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"Comisiones obreras": um sindicato de novo tipo?

TRANSIÇÕES POLÍTICAS NA AMÉRICA LATINA

ARTIGOS

"Comisiones obreras": um sindicato de novo tipo?* * Este estudo foi feito no âmbito de um programa de trabalho de pós-doutorado realizado na Espanha (Universidade Complutense de Madri), no período outubro/86 a outubro/87, e faz parte de uma pesquisa mais ampla, em curso, sobre "conselhos operários". O desenvolvimento desse programa foi possível graças a afastamento e bolsa de estudos concedidos respectivamente pela Universidade Estadual Paulista - Campus de Marília e CNPq, instituições às quais apresento os meus agradecimentos.

Cândido Giraldez Vieitez

Professor de Sociologia na UNESP

1. INTRODUÇÃO

Num artigo publicado na revista "Gazeta Sindical"1 1 Gazeta Sindical, nº 52, junho de 1987. , como contribuição ao 4? Congresso do Sindicato "Comisiones Obreras" que se realizaria em novembro de 87, Marcelino Camacho, que é a figura histórica mais proeminente da organização, refere-se à mesma nos seguintes termos: "(as 'Comisiones Obreras') nascem por volta de 1956". "Poucos podíamos pensar naquele momento que estávamos na presença do nascimento de um sindicalismo de novo tipo." "No plano sindical, trata-se do acontecimento mais importante do último século."

Será realista esta afirmação de Camacho? Ou trata-se de uma observação de quem se encontra profundamente comprometido com sua própria obra? Isto é o que tentaremos discutir neste estudo.

De qualquer modo podemos adiantar que essa afirmação não é inocente, e sim grávida de ressonâncias políticas, orgânicas e teóricas. Isto porque Camacho, bem como muitos outros militantes que tiveram um peso decisivo na consagração do sindicato "Comisiones Obreras", além de políticos do movimento sindical, eram também homens profundamente comprometidos com o Partido Comunista da Espanha.

Qualquer que seja a natureza atual das "Comisiones" uma coisa é certa: o seu processo de construção não foi um mar de calmaria mas uma duríssima altercação com vários componentes do movimento operário, históricos e contemporâneos, internacionais e nacionais. E ao mesmo tempo, portanto, um esforço considerável para tentar demarcar os parâmetros de um caminho novo para as organizações "laborais" da classe operária.

O principal da problemática com a qual o Sindicato "Comisiones Obreras" teve de se haver no transcurso de sua trajetória constituinte, e à qual as palavras de Camacho elipticamente aludem, pode ser resumida como segue.

O período revolucionário aberto pela revolução russa de 1917 introduziu no cenário político internacional da classe operária o fenômeno dos conselhos (soviets, comitês de fábrica etc.).2 2 Os conselhos da abortada revolução de 1905 não tiveram repercussão internacional significativa.

Subitamente, para tantos teóricos e tendências do movimento operário, os conselhos passaram a ocupar no horizonte da revolução a posição de organizações revolucionárias por excelência.

Em consonância com este acontecimento não foram poucos ou inexpressivos aqueles que, pondo em destaque o reformismo largamente disseminado até então entre os sindicatos - sobretudo nos países avançados -, denunciaram esta organização como sendo intrinsecamente inadequada para a preparação da revolução e, incontinenti, passaram a postular a criação de conselhos.

Infelizmente, a grande esperança depositada nos conselhos como agentes da revolução imediata não pôde transcender os anos 20. A conjuntura revolucionária refluiu, e com ela, os conselhos deixaram de ocupar a boca da cena histórica.

Não obstante, a semeadura que haviam trazido consigo já tinha sido feita, de modo que daí em diante, várias correntes do movimento operário, que abusivamente chamaremos aqui de "conselhistas" de vários tipos, passaram a privilegiar os conselhos como sendo órgãos portadores de uma dupla e essencial determinação: a) como organizações fundamentais para a tomada do poder e b) como forma básica de organização através da qual a classe operária exerceria seu governo.

Entrementes, na União Soviética a vida tomou um rumo bastante diferente daquele que fora previsto. De saída ainda sob Lenin, o exercício do governo através de um sistema de conselhos já revelara dificuldades muito maiores do que aquelas que se supusera. E em seguida, com o início da era Stalin, os soviets foram relegados a uma evidente obscuridade política.

Pode-se constatar, então, duas coisas. Por um lado, depois da conjuntura revolucionária ou para-revolucionária dos anos 1917-1920, não surgiu nenhum movimento comparável ao daqueles anos. E bem mais tarde, quando isto ocorreu, nenhuma revolução foi levada a termo tendo como pivô dos acontecimentos os conselhos. Por outro lado, no seio do movimento operário internacional majoritário, e exatamente por influência do stalinismo, o tema dos conselhos, que ironicamente adquirira uma dimensão clássica justamente com os bolcheviques, caiu no mais abstruso ostracismo, vindo inclusive a ser objeto de anatematização.

Pode-se dizer que essa situação permaneceu nesse pé até 1956, quando então a denúncia do stalinismo apresentada pelo XX Congresso do PCUS abriu uma crise de larguíssimo alcance no campo dos PCs em praticamente todo o mundo.

Despedaçada a camisa-de-força stalinista, que contribuíra tão decisivamente para manter o movimento comunista num trilho estreito, o terreno foi se abrindo vagarosamente para os vários temas que, outrora, tinham alimentado a reflexão teórica e a polêmica político-ideológica.

Os comunistas espanhóis encontravam-se no bojo desse processo de crise orgânica e ideológica, quando as primeiras manifestações relativas ao aparecimento dos conselhos na Espanha, fizeram com que tivessem de encarar o tema de frente.

Devido à tradição existente a tarefa não pôde ser fácil para os comunistas. De qualquer maneira, e face à falência do stalinismo, esta questão articulou-se com a necessidade de um amplo reposicionamento político-ideológico. Deste modo, no fim das contas, a opção do PC pelo trabalho com as "comissões operárias" ("comisiones obreras" ou "CC.OO.") esteve em consonância com as diretrizes programáticas que tentariam dar conta de uma Espanha capitalista em rápido processo de modernização: bem como com a vontade de voltar a examinar com uma certa isenção o legado prático e teórico do marxismo.

Que questões derivavam desse legado no que tange à organização do movimento operário, assim como em relação ao papel que nele deveriam desempenhar os conselhos?

O aparecimento da forma conselho propiciara o surgimento de várias interpretações quanto às suas possíveis virtualidades. Formaram-se, inclusive, como indicamos anteriormente, várias tendências "conselhistas". Entretanto, Trotski e Lenin, que - excetuando as análises de Marx sobre a Comuna - foram os primeiros a teorizar o papel dos conselhos, não eram conselhistas, ou seja, não viram nessa forma de organização nenhuma panacéia revolucionária. Em suma, o aparecimento dos conselhos no cenário histórico, entre outras coisas, serviu também para instaurar um debate - até hoje não superado - que coloca em tela de juízo as funções e natureza dessas organizações.

A problemática envolvida nesse debate é multifacetada. O principal, porém, move-se em torno de um eixo que se pergunta sobre as virtualidades dos partidos, dos sindicatos e dos conselhos, como organizações pressupostamente "demiúrgicas" do processo de transformação social radical.

Os comunistas do PC que atuaram nas "Comisiones" encontravam-se a bastante distância de qualquer tipo de "conselhismo". E, no entanto, uma vez tendo admitido a pertinência do tema no movimento operário, não puderam manter-se imunes à sua influência. Foi esta influência, com seus aspectos positivos, mas também com suas controvérsias e pontos débeis, que levaram os militantes das "Comisiones" ao terreno da pesquisa e da experimentação organizativa que, no final, permitiu que se sentissem autorizados a falar em sindicato de novo tipo.

A referência que acabamos de fazer, por si só seria suficiente para que examinássemos o caso das "Comisiones" com cuidado. E, não obstante, há elementos complementares que devem ser acrescentados.

Para começar não é sem importância observar que a "Confederación Sindical de Comisiones Obreras - CS de CC.OO." é hoje - juntamente com a "Unión General de Trabajadores" (UGT), uma das centrais sindicais de maior peso político e de maior penetração na classe operária em particular e trabalhadora em geral - e é bastante provável que seja inclusive a de maior peso, uma vez que nas médias e grandes industrias é frequente encontrar sua hegemonia.

Além disso também é digno de nota o curto espaço de tempo no qual a organização foi construída a partir praticamente da estaca zero, isto é, entre os anos 1958 e 1978. Deve-se ainda recordar e levar em consideração que sua formação, assim como uma boa parte de sua trajetória, consumou-se durante o período em que foi também necessário arcar com o peso repressivo da ditadura franquista.

Enfim, a organização das "Comisiones" merece a atenção de quem quer que se interesse pelo movimento operário. Não porque o seu modelo de organização e atuação sindical possa ser transplantado automática e mecanicamente para outro país. Mas porque os problemas que colocou e as soluções que engendrou apresentam um eco de interesse geral. Quanto a isto, pode-se muito bem afirmar que, se tentar importar para um país, "imitativamente", as equações políticas encontradas em outro é falta de bom senso e de "malícia" histórica, falta de bom senso também é não levar na devida conta essas experiências originais, nas quais o particular é tão prenhe de elementos de universalidade.

FORMAÇÃO DO MOVIMENTO DAS "COMISIONES OBRERAS" - 1956-1964

A formação espontânea, em 1958, de uma "comisión obrera" na mina de "La Camocha", em Astúrias, é comumente citada como sendo o acontecimento que inaugurou o movimento. Daí em diante foram se formando "comisiones" em quase todas as regiões industriais da Espanha.

O que eram "comisiones obreras"? "Comisiones Obreras" eram conselhos ou comitês de empresa. De fato, inicialmente e numa primeira fase, tratava-se de uma organização elementar bem conhecida na história do movimento operário. Os trabalhadores de uma unidade econômica ou de um setor da mesma formam um pequeno comitê ou conselho - que pode ser eleito, cooptado ou autoformar-se - para apresentar uma reivindicação, dirigir uma greve etc, dissolvendo-se quase sempre em seguida.

