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O México na OEA: da contenção à coordenação

Mexico and the OAS: from containment to coordination

Resumos

O artigo identifica quais são os determinantes da atuação do México na OEA e explica sua evolução histórica entre 1948 e 2012. Argumenta-se que o teor geral da relação do Estado mexicano com a organização hemisférica em diferentes períodos históricos fixou-se em função de: (a) a estratégia mais geral de relacionamento com os Estados Unidos; e (b) a maior ou menor coincidência mexicana com o conceito e a arquitetura de segurança que predominaram na organização em diferentes etapas. Demonstra-se que, no transcurso dos 65 anos desde sua fundação, o México transitou entre ver a OEA como um foro para conter os Estados Unidos e percebê-la como um espaço para melhorar a coordenação interestatal com aquele país na solução de problemas comuns.

México; OEA; Segurança Hemisférica; Política Externa do México


The article identifies the factors that shape Mexico's position in the OAS and explains its historical evolution from 1948 to 2012. It argues that the Mexican state's general approach to the hemispheric organization in different historical periods has depended on: a) the more general strategy envisioned to manage the relationship with the United States; and b) the greater or lesser agreement of Mexico with the security architecture prevailing at different points in time in the organization. The article shows that, along the 65 years since its inception, Mexico has transited from conceiving the OAS as an arena to contain the United States to perceive it as a space conducive to the improvement of intergovernmental coordination in the solution of shared problems.

Mexico; OAS; Hemispheric Security; Mexican Foreign Policy


PARTE I – ESTRATÉGIAS E POTENCIALIDADES DE ALGUNS PAÍSES PARA AS ORGANIZAÇÕES REGIONAIS

O México na OEA: da contenção à coordenação* * Este artigo, " México en la OEA: de la contención a la coordinación", foi traduzido por Fernando Pinheiro.

Mexico and the OAS: from containment to coordination

Natalia Saltalamacchia Ziccardi

Professora e pesquisadora do Departamento Académico de Estudios Internacionales do Itam, México

RESUMO

O artigo identifica quais são os determinantes da atuação do México na OEA e explica sua evolução histórica entre 1948 e 2012. Argumenta-se que o teor geral da relação do Estado mexicano com a organização hemisférica em diferentes períodos históricos fixou-se em função de: (a) a estratégia mais geral de relacionamento com os Estados Unidos; e (b) a maior ou menor coincidência mexicana com o conceito e a arquitetura de segurança que predominaram na organização em diferentes etapas. Demonstra-se que, no transcurso dos 65 anos desde sua fundação, o México transitou entre ver a OEA como um foro para conter os Estados Unidos e percebê-la como um espaço para melhorar a coordenação interestatal com aquele país na solução de problemas comuns.

Palavras-chave: México; OEA; Segurança Hemisférica; Política Externa do México.

ABSTRACT

The article identifies the factors that shape Mexico's position in the OAS and explains its historical evolution from 1948 to 2012. It argues that the Mexican state's general approach to the hemispheric organization in different historical periods has depended on: a) the more general strategy envisioned to manage the relationship with the United States; and b) the greater or lesser agreement of Mexico with the security architecture prevailing at different points in time in the organization. The article shows that, along the 65 years since its inception, Mexico has transited from conceiving the OAS as an arena to contain the United States to perceive it as a space conducive to the improvement of intergovernmental coordination in the solution of shared problems.

Keywords: Mexico; OAS; Hemispheric Security; Mexican Foreign Policy.

Hoje em dia, a Organização dos Estados Americanos (OEA) é objeto de críticas de gregos e troianos. De um lado, nos Estados Unidos, existem setores que opinam que a OEA já não responde aos interesses de seu país, razão pela qual não faz sentido continuar a financiá-la (Rogin, 2011). De outro, os governos de vários Estados latino-americanos veem na OEA um simples instrumento da política externa estadunidense e, assim, desejam enfraquecê-la. Nesse contexto, a posição mexicana resulta singular. Na última década, o México converteu-se em uma espécie de aliado da OEA e se mostrou disposto a respaldá-la politicamente. Em meio à chuva de questionamentos dirigida à organização hemisférica, o governo de Felipe Calderón expressou claramente que a considerava uma entidade "indispensável e insubstituível" e que seu trabalho era complementar o de outros foros regionais (Secretaria de Relaciones Exteriores, 2011, p.15)1 1 A chanceler Patricia Espinosa reiterou esse conceito na 42ª Assembleia Geral ocorrida na Bolívia em 2012: "Sigamos construindo uma OEA forte, com base em nossas coincidências e aspirações [...] Tenho a certeza de que esse processo de reflexão nos levará à conclusão de que, em certos âmbitos e para algumas tarefas, nossa organização continua sendo indispensável e insubstituível". . Esse fato é notável para um país que até princípios do século XXI fazia da distância e da cautela frente à OEA um signo de distinção.

