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O continente cético: a Europa e os valores da modernidade

The sceptical continent: Europe and the values of modernity

Resumos

As grandes mudanças na Europa contemporânea exigem para a sua compreensão um exame das trajetórias históricas dos seus fundamentos valorativos e do modo como eles se manifestam nas condições atuais. O autor examina, de uma perspectiva "iluminista", os sinais de erosão de certas crenças e de emergência de novas orientações valorativas.


The great changes in contemporary Europe must be understood taking into acount the historical paths of its basic values and the way they manifest themselves in the present conditions. The author examines, from an "enlightened" point of view, the signs of erosion of some beliefs as well as of the emergence of new value orientations.


AS TRANSIÇÕES E A MODERNIDADE

O continente cético: a Europa e os valores da modernidade* * "The values of contemporary modernity", capítulo 14 de Göran Therborn, European modernity and beyond - the trajectory of European society 1945-2000, London, Sage, 1995, cap. 14, pp. 272-303. Tradução de Gabriel Cohn.

The sceptical continent: Europe and the values of modernity

Göran Therborn

Professor de Sociologia na Universidade de Götteborg, Suécia

RESUMO

As grandes mudanças na Europa contemporânea exigem para a sua compreensão um exame das trajetórias históricas dos seus fundamentos valorativos e do modo como eles se manifestam nas condições atuais. O autor examina, de uma perspectiva "iluminista", os sinais de erosão de certas crenças e de emergência de novas orientações valorativas.

ABSTRACT

The great changes in contemporary Europe must be understood taking into acount the historical paths of its basic values and the way they manifest themselves in the present conditions. The author examines, from an "enlightened" point of view, the signs of erosion of some beliefs as well as of the emergence of new value orientations.

Os padrões de valor da modernidade européia são antes de mais nada os da religião cristã e da sua secularização, do Estado nacional e da sua cidadania, e do individualismo e da classe. Os três padrões referem-se a dilemas, conflitos, rivalidades inerentes à via européia pela modernidade. Por outro lado há também a nova questão suscitada pelo multiculturalismo, com a coexistência lado a lado de culturas segmentadas; uma questão que outrora se supôs poder ser resolvida por uma secularização do Estado e a assimilação de seus habitantes, pela autodeterminação nacional, e pela igualdade individual - ou, alternativamente, pela limpeza étnica e pelo genocídio. Trata-se, aqui, de indicar algumas constelações e trajetórias neste vasto campo.

O CONTINENTE CÉTICO

O período posterior à Segunda Guerra Mundial viu, até recentemente, duas mudanças de grande envergadura na paisagem religiosa da Europa ocidental. Uma delas é basicamente uma conseqüência da guerra e dos seus efeitos políticos imediatos. A outra refere-se a uma nova fase numa tendência histórica de longo prazo. A mudança na relação do catolicismo como o Estado é a primeira, e novos níveis de secularização constituem a segunda.

Como uma organização supranacional, e especialmente como uma organização há muito ligada à ordem sócio-política medieval, a Igreja Católica entrou em conflito com o nacionalismo e o liberalismo modernos, com o Estado moderno. É verdade que, entre populações católicas desprovidas de qualquer estrutura política própria desenvolvida mas regidas por dirigentes de outras denominações, a Igreja Católica soube tornar-se um ponto de referência do nacionalismo moderno: a Irlanda e a Polônia são os melhores exemplos.

Na maioria dos países católicos os nacionalistas e os liberais ganharam as duras batalhas do século passado e do início deste, com a marcada exceção da Bélgica. O resultado foi uma relativa marginalização nacional, política e administrativa dos crentes mais radicais. O processo de reconciliação e reintegração começou após a Primeira Guerra Mundial (sublinhada de modo importante pela Concordata entre o Vaticano e a Itália fascista em 1929) mas somente se consumou e estabilizou após a Segunda Guerra Mundial.1 1 Uma análise um tanto anedótica por um observador direto da estratégia e da intensa atividade da Igreja na política italiana no imediato pós-guerra é dada pelo sociólogo político Gianfranco Poggi, "The Church in Italian politics 1945-50", in S.J. Woolf (ed) The rebirth of Italy, 1943-50, London, Longman, 1972.

Nesse período políticos explicitamente católicos tornaram-se líderes numa série de nações ocidentais modernas, do Estado italiano, que o Papado havia mantido sob anátema por mais de meio século, de nações anteriormente dirigidas por protestantes como a Alemanha e a Holanda. O catolicismo político tornou-se parte da "terceira força" mantenedora do Estado na França do pós-guerra, antes de implodir. Na Suíça os católicos haviam sido reintegrados já antes da Primeira Guerra. Portugal e Espanha mantiveram entre as guerras os seus regimes autoritários da Contra-Reforma. Mas quando a democracia retornou, na segunda metade dos anos 70, tanto o clericalismo quanto o anticlericalismo haviam-se tornado irrelevantes, sem terem dado origem a qualquer Democracia Cristã significativa.

Na Europa do Leste a continuidade ibérica foi rompida. Os regimes mais ou menos fascistas na Croácia, na Hungria, na Eslováquia e na Polônia de pré-guerra, com os quais o Vaticano havia mantido íntima aliança, caíram todos, ou foram jogados no lixo. Escasso espírito conciliatório foi exibido por um lado ou outro.

O pesadamente comprometido primaz croata, cardeal Stepinac, foi confirmado na sua posição pelo Vaticano, e seguiu numa posição militantemente direitista. Seu colega húngaro, Mindszenty, também escolheu uma posição irredutivelmente oposta às mudanças sociais após a guerra.

Na Tchecoslováquia e na Polonia a Igreja foi menos intransigente. Os comunistas, que detinham o poder estatal, responderam com prisões e julgamentos.2 2 Cf. F. Fetjö, Histoire des démocraties populaires: 1. Lère de Staline, Paris, Seuil, 1972, pp. 367 sg. Nos anos 50 uma espécie de modus vivendi católico-comunista foi estabelecido. Mas só na intensamente católica Polonia a Igreja conseguiu manter seu rebanho sob controle espiritual.

Na Alemanha oriental majoritariamente protestante o sucesso da secularização comunista foi notável e persistente, a despeito do papel desempenhado pela Igreja Luterana como abrigo para os movimentos de oposição nos últimos anos de agonia. Segundo número oficiais a proporção de pessoas que não professavam religião alguma aumentou de 7,6% em 1950 para 63,5% em 1989.3 3 G. Winkler (ed) Sozialreport '90, Berlin, Die Wirtschaft, 1990, p. 308. Mais claro do que qualquer outro dado a respeito disso talvez seja a manutenção após o Anschluss* * NT: Após a incorporação da RDA pela RFA. do secular rito de passagem juvenil da Jugendweihe, uma cerimônia com origens no movimento operário alemão clássico e fortemente promovido pelo regime comunista. Em 1994 cerca de metade dos jovens alemães-orientais com 14 anos passaram por essa comunhão. Em Berlim oriental a proporção dessa cerimônia secular em relação à sua contrapartida religiosa foi de 7,5 para l.4 4 Die Zeit, 22-4-1994, p. 78.

Os efeitos do Segundo Concilio Vaticano de 1965 foram primariamente internos ao catolicismo, abrindo-o aos povos do mundo moderno. Pelo menos no curto prazo aumentou a permeabilidade a influências seculares, algo que João Paulo II atualmente tenta neutralizar.

A segunda grande mudança no pós-guerra é a secularização. Isso foi especialmente dramático na Holanda, onde a vida política, cultural, social e até certo ponto também econômica havia-se organizado em "pilares" (zuillen) confessionais: o calvinista (subdividido em diferentes variedades), o católico, o social-democrata e, mais fraco, o liberal. Havia associações de "criadores católicos romanos de cavalos" e de "jardineiros cristão-protestantes", ou de organizações de empresários e de caridade do mesmo tipo, e companhias de seguros social-democratas ou liberais etc. Uma maneira de realçar a secularização holandesa consiste em assinalar sua expressão política. Nas 12 eleições parlamentares de 1918 a 1963 os partidos religiosos ganharam entre 52 e 58% dos votos. Em 1967 começou o declínio: 47,5%, e 41,0% em 1971, caindo para 36,0% um ano depois. A partir disso o eleitorado confessional estabilizou-se em volta de um terço dos votos, agora captura do principalmente por uma Democracia Cristã interdenominacional.5 5 Dados em T. Mackie e R. Rose, International Almanac of Electoral History, London, Mac-millan, 1982, p. 269, 273. Nas eleições parlamentares de 1994 os partidos religiosos holandeses obtiveram apenas pouco acima de um quarto dos votos, enquanto a democracia cristã interconfessional obteve 22,2% e os três partidos calvinistas fundamentalistas aliados, SGP, RPF e GPV, alcançaram juntos 4,8%.

Malgrado seu caráter generalizado e ter em geral retomado ímpeto a partir dos final dos anos 60, a secularização tem sido um processo desigual. Afetou as maiores igrejas protestantes com mais força do que a igreja católica, e afetou menos as variantes mais fundamentalistas do protestantismo. Associado à fertilidade diferencial isso conduziu ao fato de que nos anos 80 a Alemanha ocidental, a Holanda e a Suíça tivessem todas maiorias católicas6 6 Der Fischer Weltalmanach 1990, Frankfurt, Fischer, 1989, pp 138, 395, 466. É verdade que na Suíça isso se deve ao caráter majoritariamente católico (principalmente italiano) da população imigrante: Statistisches Jahrbuche der Schweiz 1992. . Onde a igreja vinculou-se à formação nacional recente as crenças e práticas religiosas mantiveram-se muito melhor do que em outros países. Na Europa esse é o caso com a Irlanda e a Polônia. Incluem-se no mesmo caso a Igreja Ortodoxa relativamente forte na Grécia e na Romênia.7 7 Sobre isso ver D. Martin, A general theory of modernization, Oxford, Blackwell, 1978, esp. cap. III: também do mesmo, "The religious condition of Europe", in S. Giner & M.S. Archer (ed) Contemporary Europe: social structures and cultural patterns, London, Rout-ledge & Kegan Paul, 1978.

No conjunto, a Europa, ocidental e oriental, emerge como o continente da secularização (ver Quadro 1). A distância religiosa da Europa em relação aos Novos Mundos (Brasil, Canada, Chile, México, EUA) e também à Zona ex-Colonial (índia e Nigéria) é notável. (Os dados para grupos de países representam médias não ponderadas, o que é problemático quando a dispersão é muito grande, como no caso dos países com Modernização Externamente Induzida - MEI: China, Japão, Coréia do Sul e Turquia, nos quais a freqüência a serviços religiosos pelo menos uma vez por mês varia entre 1% na China a 64% na Coréia do Sul). Dentro da Europa, cada metade contém uma exceção à regra muito religiosa, a Irlanda e a Polônia, ambas católicas. Os holandeses são polarizados, tanto contendo um forte contingente de não-crentes quanto, pelo outro lado, uma comunidade ainda maior de freqüentadores assíduos de igreja. Os países nórdicos, nesse aspecto como em diversos outros, revelam-se bastante similares à Europa oriental, em particular à parte não-católica desta. Mas ainda mais eles se associam ao caso da França, o centro das lutas pró e contra a modernidade na Europa ocidental.


Pode ser visto como um aspecto do processo de secularização que a influência cultural remanescente da religião tenha se tornado menos institucional, mais desencarnada, mais "puramente cultural". A Igreja Católica ainda é uma instituição supranacional poderosa, mas com a moderna separação de Igreja e Estado, a influência efetiva do papa e do Varticano sobre as nações católicas, mesmo no concernente a questões muito sensíveis do ponto de vista religioso, como o patriarcado, o divórcio, o aborto, é difusa e indireta mais do que exercida em contextos institucionais ou negociações formais.

As igrejas protestantes, por seu turno, são todas instituições nacionais (na Alemanha, mesmo provinciais) mas por muito tempo sem qualquer acesso especial ao poder político e à formulação de políticas das suas nações. O Protestantismo, com suas subdivisões em Luteranismo e Calvinismo, forma uma específica ressonância cultural herdada para as discussões de questões contemporâneas nos países protestantes. À parte os vínculos através de outros meios, como o Conselho Mundial das Igrejas e as conexões regionais-territoriais entre os países nórdicos, parece haver pouca cooperação entre as manifestações nacionais da mesma fé protestante. Parece haver mais interesse em contatos ecumênicos mais amplos do que no Luteralismo ou no Calvinismo internacionais. É verdade que desde 1973 está em vigor uma Concordata entre um grande número de igrejas luteranas e calvinistas na Europa ocidental, atualmente assinada por cerca de 80 denominações, mas seus efeitos reais parecem ser muito limitados. As importantes igrejas estatais luteranas dos países nórdicos mantiveram-se à parte.8 8 Frankfurter Allgemeine Zeitung, 3-5-1994, p. 5.