Nesta acepção elementar, a irrupção no cenário espanhol das "comisiones" pode ser entendida como uma manifestação política imanente, imediata e direta do "trabalhador coletivo", face a certas particularidades presentes na sociedade e, em especial, a nível das relações de produção.

Que peculiaridades eram essas? As mais salientes foram as seguintes:

1. O "boom" do capitalismo industrial. De 1939 a 1951 a Espanha viveu um período de estancamento e de autarquia fascista (fim da guerra civil, transcurso da grande guerra etc).

A partir de 1953, entretanto, iniciou-se um processo de industrialização que culminaria por situar o país, nas décadas seguintes, praticamente na fronteira das nações desenvolvidas.3 3 Cf. El País, 23.08.87.

A industrialização foi rápida e intensa. E os problemas não foram menores. Salários muito baixos. Migração massiva do campo para a cidade. Aparecimento do "chabolismo" (favelas). Em suma, o quadro conhecido nos processos de industrialização capitalista rápida e "despreocupada".

De qualquer modo, a industrialização do país, feita em boa parte com o concurso do grande capital estrangeiro, trouxe consigo um significativo crescimento da classe operária, a qual passou a contar com setores inteiros empregados em médias e grandes indústrias. Aliás, não se tratou apenas do crescimento, mas da própria reformação de uma classe operária que em boa medida passou a ser constituída por um contingente jovem, recém-emigrado do campo, que não possuía tradição de organização e luta, mas que se defrontou com o impacto das condições de vida operária.

2. A organização da desorganização operária. A contrapartida do desenvolvimento da classe operária foi a ausência de qualquer canal reivindicativo próprio que pudesse representar seus interesses, pois, em continuação ao término da guerra civil, o regime franquista implantou a organização da desorganização operária.

Isto foi feito basicamente de dois modos. Pela organização monopolista de um "sindicato vertical" (nacional-sindicalismo), no qual deveriam participar em condições de "igualdade" o Estado, os patrões e os trabalhadores; e através da repressão eficaz montada pelo regime contra qualquer atividade de oposição política.

O sindicato vertical, naturalmente, nem constituía uma organização operária (malgrado o nome), nem muito menos representava os trabalhadores. E a repressão, por seu turno, foi suficientemente competente para, aberta a década dos cinquenta, reduzir a praticamente nada as tentativas de ação desenvolvidas clandestinamente péla "Unión General de Trabajadores" (UGT, socialista), pela "Confederación Nacional del Trabajo" (CNT, anarco-sindicalista), pela "Oposición Sindical Obrera" (OSO: comunista), assim como por outras agremiações de menor expressão.

3. A política sindical do PC e dos católicos ou a "espontaneidade provocada". A coexistência de um capitalismo industrial plenamente configurado com uma classe operária exercitando suas funções no processo de trabalho como "trabalhador coletivo", explorada, subordinada, e ao mesmo tempo "livre", mas despojada de qualquer instrumento a partir do qual pudesse veicular suas reivindicações, e assim sendo dar uma certa vazão à conflitividade acumulada; criara as premissas fundamentais para a emergência ("imanente") das "comisiones obreras".4 4 Esta é provavelmente a determinação básica. Mas neste caso, fica como uma questão aberta à pesquisa, o que poderíamos chamar aqui de tradições históricas fortemente descentralistas da nação espanhola. Essas tradições vão desde a forte presença das várias nações no Estado espanhol, passando por um centralismo estatal que sempre esteve sujeito a forças centrífugas, até chegarmos ao anarco-sindicalismo tão pronunciado no passado, aos conselhos republicanos durante a guerra civil, e à própria presença dessas tradições na organização do sindicato franquista através dos "jurados de empresa".

Aliás, na literatura sobre as "Comisiones", lê-se reiteradamente que estas surgiram espontaneamente das profundezas das fábricas, que não foram invenção de uma organização ou de alguém.

E de fato, nas circunstâncias, o mais provável é que, enquanto organismos elementares, de vida lábil, entrecortada, as "comisiones" tivessem tido uma presença relevante mesmo se não tivessem existido outros impulsionadores que não os "naturais". Mas estes existiram. E, sem dúvida alguma, tiveram importância no florescimento e, mais ainda, como veremos mais adiante, no tipo de desenvolvimento que viriam a ter as "comisiones". Por isso, aqueles que têm plena consciência do fenômeno referem-se a seu aparecimento.não simplesmente como a um acontecimento espontâneo, mas como a um caso de "espontaneidade provocada".5 5 SARTORIUS, N. Qué Son las Comisiones Obreras, La Gaya Ciência, 1976. Ademais, a partir do momento em que a classe operária trouxe à luz suas organizações, é muito pouco provável que os acontecimentos subsequentes e importantes do movimento operário venham a ocorrer de um modo completamente e propriamente espontâneo. Como muito bem mostrou um estudo sobre 150 anos de greves na França, o fator organização, em algum ou vários de seus desdobramentos, encontra-se freqüentemente por trás, ou atrás, mesmo daqueles fenômeno que eventualmente podem aparecer como espontâneos. Ver Shorter E., Tilly, C. Las Huelgas en Francia, MT, Madrid, 1986.

Quem foram, pois, os "provocadores" dessa; "espontaneidade"?

Há várias siglas. Porém, os destaques ficaram por conta do Partido Comunista e de vários grupos da esquerda católica, os quais, em 196O, fundariam a "Unión Sindical Obrera" (USO)6 6 A maioria dos militantes da USO procediam de grupos cristãos tais como o "Movimento Apostólico", a "Hermandad Obrera de Acción Católica" e "JOC" (Juventude Operária Católica). Cf. Morcillo, FA. e outros. El Sindicalismo de Clase en España (1939-1977), Ediciones 62, Barcelona, 1978. .

A participação desses grupos católicos na ação das "Comisiones" foi, por assim dizer, natural, uma vez que eles estavam chegando ao movimento operário provenientes de uma atmosfera ideológica, na qual algum tipo de "comunitarismo de base" constituía uma âncora que podia repousar perfeitamente sobre os comitês de fábrica.

Já para os comunistas, a opção pela participação e impulsionamento das "comisiones" exigiu uma ginástica política e ideológica mais complicada. No começo dos anos 50 o PC já abandonara sua política de "levantamento nacional", que tinha sido uma herança tática de pós guerra civil. Ultrapassada esta política pelos acontecimentos, o PC passou a investir no movimento de massas através da "Oposición Sindical Obrera". E assim, em 1956, o PC, que já andava às voltas com vários outros dilemas, viu-se, também, na contingência de ter de se desfazer de seu trabalho na "Oposición Sindical Obrera" para embarcar no ainda incerto, mas aparentemente promissor, movimento das "comisiones". De fato os comunistas já vinham atuando nas "comisiones" porque aparentemente eles estavam dispostos a participar de "qualquer" atividade que fosse útil para sacudir a classe operária. Mas então eles ainda não se haviam colocado cabalmente as implicações políticas implícitas na opção por uma organização de movimento operário com base nos conselhos. Entretanto, há indícios de que esta opção, com sua esteira de reverberações políticas, tornou-se mais consciente no Partido a contar desse mesmo ano, sendo que para isto, teve sua importância a impostação política de Santiago Carrillo.7 7 Referindo-se à luta de Vizcaya, um informe de Carrillo - numa reunião do Comitê Central de agosto de 1956 - diz textualmente: "Através das "Comisiones Obreras" estabelecidas democraticamente pelos trabalhadores, tem sido possível organizar a luta. Sem o apoio das "Cornisiones Obreras" o Partido não teria podido dirigir os trabalhadores". Cf. Manuel Azcarate, "La Política de Reconciliación Nacional" em Para Una Historia del PCE, Madrid, FIM, p. 167.

4. Metamorfose do regime político. Um elemento suplementar que foi muito importante para o assentamento generalizado das "comisiones" no sistema fabril está ligado à metamorfose do regime político e, ainda outra vez, à dinâmica da acumulação.

Lá por meados dos anos cinquenta o bloco franquista começou a fraturar-se e a Falange começou a deixar de ser o partido único do regime. Em 1957, a entrada da "Opus Dei" no governo significava que o regime, transformando-se por dentro, punha de lado ressábios autárquicos fascistas e optava claramente por uma política capitalista de corte mais clássico, começando a abrir o país para a Europa e para o capital estrangeiro.

Esta inflexão modernizadora refletiu-se imediatamente na esfera das relações de produção através da "Ley de Convenios Colectivos de 1958", que um documento das "Comisiones" interpretaria nos seguintes termos:

"Para os monopólios espanhóis era vital, com o fim de não serem asfixiados pela pressão interna e externa, aumentar a produtividade dos trabalhadores, ou seja, aumentar e sistematizar a exploração dos mesmos, aplicando as modernas técnicas de racionalização do trabalho, liberdade de demissão etc.... Mas esta operação era irrealizável com as velhas Regulamentações Nacionais do Trabalho, ditadas pelo Ministério do Trabalho, que se bem congelavam os salários também freavam a produtividade do trabalhador. Era, pois, necessário mudar..."

A "Ley de Convénios" abriu na fábrica um espaço para a negociação coletiva entre patrões e empregados. Ao fazê-lo retirou da mesmice os "Jurados de Empresa", que eram a "comissão de empresa" do regime, até então de caráter consultivo e poderes nenhuns. A negociação coletiva exigia um mínimo de representatividade real e, assim, a nova lei abriu as eleições para os "Jurados". Isto permitiu ampliar imediatamente o arco de atuação do movimento operário. E as "Comissões", explorando a ambiguidade introduzida no sindicato oficial pelo próprio regime, aproveitou a circunstância para desenvolver um trabalho político de duplo vetor: a) no plano legal ocupando o pouco espaço de participação oferecido pelos "conselhos de empresa" oficiais, e, b) no plano ilegal, incrementando a organização autônoma da classe através da formação e impulsionamento das "CC.OO." (Comisiones Obreras).

