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Áreas centrais de São Paulo: dinamismo econômico, pobreza e políticas

São Paulo downtown: economic dynamism, the poor and policies

Resumos

O texto tem por objetivo estudar as condições de vida nos cortiços do Centro de São Paulo. Após apontar as mudanças ocorridas nessas áreas: perda de população, saída do setor financeiro e do comércio luxo, o artigo destaca suas potencialidade. No entanto, a principal contribuição reside em investigar dois cortiços: impera a promiscuidade, a falta de higiene e de privacidade. Finalmente, o último item do artigo mostra que as áreas centrais transformaram-se em espaços de debates e embates sobre o destino da população pobre e dos investimentos públicos.

Áreas centrais da cidade de São Paulo; Habitação; Pobreza


The article analyses the conditions of living in the slum tenements of the central areas of São Paulo. It points out the changes that have occured in these areas: lost of population, financial sector and higher classes, commercial activities going to other areas. However, the article also points out its potenciality. Its main contribution is the investigation of two slum tenements: the general conditions are promiscuity, absence of hygiene and privacy. The last section shows that the central areas have turned into spaces of debates and conflicts concerning the poor population and the public investments.

São Paulo city downtown; Housing; The poor


Áreas centrais de São Paulo: dinamismo econômico, pobreza e políticas * * Este texto é parte de pesquisa de maior envergadura, financiada pela Fapesp e CNPq. As entrevistas foram realizadas por: Cristiana Borges, Daniel Cara, Daniela Sequeira e Maria Encarnación Reccio.

São Paulo downtown: economic dynamism, the poor and policies

Lúcio Kowarick

Professor do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP

RESUMO

O texto tem por objetivo estudar as condições de vida nos cortiços do Centro de São Paulo. Após apontar as mudanças ocorridas nessas áreas: perda de população, saída do setor financeiro e do comércio luxo, o artigo destaca suas potencialidade. No entanto, a principal contribuição reside em investigar dois cortiços: impera a promiscuidade, a falta de higiene e de privacidade. Finalmente, o último item do artigo mostra que as áreas centrais transformaram-se em espaços de debates e embates sobre o destino da população pobre e dos investimentos públicos.

Palavras-chave: Áreas centrais da cidade de São Paulo; Habitação; Pobreza.

ABSTRACT

The article analyses the conditions of living in the slum tenements of the central areas of São Paulo. It points out the changes that have occured in these areas: lost of population, financial sector and higher classes, commercial activities going to other areas. However, the article also points out its potenciality. Its main contribution is the investigation of two slum tenements: the general conditions are promiscuity, absence of hygiene and privacy. The last section shows that the central areas have turned into spaces of debates and conflicts concerning the poor population and the public investments.

Keywords: São Paulo city downtown; Housing; The poor.

"[...] O inquestionável deslocamento da centralidade dominante [...] para o setor sudoeste da cidade não determinou o esvaziamento do centro histórico, mas sim uma mudança no perfil de seus usos e usuários, configurando novos focos de dinamismo e novas vocações para a área [...]. Todavia, a popularização do centro e seu atual elenco de atividades, formais e informais, são também manifestações de uma nova vitalidade econômica, que mantém em muitas instâncias o papel central da região no âmbito do universo terciário da Cidade"(Nakano, Malta Campos, Rolnik, 2004: 154-156).

A perda da primazia social dos distritos das áreas centrais de São Paulo é fenômeno conhecido. Lugar de prestígio desde o século XIX, paulatinamente, após 1950, decresce sua importância econômica e demográfica. Até certo ponto, também suas atividades artístico-culturais, não obstante os esforços do poder público municipal e estadual em termos de reformas e reabilitação de prédios como o da Light, Banco do Brasil, a estação Júlio Prestes com a Sala São Paulo, a estação e área da Luz com a Pinacoteca, o antigo Dops, Biblioteca Municipal, Casa da Marquesa e o Pátio do Colégio, Museu de Arte Sacra, Teatro São Pedro, as praças Patriarca, Sé, República, Largo de São Bento e Arouche, bem como a reurbanização do Parque D. Pedro II que dará origem a 135 mil m² de áreas verdes e a remoção da Favela do Gato, onde está prevista a construção de cerca de 500 unidades habitacionais, áreas e centros de lazer. Local de intensos conflitos operários no Brás e Mooca de 1917, das sucessivas paralisações da conjuntura 1945-1947, sem esquecer o explosivo quebra-quebra de 1944, e os enfrentamentos mais recentes referentes à derrocada do populismo dos anos 1960: nas grandes praças da época, Bandeiras ou Roosevelt, ocorriam grandes comícios que, em boa medida, decidiam os destinos políticos do País. Sem esquecer, também, a Praça da Sé no ato ecumênico de protesto pelo assassinato de Vladimir Herzog em 1975 e o milhão de pessoas no comício das Diretas-Já em 1984.

O percurso da primazia urbana foi do Centro para a Paulista nos anos 1960-1970 e para a Faria Lima e a Berrini/Marginal em tempos mais recentes (Frugoli, 2000). Não cabe detalhar os processos que estiveram na raiz dos deslocamentos socioeconômicos e urbanos para estas regiões. Basta mencionar a saída das camadas de renda média e alta fundamentalmente para o Vetor Sudoeste da Cidade que recebeu vultosos investimentos públicos, tais como alargamento de avenidas, construção de pontes e viadutos, linha de metrô, além de novas formas de consumo, em especial shopping centers. Na década de 1990, o poder público desenvolveu ações pontuais na área central, com exceção da administração petista de 1989-1992 que remodelou o Vale do Anhangabaú e transferiu para o Centro a sede da Prefeitura, ação que teve forte impacto simbólico. A ocorrência dessas dinâmicas ocorreu uma vez que houve crescente dificuldade de acesso às zonas centrais, que se traduz em restrições de trânsito, falta de estacionamento, pedestrianização de ruas, aumento da poluição atmosférica, visual e sonora, além da deterioração de vastas áreas, entre as quais se destacam aquelas contíguas ao elevado Costa e Silva. A população diminui, muitos edifícios residenciais e de serviço ficam parcial ou totalmente desocupados, e a atividade econômica muda de perfil com a saída dos grupos abastados e a maior presença das camadas pobres.

Esses deslocamentos revelam decadência sociourbana em certas áreas, mas significam também novos dinamismos e potencialidades. Nesse sentido, basta mencionar a existência de 530 mil habitantes nas áreas centrais, 723 mil empregos formais, 3,8 milhões de pedestres diários, ou os dois milhões de passageiros que diariamente são canalizados para os distritos da Sé e da República através de 294 das 1,2 mil linhas de ônibus existentes no Município, das 17 estações de metrô e outras três de grande circulação ferroviária espalhadas nos seus distritos de ocupação mais antiga.

Decorrente de um sistema obsoleto e desordenado de transportes, cujo nascedouro foi uma rede viária que, por grandes artérias, desemboca nas áreas centrais, tornando-as destinatárias da quarta parte das viagens em veículos coletivos, o Centro constitui um "território de transbordo"(Meyer, 1999). Mas é mais do que isso, pois em uma pequena área de 4,4 km2 correspondente à Sé e à República "[...] o poder público investiu 25 bilhões de dólares para instalação de [...] redes de água, luz e esgoto em todos os 2.744.000 m2 para fins residenciais e 6.857.000 m² de área construída para (outros) fins [...]" (Piccini, 1999: 66). Nos distritos do Centro, estão também concentrados boa parte dos 600 mil habitantes em cortiços, 10 mil ambulantes, 2 mil catadores de lixo, muitos com suas carroças realizando coleta seletiva e, ao mesmo tempo, engarrafando ainda mais o trânsito, cerca de 5 mil moradores de rua, número que deve ter diminuido após as 12 vítimas fatais por espancamento em 2004, não obstante a existência de 800 guardas-civis e 4.250 policiais militares alocados nas zonas centrais. Há vasta hotelaria e restaurantes de padrão popular, o comércio atacadista nas cercanias do Mercado Municipal; a indústria de confecções no Bom Retiro, com 2 mil unidades produtivas, 50 mil empregos diretos, antes, com forte presença de judeus e, mais recentemente, de coreanos, recebe 70 mil compradores por dia; as zonas bolivianas do Pari, os japoneses na Liberdade, o comércio de máquinas e ferramentas na Florêncio de Abreu, de eletroeletrônicos na Santa Efigênia, de tecidos na 25 de Março e adjacências, onde existem cerca de 300 lojas que atraem 400 mil pessoas por dia e número que dobra nos dias festivos, gerando 40 mil empregos e atraindo compradores de todo o País e do Exterior (Folha de S.Paulo, 2003: C4). Há, ainda, o sistema financeiro da rua XV de Novembro, o intenso comércio da rua Direita e muitas ruas tomadas pelos 10 mil ambulantes. Vale mencionar que a Estação da Luz, principal entroncamento metro–ferroviário do Município, por onde transitam 400 mil pessoas por dia através do entroncamento de duas linhas de metrô e outras seis de trens metropolitanos. Digno de nota, também, o fato de que, no conjunto dos 13 distritos que compõe a região central, se efetuam 10,6 milhões de viagens/dia, das quais 6,2 milhões a pé e o restante por transporte motorizado individual ou coletivo, muito superior ao existente nas demais partes da cidade. No Centro, está também cerca da terça parte das bibliotecas, museus e cinemas do Município e a metade dos teatros. Mencione-se também a presença de 97 mil alunos matriculados em 29 instituições de ensino superior e 102 mil em 177 escolas públicas e privadas do ensino infantil aos cursos de nível médio. (Botelho & Freire, 2004: 180, 192, 193).