A Europa ocidental é o continente cético, com as crenças mais fracas tanto em Deus quanto na ciência (ver Quadro 2). O seu menor país, a Islândia é a exceção positiva (com dominance score de 41,2%, não incluído no quadro). A Europa ocidental situa-se entre dois países nórdicos: entre os extremamente céticos noruegueses, entre os quais os que crêem e os que não crêem na ciência distribuem-se quase igualmente - com os que crêem na ciência levando uma vantagem de 0,9%, seguidos pelos austríacos (6,8%) e pelos holandeses (8,0%) - e o vizinho ocidental da Noruega, a Islândia, ou então, tirante esta, seu vizinho mais próximo a leste, a Suécia (32,2%).


Enquanto os irlandeses católicos têm um ceticismo europeu ocidental em relação à ciência (15,2% de vantagem para as respostas favoráveis) seus irmãos e irmãs poloneses são entusiastas da ciência, com o recorde europeu de 66,6%.

Considerando-se em conjunto as crenças em Deus e na ciência, os europeus e os japoneses emergem como os céticos do mundo, separados dos crentes nos Novos Mundos, nas nações ex-coloniais; e num país muçulmano de Modernização Externamente Induzida como a Turquia.

DESAFIOS DO MULTICULTURALISMO

Seria errado, contudo, encerrar esta discussão num registro de fria complacência. O ceticismo e a assimilação supra-ideológica são fenômenos recentes como traços predominantemente europeus ocidentais, que estão sendo desafiados em seus próprios fundamentos de novas maneiras.

A capital da Europa ocidental, Bruxelas, está mesmo no centro desses desafios, com mais de um quarto da sua população estrangeira, dilacerada por conflitos intra-belgas, perplexa diante da dramática pós-industrialização, polarizada entre eurocratas privilegiados e pobres imigrantes muçulmanos que tentam fazer uso dos direitos tradicionais concedidos aos católicos, e fragmentada em 19 municipalidades diferentes. Até agora ninguém com a cabeça no lugar poderia dizer que a capital da União Européia tenha feito face a esses desafios.9 9 Cf. P. Bataille, "L'expérience beige", in M. Wievorka (ed) Racisme et xénophobie en Europe, Paris, La Découverte, 1994; Frankfurter Allgemeine Zeitung, 15-1-1992, p. 27; Die Zeit, 28-1-1994, p. 69.

A homogeneidade étnica e portanto cultural alcançou seu ápice na Europa nos anos 50, após o que o quadro começou a mudar, com a reversão histórica no início dos anos 60, quando cinco séculos de emigração reverteram para um período de imigração.

O anti-semitismo não morreu com Hitler. Ele foi claramente mantido vivo no período final do reinado de Stalin, da maneira mais sinistra na armação da "conspiração dos médicos" dos seus últimos dias. Sempre foi um tema sensível na Europa oriental comunista, porque os judeus tradicionalmente, e também após a guerra, haviam sido mais atraídos pelo comunismo, pela política comunista e pela vida intelectual comunista do que outras etnias. Com base num persistente anti-semitismo popular latente, a malhação do judeu sempre podia ser usada de modo oportunista nas querelas internas entre os dirigentes. O pior caso pós-stalinista foi o da Polônia em 1967-68.

Na Alemanha ocidental o anti-semitismo recuou lentamente. Enquanto algo menos do que metade da população não tinha opinião, uma clara maioria dos alemães ocidentais que a tinham no final de 1952 pensavam que uma Alemanha sem judeus seria uma Alemanha melhor. Somente em meados dos anos 50 essa distribuição de opinião se inverteu. O primeiro registro disto é de abril de 1956. Em março de 1960 a maioria daqueles que tinham alguma opinião não apoiariam que um judeu "muito qualificado" se tornasse primeiro-ministro no governo federal. Essa rejeição era comum aos democrata-cristãos, aos social-democratas e aos liberais Democratas Livres, mas é nos partidários destes últimos que a rejeição aos judeus era mais pronunciada. Uma ano depois a maioria da população ainda se opunha sem reservas a casar-se com um judeu ou uma judia.10 10 E. Noëlle & E. P. Neumann, The germans: public oppinio polls, 1947-1966, Westport, Greenwood Press, 1981, pp. 189-91.

Caso uma nova onda de anti-ideologia venha a emergir na Europa é mais provável que seja anti-islâmica do que anti-judia, no mínimo porque os muçulmanos são mais recentes e portanto mais diferentes, e estão se tornando mais numerosos.

Embora seja em todo lugar uma diminuta minoria, a chegada de novas comunidades religiosas - principalmente muçulmanos, mas na Inglaterra também hindus e sikhs - levantam novos desafios para estados secularizados e compromissos religiosos históricos.

As primeiras grandes mesquitas na Europa, fora da ex-área otomana, foram construídas nos anos 20. Uma, em Berlim, destinada principalmente a diplomatas e estudantes estrangeiros, a outra em Paris, exprimindo o caráter peculiar do poder colonial francês no Norte da África. Desde meados dos anos 60 houve um crescimento espetacular de centros de veneração islâmicos na França, de 68 em 1975 a 912 em 1985.11 11 Frankfurter Allgemeine Zeitung (FAZ), 18-6-1993, p. 12; G. Kepel, Les banlieues de I'Islam, Paris, Seuil, 1991, pp. 72-73 e 229. O Islã tornou-se uma minoria significativa na Europa. O número de muçulmanos não é conhecido exatamente. Parece haver cerca de três milhões na França, dois milhões na Alemanha e um milhão na Inglaterra, e podem ser encontrados também nos velhos países homogeneamente luteranos do Norte da Europa.12 12 Kepel, Les banlieues de l'Islam, p. 13; FAZ, 18-6-1993, p. 12; CSO, Social trends 24, London, HMSO, 1994, p. 145.

Na realidade, a Europa vem-se tornando cada dia mais central para o debate sobre o Islã e islâmico. Isso se deve principalmente à mais ampla liberdade de expressão na Europa, em contraste com as nações islâmicas originais.13 13 Neste ponto devo muito a uma série de conversas com o eminente islamologista sueco Jan Hjärpe, na Universidade de Lund. Mas a nova centralidade islâmica da Europa também tem seu lado sombrio. A perseguição de Salman Rushdie foi instigada pela comunidade islâmica de Bradford, na Inglaterra, e suas duas vítimas mais representativas até agora foram o imã e o vice-imã de Bruxelas, ambos assassinados.

A construção de mesquitas, o aumento de demandas islâmicas por educação - por exemplo, as demandas muçulmanas em Bruxelas em 1989 para a aplicação ao Islã do compromisso entre o Estado e a Igreja Católica no sentido do apoio público à educação confessional, o uso de "trajes islâmicos" nas escolas, uma preocupação com a moralidade na educação pública, o estabelecimento de uma universidade islâmica na França - enfim, demandas naturais de uma comunidade religiosa bem conhecidas da história da Europa continental, conduziram ao atrito cultural, desafiando tanto a secularização quanto o cristianismo.14 14 Um interessante sinal no nível de um argumento intelectual sério, é o livro do inter alia teólogo católico J.-C. Barreaur De l'Islam, Paris, Le pré aux Clercs, 1991. Ver também B. Lewis & D. Schapper (ed) Mussulmans en Europe, Poitiers, Actes Sud, 1992; M. Wievorka (ed) Racisme et xénophobie en Europe.

Por cerca de 20 anos uma guerra basicamente religiosa "de baixa intensidade" vem ocorrendo em parte da Europa ocidental, na Irlanda do Norte, entre católicos e protestantes, sem fim à vista até o final de 1994. O colapso do comunismo já abriu espaço para conflitos religiosos, ou reforçados religiosamente, nos Balcãs, na Ucrânia, no Cáucaso e na Ásia central. A Igreja Ortodoxa grega, o Catolicismo, (diferentes tendências do) Islã e, talvez, o Protestantismo norte-americano são os maiores competidores pelo vasto novo mercado de almas da Europa oriental e nas áreas a leste das fronteiras européias.

Neste momento não há bases firmes para predições acerca da periferia européia, nem de competição pacífica nem de guerras religiosas e novos conflitos religiosos. Mas o processo de secularização foi interrompido ali, e vem sendo questionado nas áreas centrais do continente. Se houver uma solução pacífica, dificilmente será seja a secularização/ assimilação ou a senda luminosa da crença correta, mas o restabelecimento de uma sociedade conscientemente multicultural. (...)

POS-NACIONALISMO?

No período posterior à guerra a Europa ocidental viu o encerramento de vários conflitos nacionais anteriores. Desapareceram os conflitos entre a Noruega e a Dinamarca sobre a Groenlândia, entre a Bélgica e a Holanda sobre as vias aquáticas Scheldt, e entre a França e a Alemanha sobre a Alsácia-Lorena. A questão da partilha da Irlanda foi posta em repouso por décadas. As terras originalmente dispersas e ocupadas da Alemanha ocidental e da Áustria foram logo reunificadas em ambos os casos com pouco atrito. O retorno do Sarre à Alemanha ocidental e a retenção pela Itália do sul do Tirol foram decididos pacificamente.

Os conflitos de estados nacionais foram superados. Enquanto um quarto a um terço dos franceses tinham uma opinião "má ou muito má" dos seus vizinhos alemães em meados dos anos 50, na altura dos 80 pesquisas de opinião na França e também na Alemanha revelaram que o outro era o melhor amigo.15 15 M. Dogan, "Comparing the decline of nationalismin Western Europe: the generational dynamic", International Social Science Journal, 136, 1993, p. 186. Questões nacionais quentes foram congeladas ou então derretidas pela polarização sócio-política entre comunismo e capitalismo. A Alemanha ocidental tornou-se aliada da Inglaterra e da França, enquanto a Alemanha oriental se alinhava com a URSS. A Guerra Fria congelou a velha questão macedônia, e na realidade todas as questões balcânicas, ao longo das fronteiras definidas em Yalta. Ela também manteve sob controle o irredentismo alemão.

Na Alemanha oriental os soviéticos encaravam com suspeita os agrupamentos regionais - rompendo com a Iugoslávia de Tito por causa de uma federação balcânica - mas eram ainda mais vigilantes em relação a quaisquer manifestações de nacionalismo. O ódio nacional entre húngaros e romenos, húngaros e eslovacos, poloneses e alemães, checos e alemães, da maior parte dos europeus orientais contra os russos etc. - ficou oculto pelo biombo do "internacionalismo proletário".

Pouca coisa demonstra com mais clareza a nova era pós-nacionalista na Europa, o novo espírito do tempo, do que o fato de que nenhum dos novos aliados da Alemanha ocidental apoiou uma amputação dos novos estados comunistas polonês e checo em favor das fronteiras do Reich em 1937. Todo tipo de subversão do comunismo era legítimo, mas não revisões de fronteiras.

A despeito de toda sua concepção nacional ocidental e low-profile, contudo, os cristão-democratas da Alemanha ocidental jamais chegaram a se conformar com a aceitação voluntária do mapa da Europa de pós-guerra. Mas eles não tinham poder para retraçá-lo, e coube aos social-democratas (e os liberais, livres da sua ala nacionalista) sob a liderança de um emigrado antifascista, Willy Brandt, reconhecer explicitamente a era pós-nacionalista da Europa ocidental e central.

Por "nacionalismo" entendemos aqui o -ismo em torno do Estado nacional, afirmações ideológicas acerca da sua necessária criação, se não da sua existência, sua defesa, sua extensão, seu poder e sua glória. Como tal, o nacionalismo não é sinônimo de valores étnicos, que dizem respeito a questões de homogeneidade e heterogeneidade e a interesses étnicos (como quer que sejam definidos) no interior das fronteiras e da potência de um dado Estado. A Europa de pós-guerra experimentou uma sobredeterminação sócio-política do nacional, que se manifestou num orgulho nacional mais modesto.

Mesmo admitindo uma ampla margem de interpretações incertas, duas diferenças destacam-se no Quadro 3. Houve uma considerável diminuição de orgulho nacional no núcleo da Comunidade Econômica Européia da Europa ocidental desde 1970. Em segundo lugar, em torno de 1990 havia significativamente menos orgulho nacional na Europa do que em outras partes do mundo, exceto o Japão.16 16 A porcentagem de "muito orgulhosos" com sua nacionalidade foi 43 na China, 45 na Coréia do Sul, 53 no Chile, 56 no México, 60 no México, 64 no Brasil e na África do Sul, 67 na Turquia e 68 na Nigéria, segundo o World Values Survey 1990-1991, dirigido por R. Inglehart. Não há diferença geral na extensão do orgulho nacional entre a Europa ocidental e a oriental. As proporções mais baixas encontram-se na Europa central, salvo a Áustria-Hungría, e na Rússia. Os dois mais orgulhosos, os poloneses e irlandeses, estão forado seu contexto, assim como o estão no seu zelo católico.