O objetivo deste artigo é identificar os determinantes da atuação do México na OEA e explicar sua evolução histórica entre 1948 e 2012. Argumenta-se que o teor geral da relação do Estado mexicano com a organização hemisférica, em diferentes períodos históricos, fixou-se em função de: (a) a estratégia mais geral de relacionamento com os Estados Unidos; e (b) a maior ou menor concordância mexicana com o conceito e a arquitetura de segurança que predominou na organização em diferentes etapas. Ainda que o México, sem dúvida, tenha aproveitado a OEA para interagir com os outros 32 países-membros numa ampla gama de temas, esses dois fatores se apresentam como o eixo articulador de suas posições através do tempo.

Com o propósito de desenvolver esses argumentos, este trabalho divide-se em três etapas de análise, que apresentam diferentes cenários sistêmicos: a Guerra Fria, os anos 1990 e o período posterior ao 11 de Setembro de 2001. Em cada etapa, discute-se a postura do México com relação a: (1) os valores ou princípios em que se baseia a noção de segurança hemisférica; (2) as ameaças comuns identificadas; (3) os mecanismos desenvolvidos para fazer-lhes frente. A ênfase está colocada no que isso implica em termos de produzir distância ou cautela ou, pelo contrário, proximidade e compromisso do México com a organização.

Guerra Fria: a resistência ativa

Na Conferência de Chapultepec, em 1945, o tema da paz e da segurança no continente ocupou o lugar estelar nas discussões encaminhadas para configurar uma nova institucionalidade hemisférica. Em 1947, mediante a assinatura do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR) – subscrito inclusive antes da Carta da OEA –, avançaram os planos estadunidenses para gerar uma aliança político-militar na América. A partir de então, e durante toda a Guerra Fria, a OEA esteve dominada pelos assuntos de segurança definidos nos termos político-ideológicos da confrontação bipolar.

Nessa etapa, os Estados Unidos lograram impor à OEA boa parte de sua própria concepção sobre a segurança hemisférica. Como se sabe, esta era uma noção enraizada no anticomunismo como princípio e identificava o bloco socialista como a principal ameaça internacional enfrentada pelos países americanos, não só em termos de possíveis agressões abertas por parte da União Soviética, ou seus aliados, como também no tocante à difusão local do projeto comunista diante de atores políticos nacionais. Para combater a ameaça, puseram-se em marcha mecanismos institucionais regionais de defesa e segurança coletiva, como o TIAR e o Pacto de Bogotá. Durante esse período, no entanto, o México esteve fora de consonância em quase todos os aspectos da arquitetura de segurança hemisférica. Como se explicará adiante, o país não concordava inteiramente com a agenda de riscos, e, sobretudo, rechaçava os meios estabelecidos para fazer-lhes frente.

Para começar, a diplomacia mexicana considerava problemático aderir a uma definição de ameaça regional que – como o comunismo – remetia diretamente a um sistema de valores e a um modo de produção; isto é, a aspectos internos da organização política, econômica e social dos Estados. Motivada pela própria experiência histórica, a doutrina de política externa do México pós-revolucionário rechaçava por princípio a noção de que a comunidade internacional estivesse legitimada para fazer juízos sobre a identidade política de um governo, qualquer que esta fosse; e menos ainda a ponto de identificá-la como um perigo para o resto, situação que poderia justificar a aplicação de sanções contra si ou outro tipo de pressão externa considerada inapropriada. Nessa linha de raciocínio – que ficou plasmada na Doutrina Estrada (de 1930) –, as formas de governo nacionais eram um assunto que pertencia ao domínio reservado dos Estados e não deviam ser objeto legítimo de discussão em organismos internacionais como a OEA2 2 A Doutrina Estrada buscou evitar o uso do (não) reconhecimento diplomático como uma arma contra regimes supostamente indesejáveis, por exemplo, aqueles que haviam chegado ao poder mediante uma revolução social como a mexicana (ou a bolchevique). Foi uma reação ao modo pelo qual os Estados Unidos utilizaram, em princípios do século XX, sua política de reconhecimento internacional para arrancar concessões dos governos mexicanos pós-revolucionários. . No contexto do sistema interamericano, isso se traduziu, por exemplo, na conhecida reivindicação do direito de Cuba de decidir seu próprio rumo político e na defesa do pluralismo ideológico no continente. Evidente que, ainda que forjada em termos de princípios, essa posição apoiava-se também em questões de ordem prática, que conduziram o Estado mexicano a avaliar que não era de seu interesse nacional somar-se à corrente dominante e cultivar na OEA a noção de uma ameaça comum de cunho marxista.