Muitos empreendimentos cujas matrizes estavam sediadas em área central deslocaram-se para a Avenida Paulista, Faria Lima e, mais recentemente, para a Berrini/ Marginal. Destacam-se nesse sentido o setor bancário e a recente saída das sedes do Boston, Banespa-Santander e Itaú. Mas as atividades financeiras, incluindo as Bolsas de Valores e de Mercadorias, continuam ainda fortemente concentradas no Centro, de modo especial nas áreas da Sé, Bela Vista e República. Em nove distritos centrais existiam, em 1994, pouco mais de 40 mil empregos formais – 31% do existente no Município – montante que, em 2001, correspondia a 34% destes postos de trabalho de São Paulo. Por outro lado, assinalem-se os esforços do poder público municipal e estadual em valorizar as áreas centrais: além das iniciativas já assinaladas, a Prefeitura aí localizou 15 das 21 secretarias, gerando 8,5 mil empregos, iniciativa seguida pelo Governo Estadual, que deslocou três secretarias e cinco empresas estatais adquirindo para tanto oito prédios na região da Sé, onde trabalham 3 mil funcionários.

Muitos hotéis também deixaram a Região, mas é necessário apontar algum retorno, cujo exemplo pode ser ilustrado por dois empreendimentos de alto padrão, além da reabertura de outro hotel tradicional. Ela continua sediando grandes empresas da área de telefonia, bem como as atividades jurídicas em torno do Fórum da Sé. Vale assinalar que, seguindo a tendência geral do Município, a Região Central no percurso da cidade de 1990 perdeu quase 109 mil empregos formais (Amitrano, 2004: 114).

Contudo, a grande oferta de empregos continua. Milhões de pessoas diariamente para aí se dirigem, propiciando a enorme soma de negócios; o estoque de prédios de bom padrão tem um valor de locação e de venda sensivelmente inferior às outras áreas comerciais e de serviços e, não obstante ter havido empobrecimento, a população da área central continua com uma renda média razoável: dos 13 distritos considerados, 6 estão acima da média dos 67 que compõem a sub-região central-intermediária, e todos os 13 bastante acima dos 33 distritos componentes das áreas periféricas de São Paulo (Prefeitura do Município de São Paulo: 2003: 36-38).

Contrastes entre riqueza e pobreza são constantes em cidades de grande dinamismo como São Paulo que, na sua história republicana, demoliu e construiu, por três vezes, boa parte dos prédios de suas áreas centrais: além de ser de "transbordo", os territórios centrais revelam vidas em contrastes, constantes lutas pela apropriação de espaços valorizados não só do ponto de vista econômico, mas também de significados sociourbanísticos, com seus patrimônios materiais e culturais, construídos de lembrança, identidades locais, nas memórias díspares de quando o Centro era centro dos acontecimentos. Assim, considero ser redutor dizer que:

"segundo a Adviser Consultores Ltda, em estudo encomendado pela Associação Viva o Centro em 1992, o Centro encontrava-se num processo praticamente irreversível de esvaziamento econômico desde os anos 80. Um dos empecilhos para uma retomada seria a dificuldade de estacionamento e de acesso por veículos (particulares), a partir da implantação dos ‘calçadões’. São apontados também a insegurança que caracteriza a região [...] (a Adviser vincula essa insegurança à disponibilidade de áreas para ‘desocupados de toda espécie’) e o insuficiente policiamento ostensivo. Na ocasião do estudo (1992) o valor médio do metro quadrado no centro correspondia a 25,4% do valor da Avenida Paulista, 34,8% do valor dos Jardins e 35,5% do valor da Marginal Pinheiros" (Silva, 2000: s/n).

Desse parcial ponto de vista, não resta dúvida de que, na década de 1980, o Centro acelerou sua deterioração. Contudo, para muitos – moradores, trabalhadores, transeuntes, ONGs, movimentos sociais, órgãos públicos, agentes privados –, ele é muito mais do que apenas valor de troca que segue a lógica do lucro, não raras vezes de cunho eminentemente especulativo. Ele é também valor de uso, local de trabalho e de moradia, espaço de luta pela apropriação de benefícios urbanos, fulcro reivindicativo para o acesso a bens e serviços – sobretudo habitação digna – necessários à vida nas cidades.

Repita-se quantas vezes necessário for: o Centro possui boa oferta de serviços coletivos, é comercialmente dinâmico e atrai diariamente milhões de pessoas. É também local de polarizações e, por conseguinte, de conflitos pela apropriação do espaço. Nesse sentido, vale ressaltar que, não obstante o decréscimo populacional, estima-se em torno de 36 mil o número de moradias vazias nos treze distritos, sem contar os imóveis desocupados, comerciais e de escritórios, alguns nada desprezíveis pois [...] "no início de 1999 o Fórum dos Cortiços tinha identificado 180 prédios de grandes dimensões"(Bonduki, 1999: 4)1 1 Estima-se em 15% a fatia dos escritórios vazios ( Gazeta Mercantil, 1996). A estimativa de domicílios vagos varia: a Prefeitura aponta para 45.464 domicílios particulares vagos, 17,5% do total existente em 13 distritos centrais (Prefeitura do Município de São Paulo, 2004: 7). .

Cortiços: atualidades

O Dicionário Aurélio ressalta que "[...] cortiço quer dizer caixa cilíndrica, de cortiça, na qual as abelhas criam e produzem mel e cera e, por analogia, habitação das classes pobres". Outras designações: "cabeça de porco", "casas de cômodos", "pensões", "fundo de quintal", "moquifo", "mocó", "maloca" (Veras, 1999: 3). Ou ainda: "estância", "zungú", "hotel", "hospedaria", "vila", "estalagem" (Picini, 1998: 22).

A reviravolta na condição de moradia em São Paulo ocorre no percurso dos anos 1940; na década seguinte, os domicílios de aluguel representavam ainda 58% das unidades habitacionais da Capital; 20 anos depois, a proporção cai para 38%, em 1990 corresponde a 29% e no final do século a apenas a quinta parte das moradias da cidade. Os habitantes em cortiços, por sua vez, em momentos mais atuais, englobavam 18% dos moradores do Município, em 1961, 8% em 1968, 9% em 1975, decrescendo para 6% em meados da década de 1990, conforme aponta a tabela 2.

A definição de cortiço é complexa, pois a caracterização de casa de cômodos precária de aluguel envolve situações quanto a diversas condição de habitabilidade. Atenho-me à definição oficial, ou seja, à lei municipal urbana de São Paulo, que define cortiço como:

"[...] unidade usada como moradia coletiva multifamiliar, apresentando, total ou parcialmente, as seguintes características: (a) constituída por uma ou mais edificações; (b) subdividida em vários cômodos, subalugados ou cedidos; (c) várias funções exercidas no mesmo cômodo; (d) acesso e uso comum dos espaços não edificados e instalações sanitárias;(e)circulação e infra-estrutura, no geral precários; (f)superlotação de pessoas" (Lei Moura, 1991, apud Picini, 1998: 24).

Estimou-se em 600 mil pessoas em 1993, cerca de 6% da população do Município, concentrados na Sé (19%), Mooca e Vila Prudente com cerca de 9%, mas também nos anéis exteriores da Cidade, Freguesia do Ó com 7% e nas periferias com, respectivamente, 9% e 7% em Santo Amaro e Campo Limpo (Prefeitura do Município de São Paulo, 1995: 8 e seguintes)2 2 Este número é considerado subestimado pelo poder municipal (Prefeitura do Município de São Paulo, 2003: 27). . Os dados indicam que 46% foram construídos com a finalidade de serem cortiços, cujas condições falam por si: a média dos domicílios é de 11,9 m², correspondente a cada pessoa 4,1 m². Acrescente-se: 2,90 indivíduos por domicílio, 2,45 por cômodo, 5,91 por sanitário, 6,32 por chuveiro, 9,25 por pia de banheiro, 6,22 moradores para cada tanque de lavar roupa. Ainda mais: 34% dos cômodos sem janela externa, nos quais são freqüentes goteiras e umidade. A quarta parte de seus habitantes com menos de 15 anos, 15% crianças com até 6 anos, mais sujeitos às doenças respiratórias. Mais ainda: 17% vivem só, igual montante está desempregada, 23% vendem sua força de trabalho sem carteira assinada e 18% trabalham por conta própria, principalmente nos serviços, e pouco mais da metade ganha até dois salários mínimos por mês. Em suma: dois quintos vieram da assim chamada casa unifamiliar, quase a metade de outros cortiços, 40% moram no local há menos de um ano, para a maioria o contrato é verbal, viabilizando a condição de inquilino, pois as camadas pobres dificilmente têm a alternativa de uma locação com contrato formal. Habitar em cortiços apresenta vantagens. A maior delas é estar "perto de tudo", pois quase a metade dos seus habitantes vai a pé e três quartos gastam menos de 30 minutos para chegar ao local de trabalho (Kohara, 1999: 89-91). Por outro lado, as desvantagens apontadas residem nos problemas higiênicos decorrentes dos "banheiros coletivos", da "presença de ratos e baratas", "falta de espaço"e dos "vizinhos", particularmente do fato de o lixo [...] "não (ser) adequadamente embrulhado e no lugar apropriado" (Cedec, 2000: 23).