A Segunda Guerra Mundial teve um forte impacto sobre as potências derrotadas. Apenas uma minoria da população diz estar disposta a lutar por seu país na Alemanha, Itália e Japão. Isto também se aplica à Bélgica, mas no resto do mundo coberto pelo mais recente World Values Survey só ocorre no Brasil (ver Quadro 4).


Questões e respostas assumem significados diferentes em contextos diferentes. A média global da Europa ocidental está inflada pela posição heróica de umas poucas nações pequenas e pacíficas, que nunca combateram uma guerra moderna - A Dinamarca, a Islândia e a Suécia, com 89,77 e 89% de combatentes dispostos, respectivamente. A média de 53%, para a Inglaterra (74%), a França (66%), a Alemanha ocidental (42%) e a Itália (31%) é mais expressiva. Na Europa oriental, só os alemães (53%) e os checos, os compatriotas do "honesto soldado Svejk" (66%) revelam amplas reservas sobre combater. Entre os poloneses, os bielorussos e os búlgaros (acima de 90%) manifestavam sua disposição. (A contrapartida ocidental católica-nacionalista dos poloneses, a Irlanda, junta-se neste ponto ao padrão europeu ocidental, com 61 % dispostos a lutar em caso de guerra).

Com que causas estão comprometidos os europeus? Juntando dados de dois boletins de opinião europeus (Eurobarometer), para os anos 1982 e 1987, obtemos o seguinte quadro. Dois terços (63%) estavam dispostos a sacrificar algo pela paz mundial. Dois quintos poderiam oferecer algo pelos direitos humanos (43%), a luta contra a pobreza, a proteção da natureza e a liberdade individual (36%). Apenas um quinto (20%) estavam prontos a sacrificar algo pela defesa nacional.17 17 Comission of the European Communities, Eurobromètre: l'opinion publique et l'Europe 9, 1989, p. 6.

De 1982 temos um survey Eurobaromètre dos países da União Européia (menos a península ibérica), cobrindo jovens e adultos, sobre causas "pelas quais você acha que valha a pena fazer algo, mesmo que isso envolva algum risco ou o sacrifício". De uma lista de dez itens, "paz mundial" foi mencionado pela maioria em todos os países, exceto a Irlanda. A maioria dos franceses e dos gregos estavam dispostos a fazer algo acerca da "luta contra a pobreza", pelos "direitos humanos" e pela "liberdade do indivíduo". Os luxemburgueses comprometeram-se contra a pobreza e a favor dos direitos humanos. Também os holandeses responderam à questão dos direitos humanos.

Nenhuma outra questão empolgou uma maioria em lugar algum. Nenhuma causa na lista convenceu uma maioria entre os irlandeses, nem mesmo sua "fé religiosa". Além da paz mundial, nada obteve uma maioria entre belgas, ingleses, dinamarqueses, alemães e italianos. Em todos os países a preocupação com a pobreza e a proteção ambiental foi significativamente maior do que com a defesa nacional.18 18 Eurobarometer 17, abril de 1982, questão 144 (edição ICPSR, Ann Arbor, Michigan, 1983). As causas na lista eram igualdade sexual, proteção ambiental, paz mundial, pobreza, defesa nacional, fé religiosa, a unificação da Europa, liberdade do indivíduo, direitos humanos, a revolução. Vale a pena lembrar que os programas Guerra nas Estrelas e de rearmamento de Reagan estavam na agenda política na época do survey.

À guisa de conclusão, há razões comportamentais tanto quanto de atitudes para caracterizar a Europa ocidental como pós-nacionalista, definindo-se "Europa ocidental" como Europa a oeste dos rios Oder-Neisse e do mar Adriático.19 19 Cf. Dogan, "Comparing the decline of nationalism". Mesmo que se possa sustentar que não é pós-nacionalista, essa área tornou-se no final deste século a parte menos nacionalista do mundo.

A transformação alemã no pós-guerra foi central nesse processo. Em vista disso a atual retomada, na esteira da reunificação, de um discurso explicitamente nacional e proto-nacionalista em certos círculos políticos e intelectuais alemães precisa ser observada atentamente por todos os que se preocupam com o futuro da Europa.20 20 Este tema vem sendo objeto de vivo debate na imprensa alemã (em 1994) O mesmo se aplica, é claro, ao enterro oficial do antifascismo pelo governo parcialmente neofascista de Berlusconi na Itália de 1994. Entretanto, isso não é (ainda) uma era de nacionalismo no Ocidente. A opinião iluminista deste autor é que a Europa irá sobreviver pacificamente tanto à reunificação alemã quanto à incipiente reabilitação italiana do fascismo.

NOVAS ARTICULAÇÕES

Uma outra síndrome da modernidade cultural européia pode ser resumida como caracterizada por uma mescla de articulações em termos de classe de valores políticos, coletivismo público e individualismo familiar.

A articulação de valores e identidades por classes é conseqüência da rota endógena, industrial para a modernidade. Mais que em qualquer outro lugar no mundo, é na história européia que identidades coletivas com base em conjuntos complexos e heterogêneos de posição econômica, vale dizer, identidades de classe, divisões culturais e conflitos auto-conscientes entre esses conjuntos, o discurso público sobre eles e a organização coletiva fundada neles desempenharam um papel crucial.

O movimento da classe trabalhadora nasceu na Europa, e seu discurso de classe difundiu-se a partir dela. Direitos políticos modernos como o direito ao voto foram definidos, discutidos e objeto de lutas em termos de classe na Europa, mais do que em qualquer outro lugar.21 21 Ver G. Therbom, "The right to vote and the four world routes through modernity"in R. Torstendahl (ed) State theory and state history, London, Sage, 1992. Partidos governantes que explicitamente se referem a si próprios como partidos de classe e que se estabeleceram como tais em eleições competitivas estão confinados à Europa, as áreas de colonização européia nos antípodas (na Austrália e na Nova Zelândia) na antiga colônia britânica da Jamaica e, no passado, no Chile.

O caráter endógeno da modernidade européia significou que todas as batalhas a favor ou contra uma perspectiva de progresso frente a uma de experiência e tradição, a favor ou contra direitos populares ou divinos, foram travadas entre os próprios nativos.

Os desenvolvimentos do pós-guerra diluíram a densidade dos meios de classe, com os novos subúrbios do boom, com a desindustrialização desde os anos 70, com os novos padrões de consumo e de mediação cultural. Por outro lado, as perspectivas de classe também foram estendidas, pela urbanização, pela industrialização ao Sul a ao Leste, pela secularização e por um declínio geral de deferência tradicional. O movimento operário europeu ocidental alcançou sua influência política e industrial mais ampla por volta dos anos 80.22 22 Ver também G. Therborn, "The prospects of labour and the transformation of advanced capitalism", New Left Review 145, 1984. Cf. J. Mooser, Arbeiterleben in Deutschland, 1900-1970, Frankfurt, Suhrkamp, 1984; G. Noiriel, Les ouvriers dans la societé française, Paris, Seuil, 1986; M. Jacques & F. Mulhern (ed), The forward march of labour halted?, London, Verso, 1981; W. Korpi, The democratic class struggle, London, Routledge, 1983; R. Ebbin-ghausen & F. Tiemann (ed) Das ende der Arbeiterbewegung in Deutschland?', Opladen, Westdeutscher Verlag, 1984.

A corrente do coletivismo público, do apoio para o uso de instituições e recursos públicos para propósitos coletivos, deriva tanto da tradição da fase inicial do Estado moderno, do absolutismo e das monarquias constitucionais, como dos desafios de classe. O intervencionismo público foi estimulado pelos oponentes do movimento operário socialista, como Napoleão III, Bismarck ou Leão XIII, tanto quanto pelos seus aderentes. Ao invés de enfraquecer-se ou tornar-se supérfluo pela expansão econômica do pós-guerra, essa tendência intervencionista reafirmou-se por volta de 1960, sobretudo com a enorme expansão do Estado de bem-estar social. Batalhas políticas cruciais foram ganhas pelos intervencionistas, no interior da Democracia Cristã na Alemanha ocidental e pela Social-democracia escandinava. E, ambos os casos a questão chave era um sistema público de aposentadoria.

Há diferentes tipos de individualismo e de coletivismo. O individualismo econômico e político geralmente está associado com o coletivismo familiar patriarcal. A história européia de confrontos ísmicos de ideologias incluiu a maior parte das combinações concebiveis. No entanto, no que se refere aos últimos cem anos e em particular ao último meio século, creio que se pode sustentar que a Europa teve, mais do que qualquer outra parte, uma combinação de formas políticas e econômicas de coletivismo com individualismo familiar.

Várias forças interagiram nisso. O padrão familiar do início da modernidade na Europa ocidental e central, com casamentos tardios e um considerável número de celibatários, manifestou um relativo individualismo familiar. Envolvia um período de juventude solteira relativamente longo, que facilitava a ação associativa de modo geral, e em particular a ação de risco, oposicional, como a ação de classe operária.

Os teóricos e líderes do movimento operário socialista - Marx, Engels, Bebei e outros - eram explicitamente anti-patriarcais pelo menos na retórica e, junto com alguns poucos intelectuais liberais como John Stuart Mill, os socialistas foram desde o início os melhores amigos das mulheres, embora raramente muito fiéis.

O entrincheiramento do patriarcado na família e na sociedade civil geralmente significava que o estabelecimento de direitos e liberdades individuais para mulheres e crianças requeria a intervenção estatal. Ocasionalmente a tradição intervencionista européia foi aplicada para esse propósito.

Uma concepção individualista igualitária do casamento foi adotada pioneiramente pelos países escandinavos nos anos 10 e pelos revolucionários soviéticos nos anos 20. Algo similar ocorreu com a posição das crianças, com respeito às quais a interdependência do individualismo personalista com o coletivismo público intervencionista é muito claramente visível. No final dos anos 20 a primazia dos "melhores interesses da criança" nas disputas familiares havia sido estabelecida na Escandinávia e na Inglaterra (e na maior parte dos EUA).

A legislação soviética de meados dos anos 20 foi pioneira na proibição da punição física a crianças. Aparentemente esse tipo de humanitarismo resistiu bem à brutalidade do stalinismo nos anos 30. Quando soldados camponeses desertores da União Soviética foram entrevistados por sociólogos norte-americanos em 1950-51, foi registrado o seguinte veredicto sobre a legislação soviética: "As crianças devem ser obedientes a seus pais, mas num Estado livre como a URSS isto é impossível".23 23 K. Geiger, The family in Soviet Russia, Harvard University Press, 1968, p. 99; ver também na página 274 uma outra entrevista segundo a qual uma criança que tivesse sido submetida a maus tratos podia dirigir-se ao soviet da aldeia, com o que o pai seria multado. A norma contra a punição física de crianças havia sido internalizada, e informantes ficaram horripilados ao verem crianças sendo batidas na Alemanha do pós-guerra.24 24 Idem, p. 275 Preocupações conservadoras relativas à natalidade e de caráter acomodaticio finalmente vieram a impor-se à política familiar da era stalinista, na URSS desde 1944 até o novo código da familia de 1968.25 25 Um resumo da legislação soviética sobre a família é dado por D. Lane, Soviet economy and society, Oxford, Blackwell, 1985, pp. 110 sg. Mas no conjunto pode-se dizer que os arranjos relativos às relações de gêneros e de gerações constituem a conquista mais persistentemente progressiva do leninismo, talvez a única a permanecer. Após a guerra eles foram transmitidos aos novos dirigentes da Europa oriental, mas sem o individualismo de vanguarda dos anos 20 soviéticos, revestidos, ao invés disso, de solenes exortações normativas de caráter stalinista.26 26 Ver também Familiengesetze sozialistischer Lander, Berlim oriental, Deutscher Zentral-verlag, 1959.

A Escandinávia continuou a ser a vanguarda das crianças, contudo. Após ter eliminado o espancamento nas escolas no início do pós-guerra, nos anos 80 os escandinavos legalmente proibiram os pais de espancar seus filhos, um direito que o Código Civil espanhol de 1981 explicitamente dava aos pais (parágrafo 155). Neste particular os escandinavos até agora só foram seguidos pelos austríacos. Os países nórdicos também adotaram o pressuposto legal da custódia/responsabilidade conjunta dos pais em relação aos seus filhos, independente do estado civil dos pais ou de estão ou não coabitando. No caso norueguês a isto se associa o direito das crianças de procurar outros guardiões, mas os pais não podem escapar da sua responsabilidade legal perante seus filhos.27 27 Ver também, e para referências, G. Therborn, "The politics of childhood: the rights of children in modern times", in F. Castles (ed) Families of NationsI, Aldershot, Dartmouth, 1993.