E assim, posicionando-se como um movimento que aspira à legalidade, mas que combina a luta legal com a ilegal, as "Comisiones" adentraram os anos sessenta com os comitês de fábrica marcando sua presença em praticamente todos os pontos importantes da indústria espanhola.

DE MOVIMENTO ESPONTÂNEO A MOVIMENTO ORGANIZADO -1964-1978

Em setembro de 1964, 600 representantes dos trabalhadores elegeram formalmente a primeira "Comisión Obrera" de Madrid. "Depois dessa Comissão do 'Metal' - afirma Julián Ariza, um dos signatários do documento fundamental lavrado naquele evento - "vêm à luz as Comissões de Artes Gráficas, Químicos, Construção, Transporte, Ensino... Paralelamente a Madri surgem em Barcelona, Sevilha, País Basco, Galícia, Asturias, até que em intervalo muito curto de tempo estão presentes em todas as construções industriais e de serviços, assim como em zonas de abundante proletariado agrícola".8 8 Ariza, J. CC.OO., Avance/Manaña Ed., Madrid, 1976, p. 16. 9 Amsden, J. Convenios Colectivos y Lucha de Clases en España, Paris, Ruedo Ibérico, 1974, p. 93.

A essa altura é então evidente que as "Comisiones" transmudam sua natureza, ou seja, deixam de ser um movimento formado por organismos de vida intermitente, que jazem mais ou menos ao sabor das leis de sua "naturalidade", para converterem-se em opção de organização deliberadamente constituída.

Por outro lado, esta transfiguração foi conduzida a partir de mecanismos democráticos de tipo não parlamentar.

"Segundo todos os informes - e permita-se-nos fazer esta citação um pouco longa - as atividades internas a cada um dos níveis organizativos das "Comisiones Obreras" se desenvolvem segundo procedimentos rigorosamente democráticos. Apesar das dificuldades (era ilegal que se reunissem mais de cinco pessoas num mesmo local) todos os problemas eram submetidos a discussão e votação. As numerosas críticas contra as "Comisiones Obreras" nunca abrangeram sua política interna. Em certa ocasião, a revista da "Opus Dei", Mundo, fez notar de má vontade que a nota mais curiosa destes movimentos operários era que pareciam ter nascido sem uma cabeça dirigente. Desde seus inícios, nas "Comisiones Obreras" cada pessoa contava na hora de votar ou de opinar sobre algum assunto, e embora esta aparente falta de organização desaparecesse quando chegava a hora de atuar, no entanto, as diretrizes que havia por trás década ação não podiam atribuir-se pessoalmente a ninguém."

E, contudo, não é correto supor, como já indicamos, que o trajeto das "Comisiones" tenha sido traçado integralmente pelas bases, como uma criação sua, completamente espontânea. É perfeitamente plausível que os procedimentos deliberativos da organização tenham sido tão democráticos quanto os apontados. Mas isto significava apenas - e este apenas é muitíssimo - que as "Comisiones" deliberavam a partir de um sistema que não era simplesmente democrático, mas um sistema democrático de tipo operário, um que estava assentado em assembleias operárias de base.

Nas bases, entretanto, há que distinguir entre os trabalhadores comuns e os militantes organizados em vanguardas que transcendem o sistema das "Comisiones" (igrejas, partidos, sindicatos etc).

Os militantes, organizados segundo suas respectivas matrizes político-ideológicas, tendem a exercer sobre a massa operária uma função diretiva. Vários são os fatores que lhes permitem desempenhar esse papel. Mencionamos apenas p da organização extra-"comisión" a que pertencem, que lhes fornece um critério de disciplina, coesão, respaldo, programa etc, e o fato de que representam o elo saliente através do qual se dá a articulação entre a teoria e a prática, ideologia e movimento operário.

Quando examinamos as primeiras manifestações da vida incipiente das "Comisiones", não é nada simples distinguir aí o que foi produto imanente e espontâneo da atividade e, sobretudo, da lógica dos conselhos, e o que, foi produto, mesmo que mediatizado pelo próprio processo democrático interno das "Comisiones", de uma vontade consciente "externa" (relativamente externa).

Curiosamente, os "teóricos" das "CC.OO." reafirmam sempre que a mesma não teve teóricos; que a construção de seu conceito foi sendo realizado pela práxis coletiva da organização e que, aos poucos, foi sendo condensado pelos dirigentes (amiúde coletivamente) em documentos que constituíram a sua verdadeira teoria.

Contudo, os militantes das "CC.OO." que estavam também em outros tipos de organizações, e que justamente se organizavam ali principalmente segundo um critério ideológico, não participavam nas "CC.OO." como se suas cabeças fossem uma massa virgem de idéias políticas, senão que ao contrário, aportavam à dinâmica das "CC.OO." as idéias e preferencias de suas respectivas, agremiações, que ali, na dialética política própria das "Comisiones" podiam ser incorporadas, rejeitadas ou mais ou menos incorporadas.

Assim, das várias correntes políticas que participaram nas "CC.OO.", os comunistas, e sobretudo os do PC, interpretaram o papel principal, tanto em relação ao desenvolvimento político da organização, quanto ao "formato final" que a mesma veio a adquirir.

Exatamente as relações que existiram entre a política do PC e a edificação das "CC.OO.", não é coisa que possamos estabelecer aqui. Desde logo, não se trata, como já deve estar claro, de que o PC tenha "inventado" o conceito das "Comisiones" e através de seus militantes tenha-o inculcado ao movimento operário.Trata-se, isto sim, de que o PC vivia por essa mesma época um processo de revisão de suas concepções políticas; e que as novas concepções que resultaram desse processo, em seus balizamentos de fundo, encontram-se em muito boa sintonia com as próprias concepções que foram sendo elaboradas pelas "Comisiones".

Aclararemos algo deste argumento se indicarmos, ainda que rapidamente, alguns dos elementos de moldura que intervieram nas reformulações do PC:

1. O XX Congresso do PUCS, em 1956, que marcou o início da "desestalinização", foi um dos acontecimentos de maior gravidade para o PC, uma vez que, subitamente, viu-se às voltas com dolorosos acontecimentos. Em verdade tudo o que era correto e seguro tornou-se incerto. Tudo que era sagrado foi profanado e a igreja do socialismo revelou ser apenas um templo pagão;

2. Com a crise do comunismo internacional o PC viu-se obrigado a tentar renovar suas energias na fonte de um marxismo menos "datado". E, aparentemente, isto favoreceu, seu reencontro com importantes tradições do pensamento marxista que o sistema stalinista tinha relegado à crítica roedora dos ratos.

Quanto a isto, não terá sido por acaso que os militantes Nicolás Sertorius e Marcelino Camacho, que através de algumas poucas brochuras muito percucientes atuaram como verdadeiros "teóricos" das "Comisiones", na sua obstinação em não se referirem às fontes de suas influências intelectuais, só abriram exceção para mencionar o nome de Antonio Gramsci.

O resultado dessas reelaborações do PC foi chamado, em suas linhas gerais, "eurocomunismo". O fenômeno do assim chamado "euro-comunismo" é complexo. As interpretações do mesmo são controvertidas e não nos cabe aqui examiná-las. Por isto, nos limitamos a enumerar uns quantos elementos postos por uma vertente interpretativa que julga ver nas raízes desse pensamento as obras de Antônio Gramsci e Rosa Luxemburgo.10 10 Pilar Brabo, "Los Orígenes del Eurocomunismo" em Para Una Historia del PCE, op. cit., p. 199. Segundo este modo de ver, portanto, a política "euro-comunista" seria uma espécie de "guerra de trincheiras" pontualizada pelos seguintes elementos: a) o comunismo como objetivo; b) uma concepção democrática do socialismo; c) a revolução como movimento de massas; d) centralismo democrático (e não burocrático); e) organização dos conselhos de fábrica como instrumento de base de organização da hegemonia operária (superação do economicismo do sindicalismo tradicional); 0 revalorização da atividade parlamentar vinculada ao movimento de massas etc.

O PROGRAMA DAS "CC.OO."

Isto posto, retomemos o teatro de operações das "CC.OO," Em março de 1966, em Madri, como resultado de um trabalho coletivo, vem a público o documento "Ante el Futuro del Sindicalismo" que, em suas linhas mestras, enunciava o que se poderia chamar de um "programa" das "CC.OO."

O tom e o conteúdo da rápida apresentação desse documento apreende muito bem o "ethos" que se procurou imprimir às "Comisiones", Diz assim:

"Depois de quatro meses de um diálogo fraternal e sincero, um grupo de militantes do MO encontramos as bases sobre as quais cremos que poderia desenvolver-se a luta unida dos trabalhadores. Nenhum exclusivismo nem espírito de grupo nos animou a fazer este trabalho. Ninguém pretendeu que triunfasse uma ou outra parte das tendências que atualmente tratam de representar aos trabalhadores e à realidade de sua luta..."

Este "ethos" é, sem dúvida, reflexo de certas posturas político-ideológicas. Mas é mais que isso. É também reflexo de algo que é característico dos conselhos operários, ou seja, a capacidade de funcionarem como organismos unitários de frente operária numa conjuntura crítica; seja porque a energia liberada pela classe é pequena e se necessita do máximo de solidariedade para iniciar um empreendimento (as "Comisiones"), seja porque a classe operária irrompe explosivamente no teatro político - global ou setorialmente - e as organizações existentes tornam-se estreitas para conter e canalizar a energia liberada e as funções requeridas (soviets na Rússia).

Passemos em seguida a examinar o "programa" em seus principais tópicos.

AUTONOMIA E UNIDADE

O princípio de autonomia e o princípio de unidade foram duas vigas mestras sobre as quais se desenvolveria a política das "Comisiones".

Estas declaram-se como sendo um movimento organizado da classe operária, completamente independente do Estado, dos patrões, dos partidos ou de quaisquer outras organizações ou instituições.

A refutação do sindicato vertical aí contida é evidente. E a reivindicação do direito de livre associação dos trabalhadores idem. E, no entanto, é igualmente certo que o "movimento", ao enunciar esse princípio de autonomia, também tratava de rever severamente a tradição que tinha reinado até outro dia, a qual considerava que as organizações "laborais" de massa da classe operária deviam atuar como "correias de transmissão" do Partido.