Negócio imobiliário que apresenta larga margem de lucro, o cortiço constitui investimento bastante atrativo, fenômeno que vem desde os tempos do Segundo Império, época em que o Conde D’Eu possuía vários deles e, por isso, era chamado de "Conde Cortiço". Em suma, trata-se de portentoso negócio, posto que, a preços de 1993, a somatória dos aluguéis atingia o não desprezível montante de 5,5 milhões de dólares mensais (Piccini, 1997: 83). Não é por outra razão que muitos são remodelados ou construídos para essa finalidade, colocando seus moradores numa situação de promiscuidade, que só pode ser danosa para sua saúde física e mental. Vou insistir nesse fenômeno extorsivo: 52% dos rendimentos mensais são gastos com moradia, enquanto o metro quadrado dos cubículos é, em média, 34% mais alto do que o aluguel residencial em São Paulo.

Sem dúvida, as desvantagens desse tipo de moradia são inúmeras e, por isso, especialistas na área de saúde pública afirmam que o cortiço, muitas vezes caracterizado por cômodos sem janelas externas, situados nos porões, úmidos, sujeitos a infiltrações, constitui a forma mais danosa de habitar. Antes de abordar essa questão é preciso enfatizar que a condição de vida nos cortiços, não obstante o quadro geral de precariedade, é bastante diversa. De fato, uma coisa é habitar em dois cômodos, cozinha e banheiro com mais duas pessoas; outra, é morar com mais familiares em abafados e úmidos cubículos, convivendo com o barulho intenso dos vizinhos, enfrentando a fila para uso do banheiro, longa e demorada.

Algumas vantagens há por parte daqueles que fazem as escolhas. Elas são sempre comparadas a outras modalidades de moradia como as favelas e as casas autoconstruídas nas distantes periferias da Capital. Considero que um dos pontos edificadores das alternativas reside exatamente nas distâncias. Distâncias do quê? São várias e a principal é a proximidade da oferta de emprego assalariado, com ou sem registro, a possibilidade de desempenho de múltiplas tarefas pela venda de inúmeros produtos nas centenas de ruas e esquinas de São Paulo. Há também o trabalho em domicílio nos serviços domésticos e de higiene. As zonas atacadistas que circundam o Mercado Municipal congregam as assim chamadas "camas quentes", nas quais se dorme por turno de oito ou 12 horas. Pelas ruas, praças e pelos viadutos, milhares de ambulantes legalizados ou não pelos órgãos da Prefeitura, autônomos ou conectados a lojas de pequeno ou médio porte, em constantes conflitos com os fiscais, a quem precisam freqüentemene subornar, vendendo também produtos contrabandeados, disputando pontos e pagando por eles a verdadeiras máfias, no mais das vezes ligadas ao poder público que cobram uma espécie de pedágio para os locais mais disputados. Os luxuosos cinemas de antigamente transformaram-se em salas onde, desde cedo, exibem-se filmes pornôs. Na Aurora, a boca do lixo; nas imediações da General Jardim, a boca do luxo, com seus streap teases; na República, os travestis que, segundo consta, também servem os hotéis de luxo da Ipiranga; na Sé, os trombadinhas; e ao lado dos concertos da Sala São Paulo, na Júlio Prestes, a desumanidade da cracolândia.

O Centro é tudo isso e muito mais: é vai-e-vem alucinado, local onde o trabalho informal dos homens-cartazes, ofertando serviços baratos, e dos flanelinhas, junta-se a dezenas de milhares de balconistas, sem mencionar as inúmeras oportunidades do trabalho autônomo permanente ou ocasional. Mas há outras distâncias reais e simbólicas: a da quietude e solidão das periferias, onde à noite nada acontece, porque naquelas bandas não há cinemas, a diversão é a TV e alguns bailes, aos quais não se deve ir, pois a caminhada é perigosa. São Paulo não tem mais garoa, o bauru do Jeca, o Pari Bar do Arouche, as matinês do domingo no cinema Pedro II no ainda não remodelado Vale do Anhangabaú, e, ladeira acima, o Automóvel Club, onde também se jogava xadrez, atrás do Teatro Municipal; o Hotel Esplanada e a casa Degoy em frente ao Mappin Stores, hoje transformado numa grande loja popular. Por outro lado, o Centro oferece uma agitada vida noturna com inúmeros bares, restaurantes e hotéis; campo aberto para infinitos encontros onde também se localizam dezenas de creches, postos de saúde, escolas de 1.° e 2.° graus e várias faculdades privadas; e hospitais, como o da Universidade Santa Casa de Misericórdia, com suas alas antigas e modernas, e alguns dos melhores professores-médicos de São Paulo para atender a população.

As periferias estão distantes dessas benesses: empregos formais significam horas de ônibus, mais o trajeto a pé e, quando chove, a lama que não pode ser vista no local de emprego. A escola é longe e, à medida que as crianças crescem, distancia-se mais. E aí o perigo também aumenta, pois a criminalidade é muito alta, e não há policiamento. Esta é a grande distância experimentada pelos moradores dos cortiços: a favela ou a casa de periferia é lugar de bandidagem e muitos homicídios onde ninguém pode andar sozinho. Lá, faltam emprego, serviços e equipamentos públicos de saúde e de educação; não há o fervilhar prazeroso que o Centro oferece às pessoas que buscam distração longe da televisão.

Etnografia do Cortiço

" ‘Cortiço’, discriminação pejorativa para os que vêem de fora, a partir do bairro, ‘habitação coletiva’, avaliação do linguajar técnico da Prefeitura e ‘pensão’ & ‘casa de cômodos’, na fala aparentemente neutra dos seus moradores" (Furtado, 1995).

"A vantagem está sempre no Centro; é tudo no Centro", é o que se ouve de todos os entrevistados. Essa opinião diz respeito às disponibilidades das áreas centrais, onde existem vantagens sempre comparadas com o passado ou com outros locais de moradia em São Paulo. O passado varia em função das diferentes trajetórias de vida e dos problemas enfrentados. Quanto à moradia, a perceção, em geral, é que, apesar dos pesares, se "está melhor". A comparação espacial reside nas possibilidades de moradia para as camadas pobres: a favela ou a casa, ambas nas periferias distantes também chamadas de "vilas". Essas modalidades de habitação são avaliadas como "não-lugar" em termos de oportunidades de vida: trabalho, acesso a serviços públicos de transporte, educação, saúde, saneamento e lazer, a presença da violência.

Contudo, à medida que as conversas se aprofundavam, e os pesquisadores ganhavam a confiança dos entrevistados, tornando-se personagens de uma história a ser contada, as conotações da vida em cortiço ganharam os conteúdos de um cotidiano em que era necessário suportar a presença de outros. Ou seja, os outros "estavam aqui" e em espaços extremamente próximos e exíguos. É freqüente ouvir: "É muito humilhante; aqui ninguém vive, todo mundo convive: é um barraco no meio de um cortiço". Vale insistir numa fala mais explícita: "Em um apartamento, há sociedade e brincadeira, aqui é o corticeiro, morador de caverna que vira bicho".

Os lugares e seus personagens

De imediato, vale apontar para as condições substancialmente mais precárias do João Teodoro em relação aos cortiços do Município: 31 pessoas usando o mesmo chuveiro e a metade deste montante nas filas do sanitário. Antes de debruçar-me sobre o sentido e a significação das falas, é conveniente situar o João Teodoro no respectivo bairro. Quem caminha pelas ruas vê movimento, tráfego intenso, barulho, poluição. Trata-se de zona atacadista-cerealista de importância, em parte impulsionada pelo Mercado Municipal. Região de cortiços, pois há dezenas de placas que anunciam "quartos"para alugar ou "vagas", o que significa vários adultos compartilharem o mesmo cubículo e, não raras vezes, dividindo o mesmo beliche ou colchão. Ou seja: há emprego, freqüentemente sem registro, aonde se vai a pé . Na zona de confecções, agora nas mãos de coreanos, destaca-se o trabalho a domicílio. O Pari também se caracteriza pela existência de dezenas de bares, pequenas oficinas e por inúmeros trabalhadores autônomos que vendem nas ruas variada quantidade de produtos. Em suma, não se trata de região estagnada ou decadente, pois, ao contrário, lá existe intensa atividade social e econômica. A renovação urbana não é grande, a não ser pelo Programa de Atuação em Cortiços, PAC, da Secretaria da Habitação, na rua Canindé, que, no final de sua construção, terá 320 unidades habitacionais, montante irrisório, mesmo quando se sabe que sua população tem diminuído, bem como o número de cortiços, que chegava a 200 em 1981 e era pouco mais de 100, dez anos depois (Taschner, 1997: 33).