Com efeito, mesmo que se possa dizer que, do ponto de vista ideológico, a elite governante do México pós-revolucionário comungava, em graus variáveis, com as posições anticomunistas, também estava, em termos relativos, menos preocupada que outros pares latino-americanos com o tema concreto da expansão do comunismo no próprio país ou com o bloco socialista como fonte de ameaça externa. Quanto ao primeiro ponto, o México foi efetivamente território pouco fértil devido a uma série de razões estruturais. Em primeiro lugar, o nacionalismo revolucionário foi capaz de hegemonizar ideologicamente o lado esquerdo do espectro político, estreitando o espaço para que forças mais radicais prosperassem3 3 Segundo Bartra (1990, p.147), ao menos até os anos 1980, tanto no México como em Washington assumia-se que "a segurança nacional do México era protegida por uma dura crosta que impermeabilizava o país de possíveis contaminações comunistas". . Em segundo lugar, o PRI desenvolveu uma série de mecanismos corporativos e eleitorais que demonstraram ser eficazes para manter a estabilidade social e não perder o poder para outras forças políticas. Finalmente, chegou-se a um acordo tácito com o governo marxista-leninista de Cuba, para que este não apoiasse potenciais guerrilhas ou movimentos revolucionários no país. Ademais, as forças de segurança mexicanas não deixaram de recorrer à repressão legal e ilegal quando julgaram necessário. De tal forma que, ainda que o "perigo comunista" de modo algum estivesse fora da lista de ameaças internas ao Estado mexicano, seus governantes sentiram-se mais autossuficientes do que as elites políticas de outros países latino-americanos para enfrentá-lo, e, por fim, se viram na posição de recusar uma colaboração internacional de envergadura nessa matéria, fosse ela bilateral (com os Estados Unidos) ou multilateral (mediante a OEA)4 4 Com efeito, o México não só recusou reconhecer à OEA a função de guarda anticomunista, como foi um dos poucos países latino-americanos que, durante a Guerra Fria, não estabeleceu acordos bilaterais de segurança ou defesa com os Estados Unidos (em todo caso, ofereceu a Washington cooperação informal com sua estratégia anticomunista, velada e com limites próprios). . No tocante ao Pacto de Varsóvia como ameaça externa – ameaça que naqueles tempos era pensada em termos de invasões convencionais ou ataques nucleares –, o México confiou na dissuasão de fato que supunha sua vizinhança com os Estados Unidos, ou, dito de outro modo, resolveu abrigar-se tacitamente, sem a mediação de acordos formais, na "sombra de proteção" daquele país (Herrera-Lasso e Tello, 2011, pp.272 e 282).