Na política das "CC.OO.", o princípio de autonomia estava para o princípio de unidade como o oxigênio está para a chama.

Nenhuma força operária na Espanha defendeu tão insistentemente e com tanta eloquência esse princípio.

E não se tratava apenas de que a velha tese de unidade sindical fosse tão cara aos comunistas. Em verdade, e este foi um fator tático importante, não se pode ter dúvidas quanto ao fato de que o florescimento das "Comisiones" teve muito a ver, sobretudo nos anos de formação, com a habilidade do movimento para cultivar a cooperação dos disparatados grupos políticos que nele atuavam (como era o caso, por exemplo, dos católicos de esquerda, cujo anticomunismo constituía uma séria dificuldade para seu engajamento).

Deste modo, é com o claro intuito de fortalecer o princípio de unidade, de tentar equacionar a praga do fracionamento no movimento operário, que já nesse primeiro documento - "Ante el Futuro del Sindicalismo" -, as "CC.OO." avançam um conceito que viriam a incorporar em sua prática subsequente. Contra uma eventual "ditadura" da maioria, lançam uma espécie de carta de direitos das minorias.

"(...) consideramos - podemos ler - que no autêntico sindicalismo operário, deve haver um respeito pelas diversas tendências que em seu seio possam manifestar-se. Por isso, as assembléias constituintes dos sindicatos deverão acordar uma fórmula que evite a ditadura do grupo mais forte ou melhor organizado, compatível com o respeito aos direitos democráticos da maioria. Isto seria garantia de unidade".

E apesar de toda essa preocupação o movimento das "CC.OO." não quer a unidade de organização sindical como decorrência de uma imposição do Estado. Ele defende - sempre defendeu - a unidade a partir da liberdade de ação da classe operária. Por isto, no período de construção e de ilegalidade, as "Comisiones" postulavam que quando a liberdade de organização chegasse, o MO deveria constituir uma única central sindical de acordo com a vontade expressa da classe e através de uma assembleia sindical constituinte.

Apesar de todos esses cuidados, entretanto, o trajeto da unidade de organização do movimento operário não foi percorrido.

Assim, já em 1966, os católicos de esquerda, congregados na "Unión Sindical Obrera", começaram a desligar-se das "Comisiones".

Pela mesma época, a "Unión General de Trabajadores", que apenas começava a recompor suas fileiras no país, negava-se a participar das "CC.OO." sob a alegação de que as mesmas eram monopolizadas pelos comunistas, como também de que não possuíam um perfil de organização configurado claramente como entidade sindical. Com esta recusa a UGT nada mais fazia do que prefigurar o que viria mais tarde.

E, de fato, quando à raiz da morte de Franco foi possível vislumbrar a legalização dos sindicatos; a UGT obstinou-se em não apoiar a idéia de assembléia sindical constituinte.

Desse modo instalou-se o pluralismo sindical. E hoje - quando há organizações com concepções orgânico - programáticas tão distintas e cristalizadas, também não é provável que a unidade esteja ao alcance da mão. Assim mesmo deve ser considerado um avanço que, vez ou outra, em momentos mais ou menos candentes, consiga-se chegar à unidade na luta, o que, por momentos de duração variável, ombreia o principal das forças operárias.

MASSAS, POLÍTICA E REVOLUÇÃO

Três outras categorias completavam o quinteto de conceitos sobre os quais caminhou o movimento: a idéia de transformação da sociedade capitalista; a convicção de que a organização tinha de manter-se intimamente unida à massa operária (bases); e a concepção de que o sindicalismo das "CC .OO." tinha de possuir um caráter sócio-político.

Tomemos uma dessas idéias de cada vez:

Transformação Social

O documento "Ante el Futuro dei Sindicalismo" apresenta-nos o tema da transformação social.

"Os trabalhadores - declara este documento - devem compreender claramente que formam um mundo marginalizado pela sociedade capitalista. Eles são os despossuídos... Porque acreditamos que todos os homens são originalmente iguais em direitos, a sociedade que os enquadra deve ser á sociedade de todos. Para isso é necessário mudar as estruturas da sociedade atual..."

"Com este propósito, os trabalhadores, rechaçando as atenções da sociedade capitalista, que apenas aspira a prolongar sua vigência enganando e comprometendo as massas populares, têm de organizar-se com plena independência para desenvolver os planos que conduzam à sua emancipação e à construção de uma sociedade para todos..."

É o tema do socialismo. Mas é o tema do socialismo não pronunciado. Em sua forma esópica.

A direção das "CC.OO." entende que á luta por reformas é melhorias que o sindicalismo tradicional tem sustentado, ainda que necessária e progressista, tem um alcance de transformação limitado. Obriga o capital a fazer concessões, sem dúvida. Mas não caminha no sentido de produzir uma zona (crítica) de erosão real do sistema.

Então, é patente que as lideranças esforçam-se para que seja reafirmado, e desde logo, o caráter não-reformista do movimento (é que talvez fosse melhor chamá-lo de caráter com intencionalidade não-reformista).

E, no entanto, as "CC.OO." não podem sacudir, ao mesmo tempo e peremptoriamente, as velhas determinações e os velhos dilemas que as acompanham.

A questão central pode ser enunciada assim. Como levar a cabo uma política revolucionária de massas - não de pequenas seitas iluminadas - rio bojo de uma conjuntura reformista (que foi justamente a conjuntura na qual nasceram e se desenvolveram as "comisiones")?

A resposta das "Comisiones" a esse dilema não foi (e não é) nítida. Bem vistas as coisas, na fase de formação e acumulação de forças; encontramos todas as suas comunicações trespassadas pôr essa espécie de esopismo. Se, por um lado, os objetivos imediatos são tenazmente perseguidos e a organização é combativa, por outro lado, as colocações feitas a seu público são prudentes e comedidas.

A literatura de trabalho, pelo menos a de mais alto nível, foi expurgada de qualquer retórica ideológica mais ostensiva. Os textos são breves e encontram-se despojados de jargão revolucionário ou sofisticações. No devido tempo as "CC.OO." enfrentaram-se com o franquismo às escâncaras. Porém, em seus textos de construção inicial, de movimento de comissões, o enfrentamento foi menos com a ditadura em geral do que com a ditadura tal como se manifestava no processo de trabalho.

Em fase posterior, de maturidade orgânica, o "esopismo" foi substituído por uma maneira de falar mais frança. O socialismo é pronunciado com todas as letras. As "CC.OO." parecem colocar-se o problema de "produzir" uma esfera de reformas de novo tipo; de uma qualidade que poderíamos denominar de "reformas não-reformistas". Isto aproximaria a Confederação, aparentemente, de uma política eurocomunista de esquerda. A simples busca de uma maioria parlamentar, ou de um breve período de duplo poder antes de desmantelar o Estado burguês, deve trocar-se por uma estratégia que almeje uma vitória parlamentar e um desenvolvimento de formas de democracia direta, bem como o crescimento rápido de instituições de auto-governo.

Sindicato Sócio-Político

A idéia de sindicato sócio-político arremete contra uma concepção burguesa da política muito encontradiça nos sindicatos na forma de economicismo. Implica, portanto, a reafirmação da concepção operária de que a política, em última análise, repousa sobre determinadas relações de produção.

Por isso, as "CC.OO.", sem pretender confundir-se com o partido político e muito menos substitui-lo, formula o propósito de intervir em qualquer setor da sociedade que julgue pertinente. "Proclamamos o direito - declara o "Manifest Sindical de Catalunya", em maio de 1976, quando a nação já vivia o "destape" - que têm os trabalhadores e suas organizações a intervir no controle e decisão das condições de trabalho e a todos os níveis da empresa, assim como seu direito a intervir de forma decisiva naqueles aspectos da vida comunitária nas quais se decidam questões sociais e econômicas que repercutem no trabalho do mundo operário. Proclamamos o direito do sindicalismo e de todos os trabalhadores a intervir na vida pública do país de forma ativa e responsável."

Não pode haver dúvida quanto ao fato de que a luta aberta, que a partir de um dado momento a organização travou contra o regime franquista, tenha contribuído para formar essa concepção. Porém, no fundo da moldura ideológica na qual se movem as "CC.OO." encontra-se a idéia da criação de instituições de contra-poder operário, ou seja, daquelas formas de democracia direta e autogoverno às quais aludimos acima.

Deste "anti-sindicalismo" das "CC.OO." destacam-se dois aspectos: a) a nível das unidades econômicas recoloca-se a meta do controle operário. O enfoque do assunto, porém, não é aquele classicamente formulado como sendo o estabelecimento "abrupto" de uma dualidade de poder industrial (ou seja, de choque frontal com a sociedade e o Estado). Não cremos que as "CC.OO." tenham definido claramente como se construiria esse controle sem chegar às vias de fato. De qualquer modo, e se não interpretamos mal seriam elementos desse controle a atuação dos conselhos de empresa, a negociação coletiva, o "plano" de empresa (negociação coletiva de empresa) e avanços progressivos na dependência de outros tantos progressos no terreno Estatal propriamente dito; b) no nível Estatal, portanto; colocam-se as metas do fortalecimento da participação operário popular na esfera parlamentar, bem como a participação independente dos trabalhadores na administração da coisa pública, sobretudo naquelas instituições mais diretamente envolvidas com o mundo do trabalho (saúde, aposentadoria etc).

Sindicato Construído a Partir da Base

A classe operária espanhola, privada de uma via própria e eficaz para a manifestação de seus interesses e reivindicações, redescobriu a fórmula das "Comisiones Operárias" como meio direto e imediato de expressão de sua vontade política.

Em contrapartida, uma parte do peso dos ativistas do movimento operário compreendeu prontamente que essa fórmula, nas condições espanholas, com seu componente marcante de participação operária de base, encerrava o segredo da reconstrução do movimento da construção e reconstrução de suas organizações coletivas de massa e, em decorrência, em parte, da possibilidade de democratização da nação.

Não resta dúvida que a natureza desta participação operária de base nas "Comisiones" não foi sempre da mesma ordem. Como veremos mais adiante, a partir do momento em que foi necessário fazer uma opção entre modalidades alternativas; de organização, a natureza e o papel dos institutos de base redefiniu-se.