O João Teodoro 975 é formado por duas casas bastante deterioradas e, através de portões distintos se enfileiram os respectivos corredores com os cômodos nos dois lados. É a área nobre, quarto com janelas externas, chuveiros, e privadas no interior de unidades formadas por duas ou três peças; trata-se, segundo seus moradores, de uma "casa de cômodos". No final, os corredores se juntam e, por meio de uma escada, chega-se ao quintal, local de lavagem e secagem de roupa, onde também se encontram a privada e o chuveiro que servem a maioria dos moradores. Dos 20 cômodos, oito estão no térreo, três, no quintal e nove, no porão. Lá, falta ventilação, a fiação elétrica apresenta maiores riscos, sobressai o bolor esverdeado da umidade nas paredes, o longo corredor é escuro, as portas dos cubículos avizinham-se, a conversa das pessoas e o barulho de rádios e televisões tornam-se próximos, as crianças parecem contidas, algumas com olhos arregalados, outras com respiração ofegante, visivelmente subnutridas. Dos 51 moradores, a metade é composta de crianças e adolescentes, 31 pessoas utilizam as duas privadas e o único chuveiro em funcionamento. O outro está em reforma e, assim, quando a obra terminar, serão 15 pessoas para banhar-se no mesmo local. No momento, a sobrecarga elétrica não permite o funcionamento de dois chuveiros simultaneamente.

Carlos, ex-PM, é quem "administra" o local, recebe os aluguéis e, na medida do possível, faz os consertos e reformas: não pára de fazê-los. Administrar o local, certamente, é muito mais do que fazer cobranças e reparos nas rachaduras, telhados e goteiras. É também decidir sobre aqueles que podem entrar e devem sair, bem como, nos momentos de confusão, ameaças, gritos, bebedeiras, brigas e quebra-quebra, exercer a sua autoridade. É ouvir as reclamações do barulho, das desavenças, da sujeira, das crianças que correm, brincam e gritam; dos insetos e ratos, e também dos perigos da fiação e das goteiras que nunca secam. Dolores é tida como proprietária, mas só aparece uma vez por semana. Afirma que só tem o "ponto", alugando de alguém e sublocando aos inquilinos: alguns estão lá há anos, enquanto outros, a maioria, trocam constantemente de "pensão", permanecendo na trilha do aluguel de cubículos.

Para todos, habitar em "pensão" é muito melhor do que morar em "vila" ou "favela", pois esta é longe de tudo, menos da violência. Nem por isso o cortiço deixou de ser invadido por um grupo de jovens que furtava automóveis nas redondezas e tinha ligações com tráfico de drogas dentro e fora do cortiço, provocando enorme temor nos seus habitantes que queriam de toda forma "escapar de confusão". Ou o Alemão, gerente do estacionamento em frente ao cortiço, que por ele nada cobrava, no pico do trânsito das 19 horas, alvejado a tiros. Na fuga inútil, tentou entrar no cortiço, cuja porta estava trancada: morreu no bar ao lado do 975, sem chegar a atrapalhar o intenso trânsito.

O Joaquim Murtinho 236 a 250, no Bom Retiro, não é propriamente um cortiço, se isso significar o pagamento de aluguel. Além disso, das 16 unidades domiciliares, apenas três carecem de banheiro interno, não obstante só oito dos 24 cômodos possuirem janelas externas. Parte dos moradores reivindica o direito à propriedade do imóvel, valendo-se da prerrogativa do usucapião. Assim, deixaram de pagar aluguel, reivindicando, por intermédio dos movimentos de luta por habitação, a obtenção de sua moradia própria. Trata-se de dois prédios com entradas autônomas, com dois andares na frente e no fundo. Comparados a outros cortiços, inclusive ao do Pari, a situação é relativamente boa do ponto de vista da habitabilidade do imóvel. Nos números 241, 244, 248 e 250, que correspondem a um dos prédios, moravam 34 famílias e 92 pessoas, reduzidas, depois do despejo, a 60 moradores, incluindo 22 crianças e adolescentes. Não ocorre o "esquema de pensão" em que um administrador cobra os aluguéis, sendo o responsável pelas condições físicas do prédio e pelo comportamento de seus inquilinos. Isso, em última instância, é responsabilidade dos moradores, que procuram melhorar seus domicílios e o próprio imóvel, com a perspectiva de tornarem-se proprietários

Helena é a líder, e há 11 anos mora no número 250. Impulsiona o processo de usucapião das duas casas, com a assessoria do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos. É também ela quem, com apoio da Pastoral da Moradia e da OAB, interpela judicialmente os proprietários contra as ações de despejo. Por outro lado, fundou no Fórum dos Cortiços a Associação Comunitária da Rua Joaquim Murtinho "21 de Novembro do Bom Retiro", data que se refere ao dia em que os proprietários, com apoio jurídico, bloquearam a entrada de uma das casas, obrigando muitos dos seus inquilinos a abandonar o local. Para evitar a entrada de estranhos, os remanescentes demoliram um dos casarões. A "21 de Novembro" negocia com órgãos da Prefeitura e do Estado a demolição dos casarões e sua substituição por prédios de apartamentos cujas pequenas unidades habitacionais poderiam ser adquiridas por seus moradores atuais.

O cotidiano no João Teodoro

Almi mora há dois anos na "pensão", em um pequeno cubículo do térreo, chuveiro, privada, tanque e secagem de roupa divididos com outros inquilinos. Vive sozinho, cuidando de suas roupas, comidas e pertences. Procura controlar seu cotidiano através da agenda da evitação de contatos domiciliares: "Para mim não tem convivência, porque sempre estou na rua. Boa noite para esse, para aquele, tomo meu banho e vou dormir. No outro dia eu saio cedo, então, não tenho contato".

Nasceu no interior do Paraná em 1968. Abandonado pelos pais, viveu em orfanato até os 16 anos, trabalhando como jornaleiro e office-boy. Negro, desde moço sabe o lugar de cada um dentro e fora dos locais de moradia: "eu me sinto muito humilhado, colocar a mão na parede, se bem que a gente sabe que isso é necessário. Acho que porque eu sou de cor e lá tem muito racismo: – ‘ei! você, mão na parede’. Depois fala – ‘agora corre e não olha para trás’. Se quiser atirar – retruca Almi – pode atirar: não sou bandido, estou exigindo o meu direito, o direito de ir e vir."

O direito de ir e vir. Com 20 anos, migra para São Paulo em busca dos pais e, em 1990, muda-se definitivamente, habitando desde então em 13 locais diferentes: cortiços, hotéis e minúsculos apartamentos da área central da Cidade, além de uma experiência amarga na periferia de Guarulhos. "Eu sempre morei no centro [...] tudo é mais fácil: cinema, condução, para trabalhar é melhor. Você encontra de tudo: diversão, serviço, moradia, tem tudo. É claro que custa mais caro. Só que esse mais caro acaba se tornando barato, porque se você morar longe, você paga um pouco menos no caso do aluguel , mas, em compensação, você tem condução e tem que almoçar sempre na rua. Além do tempo perdido, a viagem é cansativa. Dia de semana já é terrível, fim de semana pior ainda. Muita desvantagem morar num lugar longe. A vantagem está sempre no centro. Tem campo de futebol, a Portuguesa, tem shows no ginásio. No shopping tem muita diversão. Tem parque na pracinha, já fui várias vezes; junho, julho sempre tem festa de São João, de um lado os bolivianos, de outro os brasileiros". Para quem vende CDs, como autônomo, a uma clientela fixa e precisa perambular pela Cidade, não resta dúvida: "no centro (tenho) 4 horas a mais de serviço por dia. Essas 2 horas de condução que eu tinha para vir para São Paulo e 2 horas para voltar, ganhei como hora de trabalho e com isso aumentei o dinheiro". Trabalhou como assalariado na Sears ("eram seis conduções por dia"); foi vendedor de livros em uma empresa "enrolada para pagar; você ouvia que era um pangaré. Aqueles papos de guerra mental". Em 1993, com o dinheiro poupado, decidiu abrir um armazém em Guarulhos: "aluguei uma casinha, comecei um negócio nos fundos. Estava indo bem, só que tive a infelicidade dos ladrões entrarem lá: aí voltei para a estaca zero. Tinha muita coisa . Foram 4 anos para levantar tudo aquilo, sempre concordando em pagar com correção".

Daí a opção definitiva pelo Centro, a escolha de ser o andarilho no trabalho e itinerante do aluguel: primeiro foi uma "vaga"na Rua Coimbra, no Brás, dividindo um quarto: "as idéias dele não batiam com as minhas". Vai para a pensão ao lado, da mesma dona. Uma cama, dividindo o quarto com outros seis, por um ano e meio: "arranca rabo por causa da bebida, gente que demorava no banheiro". Vai para a rua Santa Rosa, também no Brás, "uma cozinha bem pequeninha, uma pia e uma cama. Era R$ 200,00, bem caro, mas aceitei porque para mim era R$ 50,00 por semana, não numa paulada". Depois a quitinete alugada por um amigo que queria vendê-la. Trato provisório, apenas dois meses: "era bem melhor, tinha tudo, banheiro, cozinha, área". Em seguida, um hotel na rua Iapoque, perto do gasômetro: "era mais ou menos uma pensão; a diferença é que lá, em um hotel com atividade de hotel, tinha tudo, até prostituição. Ali rolava muita droga, roubos, prisões. Então, fui morar numa pensão perto do edifício São Vito, aqui no Brás mesmo: o pessoal jogava coisas lá de cima e quebrava o telhado. Caía água em vários locais, a umidade era total".