"POS-MATERIALISMO"

A interessante e famosa tese desenvolvida por Ronald Inglehart28 28 R. Inglehart, The silent revolution, Princeton University Press, 1977, e Culture shift in advanced industrial society, Princeton University Press, 1990. , de uma "mudança de marcha" cultural, passando dos "valores materialistas" para "pós-materialistas", não se refere apenas à mudança cultural. Ela também explicitamente vai no sentido de considerar declinante o significado da classe social no concernente a avaliações e atos políticos, tais como votar.

Em nosso contexto o trabalho de Inglehart levanta duas questões. É verdade que a classe perdeu seu caráter como algo específico à política européia? Em segundo lugar, é correto dizer que "pós-materialismo" indica uma virada histórica no rumo de uma "polarização política com base em valores"?

Sem negar o grande valor do trabalho empírico de Inglehart - do qual eu próprio me estou gratamente servindo - parece-me claro que a tese básica da substituição de uma polarização política "com base na classe" por uma "com base em valores" está prejudicada em dois pontos. (Claro que se algo está prejudicado isto não significa que não tenha substância).

Em primeiro lugar, a concepção de voto de classe de Inglehart deriva da distinção anglo-saxã entre manual e não manual e do índice de voto de classe inventado por Robert Alford, a saber, a porcentagem de trabalhadores manuais que votam esquerda menos a porcentagem de votos para a esquerda de trabalhadores não-manuais. Esse já foi um útil instrumento de medida, e Inglehart está em considerável companhia ao usá-lo. Mas há dois problemas com ele. O principal deles é a sua duvidosa utilidade para comparações ao longo de tempo considerável. Essas comparações pressupõem que a distinção social entre ocupação manual e não-manual é mais ou menos a mesma hoje do que era nos anos 50. As mudanças na estrutura social tornam isto muito improvável.

Especialistas suecos em pesquisa de opinião calcularam o tamanho do efeito estrutural de mudanças categoriais muito amplas. Com a mesma estrutura de ocupações não-manuais em 1985 do que em 1956, o índice de voto de classe sueco teria mudado de 51 para 42 e não para 34, como ocorre quando se opera com uma divisão manual / não-manual sem quaisquer ajustes.29 29 S. Holmberg & M. Gilljam, Váljare ochvali Sverige, Stockholm, Bonniers, 187, p.184. Uma atenção maior à mudança do significado de ter uma ocupação "não-manual" certamente diminuiria ainda mais a mudança registrada.

Uma outra crítica pertinente é mais técnica, e tem a ver com a mensuração mais adequada para o voto de classe. John Goldthorpe e colaboradores na Inglaterra sustentaram que o voto de classe deveria ser captado pela divisão das probabilidades dos votos para a esquerda de ocupações manuais pelas probabilidades de ocupações não-manuais fazerem o mesmo. Essa medida de voto transversal à classe não exibe tendência declinante do voto de classe no que se refere à Inglaterra.30 30 Para um apanhado do debate veja-se A. Heath, "Class and political partisanship" e D. Kav-anagh, "Ideology, Sociology, and the strategy of the British Labour Party", ambos em J. Clark et al (ed) John H. Goldthorpe, London, Falmer Press, 1990. Em suma, a questão sobre a extensão do declínio secular do voto de classe, e sobre se ocorreu, permanece aberta à controvérsia.

Em segundo lugar, a contraposição por Inglehart dos valores materialistas / pós-materialistas ao alinhamento de classe é questionável também no tocante ao modo como concebe esses valores. Por alguma razão ele deu ao seu valor "materialista" uma orientação engajada, de direita. Nas democracias ocidentais, na maior parte do tempo a manutenção da ordem, o combate à inflação e ao crime, a manutenção de uma defesa nacional forte e, em menor escala, a manutenção de altas taxas de crescimento ou de uma economia estável31 31 R. Inglehart, Culture shift, pp. 74-75 têm sido prioridades da direita. Por seu turno, o "materialismo" de esquerda se manifestaria no combate ao desemprego e à pobreza, no empenho pela garantia da igualdade econômica e da seguridade social.

O resultado disso é que a dicotomia de Inglehart entre "materialismo e "pós-materialismo" não pode ser usada como uma alternativa à classe na predição de alinhamento político, porque ela própria envolve em grande parte uma oposição tradicional esquerda-direita. Que uma ideologia de esquerda mais provavelmente será expressa em voto de esquerda do que pertencer à classe operária é pouco surpreendente. Além disso, a operacionalização da distinção ajuda pouco a distinguir o que usualmente se quer dizer com valores materialistas ou não-materialistas.

Devido à operacionalização engajada da dicotomia materialismo / pós-materialismo deixa de ser paradoxal, como deveria ser, que a opção política mais nitidamente "materialista" na Comunidade Européia, segundo os próprios dados de Inglehart, seja a Democracia Cristã.32 32 Ibidem, Tabela 8-7, p. 280.

Seja como for, examinemos os dados empíricos sobre o voto de classe manual / não-manual. Graças a Ronald Inglehart temos disponíveis um amplo conjunto de dados presumivelmente comparáveis entre nações, reunindo as sondagens políticas do Eurobarometer para o período de 1980 a 1987. Para cada país calcularemos o quociente das proporções de que alguém da classe manual e alguém da não-manual vote o maior partido de esquerda e o maior partido de direita. Isso nos dá uma medida de apoio de classe relativo para ambos os conjuntos de partidos, independente do seu tamanho relativo. O significado global do voto de classe será indicado pelas probabilidades dos manuais votarem o partido mais à esquerda ao invés de o mais à direita entre os maiores partidos, dividido pela probabilidade correspondente entre os não-manuais. O quociente das probabilidades indica quanto a chance de escolher uma ou outras das duas maiores alternativas políticas no país é afetada por pertencer-se à classe manual ou à não-manual. Em ambos os casos, quanto maior a distância de 1,0 mais o voto é específico de classe. Um quociente porcentual maior que 1,0 significa que um número maior de manuais do que de não-manuais estão apoiando um partido de direita, ou vice-versa. Um quociente de probabilidades inferior à unidade significa que o partido mais à direita tem mais apoio do que o outro em ambas as classes. (Ver Quadro 5). No quadro a referência a partidos de esquerda e direita é bastante ampla. (Nos EUA a esquerda é representada por Mondale e a direita por Reagan nas eleições presidenciais de 1984).


O voto de classe ainda é uma característica específica da Europa nos anos 80. A Grécia é uma exceção, próxima aos EUA na distribuição relativa por classe dos votos. Mas as diferenças intra-européias são muito grandes. A Dinamarca, e a Escandinávia de modo mais geral, têm as clivagens de classe mais nítidas. Na eleição sueca de 1991, por exemplo, o quociente manual / não-manual de eleitores da esquerda (Social-democracia ou partido da esquerda) foi de 2,14. Depois da Escandinávia, a Inglaterra, a Itália, a Espanha e Portugal tem políticas de classe mais acentuadas. Vale a pena notar que a França distingue-se dos outros países latinos e se alinha neste respeito com um aglomerado de países da Europa ocidental-central em que as clivagens de classe no voto são mais borradas.

Os partidos socialistas do Sul da Europa têm uma base social consideravelmente mais ampla ou mais heterogênea do que suas contrapartidas ao Norte. O Partido Comunista Italiano (o maior partido de esquerda italiano, agora o Partido da Esquerda Democrática - PSD e membro da Internacional Socialista) por sua vez, assemelha-se mais às social-democracias do Norte.

Em termos nacionais, contudo, as diferenças da base eleitoral de partidos de direita são muito maiores do que as nos partidos de esquerda. O bem sucedido apelo supra-classes da Democracia Cristã exprime-se em quocientes manuais / não-manuais unitários ou próximos à unidade na Bélgica, na Holanda, na Itália e, em escala um pouco menor, na Alemanha. O partido nacionalista irlandês Fiánna Fáil na realidade tem mais apoio no manual do que no não-manual. O contraste com a direita escandinava é trazido à tona do modo mais chapado no apoio esmagadoramente não-manual para o Partido Conservador dinamarquês, uma agremiação bem sucedida também nos anos 80, liderando o governo.

O significado político da classe (que, convém não esquecer, é aqui tratado de modo muito rudimentar pela distinção manual / não-manual) variável como é, não exibe qualquer padrão econômico claro - de desenvolvimento econômico, ou de desigualdade econômica, digamos. Ao invés disso as variações parecem manifestar culturas nacionais historicamente formadas, suscetíveis elas próprias de análise estrutural-cultural, contudo.

Uma revisão e reanálise de um grande número de estudos eleitorais por Paul Nieuwbeerta e Wout Uitee permite chegar a três conclusões. Em primeiro lugar, ao longo de todo o período pós-guerra os países nórdicos apresentaram de longe a maior divisão por classe no seu padrão de voto. Segundo, há uma tendência secular mas desigual em termos nacionais no sentido do declínio do voto de classe, definido em termos de manual versus não-manual. Terceiro, há carência de explicações gerais para as variações. A única hipótese que se manteve em pé foi a de que quanto maior a classe operária manual maior o voto de classe.33 33 P. Nieuwbeerta & W. Uitee, "Explaining differences in the level of class voting in 20 Western industrial nations, 1945-1990", Nijmegen, Dept. of Sociology of the Catholic University of Nijmegen, 1992.

A antiga orientação européia para a intervenção pública e os arranjos sociais coletivos mantêm-se como valores específicos do continente também no início dos anos 90. (Ver Quadro 6). No quadro 6, com dados de 1991, o índice de apoio varia de 1,0 (forte acordo) a 5,0 (forte desacordo).


É nítido o apoio à provisão governamental no Leste europeu pós-comunista, mesmo antes que se tornassem discerniveis os efeitos da "terapia de choque" (exceto na Polônia). O menor apoio foi na Checoslováquia, mas mesmo neste caso o índice de 2,22 indica considerável mais apoio do que o do país mais positivo da Europa ocidental, a Alemanha, com 2,42. O apoio mais forte à provisão governamental foi obtido na Alemanha oriental (1,68), na Hungria (1,73) e na Esolovênia (1,87). No conjunto a Europa é claramente diferente dos EUA mas não, neste ponto, do Japão.

Resultados similares foram obtidos pelo International Social Survey em 1990. Apoio consideravelmente menor para a redistribuirão governamental de rendas foi verificado nos EUA e na Austrália do que em qualquer um de seis países europeus (desta feita incluindo a Suíça). Na sua análise do survey Geoffrey Evans encontrou uma identidade de classe mais clara na Europa mas não uma diferença sistemática na extensão de polarização de classe em torno da questão da redistribuição governamental.34 34 G. Evans, "Class conflict and inequality", in R. Jowell et al (ed) International social attitudes: the 10th BSA report, Adershot, Dartmouth, 1993, pp. 126, 124; cf. também P. Taylor-Gooby, "What citizens want from the state", no mesmo volume.

O coletivismo público também implica não caber unicamente aos proprietários a administração de empresas privadas, mas que também os empregados e/ou o Estado devem ter voz. E também aqui é discernivel um padrão de valor europeu, ainda que não único. (Ver Quadro 7).


Aqui é a América do Norte (apoio irrestrito para propriedade/ administração, canada 53% e EUA 57%) que se destaca do resto do mundo. Nenhum dos 24 países europeus no survey alcançou o nível norte-americano de individualismo proprietário. A linha divisória Leste-Oeste na Europa também é bem marcada. Apenas três dos dez países orientais aproximam-se da média ocidental: os búlgaros (40%), os estonianos (42%) e os lituanos (38%).

INDIVIDUALIZAÇÕES

Na maior parte do mundo moderno - com a principal exceção dos novos mundos criados pela migração, especialmente suas plantations escravistas e as sociedades que as sucederam - a sexualidade e a paternidade foram normatizadas de modo bastante estrito. Áreas periféricas, estratos sociais marginais e subpopulações migrantes podem ter-se desviado da norma central, sem comprometer sua validade legítima. Após os deslocamentos sociais iniciais com a capitalização da agricultura, a industrialização, a urbanização etc, seguiu-se na Europa uma estabilização normativa, em torno do casamento e da domesticidade. À parte os ápices de períodos de guerra a proporção de nascimentos fora da casa paterna tenderam a declinar ao longo do século 20, ou manteve-se estável.35 35 P. Flora (ed), State, economy and society in western Europe, 1815-1975, Frankfurt, Campus, vol 2, cap. 2.