Um formato organizacional diferenciado serve de divisor de águas entre as "Comisiones" movimento-organizado e as "Comisiones" sindicato de novo tipo.

E, no entanto, podemos afirmar que, transcendendo as próprias formas orgânicas, constituiu-se uma tradição operária - a tradição das "'Comisiones" -, na qual a organização de base e a participação operária direta ocupam um lugar muito alto.

A organização de base valoriza como essencial a organização no local de trabalho. Na tradição das "CC.OO." foi encarnada originariamente pelas "comisiones obreras" e, posteriormente, já na fase de "Sindicato de novo tipo", pela seção sindical de fábrica e pelo comitê de fábrica.

A participação de base encontra seu reduto último na assembléia operária de base. Também aqui ocorreram transformações orgânicas importantes. As assembléias de hoje não são exatamente como as de ontem. A organização soube reconhecer e preservar o alto valor organizativo dessa manifestação típica da classe (a assembleia), sobre a qual, dando-a por banal ou óbvia, frequentemente se passa por cima com demasiada pressa.

Por isso, o sindicato segue reivindicando para si o caráter de organização operária democrática e "assembleária", ou seja, que utiliza a assembléia como instrumento de trabalho em todos os níveis (ressalvando-se aqui que não se deve confundir "assembleário" com assembleísmo).

DE MOVIMENTO ORGANIZADO DAS "COMISIONES OBRERAS" A "SINDICATO DE NOVO TIPO": 1978-1987

Em 1975, com a morte do caudilho, o regime franquista estava praticamente liquidado. A iminente passagem para um regime democrático, com a concomitante normalização do direito à organização independente da classe operária, precipitou os acontecimentos e fez com que o movimento tivesse de decidir a respeito do formato organizativo com o qual faria face ao futuro.

Esta decisão tornava-se mais premente a cada dia. Enquanto o governo, que preparava a transição, dava facilidades às demais correntes sindicais, o tratamento reservado às "Comision" era de franca hostilidade (proibição para realizar assembléias e atos públicos empastelamento de publicações etc). Nenhum sindicalismo era bom. Mas qualquer um era preferível ao sindicato "comunista".

A "Unión General de Trabajadores", cuja expressão no MO entre 1956 e 1975 tinha sido modesta, apoiando-se em excelentes quadros e ajudada maciçamente por forças externas, retornava ao MO como uma grande força concorrente em ascensão visível.

Como os fatos indicam, em 1976 as "Comisiones" ainda tinham alguma esperança de que a estrutura do MO, sob a legalidade, pudesse ser feita a partir do princípio de unidade orgânica que tanto propagandeara. Uma relativa unidade de ação fora conseguida através da "Coordenadoria de Organizações Sindicais", e assim, "como culminação consequente de todo o trabalho efetuado na clandestinidade, o movimento das 'CC.OO. lançava o manifesto 'em direção à unidade', no qual delimitava sua proposta de um Congresso Sindical Constituinte, no qual fossem escolhidas as diferentes correntes democráticas sindicais existentes... tendo em vista a criação de uma grande central unitária".11 11 MORCILLO, F A. e outros. El Sindicalismo de Clase en España, op. cit., p. 144.

No entanto, as demais centrais sindicais, apoiando-se em argumentos que iam desde a alegação da ausência de plenas liberdades políticas, passando pela acusação de que os comunistas esperavam dominar a central, até a objeção ao caráter pouco claro das "CC.OO." como organização sindical, não aderiram à proposta de Congresso Sindical Constituinte.

Fracassado o intento de unidade em julho de 1976, uma assembléia geral das "CC.OO.", premida pelos acontecimentos, decidia - não sem problemas internos: cisões, etc. - converter o movimento em sindicato. E assim, o movimento-organizado das "CC.OO." transformou-se em "sindicato de novo tipo" sob a denominação de "Confederación Sindical de Comisiones Obreras" (CS. de CC.OO.).

Institucionalizado o sistema sindical legal, a "CS. de CC.OO.", juntamente com as demais centrais, passou a operar num sistema que, descrito em duas palavras, é o seguinte:

Na base, isto é, na empresa, encontra-se o comitê de empresa. O comitê, para implementar uma determinada política, precisa de uma maioria simples de votos. Ele é composto por delegados eleitos na empresa. Os eleitos podem ser delegados na condição de independentes ou na condição de afiliados às centrais sindicais existentes.

Em qualquer dos casos seu estatuto legal é o de delegado dos trabalhadores da empresa no comitê empresa.

Esses delegados articulam-se em dois níveis, dependendo das circunstâncias. Oficialmente, no comitê de empresa (se existir), na condição de representantes dos trabalhadores da empresa, como explicamos. E oficiosamente - mas não menos realmente - com a central sindical por cuja "chapa" eventualmente foram eleitos. Neste último caso, a ligação do delegado ao comitê da empresa com a central sindical se dá através da seção sindical de fábrica (se houver uma) de seu respectivo sindicato, ou através de qualquer outro órgão sindical extrafábrica (geralmente um comitê sindical organizado através de um critério territorial).

No caso da "CS. de CC .OO." as seções sindicais de empresa chamam-se "comisiones obreras". Entre a seção sindical e a direção geral com seus Congressos, Conselho Federal, secretário geral etc, o sindicato estrutura-se por ramo industrial (federação de ramo etc.) e por território (organização local, regional, provincial etc).

"CS. DE CCOO.": SÍNTESE DE ORGANIZAÇÕES DISTINTAS OU RENOVAÇÃO SINDICAL?

A "CS. de CCOO." autodefine-se como sendo um sindicato de novo tipo.

O que devemos entender por isto?

"O futuro e próximo movimento sindical - explica-nos Camacho, num dos escritos que antecederam a constituição da Confederação - deve ser uma espécie de síntese de Conselhos Operários e de Sindicatos, elaborada por baixo nos centros de trabalho e, por cima, em colaboração com todas as tendências sindicais de classe."12 12 CAMACHO, M. Charlas en la Prisión, Barcelona, 1976.

A observação é genérica. Mas não deve haver dúvida quanto ao fato de que o objetivo era fundir numa organização nova (unitária) as propriedades fundamentais de conselhos e sindicatos.

Tomado em todas as suas consequências, este objetivo não pode ser confundido com a simples existência de influências, ainda que estas sejam relevantes. Não se trata, portanto, de que tais ou quais elementos dos conselhos e dos sindicatos tradicionais tenham sido incorporados na nova organização, mas sim de que o essencial dos conselhos, assim como o essencial dos sindicatos, tenha sido preservado na organização sindical de novo tipo.

Foi isto o que ocorreu?

Nas linhas seguintes vamos tentar aclarar este assunto. Para isso, porém, é necessário delinear, mesmo que sumariamente, o que distingue os conselhos dos sindicatos.

Sindicatos e conselhos apresentam várias determinações comuns. O mais saliente e ao mesmo tempo o mais comezinho, é que são organizações coletivas de massa da classe operária constituídas sobre o universo do mundo do trabalho. Isto as torna, digamos assim, sem querer insinuar qualquer tipo de economicismo, organizações "laborais".

Ao mesmo tempo essas organizações apresentam determinações características ou especificidades. Certamente foram essas especifidades que serviram de base para a constituição de teorias muito diferentes sobre o valor organizativo, educativo, mobilizativo e, em última análise, no limite, reformista ou revolucionário das mesmas.

Uma exposição mais abrangente dessas diferentes determinações não é tarefa que possamos empreender aqui. Assim, nos limitaremos a enunciar apenas o que consideramos básico.

CONSELHOS DE EMPRESAS E SINDICATOS

Dentre os teóricos que trataram do tema nos quatro primeiros lustros do século, foi Gramsci quem, de um certo modo, lançou sobre o mesmo o olhar mais penetrante.

Gramsci percebeu e enunciou com grande força sugestiva qual é a determinação básica que diferencia os sindicatos dos conselhos de fábrica ou empresa.

Enquanto nos sindicatos (e nos partidos) os trabalhadores se organizam segundo o princípio de associação voluntária13 13 A associação voluntária pressupõe uma certa escolha orgânica-programática. Mas essa escolha nada tem a ver com uma concepção idealista das organizações operárias que, supõe, as pessoas se agrupam em organizações segundo um paradigma ideológico qualquer. Isto é, ou pode ser verdade, mas só em termos relativos. Pois, o primeiro "partido" da classe operária está constituído por ela mesma enquanto classe, está dado por sua própria existência estrutural. , o que justifica a organização dos conselhos de empresa é o princípio de produtor.

No primeiro caso a relação entre os trabalhadores e sua organização é de tipo contratual. Associam-se os trabalhadores que querem, e enquanto querem, porque compreenderam de algum modo essa necessidade.

No segundo caso, a relação entre os trabalhadores e sua organização é de tipo orgânico: Os trabalhadores "integram" automaticamente o conselho de empresa - pelo simples fato de serem "produtores", porque é absolutamente vital e inelutável que eles tenham de trabalhar - sob o capital na condição de assalariados - para ganhar a vida.

OS CONSELHOS NUMA CONJUNTURA REVOLUCIONÁRIA

Gramsci enunciou essas suas elaborações na época do movimento dos conselhos de fábrica de Turim. As conclusões mais gerais que Gramsci extraiu daí, entretanto, se seccionadas do preciso contexto histórico em que foram formuladas, são problemáticas.

Nesse momento - e sem dúvida também por influência dos soviets russos -, os conselhos de fábrica para ele não podiam ser outra coisa senão organizações revolucionárias, germens de um novo "território estatal proletário" a ser construído imediatamente a partir da fábrica.

Esse enfoque era coerente com a situação histórica. A conjuntura europeia do pós-guerra era, em muitos países, no que se incluía a Itália, de alta conflitividade. Não eram poucos os que acreditavam que se vivia uma situação revolucionária generalizada, que a derrocada final do capitalismo estava próxima e que a revolução socialista internacional se encontrava muito próxima.