O andarilho urbano continua seu trajeto: Rua Benjamim Oliveira, daí rumo ao Pari com a namorada; depois o Hotel Nova Amazônia na rua Monsenhor de Andrade, quarto com banheiro, custava R$ 300,00: "tinha muita infiltração. A roupa lavava no banheiro e estendia no banheiro também. Uma semana para secar, quando secava ficava aquele cheiro desagradável". Em 2000, chega na "pensão da Dolores", na João Teodoro: paga R$ 135,00 por um cubículo de 1,5 x 3,0 metros, acrescido de outro pedaço ainda menor que usa como cozinha sem pia: "Visitei vários lugares e achei que aqui era melhor em vista do preço e da condição do ambiente. Tapei as goteiras, consertei a fiação, [...] fio por todo lado. O relógio é um só; se o chuveiro estiver ligado não agüenta". Bagunça, brigas, o problema da bebida: "tinha muita, mas há pouco tempo saíram algumas pessoas que realmente davam muito problema". Há enorme mobilidade de pessoas no cortiço e "o certo seria exigir um pouco mais para selecionar melhor, como toda instituição financeira exige".

E as crianças? "criança é tudo: bola, parede, barulho, briga, espaço. Consertaram a porta, e a molecada quebrou, colocaram fechadura, e a molecada quebrou. Consertou o chuveiro, foi quebrado; você passa uma cera no chão, daqui a duas horas está tudo sujo: jogaram ovo no chão, na parede. O pessoal chegava e achava que banheiro era em todo lugar, vai e faz, outro vê fazendo, aí vai e faz também". E dá para resolver? "Tem que pensar diferente: mas aqui, se vive em conjunto. Na medida do possível, até que não está tão horrível, já foi pior".

E agora como vai ser? "A própria pessoa faz a oportunidade. Tem que correr atrás. Meu sonho é trabalhar para mim mesmo e não para os outros: não sei trabalhar preso. O andarilho caminha sem parar, provavelmente, já morando em outro local. De aluguel, no Centro, onde tem de tudo.

Denise está há 12 anos na João Teodoro. Baiana de Itambé, veio pela primeira vez para São Paulo no início dos anos 1980: "é tanto lugar que eu já morei que não sei qual é a base de qual é o primeiro, o segundo. "Viúva de Geraldo faz seis anos, são 4 os filhos que moram com ela, além de uma sobrinha. Todos estudam ou trabalham nas redondezas, inclusive Denise que complementa a 2.ª série com curso de alfabetização na comunidade Mãe de Jesus, onde uma das filhas é professora com carteira assinada. À parte o pequeno de 9 anos que segue a 4.ª série, todas têm o 2.° grau completo ou para terminar. E também trabalham pelas redondezas, nas lojas da São Caetano, ou como domésticas nos domicílios das áreas centrais; isso quando não estão grávidas e são demitidas.

Ao todo são seis pessoas em dois apertados cômodos, em um dos quais foi instalada uma pequena cozinha. Há também um terraço onde fizeram um tanque; segue-se uma escada que termina num banheiro com chuveiro e privada: "obras do Geraldo que fez". Há janelas externas, mas as paredes são úmidas e do teto caem goteiras. Pagam R$ 200,00 de aluguel mais R$ 5,00 por pessoa pela água. Vale a pena o preço? "(a vila) é longe". Outra filha, casada, também mora na João Teodoro com o marido e duas crianças numa "pensão" próxima.

Ao todo, foram 8 moradias, 7 cortiços e uma casa. O primeiro, na rua Rodrigues dos Santos, no Pari: um único quarto compartilhado com 7 pessoas, pois além de Geraldo e duas filhas, mais dois cunhados e um irmão. Foram dois anos com banheiro e tanque coletivos: "era muita gente na casa. Aí era ruim para usar o banheiro e o tanque. Todo mundo usava tudo junto, não era bom, ninguém sabia quem era bom, quem era ruim". Depois, em um porão na paralela da rua Oriente, um cubículo com pia, mas o banheiro dividido com outras duas pessoas. "Dava agonia, o Geraldo parecia cigano, ele não gostava, não se sentia bem, queria sair, mas nunca gostava de vila. O motivo era o ambiente; tinha muita gente, o pessoal brigava muito. Quando via que ia dar confusão ele saía: era muito ciumento por causa das filhas. Não gostava que nem eu nem as meninas ficassem andando muito pela pensão". Em seguida, outro cortiço na rua Oriente, um único cômodo, sem banheiro e tanque.

Novamente a Bahia, em Itambé, pequeno negócio: "a venda só dava pra não ficar sem comer". Voltam para o Pari, agora no 975 da João Teodoro. Inicialmente, na parte de baixo, sem banheiro e tanque, praticando a agenda da evitação: "quando ia lavar roupa levantava bem cedinho. Aí não criava confusão". Após alguns meses, mudaram-se para os cômodos na parte superior do cortiço. Não pagavam aluguel, pois Geraldo tomava conta da "pensão", fazendo reparos, cobrando aluguéis: "ele cansou do falatório; falavam que precisavam disso, daquilo, e ele também precisava trabalhar pra ele. Trabalhou em tantas firmas que nem me lembro. Tinha muitos problemas, cirrose, pneumonia aguda, tava doente e tava trabalhando. Mandaram ele embora porque viram que ele estava doente". Com a doença e morte do marido o aluguel baixou de R$ 50,00, mas ficou uma dívida a ser paga: "aluguel, água e luz é dinheiro sagrado. Foi um tempo muito difícil e eu me sentia muito perdida. Depois que meu marido morreu, acabou aquela vontade, a alegria de viver".

Tem muito problema de morar aqui? "Tem rato aqui. Tem no porão. Quando começa a chover, aí é que vem bastante. Quando chove entope o esgoto. Essa água que cai entra aqui, enche o banheiro, enche toda a casa, jogam coisas no vaso. Aquelas panelas de feijoada tudo no esgoto". E a violência, como anda? "De dois anos para cá começou essa bagunça. Eu acho que eles saem da delegacia, da prisão, da Febem. Antigamente não tinha isso de ficar entrando aqui. Pôs as fechaduras, eles quebraram. Se a gente arrumar um lugar pra gente sair, a gente sai porque aqui está muito manjado, com esse pessoal, essa briga, com essa morte".

A televisão está sempre ligada. As filhas gostam do Raul Gil, e Denise prefere o Cidade Alerta: "ajuda a ver o que está acontecendo com a gente".

O cotidiano no Joaquim Murtinho

Como já mencionado, no Joaquim Murtinho não há o "esquema de pensão" em que um encarregado cobra os aluguéis, faz os reparos e é responsável pelo andamento do cotidiano. A história do imóvel e sua condição atual estão diretamente ligadas à atuação de Helena que lá está há 11 anos: 45 anos, pernambucana de Camutanga, é quem procura ordenar o dia-a-dia, escolhendo os que ficam ou saem e aqueles que não podem entrar. É a liderança que leva adiante a luta para obter a propriedade das duas casas: "embaixadora de Camutanga e Timbaúba", "rainha do cortiço", "mistura de leão com raposa", "mãe de todos"são algumas das denominações que os moradores lhe atribuem.

Sua moradia tem 129 m², cozinha, sala, dois quartos, banheiro, quintal com tanque, mas serve de passagem para outros moradores. Possui todos os eletrodomésticos, inclusive TV de 29 polegadas ligada a uma rede a cabo. Com ela estão três filhos, Leonardo, Hélio e Angélica, e mais uma dependente, Patrícia. Todos contribuem para as despesas da casa, e a renda familiar atinge 1,5 mil, parte proveniente da aposentadoria por invalidez da "rainha do cortiço" e dos bicos de costura e venda de produtos de beleza que nunca deixou de fazer.

Seu sonho? "Construir uma família digna, mesmo morando em cortiço". De fato, não obstante sua satisfatória condição habitacional, Helena identifica sua moradia como cortiço: "Até hoje, onde estou morando, neste conjunto de moradias que a gente convive, casas coletivas, porque estou vivendo em conjunto. Nunca se sabe: é muita briga e muita gente que não se conhece direito, criançada apanhando, pai alcoólatra. No passado tinha mais problemas. Às vezes os vizinhos chamavam a polícia. A gente está sempre com a porta fechada. Aqui ninguém tem privacidade. Você não pode usar um roupão que o homem te quer. Então tacava pedra mesmo, até tirar os moradores ruins e só ficar os bons".

Separou-se do marido e veio para São Paulo com a filha Angélica e a irmã Salomé. Por meio de amigos-conterrâneo, alugou um quarto na Júlio Conceição: "achei ali muito humilhante. Viver em lugar apertado, sem janela, junto com todo tipo de cabra. Eu nem queria pisar no chão. Tomava muito cuidado pra Angélica não pegar doença. Como o banheiro era muito sujo, nós fazíamos tudo no quartinho mesmo. Juntávamos nossas necessidades num saco pra jogar no banheiro. Os vizinhos reclamavam do cheiro, mas era melhor do que ir ao banheiro coletivo. Lá tinha fezes na parede, muito papel higiênico jogado no chão e uma espécie de catarro na parede. A casa era tão suja mesmo que ninguém era gente, era tudo bicho. Minha filha não ia virar bicho não. Então foi por isso que mandei a menina pra Pernambuco: é melhor ficar perto do pai, aquele safado, do que virar bicho nesse lugar que não é de bem".