Assim, o fato de não experimentar o mesmo sentido de urgência anticomunista de muitos de seus vizinhos regionais, exerceu um duplo impacto na posição do México na OEA. Em primeiro lugar, o país viu-se em condições de defender com firmeza e consistência, no seio da organização, uma interpretação estrita ou absoluta da norma de soberania e do princípio de autodeterminação dos povos5 5 Ou seja, em contraste com uma concepção de "soberania limitada". A esse respeito, Olga Pellicer (1983, p.190) sustentava: "À primeira vista, poderia parecer que o resto das nações latino-americanas defendeu tal princípio com a mesma determinação. De fato, não o fizeram porque o advento da Guerra Fria e do medo da subversão interna, auxiliada pelo estrangeiro, puseram vários governos do hemisfério cara a cara com a necessidade de revisar as interpretações existentes. Viram-se obrigados a aceitar a tese da 'soberania limitada' e, em consequência, a justificar atos de intervenção unilateral ou coletiva". . Em segundo lugar, deu ao México a possibilidade de se concentrar no que percebia como verdadeiramente importante: as estratégias diplomáticas para defender sua autonomia política, econômica e militar diante do líder de seu próprio bloco, o poderoso vizinho norte-americano. Inclusive, se, desde os anos 1930, a hipótese de invasão ou de perda territorial ante os Estados Unidos parecia cada vez mais distante (embora não impossível), a preocupação em gerar condições que permitissem ao México tomar decisões baseadas em necessidades e objetivos próprios, sem interferências ou constrangimentos do exterior, estava mais vigente do que nunca no projeto nacionalista do PRI (Partido Revolucionário Institucional (Santa-Cruz, 2011, p.92). Nesse sentido, tanto a doutrina de política externa como a "cultura estratégica" das Forças Armadas mexicanas postulavam uma enorme "desconfiança a respeito das intenções e ações dos Estados Unidos em suas relações com o México", o que se viu refletido nas posturas que o país assumiu a respeito dos mecanismos de segurança interamericanos (Soriano, 2009, p.166).

Com efeito, o México recusou terminantemente a possibilidade de outorgar funções operativas à OEA no campo da segurança. De fato, no debate sobre os termos práticos da cooperação militar no hemisfério, México e Estados Unidos representaram as posições mais extremas. Enquanto Washington aspirava reunir sob sua liderança todas as forças armadas do continente e encarregar-se de seu aprovisionamento, o México adotava uma posição isolacionista em matéria de defesa, era refratário a todo plano de operação conjunta e inclusive opunha-se a que a OEA incorporasse em sua estrutura um corpo de assistência técnica militar, como a Junta Interamericana de Defesa ou JID (criada em 1942 para o "planejamento militar da defesa comum")6 6 Em 1946, Truman planejou, pela primeira vez, a criação de um exército único das "repúblicas americanas" aprovisionado e liderado por autoridades estadunidenses. Em 1951, os Estados Unidos levaram o tema à OEA e, com o apoio de Brasil, Paraguai, Colômbia, Cuba e Uruguai, propôs a criação de uma Força Armada Interamericana. O México, junto com Argentina e Guatemala, votou contra. Na Décima Reunião de Consulta de 1965, suscitada pela crise na República Dominicana, Washington forçou a criação de uma Força Interamericana de Paz para legalizar ex post sua presença militar na ilha. O México novamente votou contra essa resolução, junto com Chile, Equador, Uruguai e Peru. . Nessa mesma linha, o México via com grande receio o Tratado do Rio e desconfiava da aplicação do conceito de segurança coletiva no âmbito interamericano. Além de tudo, o tratado contemplava a autorização do uso da força armada num contexto regional marcado pela primazia de poder dos Estados Unidos; uma potência que, durante a Guerra Fria, demonstrou repetidamente sua disposição de intervir pela força em outros países do continente. Assim, ante os chamados à solidariedade militar hemisférica para fazer frente à ameaça comum da agressão comunista, o México respondia com o conhecido roteiro sobre a importância do princípio de não intervenção e de solução pacífica de controvérsias. E também respaldou qualquer esforço encaminhado para o desarme e a não proliferação de armas, ponto viável por carecer de uma indústria militar nacional que estimulasse o contrário.

O México encontrava-se, portanto, na paradoxal situação de tomar parte, indocilmente, de uma aliança cujo líder indiscutível entendia ser, ao mesmo tempo, a principal fonte de perigos – reais e imaginários – para seu desenvolvimento soberano. Deve-se recordar que, no México, o anticomunismo das elites competia com um antiamericanismo bem enraizado na doutrina de política externa e na cultura nacional promovida pelo regime pós-revolucionário. Como muitos nacionalismos, o nacionalismo revolucionário mexicano representou o Outro, ou o estrangeiro, como a origem de potenciais ameaças e agressões. Desse modo, nutriu "uma desconfiança das grandes potências (especialmente os Estados Unidos), acompanhada de doses variáveis de xenofobia e anti-imperialismo" (Bartra, 2007, p.212). Na reivindicação de uma série de diferenças e distâncias com o poderoso vizinho do norte, repousou em grande medida a construção identitária do México autônomo e progressista que prevaleceu durante essa etapa de estudo.