Tangido por essa ampla perspectiva o enfoque gramsciano dos conselhos era plausível. A própria revolução russa parecia ter indicado à toda a classe operária onde estava o caminho. Pari passu com a instauração dos soviets como poder alternativo, e em vários casos inclusive precedendo-os, os conselhos de fábrica instauraram nas mesmas o controle operário, ou seja, uma dualidade de poder Industrial que constituía seguríssimo indício de que uma luta sem quartel pelo poder Estatal seria travada, imediatamente a seguir, pelas classes em pugna.

Esta era a feição dos conselhos numa situação tipicamente revolucionária ou para-revolucionária, a qual, legitimamente, permitia empregar a expressão "germe de um novo território estatal".

Bem observados os acontecimentos, Gramsci não estava criando uma categorização original, mas retomando é retrabalhando a tradição de pensamento inaugurada por Marx em sua análise da Comuna de Paris, a qual afirmava que a Comuna, ou seja, a forma conselho constituía uma forma própria e peculiar através da qual a classe operária exerceria o governo, a "forma afinal descoberta".

Estas análises sobre a "forma afinal descoberta" não chegaram a ser verdadeiramente desenvolvidas. Porém, continham essa questão assaz importante que Gramsci soube pôr em evidência de modo tão provocante.

O estado operário, que naturalmente deve ser um estado de "produtores" por oposição ao estado burguês de "cidadãos", tanto quanto este último, tem de se desenvolver de uma forma orgânica. Numa palavra, os órgãos de autogoverno deste estado não podem ser constituídos através de um contrato qualquer, mas pelo fato de . que todos os trabalhadores, justamente por serem trabalhadores e não exploradores, devem ter o direito de integrar os organismos representativos - inclusive os mais elementares - dos produtores.

OS CONSELHOS NUMA CONJUNTURA DE HEGEMONIA BURGUESA

Até esse ponto está tudo muito bem. Mas o que ocorre com os conselhos de fábrica quando a conjuntura revolucionária passa e a burguesia reinstaura sua hegemonia e sua "paz", tal qual ocorreu subsequentemente aos anos vinte?

O problema, ou pelo menos uma parte dele, foi formulado por Rádek numa comunicação apresentada ao III Congresso da Internacional.

"Resulta claro - dizia Rádek - que atualmente não nos encontramos na mesma situação (isto é, revolucionária). É a burguesia que detém o poder. O primeiro ataque da classe operária na época da desmobilização foi rechaçado. Agora, a revolução proletária se encontra novamente no início de seu crescimento. E não podemos acelerar esta revolução proletária nem organizá-la se nos apresentamos unicamente com o mero programa da ditadura do proletariado. No momento em que os operários se lançam à greve porque amanhã não terão nada que levar à boca, nós não podemos nos apresentar a eles e dizer-lhes: "Tomem as fábricas' ".14 14 Em Mandel, E. Control Obrem, Consejos Obreros, Autogestión (antologia), México, Era, 1974, p. 130.

Rádek, aqui, está pensando obviamente na questão do controle operário, Ele - e com ele muitos outros - compreende que na situação acima mencionada, de refluxo revolucionário e de retomada da hegemonia pela burguesia, o lançamento da palavra de ordem "controle operário", pelo menos em sua forma clássica, como meta efetivamente prática e imediata e não apenas propagandística, é altamente problemática e tende a conduzir a vanguarda operária para o isolamento característico do gueto, por mais combativa, cheia de razões e iluminada que esta seja.

Por outro lado, há quem acredite que a simples criação dos comitês de fábrica constituiriam "germes de novo território estatal". Numa passagem do "Programa de Transição da IV Internacional (1938)", podemos ler:

"A partir do momento da aparição do comitê de fábrica, se estabelece de fato uma dualidade de poder. Por sua essência ela tem algo de transitório porque encerra em si mesma dois regimes irreconciliáveis: o regime capitalista e o regime proletário. A principal importância dos comitês de fábrica consiste precisamente em abrir um período pré-revolucionário, já que não diretamente revolucionário, entre o regime burguês e o regime proletário".15 15 Em Mandel, E. op. cit., p. 281.

Estabelece-se, efetivamente, uma dualidade de poder? Mas qual comitê de fábrica estabelece essa dualidade? Será que podemos afirmar que os comitês de fábrica de um tempo de "tranquilidade" estabelecem essa dualidade?

Enunciada em caráter geral, tal qual se encontra, a tese só faz sentido se partirmos do pressuposto de que os comitês SÃO revolucionários pela própria forma, isto é, porque a forma conselho, enquanto simplesmente organização (tipo de organização), é imanentemente revolucionária, é capaz de imprimir ao movimento operário, por si mesma, um caráter revolucionário.

Isto não deixa de ser verdadeiro. Porém, deve ser colocado no seu devido lugar. O conselho é uma forma de organização. É uma organização coletiva de massas da classe operária (e eventualmente de outras classes populares). Não se trata de nenhuma banalidade ou ninharia. Thompson16 16 THOMPSON, E.P. La formación Histórica de la Clase Obrera, Barcelona, Laia, 1977. o expressou esplendidamente através de uma bela epígrafe: "É um desses gonzos sobre os quais gira a roda da história".Trata-se, pois, de uma tecnologia organizativa historicamente original (ao lado dos sindicatos e dos partidos operários), criada e desenvolvida pela classe operária. E assim sendo, não se confunde com as instituições burguesas típicas, nem com as feudais, nem com quaisquer outras pertinentes às sociedades de classes.

Neste sentido a forma (o formato organizacional em sua tipicidade) traz consigo um certo conteúdo de classe imanente, declina, por assim dizer, um certo programa. Mas não exageremos. O "programa" subjacente a essa forma é de uma natureza tão genérica, tão abstraía, que por si mesmo é absolutamente insuficiente para impregnar o movimento operário de um sentido revolucionário independentemente de um explícito programa revolucionário.

Este problema, ou pelo menos uma parte substancial dele, foi enunciado por Trotski. No excerto que mencionamos em seguida, Trotski está referindo-se aos soviets (conselhos de operários, soldados e camponeses), mas o que sustenta pode perfeitamente ser estendido aos conselhos de fábrica.

"É necessário ... rechaçar - afirma ele - o fetichismo da forma soviética que os epígonos da Internacional Comunista puseram em circulação. De acordo com a opinião oficial atualmente em voga; a revolução proletária pode realizar-se unicamente com a ajuda dos soviets... Todo esse esquema não presta para nada. Os Soviets não são mais que uma forma de organização e o problema se resolve no conteúdo de classe da política e não em sua forma."17 17 Em Mandel, E. op. cit., p. 277.

Esta colocação de Trotski encontra-se impregnada de uma época e de uma determinada tradição política. É seguramente também por isto que o problema aparece enunciado e "resolvido" numa equação até certo ponto simplista. E, no entanto, até o presente momento, não dispomos de nenhuma evidência histórica real suficientemente contundente como para invalidar o significado primordial dessa tese. A criação de um comitê de fábrica não é necessariamente nenhum poder dual. Nem mesmo, rigorosamente falando, é um embrião ou germe de poder dual, de controle operário.18 18 Toda a ação reivindicativa da classe operária tende a exercer um certo controle sobre o processo de trabalho. Entretanto, aqui estamos nos referindo ao controle tal como foi teorizado classicamente. E não o é porque este embrião ou este germe não pode ser simplesmente entendido em sentido biológico. Ao contrário do que ocorre no reino natural, quando empregamos as palavras germe, embrião etc. aqui não encontramos essa evolução necessária, automática, que faz com que o embrião venha a ser adulto depois de um certo tempo.

Isto significa que, se é correto afirmar que eventualmente o conselho de fábrica pode transmudar-se num efetivo poder alternativo, ou ainda, que o mesmo é o organismo vocacionado para exercer esse poder, menos correta não é a afirmação de que o comité não evoluirá necessariamente nessa direção; não se travestirá necessariamente de órgão de resistência e luta por reformas - aproximadamente tal qual um sindicato clássico - em órgão de controle, em instituto substantivo de poder operário.

Assim, portanto, considerando-se uma conjuntura de hegemonia burguesa, qual seria o divisor de águas existente entre o comité de fábrica e a seção sindical de fábrica?

Curiosamente, o mesmo texto da IV Internacional que num determinado ponto, equivocadamente, firmou o pé na tese de que o comitê estabelece desde o começo a dualidade de poder, poucas linhas atrás expunha a questão de uma maneira muito mais adequada. "Ali - afirma - onde os operários da empresa se encontram já nos períodos "tranquilos", totalmente incluídos nos sindicatos, o comitê coincidirá formalmente com o órgão do sindicato, mas renovará sua composição e ampliará suas funções."

A frase é um pouco elíptica. Mas não temos dúvida de que ela parte da constatação de que, em tempos não revolucionários, não é nada evidente a diferença que há entre as lutas desenvolvidas pelos comitês de fábrica e as lutas sindicais tradicionais.

Para quem imagina encontrar na organização dos conselhos um antídoto infalível para tudo de ruim ou de insuficiente que pode estar presente na organização sindical, isto não pode ser muito animador. Mas é um fato. Em tempos de franca hegemonia burguesa, o comitê de fábrica comumente desempenha as mesmas funções que têm desempenhado os sindicatos tradicionais, comumente assume as mesmas lutas de resistência, por melhorias e reformas. Isto significa simplesmente que a forma conselho não possui o condão de "proteger" o movimento operário do reformismo ou de outros problemas.

Se os conselhos não têm a virtude de imunizar o MO contra esses malefícios ou insuficiências, o que, então, os justificaria como organizações autônomas e diferenciadas dos sindicatos?

O próprio documento da IV Internacional que acabamos de transcrever o sugere: composição e funções. Vejamos.

a) novo tipo de representação

Do conselho participam os "produtores" (assalariados) da fábrica. As consequências que se desprendem deste fato não são de somenos importância.

Em primeiro lugar, isto significa que o MO tem à sua disposição na fábrica (ou qualquer outra unidade económica) uma organização na qual, em princípio, podem participar todos os trabalhadores assalariados, sejam eles organizados, independentes ou, ainda, se encontrem na condição: de simples massa trabalhadora amorfa ou desarticulada.