Pelo menos isso foi assim até os anos 70, ou meados dos 60 em alguns casos. Então uma mudança dramática ocorreu. Não há evidência dura, comparativa, sobre a mudança nas normas e práticas sexuais em geral. Que mudaram, toda pessoa com um contato com esses tempos sabe. A proporção de nascimentos extramaritais não é um indicador muito bom da extensão da mudança sexual, particularmente não com os avanços da tecnologia anticoncepcional. A pílula anticoncepcional foi liberada para uso geral nos EUA em 1960, e espalhou-se pela Europa ao longo da década - na Alemanha ocidental, por exemplo, desde os meados dos anos 60, recebida com severas advertências morais e pela condenação papal. Abster-se de casar é também um reflexo da secularização, que, como vimos antes, deu um salto nesse mesmo período.

Apesar disso não me parece que a quantidade de casamentos extramaritais seja um indicador de uma desregulação de normas sexual e de paternidade em favor de uma margem mais ampla de escolha individual. Isso vale em particular na medida em que a mudança não se concentra no interior de um grupo étnico ou social especial, o que de modo geral não é o caso na Europa.

O padrão ilustrado no Quadro 8 é muito desigual, com uma ampla margem entre os dois pólos da Suécia e da Grécia. Séries temporais mais longas mostram que a presente taxa austríaca de nascimentos extramaritais é aproximadamente a mesma que em 1919, e claramente abaixo do que era em 1927-35. Meu palpite é que está em jogo um afastamento de parte da população em relação à Igreja Católica, junto com direitos sexuais. Os países nórdicos, por sua vez, e a Suécia em particular, exibem incrementos dramáticos a partir dos anos 60. Em 1960 os nascimentos extramaritais correspondiam a 11,3% do total de crianças nascidas vivas na Suécia, número que quase se havia multiplicado por cinco em 1990.


No quadro podemos discernir uma tendência protestante no sentido de uma sexualidade mais informal, com a exceção tradicional da Áustria e mais recente da França em relação a um padrão mais estritamente católico. Mas não há efeito comunista discernivel. A (ex) protestante Alemanha oriental comunista estava próxima da Dinamarca protestante e capitalista, mas não da Checoslováquia ou da Hungria comunistas católicas, que eram semelhantes à Alemanha ocidental e a Portugal.

Aqui torna-se difícil falar de qualquer padrão para toda a Europa em termos de níveis. Mas há uma tendência para uma mudança rápida particularmente na Europa. (Enquanto a taxa de divórcio, também um indicador de individualismo familiar, tendeu a crescer mais nos EUA, em medidas absolutas, do que na Europa ocidental, a partir de um nível anteriormente muito mais elevado).36 36 F. Castles & M. Flood, "Why divorce rates differ: law, religious belief, and modernity", in Castles, Families of nations, p. 304. Os países da Europa do Norte representam da maneira mais clara uma combinação de individualismo privado com coletivismo público. Em outros países tendências nessa direção podem ser discernidas.

As relações entre crianças e pais foram significativamente afetadas por três outras tendências pós-1960, todas as quais tendem a enfraquecer o coletivismo familiar. Uma é a entrada dos meios de massa, da televisão, na vida das crianças, que abre todo um mundo especial fora dos do lar e da vizinhança. Se o seu efeito principal é uma moldagem global pelos media ou uma extensão da individualização permanece uma questão aberta. A junção das alternativas opostas é mais uma manifestação da dialética da modernidade.

Em segundo lugar, há o desenvolvimento, do qual foi pioneira a Europa oriental e forte na Escandinávia após 1970 mas muito menos importante nos outros lugares, do cuidado infantil extra-maternal, e da escolarização pré-primária, nas "escolas maternais" francesas, italianas e belgas, nos Kindergarten alemães etc. Tanto os meios de comunicação quanto a atenção infantil / pré-escolarização revertem a centralidade maternal no lar que se seguiu à constituição da infância moderna.

Em terceiro lugar, a vida conjugal mais instável dos pais também está começando a afetar as relações criança-pais. Aumentou o número de domicílios com um só membro do casal, compreendendo no início dos anos 80 cerca de um oitavo de todos os domicílios com crianças na Europa ocidental. Em regra ocorre uma estreita banda de variação, de 10,2% na França a 14,2% na Suécia, com a Irlanda (e talvez algum país do Sul da Europa) como a exceção por baixo, com 7,1%. No tocante à monopatèrnidade a Europa ocupa uma posição intermediária entre o Japão, com 4,1%, e os EUA (com sua sociedade de gueto e taxa de divórcio geralmente mais alta) com 26%.37 37 OECD, Les families monoparentales, paris, 1990, p. 34. Na União Soviética em 1979 14% de todas as unidades familiares eram desse tipo.38 38 Lane, Soviet economy and society, p. 113. O número é um dado de censo.

Se calcularmos do ponto de vista das crianças, cerca de 95% de todas as crianças até a idade de 15-16 (ou mais tarde se ainda na educação compulsória)na Irlanda, Itália e Suíça, cerca de 90% na Checoeslováquia, Finlândia, França, Alemanha oriental e ocidental e na Grã Bretanha, cerca de 85% na Escandinávia e pouco mais de 75% nos EUA viviam em famílias com casal no início dos anos 80. Os dados suecos também nos permitem considerar casais refeitos, ou seja, casais diferentes dos pais da criança. Em 1984-85 uma proporção de 9% das crianças e 10,5% dos jovens de 16-17 anos suecos viviam em domicílios com casais refeitos.39 39 A. M. Jensen & A. Saporiti, "Do children count?", Eurosocial, 36, 17, 1992; I. Raton, "Les jeunes de moins de 15 ans", Méthodes 8, 1991; J. Gysi, "Familienformen in der DDR", Jahr-buchfür Soziologie und Sozialpolitik, Berlin, Akademie Verlag, 1988; Bams levnadsvillkor, Stockholm, SCB, 1989.

Finalmente observaremos algumas concepções sobre a paternidade no mundo, com a advertência usual de que os resultados devem ser lidos no contexto nacional e histórico, e de que sempre há o risco de que questões sejam recebidas diferentemente de uma cultura a outra.

Os padrões de valores de paternidade não correspondem muito bem seja a limites continentais ou de sistemas sociais. Por um lado questões culturais significativas deveriam produzir algum aglomerado correspondente a configurações culturais conhecidas. Em vista disso, no Quadro 9 os países foram agrupados considerando-se tanto a proximidade cultural/histórica quanto a difusão de ideologias sobre a paternidade. Casos de desvios serão notados abaixo.


Um individualismo familiar consistente neste contexto envolve um encorajamento da independência tanto das crianças quanto dos pais, e um coletivismo familiar envolve o oposto. Mas as outras combinações possíveis não devem, é claro, ser tomadas como "inconsistentes". Poderíamos, sim, tratá-las como um individualismo centrado na criança ou nos pais.

Claramente há duas Europas, uma mais individualista que a maior parte do mundo, e outra não. Mas não é o alinhamento habitual. A Europa central, exceto a Checoslováquia e a Polônia mas juntando-se à Bulgária, e as áreas do Báltico e do Atlântico Norte abraçam a independência infantil e são relativamente contidas na exigência de sacrifícios dos pais. A Dinamarca e a Alemanha ocidental e, no lado leste, a Letônia, a Lituânia e a Bulgária são os mais individualistas. Com efeito, os respondentes lituanos foram os únicos na Europa em que uma maioria concedeu aos pais prioridade para suas próprias vidas (escore correspondente à coluna 3 do quadro: -17). Os sul-coreanos foram o único povo do resto do mundo a fazer isso, com escore -5,5. A Suécia revela-se com um escore relativamente baixo no agrupamento da Europa Norte/central.

O Sudoeste da Europa, da Bélgica a Portugal, incluindo as ilhas britânicas, abriga valores familiares nitidamente coletivistas. Portugal, França e Irlanda do Norte, nesta ordem, também têm uma marcada preferência pela obediência em relação à independência, enquanto os outros nesse grupo de países estão divididos a respeito (na República da Irlanda até com uma pequena maioria a favor da independência). A marcada diferença franco-germânica, uma inversão de velhos estereótipos, é confirmada por outra evidência, relativa à escolarização.40 40 H. Kaelble, Nachbarn am Rhein, Munich, C.H. Beck, 1991, p. 172.

A parte mais autoritária da Europa oriental consiste, em particular, na Checoslováquia e Polônia, e Bielorrússia e Rússia.

A questão de como interpretar os vincados desvios em relação aos valores confucianos no Leste asiático talvez devessem ficar fora de um texto sobre a modernidade européia. Talvez se possa arriscar a conjectura de que as respostas - na China apenas de uma amostra urbana - exprimem uma reflexão crítica sobre o passado, mais do que um sistema de valores institucionalizado.

Com relação à Europa podemos concluir que persistem fortes contrastes quanto a valores familiares entre blocos de países que para todos os efeitos têm que ser encarados como modernos. Mas cabe concluir também que o individualismo da família, ou do mundo privado, claramente é mantido numa parte forte e central da Europa, mais do que nos novos mundos e provavelmente mais do que em qualquer outro lugar do globo.

A REVOLUÇÃO INFELIZ

"Ainda em 1987 e 1988 eu acreditava na renovação do Partido (Comunista), que ajudaria na reforma do sistema. Em 1990 quase nada restava dessas esperanças. E em 1991 eu estava convencido de que o Partido Comunista da União Soviética havia-se tornado uma força irrevogavelmente hostil ao interesse público".41 41 G. Arbatov, Das System, Frankfurt, Fischer, 1993, p. 380. Arbatov foi diretor do instituto para Estudos dos EUA e do Canada em Moscou desde 1967, e foi um consultor muito importante do governo soviético para política exterior por cerca de um quarto de século. Não precisamos tomar à letra as memórias de Georgi Arbatov, mas ele claramente remete a uma importante mudança de valores na Europa recente - a implosão do comunismo.

Para saber com clareza o que fez ruir o comunismo na Europa oriental teremos que dar mais tempo aos historiadores. Há, contudo, um aspecto notável do desfecho da Europa comunista que não tem sido considerado com a devida seriedade, porque não se ajusta a esquema ideológico algum. Trata-se da rendição sem luta de um movimento forjado no combate, e de um sistema de poder bem experimentado na arte da repressão. O sistema soviético havia sido drenado da sua vontade de sobreviver.

O que quero fazer aqui, dada a enorme importância histórica do evento e a minha severamente limitada competência em face dele, é desenvolver um contexto de interpretação e apresentar algumas evidências para futura discussão e investigação.

Os dados disponíveis não nos permitem explicar satisfatoriamente a queda do comunismo por uma crise econômica aguda ou mesmo por um evidente beco sem saída econômico, como sugerem estudos do Banco Mundial. É verdade, contudo, que nos últimos anos do comunismo havia uma disseminada experiência de inadequação e fracasso econômico. Havia a disposição para empenhar-se numa reforma política e social radical, como se pode ver pela ascensão ao poder de Mikhail Gorbachov e de outras novas lideranças. E, como demonstra o êxito chinês até agora, o comunismo não é incapaz de mudança profunda sem desmoronar.

O veredicto póstumo dos que nele viveram mostra ainda que os regimes comunistas europeus não podem ser rejeitados sem mais como aquilo que a ideologia da Alemanha ocidental chama de "estados de injustiça". Em outubro de 1992 amostras nacionais da população de 18 estados ex-comunistas europeus, incluindo a Armênia e a Geórgia do Cáucaso, foram entrevistas por Eurobarometer / Gallup. Uma questão era "levando tudo em conta, você acha que as coisas são melhores para você agora, no presente sistema político, ou você acha que as coisas eram melhores para você antes, sob o sistema político anterior?". Uma clara maioria com a resposta "melhor agora" foi encontrada só na Albânia, na República Checa e na Romênia. Maiorias frágeis e incertas apareceram na Eslovênia, na Eslováquia e na Lituânia. Claras maiorias na ex-USSR e na Hungria achavam que sua situação tinha sido melhor sob o regime comunista. Os búlgaros estavam divididos meio a meio, assim como, no conjunto, os poloneses. Mas, dada a interpretação predominantemente ocidental que se tem da Polônia, vale mencionar que realmente mais poloneses (39%) achavam ter estado melhor sob o comunismo do que em 1992 (34%).

Infelizmente a pergunta é ambígua, ao combinar a situação sócio-econômica pessoal, "coisas ... melhor para você", com "sistema político". Mas sua invocação do sistema político deveria tender a trabalhar contra uma apreciação do "socialismo realmente existente" de outrora, e as indicações de nostalgia parecem ainda mais notáveis.

Uma parte importante da constelação de forças que derrubou o sistema comunista europeu foi a erosão da ideologia comunista, a incerteza íntima de partes cruciais do regime.