Com um aumento de salário, mudou-se para a rua Júlio Conceição, n.° 142: "lugar do inferno dos cortiços". Com a ajuda dos patrões conseguiu "comprar as chaves" no 250 da Joaquim Murtinho. Tinha havido um incêndio que não causara muitos danos. Amigos e parentes trabalharam em mutirão durante três meses limpando as paredes e reformando os quartos: "falei pra todo mundo que aqui seria o lar de todos, uma embaixada. Em cortiço a gente aprende a não se gostar porque não tem privacidade. Mas eu usei a casa e minha história pra unir o povo. Todo mundo trabalhava pra arrumar isso aqui".

Em 1990, realizou seu primeiro grande sonho: busca os filhos para virem morar com ela: "Construir uma família digna mesmo morando em cortiço". Começou a sua segunda luta que era a obtenção de propriedade do imóvel pelos seus moradores: "pela paróquia construí uma relação com o centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos. Mandamos ver um processo de usucapião contra os proprietários das casas aqui. Nesse aí estamos faz uns dez anos. Depois vi que não dava jogo. Os proprietários têm mais direitos que nós. Mandei ver uma contra-ação contra as ações de despejo. Estamos junto com a Pastoral da Moradia e a OAB. Com essa história já ficamos com 5 anos de luta. Aí, por último, tem a Associação Comunitária da Rua Joaquim Murtinho 21 de Novembro do Bom Retiro. O dia mais marcante da minha vida. Nesse dia me separei, fiquei internada num hospital de louco e fui despejada. Pelo despejo chamo 21 de Novembro".

Por intermédio da Associação, liderada por Helena, os moradores negociam com os proprietários a compra do terreno através da Prefeitura ou da CDHU do Governo do Estado. E depois do despejo, como ficou? "É muito sofrido. Despejo é fogo, vem polícia, eles passam concreto nas casas. Todo mundo tira tudo com muita dor, nem pode tirar tudo, porque nem dá tempo. Mas eu sou de luta. Por isso, só eu fui autorizada pelos proprietários a voltar aqui pro 250. Aí eu deixei as pessoas que confio mais também voltar aqui. Se não viesse logo, outros safados entravam aqui. Então entrei. Mas precisei derrubar as casas lá de trás. Foi a condição do dono. Mas, no fundo, todo mundo que mora aqui agora é boa gente."

Helena já tem os filhos por perto. Quer realizar o segundo sonho: a casa própria. Mas não em qualquer lugar: o bairro da Luz é local "perigoso", "despudorado", "de vagabundo", "de prostituta". Ao contrário, o Bom Retiro é o "céu", "calmo", "seguro", "de família": "eu não penso sair do centro. Na favela só tem maloqueiro e ladrão. E morar em bairro afastado é burrice. Não tem nada de bom lá. Só pobreza e falta emprego, falta de tudo."

Decidida, corajosa, obstinada, com idéia fixa, internada para tratamento psiquiátrico mais de uma vez, as idéias "martelam" na sua cabeça: Helena lutou pelos filhos e batalha pela casa que almeja. "Sem casa, ninguém é homem, é bicho que fica dali pra cá".

Ediulza também é de Camutanga, 34 anos, semi-alfabetizada, cinco filhos: Ana Paula com 16 anos, Jaqueline, 15, Pedro, 13, Emanuela, 5, e Lucas, 4. Os mais velhos estudam em colégio próximo, e Ana Paula começou a trabalhar como vendedora numa loja nas cercanias. Veio para São Paulo em 1987: "lá eu tinha moradia, mas não tinha emprego. Aí não adianta. Falavam em pensão, só que a gente não tem noção do que é pensão. Só quando chega é que a gente tem noção: como é que pode dormir e cozinhar no mesmo quarto?".

Casada desde os 18 anos com um conterrâneo, separou-se dele porque "começou a envolver-se com a mulherada e dessa época para cá, até hoje, é sempre a mesma coisa: sempre ficava faltando as coisas em casa e eu sabia que ele estava gastando com as mulheres na rua". Só uma vez pronunciou o seu nome, Vicente. Ele fez carreira rápida: faxineiro, porteiro, zelador com carteira assinada num prédio na rua Newton Prado. Toda família vivia lá: "viver dentro da sociedade é outra coisa. Tem muita diferença a gente conviver com uma pessoa de sociedade e de repente ir pra baixo".

Comprou as chaves, ou seja, a posse de dois cômodos na Joaquim Murtinho, onde passou a morar desde 1993: "era horrível! Parecia uma caverna. Os meninos morriam de medo. Não queriam entrar no banheiro pra tomar banho, ficavam sempre em cima da cama. O telhado, a metade era umas madeiras que, quando chovia, a chuva caía no chão da cozinha". Aos poucos foi reformando, construiu outro cômodo e o banheiro com a ajuda de parentes e conterrâneos. Tem os eletrodomésticos necessários, inclusive três televisores, não raras vezes todos ligados. Paga R$ 80,00 por mês pela conta de luz e R$ 40, pela água. Quantia elevada para quem, com cinco filhos, raramente recebe ajuda do marido e ganha R$ 400,00, quando consegue fazer hora extra.

Antes de morar no apartamento, enquanto o marido era zelador, Ediulza habitava em um cortiço na rua Júlio Conceição, quando a família chegou a São Paulo, onde alguns irmãos e primos já viviam. Ficavam nove adultos e duas crianças em um só cômodo dividido por tapumes, formando minúsculos cubículos: seu marido no chão e ela numa cama com as duas filhas: "O quarto que eu dormia só cabia a cama de solteiro e a geladeira. No outro quarto, só cabiam duas beliches e ficava um meiozinho onde a gente passava e ficavam os sete rapazes [...] eu ficava apavorada. Os meninos não saíam, olhavam o povo passando no corredor, tinham medo, porque as pessoas falavam muito alto, choravam muito quando viam as pessoas brigando".

Morar no Centro? "O povo do Bom Retiro é mais bem educado porque aqui tem muita gente de sociedade; na periferia não tem não, porque lá é muito longe, não tem sociedade: só invasão. Ruim mesmo é a favela. Como pode viver assim todo mundo junto, sem divisão, sem água e esgoto? Lá é só tiroteio, morte. Ser de sociedade é não usar droga ou ser violento e também ter uma moradia digna. É ser gente, trabalhar com a carteira assinada". Na sua quietude, Ediulza diz: "meu sonho é que meus filhos virem gente mesmo. Sem ser corticeiro, sem ser pouco estudado. Porque é preciso ser de sociedade, né?"

A família Severino é formada por três irmãos – José, 35 anos, Paulo, 25, João, 23 – e o primo Anésio com a mesma idade, todos de Assaré, pequena cidade vizinha a Crato, no Ceará. Lá completaram o curso primário. O mais velho ganha R$ 700,00 e os outros três ganham mil reais no total, ao que se deve acrescentar uma comissão de R$ 450,00 a cada dois meses. Profissão: "seguranças particulares licenciados", a serviço do Barbicha, dono de vários estabelecimentos na área central de São Paulo, envolvido em contrabando e roubo de carga nas Rodovias Dutra e Régis Bittencourt3 3 O mais velho José, chefe da família, não participou das entrevistas. Ao contrário, desencorajou os outros de falarem. "O Zé falou pra gente não comentar muito essas história de trabalho. Então só te digo que mudar de um lugar pro outro é só pra desbaratinar as perseguições". Várias entrevistas foram desmarcadas e a última que deveria ser gravada não foi realizada, pois os Severino deixaram o cortiço antes da data marcada. Portanto, as falas advêm de anotações feitas logo após as entrevistas. Como estas sempre foram feitas em conjunto e as opiniões se acrescentam em torno dos temas propostos, consideramos oportuno não diferenciar as falas. .

"Ninguém é de ninguém aqui no cortiço, porque ninguém tem seu espaço. Nós já moramos em oito cômodos eu acho: aqui é um barraco no meio do cortiço, mas é o melhor". Trata-se de uma construção de madeira no 1.° andar que mede cerca de 20 m², com uma janela externa, sem cozinha, banheiro, tanque ou pia. No cômodo, há quatro colchões no chão, caixas que servem de guarda-roupa, várias fotos de mulheres nuas e os símbolos do Corinthians e do São Paulo.

Sempre moraram juntos num pequeno sítio, "um monte de terra seca: nós só passamos fome lá. Lá você sofre demais. É uma dor muito forte. Não dava nada de colheita do téquinho de chão. Aí viramos segurança". José saiu na frente. Foi para Crato buscar trabalho, onde começou a ter muito assalto: "ele é um cara tinhoso e viu que tinha pouca gente de segurança. Fizemos um curso de tiro e compramos uma licença de guarda na polícia. Nós somos fortes, ninguém mexe não". E como era o serviço lá ? "Tem jeito não: começa a prestar serviço pra um cara e ele começa a ficar seu amigo. E quando o cara passa um outro ou manda passar, você sabe quem matou, quem morreu. Você vira bode do cara e se querem o cara, te querem também. Com nós não tem problema, mas com a mãe, pai, como fica? Eles nem trabalham de carrega ganha-pão"4 4 "Bode" é cúmplice; revólver, conforme sua utilização significa: ganha-pão, ferramenta, máquina, berro, trabuco ou desgostoso, nestes dois últimos casos quando causa sofrimento de morte. .