Desse modo, tanto a aguda assimetria e a situação geopolítica (enfatizadas pela lógica da Realpolitik), como os fatores político-culturais de ordem interna (sublinhados pelo construtivismo) confluem para explicar por que o México desenvolveu, diante dos Estados Unidos, uma política geral de contenção delimitada ou equilíbrio de poder suave (soft balancing)7 7 De acordo com Robert A. Pape (2005, p.10), o soft balancing consiste em ações que "não desafiam diretamente a primazia militar" das potências, mas que "usam ferramentas não militares para retardar, frustrar e debilitar" suas políticas e sua capacidade para impor preferências. . Por sua vez, o principal cenário institucional para pôr em jogo tal categoria foi precisamente a OEA8 8 A ONU ofereceu certamente outro cenário, mas o México evitou o mais possível encontrar-se na situação de contradizer os Estados Unidos no cenário estratégico global, razão pela qual, por exemplo, durante a Guerra Fria não tentou ocupar um assento não permanente no Conselho de Segurança. Pode-se pensar, ademais, que as posições do México no sistema regional – onde o número de membros é menor e o peso relativo do país é maior – eram mais visíveis e mais influentes. . A organização mostrou-se um foro adequado para: (a) demonstrar publicamente a independência de critério do México, assim como seu frequente dissenso ante as políticas agressivas dos Estados Unidos, questão útil não só do ponto de vista de não abonar a legitimação política da dominação estadunidense, mas também para cultivar a legitimidade interna do PRI diante de certos setores da sociedade mexicana; (b) aproveitar as regras e os mecanismos da organização para dificultar ou, na medida do possível, frustrar alguns dos objetivos de Washington; isso mediante o uso de abstenções, votos negativos, apresentação de emendas aos projetos resolutivos ou tratados e declarações que o México exigia anexar às atas finais das Reuniões de Consulta ou outros foros, com o objetivo de evitar qualquer ambiguidade ou espaço de interpretação da posição mexicana; (c) questionar a interpretação que os Estados Unidos propunham das normas reconhecidas pela OEA e sua ordem de preeminência.

A falta de sintonia com a OEA, durante os anos da Guerra Fria, traduziu-se numa posição mais defensiva que propositiva9 9 Tanto assim que, nos anos 1960, Pellicer (1965-66, p.294) escrevia: "Os únicos objetivos da política mexicana (se é que a isto se pode chamar política) têm sido permanecer à margem das atividades do organismo regional e manter por razões de tradição e prestígio uma oposição que não comprometa demais o governo mexicano". . Do ponto de vista do México, a OEA não demonstrava ter nenhum grau de autonomia perante Washington, não tendo sentido apostar em seu fortalecimento ou desenvolvimento institucional. O México não se mostrou interessado em aumentar as faculdades ou expandir os âmbitos temáticos da organização. Nesses quarenta anos, não se propôs como país anfitrião de conferências especiais, nem postulou candidatos para ocupar a Secretaria Geral; nunca foi sede de alguma Reunião de Consulta de Ministros das Relações Exteriores; e a única vez que a convocou como órgão de consulta do TIAR, foi precisamente para desativar os efeitos do tratado no caso cubano. Finalmente, nos anos 1980, o México liderou algumas iniciativas multilaterais de composição claramente latino-americana – como Contadora e o Grupo do Rio – que tinham o propósito de substituir a OEA na gestão de assuntos relativos a paz e segurança regionais; sendo esta a missão central da organização até aquele momento. Pode-se ler nessas iniciativas uma segunda intenção de arrastar a OEA para a irrelevância. E, com efeito, até o final da Guerra Fria, a OEA era uma instituição desgastada e desprestigiada. Até os próprios Estados Unidos haviam se distanciado da organização, à qual recorriam cada vez menos como via para relacionar-se coletivamente com os países latino-americanos, tendo inclusive cortado seus aportes financeiros (Tokatlián, 1984). Os anos 1990, no entanto, seriam o início de uma nova etapa.