Na Europa oriental o comunismo tornou-se defensivo em 1968. A última formulação de vanguarda, após as fervilhantes promessas de Kruschov, foi o Relatório Richta checo, que era parte da Primavera de Praga no sentido amplo. Nele combinavam-se a perspectiva modernista, da "revolução científica-tecnológica com um programa de reforma de mocrática socialista.42 42 R. Richta, La civilization au carrefour, Paris, Anthropos/Seuil, 1974. Entretanto, a invasão armada da Checoslováquia colocou essa parte do continente num congelador ideológico, com concessões e justificativas. A orientação acumulacionista anterior foi substituída por uma adesão nervosa ao consumo de massa, a partir dos anos 70 freqüentemente sustentada por empréstimos externos.

Ideologicamente as audazes jactâncias de um futuro comunismo triunfante ou os programas de auto-reforma foram ambos substituídos nos anos 70 pelo conceito justificativo do principal ideólogo de Brezhnev, Mikhail Suslov, do "socialismo realmente existente" com sua explícita negação e implícito reconhecimento de um outro socialismo melhor. Como alternativa, na Romênia Ceasescu jogava a carta nacionalista romena, que também dava acesso privilegiado ao Ocidente.

O próximo passo na des-escalada foi a crise polonesa de 1980-81. Desta feita somente a liderança da Alemanha oriental estava inteiramente disposta a invadir, embora os soviéticos exercessem forte pressão. A solução, um "estado de guerra" ou lei marcial, sob os auspícios do Exército polonês, foi uma retirada comunista para trás de uma instituição nacional. Mas não foi, como por vezes se supões no Ocidente, o último recurso repressivo, pois o Exército era uma instituição popular na Polônia. Em duas sondagens de opinião no outono de 1985 entre 70 e 81% da população expressaram sua confiança nas forças armadas. A confiança no Exército, que estava dirigindo o país desde dezembro de 1981, não era muito inferior do que na Igreja, entre 86 e 80% nas mesmas sondagens. Um ano antes a maioria da população sustentava que a declaração do estado de guerra era mais ou menos justificada, contra somente um quarto que sustentavam a posição contrária.43 43 A. Sulek, "Politische Meinungsfragen in Polen - Träger, gesellschaftlicher Kontext und Zuverslässigkeit empirischer Studien", in G. Meyer & F. Ryszka (ed) Die politische Kultur Polens, Tübingen, Francke, 1989, p. 134; K. Jasiewicz, "Zwischen Einheit und Teilung: politische Orientierungen der Polen in den 80er Jahren", ibidem, p. 147.

Em março de 1985 a União Soviética passou a ter, pela primeira vez desde que Brezhnev caiu doente em dezembro de 1974, um líder político plenamente preparado. Mikhail Sergeievich Gorbachov tinha em vista uma mudança radical, uma revolução no interior do sistema socialista. Por que falhou a perestroika, enquanto as "modernizações" chinesas foram até agora inteiramente bem sucedidas tanto no impulso ao crescimento econômico quanto na manutenção do sistema de poder político, é algo a ser ainda desenredado. (Duas coisas, claro, são imediatamente evidentes. A prioridade soviética para a mudança cultural e política desconectou o sistema econômico mas não ofereceu uma nova dinâmica econômica, o que rapidamente piorou a crise. Enquanto isso, a inversão da seqüência pelos chineses deu condições para um crescimento econômico que ao menos manteve a unidade do regime, se não a sua legitimidade popular. Em segundo lugar, as tarefas da modernização na China eram mais elementares, tinham mais facilidade para obter adesão, do que a "reforma econômica" na Europa oriental).

Pode-se obter algum percepção de como o círculo em torno de Gorbachov foi encolhendo e como suas perspectivas ideológicas foram se desgastando nas memórias do seu leal secretário, Anatoly Chernayev, escritas após retirar-se do serviço público e baseadas num diário.

A coalizão reformista dissolveu-se quando não se verificaram novas aberturas econômicas enquanto o velho sistema funcionava pior do que antes na medida em que aumentava as tensões étnicas. Já por volta de dezembro de 1986 uma estado de paralisia econômica foi notado no Politburo, e suscitou uma sessão tempestuosa.44 44 A. Chernayev (transcrição alemã Tschemayev), Die letzten Jahre einer Weltmacht, Stuttgart, Deutsche Verlagsanstalt, 1993, p. 114-15 A única coisa a mover-se era o debate ideológico, que se tornava crescentemente polarizado com a nova liberdade de expressão e com a ausência de qualquer critério concreto de realismo programático. No final Gorbachov era praticamente o único na liderança soviética e no seu aparato que era tanto um reformador democrático quanto um socialista.

"A resposta à questão 'o que é realmente o socialismo?' é o problema central para decidir nossa posição ideológica" disse Gorbachov ao seu auxiliar em agosto de 1988, quando ele estava às voltas com a preparação de três conferências sobre o tema. Estas nunca se realizaram, mas Mikhail Sergeevich continuou a lutar com a questão até o fim.45 45 Chernayev, op. cit., pp. 164-65, 281-82, 393.

Em janeiro de 1990 Alexander Yakolev, o aliado mais importante de Gorbachov no Politburo, lhe propôs uma espécie de golpe de Estado capitalista, baseado em poderes presidenciais de emergência.46 46 O caso é narrado por Chernayev, que afirma ter estado basicamente de acordo com Yakolev e ter mantido contato diário com ele durante aquele período (pp. 282-83). Embora Gorbachov jamais conseguisse convencer-se a romper com o partido e a tradição que o havia formado, no verão de 1990 ele reconheceu uma "crise do socialismo" , e começou a declarar a todos os seus amigos estrangeiros "estamos indo no rumo de uma economia de mercado".47 47 Chernayev, pp. 309-10

Uma erosão interna similar ocorreu na Hungria, embora sob formas diferentes e num contexto diferente. Em maio de 1988 um congresso extraordinário do partido tirou a velha guarda do poder e uma nova geração pós-revolucionária assumiu. Reformas econômicas de mercado foram encetadas, empresas capitalistas foram fundadas, e abriu-se uma bolsa de valores. Em fevereiro de 1989 o Comitê Central do partido no poder veio a aceitar uma democracia multipartidária. Em outubro do mesmo ano deu-se a divisão formal entre os reformadores pós-comunistas radicais e os moderados.48 48 Ver também entre outros, N. Swain, Hungary: the rise and fall of feasible socialism, London, Verso, 1992, e G. Horn, Freheit die Ich meine, Hamburg, Hoffmann und Campe, 1991.

Na Polônia o governo da lei marcial anistiou seus opositores no outono de 1986, e por volta de janeiro de 1989 Jaruzelski e seu grupo conseguiram levar o partido no poder a abrir negociações com a oposição. O desenvolvimento polonês foi mais diretamente político, preocupado com questões de democracia e com a legitimidade da oposição do que socioeconómico.49 49 T. Garton Ash, The Polish revolution, London, Granta Books, 1991, pp. 326sg. ; W. Jaruzelski, Mein Leben für Polen, Munich, Piper, 1993, cap. 13.

Mesmo nos Balcãs reformas ideológicas estavam a caminho, primeiro sob forma nacionalista. Ceasescu havia embarcado num curso declaradamente nacionalista já em meados dos anos 60, enquanto mantinha algumas aparências stalinistas. Na Sérvia Milosevic chegou ao poder em 1987 com uma plataforma nacionalista. Na Bulgária medidas repressivas sobre a minoria turca foram acentuadas na segunda metade dos anos 80. Mas houve também uma surpreendente fala autocrítica pelo envelhecido líder partidário Zhikov em fevereiro de 1989, aparentemente rejeitando "o antigo modelo de socialismo, que exauriu suas possibilidades", mas sem propor um novo modelo para ele, e ao invés disso pedindo aos intelectuais búlgaros que explicassem por que o capitalismo avançado estava se desenvolvendo tão bem.50 50 D. Selbourne, Death of the dark hero, London, Jonathan Cape, 1990, pp. 143sg.

Nos partidos comunistas das repúblicas bálticas as forças nacionalistas e orientadas para a reforma democrática ganharam posições de decisão ao longo de 1988 - na Estônia no verão, na Letônia e na Lituânia no outono.51 51 D. Meissner (ed) Die baltischen Nationen, Köln, Markus, 1991, 2.a ed., pp. 118sg.

Na altura da primavera de 1989 as lideranças da URSS, da Polônia, da Hungria e da Iugoslávia estavam abdicando do seu monopólio de poder. Eleições mais ou menos livres estavam em vias de realização (como na URSS) ou estavam a caminho. Mudanças econômicas radicais haviam sido aceitas na Hungria e não mais eram anátema nos outros esta dos mencionados, nem mesmo na Bulgária. Somente os governantes da Checoslováquia e da RDA mantiveram sua ideologia marxista-leninista na geladeira até que o povo nas ruas a lançasse fora. Enquanto isso, os dirigentes romenos e albaneses mantinham-se fiéis às suas misturas particulares de nacional-stalinismo.

A insatisfação popular crescia na segunda metade dos anos 80. Os húngaros haviam estado moderadamente satisfeitos com sua situação econômica e política em 1986, mas chegaram a uma avaliação inteiramente crítica da sua situação econômica no final de 1988.52 52 Journal für Sozialforschung, 28, 4, 1988, suplemento. Na Polônia o padrão de opinião na altura de março de 1988 era dramático: mais de 80% consideravam a situação econômica má ou muito má, e bons 40% achavam que ela poderia piorar. A opinião crítica tinha-se expandido desde 1986.53 53 L. Kolarska-Bobinska, "Die marktwirtschaftliche Reform im gesellschaftlichen Bewusstsein und in der Wirtschaft Polens in den Jahren 1980-1990", Journal für Sozialforschung, 30, 3, 1990, p. 291.

Da República Democrática Alemã (RDA) temos sondagens de opinião de jovens desde os anos 70, agora acessíveis. Elas mostram um distanciamento gradual em relação ao marxismo-leninismo, embora na altura de 1988 quase 60% expressassem identificação com ela em alguma extensão, três quartos dos quais "com qualificações", contudo. Mas em maio de 1989 a maioria recusava qualquer identificação com ela. As respostas a uma quantidade de outras questões também indicavam um apoio ao regime marcadamente debilitado em 1988-89.54 54 P. Förster & G. Roski, DDR zwischen Wende und Wahl, Berlin, Linksdruck, 1990, pp 41sg.

Esses estados de ânimo populares foram claramente importantes na corrosão ideológica dos partidos comunistas mais abertos, e é de se esperar que o primeiro deles tivesse uma base material nas estruturações sócio-econômicas do comunismo tardio. Por outro lado, quanto a posterior retirada de apoio se devia a problemas sistêmicos e quanto a mudanças de esquemas de comparação e de níveis de aspiração é algo a ser esclarecido. Há também indicações de que muito da insatisfação político-econômica lembrava a insatisfação com um governo numa democracia, mais do que com um sistema social histórico.

Uma sondagem de opinião polonesa de 1986 revelou que dois terços de todos os trabalhadores preferiam um sistema econômico de propriedade predominantemente pública, e só um décimo preferia a propriedade privada.55 55 L. Kolarska-Bobinska (ver nota 53), p. 292n. Em novembro de 1989 uma proporção de 86% dos alemães orientais eram da opinião de que a futura "via de desenvolvimento" da RDA deveria ser "a via para um socialismo melhor, reformado". Em fevereiro de 1990 esta ainda era a posição de 56%.56 56 Förster & Roski, op. cit., p. 56

Uma sondagem de opinião internacional em novembro de 1993 - abril de 1994 revelou a preferência por sistemas dos europeus orientais mostrada no Quadro 10.


Só os discípulos do Professor Klaus tinham nessa altura aprendido a amar o mercado, com uma maioria não muito impressionante. Em alguns países, da Hungria à semi-periferia da ex-URSS, a alienação em relação à economia pós-comunista era esmagadora. As pessoas envolvidas aparentemente não tinham eliminado o socialismo como sistema social. Uma das diferenças ideológicas persistentes entre alemães orientais e ocidentais consiste, de modo bem interessante, na diferente avaliação da compatibilidade do socialismo com "democracia libertária". Em dezembro de 1993 somente um quarto dos "Wessis" (alemães do Westen, do Oeste) os consideravam compatíveis, mas quase o dobro (45%) dos "Ossis" (ex-alemães do Osten, leste) o faziam.57 57 Frankfurter Allgemeine Zeitung, 14-1-1994, p. 5. Se o socialismo comunista tivesse sido um fracasso monstruoso os números teriam que indicar o oposto do que fazem, pelo menos.