O serviço exige a troca constante de residência e assim perambularam durante três anos em cerca de dez cortiços, sempre na área central, onde o patrão tem seus negócios: "nós já moramos em tudo que é lugar. O Barbicha nos bota aqui porque é barato, é perto dos depósitos. Mas é muito humilhante. Outro dia tinha um cara batendo numa mulher. Eu tive que pegar o ganha pão. Sempre tem criança apanhando também. E o banheiro único? Quando um cara vai lá [...] você sabe! Aí ele deixa sujo e você tem que ir pro trampo. Aí você coloca a camisa no penduricalho e ela cai no chão: sua roupa está toda mijada. Depois de três dias que isto ocorreu, peguei o cara e porrei ele todo. Aí tivemos que mudar".

E no Joaquim Murtinho? "Aqui também é muito ruim. Acho que pouca gente imagina o que é ter que usar um lugar de intimidade com todo mundo. Eu faço assim: quando estou na rua, vou lá na Fatec, no McDonald’s. É duro você trazer uma mina pra este barraco. E se ela quiser tomar um banho? Mulher é toda vaidosa. Nunca tive em São Paulo um banheiro próprio".

E a vida por aqui? "Aqui em São Paulo, ninguém é gente ou é gente demais. A vantagem é que não tem nem mãe nem pai pra correr risco de vida. A única coisa boa do cortiço é que é aqui no centro. Eu vejo no Datena que na periferia todo mundo é ladrão. Na favela é bem pior. Pior que cortiço é só favela e bairro longe". Favela é lugar de "pé de barro, do bicho da sujeira" e a periferia é "cara pela distância, lugar sem nenhuma infra-estrutura. Também é muito complicado: é tiro pra tudo que é lado".

Na penúltima entrevista, escapou a pergunta: "vocês têm porte de arma"? "Não! Mas, você tem porte de caderno?" Saiu a resposta: "Mas ninguém machuca ninguém com caneta e caderno". E os Severino retrucam: "Epa, mas aí é trairagem [...] Você está dizendo que nós somos matador? Deixa eu deixar claro. Aqui todo mundo trabalha assim, fazendo cobrança, dando respeito ao Barbicha, fazendo um ou outro trampo. Mas nós somos da alta. Quem faz esse serviço aí que você falou é a baixa, a ralé. Não rola isso. Ninguém pode ver a gente sujando a mão. Aí o Barbicha perde o respeito. Aqui ninguém é matador: é só pra dar respeito, introduzir um blá. Mas também o Barbicha é meio ralé. É tudo peixe pequeno. Agora vamos parar por aqui, porque aí [...]"

Última entrevista: "Eu, se podia, saía dessa vida. Porque ter que segurar o berro é um perigo. Porque o revólver traz esse desgosto pra quem carrega e pra quem atira. Aqui ninguém pode reclamar do ganha pão, porque é essa máquina que traz o sustento. Ninguém aqui tem estudo [...] é tudo bruto. O berro é que nem uma máquina; tem gente que vê o berro como berro, aí atira que nem chuta bola. Pra nós não: é a introdução, pra uma de resolver um papo com o devedor. Não é trabuco! É ferramenta mesmo".

Os Severino gostariam de uma vida melhor: "preferia outra vida, ter uma casa, ser mais honesto aí na profissão. Não que nós sejamos desonestos, mas também não é certo. Aqui todo mundo tem vergonha, mas é o que põe o cascalho em casa. Eu queria trabalhar em escritório, ter estudo, família. Mas aqui é tudo matuto mesmo".

Quartos apertados, sem banheiro, pia, cozinha, sem paisagem: "Nós saímos do Ceará com dificuldade e viemos pra cá e aqui só moramos em lugar lixo mesmo. Eu chorei mesmo, porque é muito triste você não ter um lugar seu, sem gente na sua orelha, sem ouvir bater em criança, sem sofrer com as brigas o tempo todo. Aqui ninguém tem vida, todo mundo convive".

Áreas centrais: espaços de debates e embates

Assinalei que as áreas centrais foram relativamente relegadas pelo poder público, que canalizou investimentos para outras regiões da Cidade. A saída de grupos mais abastados, a migração das sedes das empresas, a popularização do comércio e serviços, ao mesmo tempo em que a mendicância e os moradores de rua apareceram de maneira expressiva, os assaltos tornaram-se freqüentes, e alguns locais transformaram-se em pontos permanentes de venda e consumo de drogas, a imagem de sujeira e periculosidade passou a ser fortemente associada ao cotidiano do Centro. O aumento do número de ambulantes, muitos não cadastrados, ao dificultar a circulação de pessoas, acumular lixo, competir com o comércio estabelecido, representar evasão fiscal e venda de produtos contrabandeados, potencializou imagens que se alimentam nas idéias da desordem: para alguns discursos e práticas, o ordenamento da Região passa pelo empenho de controlar seus espaços:

"especialmente na escala em que se verifica na área central de São Paulo, o comércio informal de rua acarreta a degradação do espaço público e o aumento dos problemas ligados à segurança, uma vez que a ocupação desordenada dos logradouros públicos dificulta o policiamento" (Favero, 2003: 19).

Em contraposição à abordagem que equaciona a recuperação do Centro como um problema que prioriza a questão da disciplinarização, os movimentos sociais reivindicam a ocupação destes espaços, apoiados na existência de imóveis vazios, por centenas de milhares de pessoas que moram em cortiços, hotéis, pensões e apartamentos precários, para não falar naqueles que habitam nas ruas ou em abrigos públicos. Assim, diante da vasta oferta de empregos e da facilidade de acesso a eles, desenvolvem discursos e atuações com base em uma concepção de reforma urbana em função de direitos de cidadania. A Cidade deveria ser franqueada também para as camadas pobres da população:

"A reforma urbana é a luta por um centro como lugar do povo, do direito à moradia, à cidade, à cidadania, um centro aberto e democrático e não um centro de repressão, da expulsão, da exclusão e de limpeza social" (Fórum Centro Vivo, 2004: 2).

Ou seja, de um lado, ênfase na limpeza, ordem e controle, de outro, a priorização da função social da propriedade e a ocupação de edifícios que se encontram vazios por parte daqueles que querem exercer o direito de viver nas áreas centrais. Nesse sentido, a maneira de ocupar os espaços da Cidade é essencialmente política em dois sentidos: na acepção de que deve ser objeto primordial das políticas públicas (policies) e, sobretudo, de que nela se estruturam em interesses diversos e, por vezes, antagônicos que procuram mobilizar forças para levar adiante suas reivindicações (politics).

Um conjunto interligado de fatores tornou a área central fulcro de embates e debates. Inicialmente, cabe mencionar a atuação da Associação Viva o Centro, entidade civil criada em 1991, capitaneada pelo Banco de Boston que conta com o apoio de várias entidades, entre as quais a Bolsa de Valores e de Mercadoria, além de outros bancos, grandes escritórios de advocacia e lojas comerciais. Define-se como uma "usina de idéias" e como tal vem promovendo eventos a fim de diagnosticar e propor soluções: tráfego, acessibilidade, segurança de pedestres, camelôs, população de rua foram alguns dos temas debatidos (Barreto, 1997). Esse empenho foi em boa medida responsável pela criação do Pró-Centro, em 1993, órgão da Prefeitura voltado para enfrentar os problemas da Região, o Programa Centro Seguro do Governo do Estado no ano seguinte, e, em 1996, o Programa Ação Local, organização que dividiu a área central em 50 microrregiões das quais participam, de modo particular, entidades do comércio local, reunindo cerca de 3,3 mil conselheiros que, sob o apoio logístico da Associação devem "[...] zelar por sua rua ou praça"(Almeida, s.d.: 7). Mencione-se que a entidade possui forte apoio de planejadores e urbanistas, tornando-se importante referência na retomada e nos rumos que pautam a discussão sobre a região central, dinamizados, após 1997, pela revista Urbs. Nela são expostas várias propostas de intervenção, mas creio não ser arriscado afirmar que na sua linha editorial prevalece uma concepção de saneamento dos espaços urbanos e dos grupos sociais pobres que os ocupam:

"[...] visava(se) [...] à requalificação e zeladoria permanente dos espaços públicos [...] e a uma ação social efetiva para equacionar a questão dos sem-teto e crianças de rua, além do urgente disciplinamento do comércio informal [...] Para atrair moradores de qualquer estrato de renda, é necessário melhorar cada vez mais a qualidade do espaço público – limpeza, segurança, disciplinamento de seu uso, iluminação e acessibilidade" (Almeida, s.d.: 5 e 10).