Esta característica relativa ao tipo de representação, em tempo de calmaria, pode jazer sem maior cuidado. Porém, ela se revela como sendo muito importante ou mesmo imprescindível, tão logo a classe operária se vê numa situação em que necessita reunir a maior parte possível de suas forças.

As próprias "CC.OO." foram um exemplo disto. Num momento em que, despertando para a luta, a classe operária teve de reunir e concentrar suas parcas energias políticas face a um controle adversário totalmente hostil e implacável, os comitês apresentaram-se como a forma de organização na qual puderam congregar-se momentaneamente, e apesar de todas as suas divergências e oposições, uma boa parte dos vários sujeitos políticos presentes no MO (operários independentes, católicos, trotskistas, socialistas, anarquistas, "trade-unionistas" e comunistas de várias vertentes).

Um segundo fator fundamental neste tipo de representação é que ela se realiza a partir da base operária, isto é a partir do próprio lugar em que os operários trabalham. Isto não é nenhuma garantia de que a massa operária esteja efetivamente representada no comitê, e muito menos, de que esteja representada num sistema de conselhos que transcendam o âmbito da própria fábrica - se houver um. Porém, é inegável, seja como for, que em última análise, este tipo de representação tende a estar muito mais próximo da base do que aquele que é próprio dos sindicatos (que, digamos, é mais suscetível de descolar-se das determinações das bases).

b) ampliação de funções e novas funções

Como vimos mais acima, dentre as teorizações clássicas sobre o tema "conselhos", houve uma propensão muito forte a vê-los como portadores específicos dessa função que seria q controle operário (eles teriam surgido com a função precípua de lutar pelo controle operário).

Quanto a este ponto do controle as expectativas não se confirmaram. Os conselhos surgem frequentemente como organizações de luta por reformas e melhorias e nada há neles que possa garantir sua evolução automática para órgãos de controle operário real (estabelecimento de poder dual na indústria).

Assim mesmo, esta constatação histórica não desqualifica completamente as reflexões que se fizeram em torno das pretensas propriedades dos comitês de fábrica como "germens de um novo território estatal".

De fato, o que se pode deduzir lógica e historicamente é que a organização "conselho", em suas muitas variações existentes ou por descobrir, é a forma possivelmente melhor dotada - e provavelmente necessária - para se levar à prática a teoria de uma organização social de "produtores associados".19 19 Quanto a isto, são significativas e sintomáticas as mudanças que estão ocorrendo na URSS sob o signo da "Perestroika" e da "Glasnost". Depois de anos de stalinismo, sob os quais a organização dos conselhos foi praticamente eclipsada e teoricamente anatematizada, estes parecem ter voltado ao horizonte dos dirigentes soviéticos na condição de organizações imprescindíveis para a construção do socialismo. Ver "Reformas Revolucionárias Requerem uma Ideologia Renovadora". Discurso de M. Gorbachov, Secretário Geral do CC do PUCS, pronunciado no pleno do CC do PCUS a 18.02.88, em Novedades de Moscú, Suplemento nº 9 (1.335), 1988.

Seguindo esta linha de raciocínio, os comitês de fábrica podem ser considerados como sendo as organizações operárias potencialmente melhor dotadas para, num dado momento, postularem e encaminharem a questão do controle.

Mas isto posto, é necessário observar energicamente que a afirmação de que são as organizações potencialmente melhor dotadas quanto a esse objetivo não significa, nem que o farão mecanicamente como produto de sua evolução "natural", nem que essa iniciativa só possa partir dos comitês.

Ao contrário. É perfeitamente plausível supor que, dependendo das concretas circunstâncias históricas, essa iniciativa possa ser assumida pelo sindicato ou pelo partido e, inclusive, apesar da existência do comitê ou mesmo contra o comitê existente.

Isto por um lado. Por outro, observa-se que mesmo não assumindo uma impostação política revolucionária, um comité de fábrica, perene ou temporário, constitui a tecnologia social necessária não só para abrigar a massa trabalhadora, segundo o princípio do "produtor", como também para exercer momentaneamente a função de "território estatal alternativo". Isto ocorre tipicamente numa situação de alta conflitividade entre o capital e o trabalho, quando, por exemplo, os operários resolvem operar uma indústria "falida", quando no caso de um desentendimento prolongado resolvem conduzir a produção por conta própria, quando à raiz de uma greve mais áspera tomam a fábrica (ou parte dela) e instauram algum tipo de administração e em muitas outras circunstâncias, nas quais o controle não é avançado como programa revolucionário, mas tão-somente como programa provisório para superar uma crise particularizada de modo favorável aos trabalhadores.

Nos dias de hoje, sobretudo nos países capitalistas altamente desenvolvidos, aventa-se a possibilidade - caso da "CS. de CC.OO.", como vimos - de os conselhos de fábrica irem construindo progressivamente o controle operário; bem entendido, sem precipitar a indiferença das massas, ou, no pólo oposto, o desencadeamento da luta pelo poder Estatal numa situação de inferioridade dos trabalhadores.

Essa possibilidade, no entanto, ainda não parece poder sustentar-se sobre evidências empíricas significativas. E como no plano teórico também não goza de vida pacífica, o mais sensato, por ora, talvez seja considerá-la como uma instigante hipótese de trabalho.

A "CS. DE CC.OO.": UM SINDICATO RENOVADO NUM SISTEMA ARTICULADO DE CONSELHOS E SINDICATOS

Pelo exposto podemos ver que a "CS. de CC.OO." não pode ser uma organização de novo tipo: pelo menos se entendermos esse novo tipo como sendo uma verdadeira síntese de conselhos e sindicatos.

E no entanto, a ideia de síntese não foi gratuitamente utilizada pelos militantes das "Cómisiones". Como já o indicamos, um certo esforço de reflexão teórica foi realizado tendo em vista a pretendida síntese. E o fato de que a questão tenha estado na pauta do Congresso Constituinte da organização mostra que a mesma representava uma inquietação real e não mero palavreado.

Uma cláusula constante do anteprojeto constitucional que todo trabalhador que se sentisse de acordo com as posições assumidas pela Confederação tinha o direito de expor suas idéias na seção sindical de fábrica (livre participação na seção sindical) e de ser eleito para ocupar cargos no sindicato a nível de empresa. E que em todo caso, se um trabalhador (não-associado) fosse eleito para ocupar cargos na "CS. de CC.OO." em instância superior ao da empresa, teria necessariamente de filiar-se à Confederação.

A cláusula revela que a organização sabia qual era o fulcro da questão que estava em jogo - a oposição entre representação orgânica e representação por associação - razão pela qual tinha procurado avançar uma fórmula conciliatória. O que se fazia era procurar criar uma zona de intersecção entre os dois tipos de organizações (conselhos e sindicatos), ou seja, aquele mecanismo que, satisfazendo tanto ao princípio do produtor quanto do associado, permitisse uma real fusão orgânica entre ambos.

Entretanto, a fórmula não foi mantida. No folheto intitulado "A Organização da Confederação Sindical de CC.OO.", lavrada no primeiro congresso realizado em 1978, ela foi substituída pela seguinte declaração:

"A reunião de todos os afiliados de uma empresa no centro de trabalho constitui a assembléia da "C.O." comisión obrera") de empresa - isto é, segundo o sistema oficializado, a seção sindical de empresa. A assembléia da "C.O." de empresa é o órgão fundamental no sindicalismo de base das "CC.OO.", no qual se aprovam as decisões que afetam a vida da "Comisión Obrera".

Os trabalhadores de empresa que não estejam afiliados à "CC.OO." nem a nenhuma outra central, e que sejam simpatizantes de nossa Confederação podem assistir à assembléia."

Com esta resolução suprimia-se a ambiguidade conciliatória do texto anterior. Mas também se suprimia, de fato, qualquer veleidade de síntese orgânica real. Como qualquer outro sindicato, a confederação tornava-se, assim, uma organização típica de associados.

Por que se abandonou o esboço através do qual se pensou integrar unitariamente a representação orgânica e a representação segundo o princípio do associado, optando-se por esta última?

Os limites desta investigação não nos permitem chegar a uma resposta. Alguns dirigentes da confederação alegaram que, se todos os trabalhadores pudessem participar da seção sindical de empresa sem filiar-se, o sistema de filiação ruiria.

É possível que este tenha sido um problema importante ou mesmo ornais importante. Mas é igualmente possível que muitas outras razões de outra natureza tenham existido, as quais, afinal, só a pesquisa poderá captar adequadamente.

Também não é nosso propósito aqui emitir um juízo quanto ao valor da escolha organizativa feita pelas "Comisiones", ou seja, se não teria sido melhor desenvolver até suas últimas consequências um sistema típico de conselhos em vez de criar um sindicato.

Esta é, por exemplo, a posição de Mandei na introdução da excelente antologia que citamos anteriormente. "As direções moderadas e oportunistas do movimento operário espanhol clandestino (incluída a do PC espanhol) - lamenta-se ele - trataram de transformar e legalizar (as) comissões em simples sindicatos, tarefa que, de resto, quadrava aos propósitos e preocupações do patronato espanhol."

Quanto ao fato de que as "Comisiones" transformaram-se num sindicato estamos de acordo, porém, o mesmo já não ocorre quanto ao mais. É óbvio que em seu ajuizamento ele se escora na tese de que um sistema "puro" de conselhos é superior a qualquer outro tipo de organização sindical.

Este tipo de suposição, entretanto, é problemático. A esse respeito o movimento operário não conseguiu, até o momento, abandonar o terreno da mais áspera polêmica. E o que podemos afirmar do ponto de vista lógico e histórico? Antes de mais nada que a questão é realmente complexa. E depois, que na ausência da síntese a que aspirou a "C.S. de CC.OO.", deve prevalecer o princípio de divisão do trabalho entre as duas modalidades de organização, tal como o fizeram notar vários teóricos da Internacional, inclusive Lenin.

E de todo modo, a correta avaliação de uma escolha realizada numa situação concreta exige uma investigação da mesma ordem, que evidentemente não podemos alcançar neste trabalho.