Um novo instituto de pesquisa de opinião da Alemanha ocidental, Allensbach, está perguntando aos cidadãos das "novas províncias federais" (neue Bundesländer, ex-RDA) sobre suas experiências correntes em comparação com a vida antes da reunificação. É lícito interpretar as respostas como se referindo ao capitalismo avançado, socialmente consciente (ou seja, a Alemanha atual) e ao socialismo comunista, em outras palavras, a comparações sistêmicas baseadas em experiência de primeira mão de ambos. O fato de que as questões não são formuladas em termos de sistemas ou ideologias mas com referência a antes e depois de um evento nacionalmente definido (a "reunificação") torna as respostas ainda mais interessantes. (Ver Quadro 11).


Certos ou errados, os alemães do Leste claramente são muito críticos sobre sua nova existência alemã-ocidental sob vários aspectos. Em todas as questões de políticas sociais e educacionais, exceto a possibilidade de prosseguir a educação, a vida antes da reunificação é considerada como tendo sido melhor. Além disso, o futuro parecia bem melhor no passado.

Houve várias tentativas de interpretação da mudança na Europa oriental entre 1989 e 1091. Talvez a opinião mais considerada seja a de Jürgen Habermas, que cunhou para ela o termo nachholende Revolution, que foi traduzido para o inglês como "the rectifying revolution", e talvez possa ser dito em português "revolução recuperadora".58 58 J. Habermas, "The rectifying revolution", New Left Review, 183, 1990. Seja como for, o que mais quer que ela seja, ela é também uma revolução infeliz. Em ensaio precedente publicado na Itália eu incluí uma seção sobre a distribuição desigual na Europa ocidental de felicidade - mais concentrada na Europa do Norte - e infelicidade - que aflige principalmente os latinos e outros europeus do Sul.59 59 G. Therborn, "Modernitá sociale in Europa (1950-1992)"in P. Anderson et al (ed) Storia d'Europa, Turin, Einaudi, 1993, vol. 1. Entretanto, confrontadas com o semblante triste dos europeus do Leste após a revolução anticomunista as diferenças no interior da Europa do Oeste empalidecem até à insignificância. (Ver Quadro 12). Na leitura do Quadro 12 convém observar que na coluna "escore de felicidade", quanto mais baixo o valor, mais feliz, e que, na coluna "satisfação com a vida", quanto mais alto o valor, mais satisfeito com a vida no conjunto.


Os europeus do Leste eram em 1990-91 os povos mais infelizes da Terra. As médias regionais escondem poucas transgressões de fronteiras. Os poloneses e os alemães orientais eram menos infelizes do que os portugueses e os sul-coreanos e mais ou menos na mesma faixa que os ex-coloniais indianos e nigerianos, mas, quanto ao resto, a situação era bem feia.

Pode-se argumentar que o desenlace do anticomunismo ainda estava então pendente na balança em muitos casos. No entanto, o fato de que em outubro de 1992 só os albaneses, os eslovenos e os checos claramente achavam que o seu país se movia na direção certa60 60 Eurobarometer I sondagem Gallup, outubro 1992 . parece indicar que a maioria dos europeus orientais estariam singularmente infelizes também em 1992, quando o jogo do poder estava bem definido.

É claro que os dados do Quadro 12 não nos contam nada sobre quanto os europeus do Leste eram (in)felizes antes da sua última revolução. Acima apresentamos evidências fortemente indicativas de consideráveis extensões de infelicidade comunista no final dos anos 80. Mas é um fato que os húngaros estavam mais felizes e mais satisfeitos com suas vidas em 1980 do que em 1990. Em 1980 eles estavam mais ou menos tão satisfeitos com suas vidas quanto estavam os franceses e os espanhóis, e claramente mais do que os portugueses e os gregos. Em 1990 a expressão da infelicidade húngara não tinha equivalente na Europa ocidental.

Comparadas com as revoluções anteriores na história moderna, as revoluções anticomunistas da Europa do Leste realizaram-se sob circunstâncias extraordinariamente favoráveis. Os poderes vigentes cederam sem qualquer resistência séria. O ambiente inteiro estava entusiasmado, cheio de boa vontade e dava apoio material. Não houve intervenção armada, nem boicote econômico, nem ostracismo político, nem organização de uma contra-revolução. No entanto, a felicidade da liberação até agora permanece uma celebração europeu-ocidental. Uma boa razão para infelicidade consistiu em que a restauração do capitalismo até agora (início de 1994) representou uma queda de padrões de vida para a maioria da população. Somente na República Checa e na Eslovênia verificou-se pelo menos uma distribuição equilibrada de ganhadores e perdedores. A esfinge europeu-oriental ainda tem muitos segredos a revelar.