Década de 1990: o medo e a confiança

Com o fim da Guerra Fria, a OEA experimentou uma espécie de ressurreição que foi, por sua vez, o reflexo de um período de maiores concordâncias nas relações interamericanas. Por um lado, a maior parte das chancelarias latino-americanas revisaram suas estratégias de vinculação com Washington, para se adaptar ao que se perfilava como uma hegemonia global com poucos contrapesos. O México entrou na rota do TLCAN e de uma crescente institucionalização da relação bilateral. Por outro lado, a maior convergência latino-americana com os Estados Unidos teve também como raiz fatores internos, como as transições democráticas, a adoção do modelo de desenvolvimento neoliberal e o fato de que, por quase todos os lados, tenha chegado ao poder uma elite latino-americana pró-estadunidense. Nesse contexto, os governos de Bush e Clinton se propuseram a relançar as relações interamericanas mediante o processo de Cúpulas das Américas e o projeto da Área de Livre Comércio das Américas (Alca). No marco da OEA, propriamente inverteu-se o desenvolvimento institucional em duas áreas: a proteção internacional da democracia e a reconfiguração da base de segurança hemisférica. Diferente da maioria dos países latino-americanos, o México recusou por completo o primeiro tema e mostrou pouco entusiasmo pelo segundo.

Com efeito, os Estados Unidos exerceram uma intensa liderança para reativar a OEA como ponto de referência da cooperação multilateral em termos de segurança (Herz, 2011, p.39). Criou-se, em 1991, a Comissão Especial de Segurança Hemisférica para iniciar o processo de revisão tanto da parte conceitual como da parte operativa da cooperação interamericana nesse campo. A luta anticomunista, como ideia principal da doutrina de segurança nacional que Washington havia promovido, estava então totalmente superada e, no entanto, não existia uma alternativa clara ou imediata para a sua substituição. Na realidade, a década de 1990 caracterizou-se pelo desenvolvimento de um debate regional que tinha como objetivo chegar a uma nova noção de segurança hemisférica, definindo os princípios, a natureza das ameaças comuns e os mecanismos específicos para fazer-lhes frente. Para o México, esse processo de redefinição do papel da OEA em matéria de segurança incorporava sérios riscos e poderia tomar direções indesejáveis. O país entrou nesse debate com enorme cautela.

Os dirigentes mexicanos viram problemas desde o ponto de partida, ou seja, desde o nível dos princípios e das cadeias conceituais, que começaram a ser propostas: a segurança internacional vinculou-se com a expansão da democracia representativa e com o respeito aos direitos humanos. Era a ideia liberal kantiana da "paz democrática", posta em voga durante o governo de William Clinton. Esta suporia que, novamente, certos traços do sistema político (ontem o anticomunismo, hoje as eleições democráticas) seriam usados para relativizar, ou limitar, o direito ao exercício da soberania dos Estados no continente. Para os diplomatas mexicanos, isso equivalia a, como no passado, abrir as portas para a manipulação hegemônica e a legitimação da intervenção externa (multilateral ou não) em nome da paz e da segurança hemisférica. E também a exemplo de tempos pretéritos, a representação do México na OEA combateu essa visão e insistiu que:

O cumprimento irrestrito dos tratados vigentes, o compromisso expresso de não usar ou ameaçar com o uso da força, em pleno respeito à soberania dos Estados, a não intervenção nos assuntos internos ou externos dos Estados e a solução pacífica das controvérsias são o ponto de partida de qualquer medida de fomento da confiança e da segurança (Conferencia Regional sobre Medidas de Fomento da Confianza y de la Seguridad, 1995, p.2)10 10 O México, ademais, voltou a tocar ocasionalmente o tema da reincorporação de Cuba à OEA como uma forma de reivindicar na organização o princípio de autodeterminação dos povos. Em 1998, por exemplo, o embaixador mexicano na OEA manifestou que o México rechaçava a exclusão de qualquer estado dos foros internacionais e a imposição de condições para sua participação neles. Disse que o México apoiava "o afiançamento da democracia como instituição básica do sistema interamericano" mas "não compartilha posições que, sob o pretexto de preservar esse regime, intervém nos assuntos internos de outros Estados e violam, em consequência, o direito de autodeterminação dos povos" ("Piden que Cuba se reintegre a OEA", 1998). .