Por outro lado, as ocupações de prédios nas áreas centrais constituem iniciativas organizadas por vários movimentos, entre os quais se destacam a União das Lutas de Cortiço, União de Movimentos de Moradia, Movimento dos Sem-Teto do Centro, Unificação das Lutas dos Cortiços, Fórum dos Cortiços, Novo Centro, Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto da Região Central, Movimento de Moradia do Centro. São aglutinações que contam com assessorias técnicas – entre as quais, Ambiente, Fábrica Urbana, Instituto Polis, Integra Cooperativa, Assessoria em Habitação aos Movimentos Populares – e que reúnem lideranças com larga experiência na condução de lutas urbanas, com coloridos diversos nas orientações políticas de curto e longo prazo. De suas ações isoladas e conjuntas resultaram seis prédios ocupados em 1997, outros dois no ano seguinte. Em meados da década seguinte, totalizam mais de 30 imóveis, congregando alguns milhares de famílias nessa nova modalidade de habitar. Sua repercussão na mídia é considerável, não só quando efetuam o que a imprensa costuma qualificar de "invasão", mas também quando são impedidos de realizá-la e, sobretudo, retirados dos edifícios pelas forças da segurança. De modo geral, essas ações visam a canalizar as políticas públicas em benefício das camadas pobres, bem como participar dos processos de decisão governamental acerca dos investimentos a serem realizados, tidos como necessários a uma política urbana de inclusão aos benefícios da Cidade:

"[...] Os movimentos de moradia têm trabalhado e elaborado a proposta de Morar Perto do Centro [...] Esta proposta foi uma construção coletiva com os movimentos, as assessorias técnicas, com entidades que atuam na área central. Ele não pensa política habitacional pontualmente ou isoladamente, mas sim conjuntamente à política urbana. Essa proposta pressupõe que não haja mais exclusão [...] que atenda família de baixa renda, família que vive na rua, que não tem renda fixa, que não tem trabalho formal [...] essa população que nunca abandonou o centro, que trabalha e o mantém funcionando, quer participar desse processo, necessita possuir o direito de morar no centro com dignidade" (Câmara Municipal de São Paulo, 2001: 13).

Não resta dúvida de que estes embates e debates influíram na orientação do poder público no sentido de direcionar suas políticas públicas. No caso da gestão municipal do Partido dos Trabalhadores – PT (2000-2004), o Centro foi definido como uma área prioritária de intervenção. Assim, além das várias iniciativas de intervenção urbana já assinaladas, convém destacar o Programa Ação Centro, coordenado pela Emurb – Empresa Municipal de Urbanização, do qual participam 16 secretarias e cinco empresas públicas. Dirigida para os distritos Sé e República, prevê a realização de 130 iniciativas e, para tanto, conta com um financiamento do BID de US$ 100 milhões ao qual a Prefeitura deve acrescentar uma contrapartida orçada em outros 67 milhões de dólares. Trata-se de Programa iniciado no final da gestão petista que visa fundamentalmente à reforma de edifícios vagos e cortiços, produção de habitação, reabilitação do patrimônio histórico, programas socioculturais, projetos de locação social, a partir de uma metodologia de reabilitação integrada do hábitat que privilegia a participação dos grupos locais nas definições políticas urbanas (Prefeitura Municipal de São Paulo: 2004).

Vale insistir: a concepção da gestão petista também se expressa nas 61 entidades, empresas, faculdades, centros de pesquisa e movimentos sociais que participaram das reuniões referentes aos programas a serem desenvolvidos, seguindo uma tradição de orientação participativa das gestões municipais do PT. A seu turno, voltados para outros distritos da área central, a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano – CDHU, órgão do governo estadual, também efetuou um convênio com o BID, do qual receberá um financiamento de US$ 34 milhões e investirá US$ 36 milhões destinados às reformas, reciclagem e erradicação dos cortiços. (CDHU-SEADE, 2003). Dessa forma, os governos municipal e estadual são atores básicos na dinamização das áreas centrais, pois definem para onde e para quem os recursos serão prioritariamente canalizados e, em conseqüência, indutores dos agentes econômicos, de modo especial, o capital imobiliário.

Repita-se mais uma vez: são vastas as potencialidades sociais e econômicas do Centro, e os recursos públicos nele alocados para os próximos anos não são em nada desprezíveis. O PT mostrou-se aberto às demandas de vários grupos de interesse, inclusive os populares, para negociar e priorizar os programas para as áreas centrais de São Paulo, incentivando a criação de instâncias de deliberação como o Conselho Municipal de Habitação. Criado em 2002, é composto por 48 membros, 16, representando o poder público, outro terço vindo de entidades da sociedade e igual fatia eleita pela população, num processo do qual participaram mais de 33 mil votantes (Sehab, 2004: 10). Originou-se da conferência Municipal de Habitação que reuniu 1.600 delegados escolhidos entre 22.230 participantes que compareceram aos 16 encontros regionais do Município realizados periodicamente. Mencione-se, ainda, que ocorreu em 2003 a Conferência Municipal da Cidade na qual estiveram presentes 3.500 delegados. Assim, a administração petista desenvolveu um estilo de gestão que pode ser denominado de republicanismo de participação, pois a ação governamental procurou não só ser transparente, como sobretudo se abriu para a negociação de interesses diversos e conflitantes. É muito cedo para dizer algo sobre a prefeitura do PSDB, mas sua tradição de governo está muito mais apoiada numa concepção de delegação do mandato popular, na qual as instâncias governamentais devem ser transparentes. A definição de prioridades, porém, não obstante aberta a consultas, é prerrogativa do Poder Executivo que tem não só o direito mas o dever de decidir: trata-se de um republicanismo delegativo. O risco do modo petista de governar reside em prolongar demasiadamente o processo decisório acabando por tornar a participação ineficaz ao gerar um conselhismo ratificador das iniciativas do poder executivo. Este não parece ter sido o caso da administração encerrada em 2004. O risco da concepção que se baseia na representação, numa sociedade extremamente hierárquica e excludente como a brasileira, reside em exacerbar posicionamentos tecnocráticos que acabam por reproduzir o elitismo que está na raiz da segregação de nossas cidades.

Contudo, há também riscos mais sérios, esboçados em ações de vigilância e limpeza de estilo sanitário-policial levadas a cabo em zonas problemáticas do Centro. Locais de consumo de drogas, de prostituição, com seus hotéis, bares, boates e cinemas, estão sendo objeto de um controle social que pode ser designado de sanitário-policial. Acrescente-se, também, que pessoas sem-teto, catadores de lixo ou camelôs passaram a ser submetidos a um rígido controle de demarcação urbana. A continuarem essas disciplinares que procuram limpar a cidade do que é considerado pelas concepções dominantes como sua sujeira, poderá chegar-se a políticas de higienização que, em nome da ordem, acabam por criminalizar a pobreza.

Os destinos que tomarão os recursos que serão injetados nos cenários centrais da Cidade estão relacionados à força dos diversos grupos em pressionar as instâncias decisórias. Sabe-se que investimentos levam à valorização de áreas, o que tende a expulsar os grupos mais pobres que não podem pagar o assim chamado "preço do progresso". Vale insistir que as intervenções urbanas são eminentemente políticas na dupla acepção antes referida, pois, necessariamente, valorizam ou desvalorizam determinadas áreas e, assim, criam novas hierarquias socioespaciais. Diante da desigualdade imperante na sociedade brasileira, o papel do poder público é essencial na gestação de modalidades de vida mais equitativas. Isso significa dizer que deixar a dinâmica urbana sob o império do mercado imobiliário e financeiro só pode conduzir os habitantes pobres das áreas centrais de São Paulo aos locais mais deteriorados que, no caso da moradia, resultam no cotidiano da vida nos cortiços.

Os processos assinalados nas páginas anteriores atestam as potencialidades da Região Central da Cidade e sublinham a vasta vulnerabilidade socioeconômica e civil que desaba sobre os moradores das habitações coletivas. Assim, considero necessário terminar este ensaio com as palavras de um dos seus moradores:

"Porque uns falam que pra ficar no CDHU tem que ganhar R$ 900,00: e você acha que corticeiro ganha R$ 900,00? Porque se eu ganhar tudo isto, jamais estava dentro de um cortiço com meus filhos. Jamais eu moraria num cortiço: um montão de gente, de bicho. Aqui tem muito trabalhador, mas quando sai do serviço e chega aqui, então vira bicho: grita, bate, fala palavrão".

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  • *
    Este texto é parte de pesquisa de maior envergadura, financiada pela Fapesp e CNPq. As entrevistas foram realizadas por: Cristiana Borges, Daniel Cara, Daniela Sequeira e Maria Encarnación Reccio.
  • 1
    Estima-se em 15% a fatia dos escritórios vazios (
    Gazeta Mercantil, 1996). A estimativa de domicílios vagos varia: a Prefeitura aponta para 45.464 domicílios particulares vagos, 17,5% do total existente em 13 distritos centrais (Prefeitura do Município de São Paulo, 2004: 7).
  • 2
    Este número é considerado subestimado pelo poder municipal (Prefeitura do Município de São Paulo, 2003: 27).
  • 3
    O mais velho José, chefe da família, não participou das entrevistas. Ao contrário, desencorajou os outros de falarem. "O Zé falou pra gente não comentar muito essas história de trabalho. Então só te digo que mudar de um lugar pro outro é só pra desbaratinar as perseguições". Várias entrevistas foram desmarcadas e a última que deveria ser gravada não foi realizada, pois os Severino deixaram o cortiço antes da data marcada. Portanto, as falas advêm de anotações feitas logo após as entrevistas. Como estas sempre foram feitas em conjunto e as opiniões se acrescentam em torno dos temas propostos, consideramos oportuno não diferenciar as falas.
  • 4
    "Bode" é cúmplice; revólver, conforme sua utilização significa: ganha-pão, ferramenta, máquina, berro, trabuco ou desgostoso, nestes dois últimos casos quando causa sofrimento de morte.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Set 2007
    • Data do Fascículo
      2007
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