas teoricamente conquistáveis no capitalista (direito de greve, autonomia sindical, por exemplo) não seriam atendidas.

Neste quadro, há muita gente que diz o seguinte: já que o poder não vem, vamos lutar por uma Constituinte, que possa ao menos garantir a vitória em algumas de nossas lutas. E esta gente, na maioria bem intencionada, cai, no fundo, no conformismo. E, ao invés de ajudar o movimento, contribui para fechar suas saídas.

Se não podemos disputar já o poder, isto não quer dizer que nos conformemos. O movimento dos trabalhadores em todo o mundo se faz na maior parte do tempo contra a corrente. Quem quer ser de esquerda não pode apoiar o que é a tendência dominante, de qualquer jeito, senão vai apoiar quase sempre as políticas dos poderosos. Se não podemos assaltar o poder, nossa política é feita para criar as condições necessárias para que esta questão se coloque e de modo mais favorável para nós.

Fazemos isto travando aquelas lutas mais chegadas à realidade da classe trabalhadora e que mudem a situação favoravelmente para nós. Lutando pela reforma agrária, pelo direito de greve, pelo salário-desemprego, por eleições diretas. Nestas lutas, acumulamos força e consciência, o que nos permite ter como desdobramento um forte movimento político dos trabalhadores.

E lutando desta forma que podemos ver amanhã colocada a questão do poder para a classe trabalhadora. Alterando a relação de forças na sociedade. Vendo um amplo movimento dos próprios trabalhadores. Além disso, é lutando deste jeito que poderemos, mesmo se a questão do poder não chegar a ser colocada, ver atendidas algumas das reivindicações que nos permitirão ter ao menos alguns direitos fundamentais em uma democracia que não é feita para nós. Ou seja, é deste modo que, se não podemos ter tudo que queremos, teremos pelo menos mais força e mais espaço de atuação.

Uma Constituinte agora não garante nada. Quando o pessoal fala que com ela teremos direito de greve e autonomia sindical está completamente errado. Uma Constituinte hoje, quando nosso movimento é ainda muito fraco, serve mais para legitimar a nossa falta de direitos do que para conquistá-los. Ela não é, portanto, a forma de lutar por reivindicações que são comuns aos que a defendem e aos que não a defendem.

Vamos pegar agora aqueles que afirmam que a Constituinte nos leva a colocar a questão do poder para os trabalhadores. Para eles, já há uma revolta muito grande entre os trabalhadores. A luta pela Constituinte e sua convocação permitiriam que os trabalhadores ampliassem suas possibilidades de luta e chegassem a se organizar diretamente na luta pelo poder.

Em primeiro lugar, estes companheiros não vêem que o crescimento de nosso movimento é muito reduzido para se falar em revolta popular. Em segundo lugar, já vimos que uma Constituinte hoje consagra uma relação de forças desfavorável. Em vez de abrir espaços para o avanço do movimento, ela pode congelá-lo, criando uma legislação restritiva mas que terá sido criada por deputados eleitos pelo voto.

A convocação de uma Constituinte, então, aprisiona nosso movimento. Não facilita nossos objetivos imediatos. Não nos aproxima do poder.

Já são motivos de sobra que explicam por que não é oportuno lutar por uma Constituinte agora.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Jan 2011
  • Data do Fascículo
    Dez 1984
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