Retomemos, porém, a questão da síntese. Se nos limitamos a entender por síntese criadora o fato de que a Confederação preservou como sindicato muito daquilo que tinha desenvolvido como movimento de conselhos, isto é certo. Mas, então, a utilização da expressão síntese criadora não é a mais apropriada e o melhor seria falar em influências.

Estas influências existiram, são marcantes e dentre elas podemos distinguir duas vertentes: a) aquelas que decorreram da própria natureza orgânica dos conselhos; b) aquelas que decorreram das injunções político-ideológicas mais gerais, bem como da evolução do movimento operário da específica conjuntura espanhola.

No primeiro caso é notável a ênfase dada ao trabalho de base (comitês de empresa, seções sindicais), na idéia de controle operário e na representação através de delegados eleitos de baixo para cima, ou seja, da seção sindical de empresa ao fórum máximo (o congresso da Confederação).

No segundo caso, pode-se indicar a opção pelo caráter de classe do sindicato, a autonomia, sua impostação sócio-política e a aspiração à unidade e ao socialismo.

Ademais destes aspectos "internos" à Confederação, deve-se mencionar aspectos "externos", ou seja, a importante contribuição que, direta ou indiretamente, o sindicato deu para a formação do perfil organizativo do movimento operário espanhol, notadamente para a preservação nesse sistema de um organismo tipicamente de base, como é no caso o comitê de empresa.

Os comitê passam ser as organizações que mediam a política da classe operária nas empresas (negociação coletiva, greves etc). E por isso compreende-se que os vários sindicatos rivalizem duramente entre si para que os trabalhadores elejam para os comitês o maior número possível de delegados que também sejam seus respectivos afiliados. O sistema não deixa de ser original, pois estabelece uma notável articulação e cooperação entre sindicatos e comitês, embora nas circunstâncias presentes as centrais sindicais exerçam sobre todo o sistema uma vasta hegemonia.

Terminando. O movimento das "Comisiones" nasceu das profundezas das empresas como um movimento de base e de conselhos e assim se desenvolveu até transformar-se em sindicato. Este, porém, incorporou muitíssimo dos costumes desenvolvidos em sua própria trajetória, de sorte que, devido a isto, se apresenta como um sindicato que fez um grande esforço de renovação e que, efetivamente, constitui um exemplo notável e até certo ponto original de renovação sindical.

Tendo chegado a este ponto de sua existência, duas questões cruciais, que, de um modo ou de outro, fazem parte de sua cultura política específica, permanecem em aberto. Uma é a questão da síntese criadora que, rigorosamente falando, não se realizou. A outra questão, que também não parece ter ido muito além do papel, ou seja, do nível da intencionalidade (ainda que explicitada), é a pretensão de superar a tradicional prática reformista dos sindicatos, através do desenvolvimento de algum tipo de ação real de controle operário (não-cogestionário); seja ao nível da empresa, seja ao nível de outras instancias (política parlamentar etc).

Nenhuma dessas questões pode esperar encontrar uma resposta fácil. Mas, enfim, o movimento operário espanhol reencontrou a si mesmo nas suas melhores tradições. Ele tem sido combativo, dinâmico e notavelmente criativo. E quanto a este último aspecto, sobretudo, não é de esperar que o até aqui pronunciado tenha sido sua última palavra.

BIBLIOGRAFIA E OUTRAS FONTES

Documentos sobre os congressos de 1978, 1981 e 1984.

Entrevistas com dirigentes sindicais de CC.OO.

  • OLLER, J.S. Entre el Fraude y la Esperanza (Las Comisiones Obreras de Barcelona), Ruedo Ibérico, Paris, 1972.
  • Para una Historia del P.C.E., F.I.M., Madrid, 1980.
  • SETIÉN, J. El Movimiento Obrero y el Sindicalismo de Clase en España (1939-1981), Ed. de la Torre, Madrid, 1982.
  • ARIZA, J. CC.OO., Avance-Mañana Ed., Barcelona, 1976.
  • AMSDEN, J. Convenios Colectivos y Lucha de Clases en España, Ruedo Iberico, Paris, 1974.
  • CAMACHO, M. Charlas en la Prisión, Ed. Laia, Barcelona, 1976.
  • GUERRERO, F. El Sindicato en la España de Hoy, Bibl. de Autores Cristianos, Madrid, 1978.
  • GARCIA, C. e outros. Sindicalismo en Cataluña, Ed. Mayoría, Madrid, 1977.
  • ALMENDROS, F. e outros. El Sindicalismo de clase en España (1939-1977), Ed. Península, Barcelona, 1978.
  • SARTORIUS, N. Qué Son las Comisiones Obreras. La Gaya Ciencia. Barcelona, 1976.
  • Revista Gazeta Sindical de CC.OO., 1987.
  • Jornal El País, 1987.
  • *
    Este estudo foi feito no âmbito de um programa de trabalho de pós-doutorado realizado na Espanha (Universidade Complutense de Madri), no período outubro/86 a outubro/87, e faz parte de uma pesquisa mais ampla, em curso, sobre "conselhos operários". O desenvolvimento desse programa foi possível graças a
    afastamento e
    bolsa de estudos concedidos respectivamente pela Universidade Estadual Paulista - Campus de Marília e CNPq, instituições às quais apresento os meus agradecimentos.
  • 1
    Gazeta Sindical, nº 52, junho de 1987.
  • 2
    Os conselhos da abortada revolução de 1905 não tiveram repercussão internacional significativa.
  • 3
    Cf. El País, 23.08.87.
  • 4
    Esta é provavelmente a determinação básica. Mas neste caso, fica como uma questão aberta à pesquisa, o que poderíamos chamar aqui de tradições históricas fortemente descentralistas da nação espanhola. Essas tradições vão desde a forte presença das várias nações no Estado espanhol, passando por um centralismo estatal que sempre esteve sujeito a forças centrífugas, até chegarmos ao anarco-sindicalismo tão pronunciado no passado, aos conselhos republicanos durante a guerra civil, e à própria presença dessas tradições na organização do sindicato franquista através dos "jurados de empresa".
  • 5
    SARTORIUS, N.
    Qué Son las Comisiones Obreras, La Gaya Ciência, 1976. Ademais, a partir do momento em que a classe operária trouxe à luz suas organizações, é muito pouco provável que os acontecimentos subsequentes e importantes do movimento operário venham a ocorrer de um modo completamente e propriamente espontâneo. Como muito bem mostrou um estudo sobre 150 anos de greves na França, o fator organização, em algum ou vários de seus desdobramentos, encontra-se freqüentemente por trás, ou atrás, mesmo daqueles fenômeno que eventualmente podem aparecer como espontâneos. Ver Shorter E., Tilly, C.
    Las Huelgas en Francia, MT, Madrid, 1986.
  • 6
    A maioria dos militantes da USO procediam de grupos cristãos tais como o "Movimento Apostólico", a "Hermandad Obrera de Acción Católica" e "JOC" (Juventude Operária Católica). Cf. Morcillo, FA. e outros.
    El Sindicalismo de Clase en España (1939-1977), Ediciones 62, Barcelona, 1978.
  • 7
    Referindo-se à luta de Vizcaya, um informe de Carrillo - numa reunião do Comitê Central de agosto de 1956 - diz textualmente: "Através das "Comisiones Obreras" estabelecidas democraticamente pelos trabalhadores, tem sido possível organizar a luta. Sem o apoio das "Cornisiones Obreras" o Partido não teria podido dirigir os trabalhadores". Cf. Manuel Azcarate, "La Política de Reconciliación Nacional" em
    Para Una Historia del PCE, Madrid, FIM, p. 167.
  • 8
    Ariza, J.
    CC.OO., Avance/Manaña Ed., Madrid, 1976, p. 16.
    9 Amsden, J.
    Convenios Colectivos y Lucha de Clases en España, Paris, Ruedo Ibérico, 1974, p. 93.
  • 10
    Pilar Brabo, "Los Orígenes del Eurocomunismo" em
    Para Una Historia del PCE, op. cit., p. 199.
  • 11
    MORCILLO, F A. e outros.
    El Sindicalismo de Clase en España, op. cit., p. 144.
  • 12
    CAMACHO, M.
    Charlas en la Prisión, Barcelona, 1976.
  • 13
    A associação voluntária pressupõe uma certa escolha orgânica-programática. Mas essa escolha nada tem a ver com uma concepção idealista das organizações operárias que, supõe, as pessoas se agrupam em organizações segundo um paradigma ideológico qualquer. Isto é, ou pode ser verdade, mas só em termos relativos. Pois, o primeiro "partido" da classe operária está constituído por ela mesma enquanto classe, está dado por sua própria existência estrutural.
  • 14
    Em Mandel, E.
    Control Obrem, Consejos Obreros, Autogestión (antologia), México, Era, 1974, p. 130.
  • 15
    Em Mandel, E.
    op. cit., p. 281.
  • 16
    THOMPSON, E.P.
    La formación Histórica de la Clase Obrera, Barcelona, Laia, 1977.
  • 17
    Em Mandel, E.
    op. cit., p. 277.
  • 18
    Toda a ação reivindicativa da classe operária tende a exercer um certo controle sobre o processo de trabalho. Entretanto, aqui estamos nos referindo ao controle tal como foi teorizado classicamente.
  • 19
    Quanto a isto, são significativas e sintomáticas as mudanças que estão ocorrendo na URSS sob o signo da "Perestroika" e da "Glasnost". Depois de anos de stalinismo, sob os quais a organização dos conselhos foi praticamente eclipsada e teoricamente anatematizada, estes parecem ter voltado ao horizonte dos dirigentes soviéticos na condição de organizações imprescindíveis para a construção do socialismo. Ver "Reformas Revolucionárias Requerem uma Ideologia Renovadora". Discurso de M. Gorbachov, Secretário Geral do CC do PUCS, pronunciado no pleno do CC do PCUS a 18.02.88, em Novedades de Moscú, Suplemento nº 9 (1.335), 1988.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Jan 2011
    • Data do Fascículo
      Mar 1989
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