  • * "The values of contemporary modernity", capítulo 14 de Göran Therborn, European modernity and beyond - the trajectory of European society 1945-2000, London, Sage, 1995, cap. 14, pp. 272-303.
  • 1 Uma análise um tanto anedótica por um observador direto da estratégia e da intensa atividade da Igreja na política italiana no imediato pós-guerra é dada pelo sociólogo político Gianfranco Poggi, "The Church in Italian politics 1945-50", in S.J. Woolf (ed) The rebirth of Italy, 1943-50, London, Longman, 1972.
  • 2 Cf. F. Fetjö, Histoire des démocraties populaires: 1. Lère de Staline, Paris, Seuil, 1972, pp. 367 sg.
  • 3 G. Winkler (ed) Sozialreport '90, Berlin, Die Wirtschaft, 1990, p. 308.
  • 4Die Zeit, 22-4-1994, p. 78.
  • 5 Dados em T. Mackie e R. Rose, International Almanac of Electoral History, London, Mac-millan, 1982, p. 269, 273.
  • 6Der Fischer Weltalmanach 1990, Frankfurt, Fischer, 1989, pp 138, 395, 466.
  • 7 Sobre isso ver D. Martin, A general theory of modernization, Oxford, Blackwell, 1978,
  • esp. cap. III: também do mesmo, "The religious condition of Europe", in S. Giner & M.S. Archer (ed) Contemporary Europe: social structures and cultural patterns, London, Rout-ledge & Kegan Paul, 1978.
  • 8Frankfurter Allgemeine Zeitung, 3-5-1994, p. 5.
  • 9 Cf. P. Bataille, "L'expérience beige", in M. Wievorka (ed) Racisme et xénophobie en Europe, Paris, La Découverte, 1994;
  • Frankfurter Allgemeine Zeitung, 15-1-1992, p. 27;
  • Die Zeit, 28-1-1994, p. 69.
  • 10 E. Noëlle & E. P. Neumann, The germans: public oppinio polls, 1947-1966, Westport, Greenwood Press, 1981, pp. 189-91.
  • 11Frankfurter Allgemeine Zeitung (FAZ), 18-6-1993, p. 12;
  • G. Kepel, Les banlieues de I'Islam, Paris, Seuil, 1991, pp. 72-73 e 229.
  • 12 Kepel, Les banlieues de l'Islam, p. 13;
  • FAZ, 18-6-1993, p. 12;
  • CSO, Social trends 24, London, HMSO, 1994, p. 145.
  • 14 Um interessante sinal no nível de um argumento intelectual sério, é o livro do inter alia teólogo católico J.-C. Barreaur De l'Islam, Paris, Le pré aux Clercs, 1991.
  • Ver também B. Lewis & D. Schapper (ed) Mussulmans en Europe, Poitiers, Actes Sud, 1992;
  • M. Wievorka (ed) Racisme et xénophobie en Europe.
  • 15 M. Dogan, "Comparing the decline of nationalismin Western Europe: the generational dynamic", International Social Science Journal, 136, 1993, p. 186.
  • 16 A porcentagem de "muito orgulhosos" com sua nacionalidade foi 43 na China, 45 na Coréia do Sul, 53 no Chile, 56 no México, 60 no México, 64 no Brasil e na África do Sul, 67 na Turquia e 68 na Nigéria, segundo o World Values Survey 1990-1991, dirigido por R. Inglehart.
  • 17 Comission of the European Communities, Eurobromètre: l'opinion publique et l'Europe 9, 1989, p. 6.
  • 18Eurobarometer 17, abril de 1982, questão 144 (edição ICPSR, Ann Arbor, Michigan, 1983).
  • 21 Ver G. Therbom, "The right to vote and the four world routes through modernity"in R. Torstendahl (ed) State theory and state history, London, Sage, 1992.
  • 22 Ver também G. Therborn, "The prospects of labour and the transformation of advanced capitalism", New Left Review 145, 1984.
  • Cf. J. Mooser, Arbeiterleben in Deutschland, 1900-1970, Frankfurt, Suhrkamp, 1984;
  • G. Noiriel, Les ouvriers dans la societé française, Paris, Seuil, 1986;
  • M. Jacques & F. Mulhern (ed), The forward march of labour halted?, London, Verso, 1981;
  • W. Korpi, The democratic class struggle, London, Routledge, 1983;
  • R. Ebbin-ghausen & F. Tiemann (ed) Das ende der Arbeiterbewegung in Deutschland?', Opladen, Westdeutscher Verlag, 1984.
  • 23 K. Geiger, The family in Soviet Russia, Harvard University Press, 1968, p. 99;
  • 25 Um resumo da legislação soviética sobre a família é dado por D. Lane, Soviet economy and society, Oxford, Blackwell, 1985, pp. 110 sg.
  • 26 Ver também Familiengesetze sozialistischer Lander, Berlim oriental, Deutscher Zentral-verlag, 1959.
  • 27 Ver também, e para referências, G. Therborn, "The politics of childhood: the rights of children in modern times", in F. Castles (ed) Families of NationsI, Aldershot, Dartmouth, 1993.
  • 28 R. Inglehart, The silent revolution, Princeton University Press, 1977,
  • e Culture shift in advanced industrial society, Princeton University Press, 1990.
  • 29 S. Holmberg & M. Gilljam, Váljare ochvali Sverige, Stockholm, Bonniers, 187, p.184.
  • 30 Para um apanhado do debate veja-se A. Heath, "Class and political partisanship" e D. Kav-anagh, "Ideology, Sociology, and the strategy of the British Labour Party", ambos em J. Clark et al (ed) John H. Goldthorpe, London, Falmer Press, 1990.
  • 31 R. Inglehart, Culture shift, pp. 74-75
  • 33 P. Nieuwbeerta & W. Uitee, "Explaining differences in the level of class voting in 20 Western industrial nations, 1945-1990", Nijmegen, Dept. of Sociology of the Catholic University of Nijmegen, 1992.
  • 34G. Evans, "Class conflict and inequality", in R. Jowell et al (ed) International social attitudes: the 10th BSA report, Adershot, Dartmouth, 1993, pp. 126, 124;
  • 35 P. Flora (ed), State, economy and society in western Europe, 1815-1975, Frankfurt, Campus, vol 2,
  • 36 F. Castles & M. Flood, "Why divorce rates differ: law, religious belief, and modernity", in Castles, Families of nations, p. 304.
  • 37 OECD, Les families monoparentales, paris, 1990, p. 34.
  • 38 Lane, Soviet economy and society, p. 113.
  • 39 A. M. Jensen & A. Saporiti, "Do children count?", Eurosocial, 36, 17, 1992;
  • I. Raton, "Les jeunes de moins de 15 ans", Méthodes 8, 1991;
  • J. Gysi, "Familienformen in der DDR", Jahr-buchfür Soziologie und Sozialpolitik, Berlin, Akademie Verlag, 1988;
  • Bams levnadsvillkor, Stockholm, SCB, 1989.
  • 40 H. Kaelble, Nachbarn am Rhein, Munich, C.H. Beck, 1991, p. 172.
  • 41 G. Arbatov, Das System, Frankfurt, Fischer, 1993, p. 380.
  • 42 R. Richta, La civilization au carrefour, Paris, Anthropos/Seuil, 1974.
  • 43 A. Sulek, "Politische Meinungsfragen in Polen - Träger, gesellschaftlicher Kontext und Zuverslässigkeit empirischer Studien", in G. Meyer & F. Ryszka (ed) Die politische Kultur Polens, Tübingen, Francke, 1989, p. 134;
  • 44 A. Chernayev (transcrição alemã Tschemayev), Die letzten Jahre einer Weltmacht, Stuttgart, Deutsche Verlagsanstalt, 1993, p. 114-15
  • 48 Ver também entre outros, N. Swain, Hungary: the rise and fall of feasible socialism, London, Verso, 1992,
  • e G. Horn, Freheit die Ich meine, Hamburg, Hoffmann und Campe, 1991.
  • 49 T. Garton Ash, The Polish revolution, London, Granta Books, 1991, pp. 326sg.
  • ; W. Jaruzelski, Mein Leben für Polen, Munich, Piper, 1993, cap. 13.
  • 50 D. Selbourne, Death of the dark hero, London, Jonathan Cape, 1990, pp. 143sg.
  • 51 D. Meissner (ed) Die baltischen Nationen, Köln, Markus, 1991, 2.a ed., pp. 118sg.
  • 52 Journal für Sozialforschung, 28, 4, 1988, suplemento.
  • 53 L. Kolarska-Bobinska, "Die marktwirtschaftliche Reform im gesellschaftlichen Bewusstsein und in der Wirtschaft Polens in den Jahren 1980-1990", Journal für Sozialforschung, 30, 3, 1990, p. 291.
  • 54 P. Förster & G. Roski, DDR zwischen Wende und Wahl, Berlin, Linksdruck, 1990, pp 41sg.
  • 57Frankfurter Allgemeine Zeitung, 14-1-1994, p. 5.
  • 58 J. Habermas, "The rectifying revolution", New Left Review, 183, 1990.
  • 59 G. Therborn, "Modernitá sociale in Europa (1950-1992)"in P. Anderson et al (ed) Storia d'Europa, Turin, Einaudi, 1993, vol. 1.
  • *
    "The values of contemporary modernity", capítulo 14 de Göran Therborn,
    European modernity and beyond -
    the trajectory of European society 1945-2000, London, Sage, 1995, cap. 14, pp. 272-303. Tradução de Gabriel Cohn.
  • *
    NT: Após a incorporação da RDA pela RFA.
  • 1
    Uma análise um tanto anedótica por um observador direto da estratégia e da intensa atividade da Igreja na política italiana no imediato pós-guerra é dada pelo sociólogo político Gianfranco Poggi, "The Church in Italian politics 1945-50", in S.J. Woolf (ed)
    The rebirth of Italy, 1943-50, London, Longman, 1972.
  • 2
    Cf. F. Fetjö,
    Histoire des démocraties populaires: 1. Lère de Staline, Paris, Seuil, 1972, pp. 367 sg.
  • 3
    G. Winkler (ed)
    Sozialreport '90, Berlin, Die Wirtschaft, 1990, p. 308.
  • 4
    Die Zeit, 22-4-1994, p. 78.
  • 5
    Dados em T. Mackie e R. Rose,
    International Almanac of Electoral History, London, Mac-millan, 1982, p. 269, 273.
  • 6
    Der Fischer Weltalmanach 1990, Frankfurt, Fischer, 1989, pp 138, 395, 466. É verdade que na Suíça isso se deve ao caráter majoritariamente católico (principalmente italiano) da população imigrante: Statistisches Jahrbuche der Schweiz 1992.
  • 7
    Sobre isso ver D. Martin,
    A general theory of modernization, Oxford, Blackwell, 1978, esp. cap. III: também do mesmo, "The religious condition of Europe", in S. Giner & M.S. Archer (ed)
    Contemporary Europe: social structures and cultural patterns, London, Rout-ledge & Kegan Paul, 1978.
  • 8
    Frankfurter Allgemeine Zeitung, 3-5-1994, p. 5.
  • 9
    Cf. P. Bataille, "L'expérience beige", in M. Wievorka (ed)
    Racisme et xénophobie en Europe, Paris, La Découverte, 1994;
    Frankfurter Allgemeine Zeitung, 15-1-1992, p. 27;
    Die Zeit, 28-1-1994, p. 69.
  • 10
    E. Noëlle & E. P. Neumann,
    The germans: public oppinio polls, 1947-1966, Westport, Greenwood Press, 1981, pp. 189-91.
  • 11
    Frankfurter Allgemeine Zeitung (FAZ), 18-6-1993, p. 12; G. Kepel,
    Les banlieues de I'Islam, Paris, Seuil, 1991, pp. 72-73 e 229.
  • 12
    Kepel,
    Les banlieues de l'Islam, p. 13;
    FAZ, 18-6-1993, p. 12; CSO,
    Social trends 24, London, HMSO, 1994, p. 145.
  • 13
    Neste ponto devo muito a uma série de conversas com o eminente islamologista sueco Jan Hjärpe, na Universidade de Lund.
  • 14
    Um interessante sinal no nível de um argumento intelectual sério, é o livro do
    inter alia teólogo católico J.-C. Barreaur
    De l'Islam, Paris, Le pré aux Clercs, 1991. Ver também B. Lewis & D. Schapper (ed)
    Mussulmans en Europe, Poitiers, Actes Sud, 1992; M. Wievorka (ed) Racisme et xénophobie en Europe.
  • 15
    M. Dogan, "Comparing the decline of nationalismin Western Europe: the generational dynamic",
    International Social Science Journal, 136, 1993, p. 186.
  • 16
    A porcentagem de "muito orgulhosos" com sua nacionalidade foi 43 na China, 45 na Coréia do Sul, 53 no Chile, 56 no México, 60 no México, 64 no Brasil e na África do Sul, 67 na Turquia e 68 na Nigéria, segundo o
    World Values Survey 1990-1991, dirigido por R. Inglehart.
  • 17
    Comission of the European Communities,
    Eurobromètre: l'opinion publique et l'Europe 9, 1989, p. 6.
  • 18
    Eurobarometer 17, abril de 1982, questão 144 (edição ICPSR, Ann Arbor, Michigan, 1983). As causas na lista eram igualdade sexual, proteção ambiental, paz mundial, pobreza, defesa nacional, fé religiosa, a unificação da Europa, liberdade do indivíduo, direitos humanos, a revolução.
  • 19
    Cf. Dogan, "Comparing the decline of nationalism".
  • 20
    Este tema vem sendo objeto de vivo debate na imprensa alemã (em 1994)
  • 21
    Ver G. Therbom, "The right to vote and the four world routes through modernity"in R. Torstendahl (ed)
    State theory and state history, London, Sage, 1992.
  • 22
    Ver também G. Therborn, "The prospects of labour and the transformation of advanced capitalism",
    New Left Review 145, 1984. Cf. J. Mooser,
    Arbeiterleben in Deutschland, 1900-1970, Frankfurt, Suhrkamp, 1984; G. Noiriel,
    Les ouvriers dans la societé française, Paris, Seuil, 1986; M. Jacques & F. Mulhern (ed),
    The forward march of labour halted?, London, Verso, 1981; W. Korpi,
    The democratic class struggle, London, Routledge, 1983; R. Ebbin-ghausen & F. Tiemann (ed)
    Das ende der Arbeiterbewegung in Deutschland?', Opladen, Westdeutscher Verlag, 1984.
  • 23
    K. Geiger,
    The family in Soviet Russia, Harvard University Press, 1968, p. 99; ver também na página 274 uma outra entrevista segundo a qual uma criança que tivesse sido submetida a maus tratos podia dirigir-se ao
    soviet da aldeia, com o que o pai seria multado.
  • 24
    Idem, p. 275
  • 25
    Um resumo da legislação soviética sobre a família é dado por D. Lane,
    Soviet economy and society, Oxford, Blackwell, 1985, pp. 110 sg.
  • 26
    Ver também
    Familiengesetze sozialistischer Lander, Berlim oriental, Deutscher Zentral-verlag, 1959.
  • 27
    Ver também, e para referências, G. Therborn, "The politics of childhood: the rights of children in modern times", in F. Castles (ed)
    Families of NationsI, Aldershot, Dartmouth, 1993.
  • 28
    R. Inglehart,
    The silent revolution, Princeton University Press, 1977, e
    Culture shift in advanced industrial society, Princeton University Press, 1990.
  • 29
    S. Holmberg & M. Gilljam,
    Váljare ochvali Sverige, Stockholm, Bonniers, 187, p.184.
  • 30
    Para um apanhado do debate veja-se A. Heath, "Class and political partisanship" e D. Kav-anagh, "Ideology, Sociology, and the strategy of the British Labour Party", ambos em J. Clark et al (ed)
    John H. Goldthorpe, London, Falmer Press, 1990.
  • 31
    R. Inglehart,
    Culture shift, pp. 74-75
  • 32
    Ibidem, Tabela 8-7, p. 280.
  • 33
    P. Nieuwbeerta & W. Uitee, "Explaining differences in the level of class voting in 20 Western industrial nations, 1945-1990", Nijmegen, Dept. of Sociology of the Catholic University of Nijmegen, 1992.
  • 34
    G. Evans, "Class conflict and inequality", in R. Jowell et al (ed)
    International social attitudes: the 10th BSA report, Adershot, Dartmouth, 1993, pp. 126, 124; cf. também P. Taylor-Gooby, "What citizens want from the state", no mesmo volume.
  • 35
    P. Flora (ed),
    State, economy and society in western Europe, 1815-1975, Frankfurt, Campus, vol 2, cap. 2.
  • 36
    F. Castles & M. Flood, "Why divorce rates differ: law, religious belief, and modernity", in Castles,
    Families of nations, p. 304.
  • 37
    OECD,
    Les families monoparentales, paris, 1990, p. 34.
  • 38
    Lane,
    Soviet economy and society, p. 113. O número é um dado de censo.
  • 39
    A. M. Jensen & A. Saporiti, "Do children count?",
    Eurosocial, 36, 17, 1992; I. Raton, "Les jeunes de moins de 15 ans",
    Méthodes 8, 1991; J. Gysi, "Familienformen in der DDR",
    Jahr-buchfür Soziologie und Sozialpolitik, Berlin, Akademie Verlag, 1988;
    Bams levnadsvillkor, Stockholm, SCB, 1989.
  • 40
    H. Kaelble,
    Nachbarn am Rhein, Munich, C.H. Beck, 1991, p. 172.
  • 41
    G. Arbatov,
    Das System, Frankfurt, Fischer, 1993, p. 380. Arbatov foi diretor do instituto para Estudos dos EUA e do Canada em Moscou desde 1967, e foi um consultor muito importante do governo soviético para política exterior por cerca de um quarto de século.
  • 42
    R. Richta,
    La civilization au carrefour, Paris, Anthropos/Seuil, 1974.
  • 43
    A. Sulek, "Politische Meinungsfragen in Polen - Träger, gesellschaftlicher Kontext und Zuverslässigkeit empirischer Studien", in G. Meyer & F. Ryszka (ed)
    Die politische Kultur Polens, Tübingen, Francke, 1989, p. 134; K. Jasiewicz, "Zwischen Einheit und Teilung: politische Orientierungen der Polen in den 80er Jahren", ibidem, p. 147.
  • 44
    A. Chernayev (transcrição alemã Tschemayev),
    Die letzten Jahre einer Weltmacht, Stuttgart, Deutsche Verlagsanstalt, 1993, p. 114-15
  • 45
    Chernayev, op. cit., pp. 164-65, 281-82, 393.
  • 46
    O caso é narrado por Chernayev, que afirma ter estado basicamente de acordo com Yakolev e ter mantido contato diário com ele durante aquele período (pp. 282-83).
  • 47
    Chernayev, pp. 309-10
  • 48
    Ver também entre outros, N. Swain,
    Hungary: the rise and fall of feasible socialism, London, Verso, 1992, e G. Horn,
    Freheit die Ich meine, Hamburg, Hoffmann und Campe, 1991.
  • 49
    T. Garton Ash,
    The Polish revolution, London, Granta Books, 1991, pp. 326sg. ; W. Jaruzelski,
    Mein Leben für Polen, Munich, Piper, 1993, cap. 13.
  • 50
    D. Selbourne,
    Death of the dark hero, London, Jonathan Cape, 1990, pp. 143sg.
  • 51
    D. Meissner (ed)
    Die baltischen Nationen, Köln, Markus, 1991, 2.a ed., pp. 118sg.
  • 52
    Journal für Sozialforschung, 28, 4, 1988, suplemento.
  • 53
    L. Kolarska-Bobinska, "Die marktwirtschaftliche Reform im gesellschaftlichen Bewusstsein und in der Wirtschaft Polens in den Jahren 1980-1990",
    Journal für Sozialforschung, 30, 3, 1990, p. 291.
  • 54
    P. Förster & G. Roski,
    DDR zwischen Wende und Wahl, Berlin, Linksdruck, 1990, pp 41sg.
  • 55
    L. Kolarska-Bobinska (ver
    nota 53 53 L. Kolarska-Bobinska, "Die marktwirtschaftliche Reform im gesellschaftlichen Bewusstsein und in der Wirtschaft Polens in den Jahren 1980-1990", Journal für Sozialforschung, 30, 3, 1990, p. 291. ), p. 292n.
  • 56
    Förster & Roski, op. cit., p. 56
  • 57
    Frankfurter Allgemeine Zeitung, 14-1-1994, p. 5.
  • 58
    J. Habermas, "The rectifying revolution",
    New Left Review, 183, 1990.
  • 59
    G. Therborn, "Modernitá sociale in Europa (1950-1992)"in P. Anderson et al (ed)
    Storia d'Europa, Turin, Einaudi, 1993, vol. 1.
  • 60
    Eurobarometer I sondagem Gallup, outubro 1992 .
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Nov 2010
    • Data do Fascículo
      Ago 1997
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