Diante da inexistência de um inimigo extrarregional, começou a se conformar na OEA uma nova agenda de ameaças constituída por fenômenos de índole transnacional, como o narcotráfico, a lavagem de dinheiro, o tráfico de armas e até os desastres naturais. Ou seja, as ameaças não convencionais, provenientes de atores não estatais, começaram a ganhar centralidade e, nessa medida, as discussões na OEA passaram a ser mais relevantes para o México. Diferentemente da cooperação em matéria militar, vários desses assuntos eram de interesse direto e imediato para o país, razão pela qual a OEA começou a perfilar-se como uma organização que, ao menos sob esse ponto de vista, podia prestar ao México serviços apreciáveis.

O caso do narcotráfico é emblemático nesse sentido. Na década de 1990, o combate à produção e ao trânsito de drogas já se tinha revelado como um desafio grave para o Estado mexicano e como um problema que introduzia o máximo de tensão na relação com o novo sócio comercial, os Estados Unidos. A OEA, sobretudo mediante a Comissão Interamericana para o Controle do Abuso de Drogas (Cicad), deu ao México a oportunidade de envolver Washington numa discussão permanente sobre os diferentes aspectos do fenômeno das drogas, incluindo o lado da dependência e da demanda. Assim, o México estimulou a criação de um Mecanismo de Avaliação Multilateral (MEM), cujo objetivo era monitorar os esforços realizados por todos os países membros da OEA nesse campo. O MEM foi adotado em 1999 e, posteriormente, serviu para que o Congresso dos Estados Unidos pusesse fim ao chamado "processo de certificação" unilateral, que dava tantas dores de cabeça aos governantes mexicanos. Ou seja, a gestão desse espinhoso assunto perante a OEA permitiu diminuir a pressão na relação bilateral.

Decerto, as ameaças convencionais e os assuntos de defesa não desapareceram do mapa e essa foi uma área de preocupação crítica para o México. Ao mesmo tempo, os Estados Unidos aceitaram transitar para um enfoque mais pactuado na matéria, porque já não havia a preocupação de que os países latino-americanos – sempre considerados frágeis e dependentes – pudessem ser manipulados por alguma potência rival extrarregional em detrimento de sua segurança. Vários especialistas assinalam que se foi forjando na OEA uma mudança de paradigma, que se distanciaria da ideia de segurança coletiva para dar lugar a uma noção de segurança cooperativa11 11 Michelena (1995, p.10) explica que "a segurança cooperativa é a segurança baseada no princípio de prevenir a guerra evitando o desenvolvimento dos instrumentos e meios de agressão. Nesse sentido, evita o desenvolvimento da contra-preparação que os EUA devem fazer no contexto do balanço de poder e promove os meios para evitar que as ameaças surjam, tornando a preparação para a agressão mais difícil". . Mónica Herz (2011, p.41) explica que a mudança conceitual consistiu em diminuir a importância da dissuasão e do castigo aos agressores para sublinhar, em troca, a prevenção dos conflitos interestatais, mediante a promoção de Medidas de Fomento da Confiança e Segurança (MFCS), assim como promover a transparência nas políticas de defesa. Nos anos 1990, sem dúvida avançou-se na adoção e no cumprimento de uma série de MFCS acordadas no foro hemisférico.

O México, de imediato, podia ver com bons olhos a agenda da segurança cooperativa já que esta, no lugar de se preocupar em regular o uso coletivo da força, concentrava-se em desativar essa eventualidade, mitigando o dilema da segurança e da consequente corrida armamentista entre os membros da comunidade regional. Tudo isso se ajustava muito melhor à limitada capacidade militar do México e à sua histórica doutrina sobre a solução pacífica de controvérsias. No entanto, a chancelaria mexicana preocupou-se com a interpretação e a aplicação prática desses conceitos. Por exemplo, um dos assuntos que mais inquietava era a possibilidade de as MFCS converterem-se em uma desculpa para propiciar a criação de órgãos militares na OEA ou para concretizar o antigo projeto estadunidense de instituir uma força militar interamericana12 12 Em 1995, por exemplo, a embaixadora Moreno disse: "O México sempre se opôs e continuará opondo-se ao estabelecimento de uma força multinacional de caráter militar na OEA para enfrentar supostas novas ameaças. Também recusaremos qualquer tentativa de desnaturar o conteúdo da Carta da OEA ou de eliminar o caráter voluntário da participação dos exércitos nas operações de manutenção da paz" (Conferencia Regional sobre Medidas de Fomento de la Confianza y de la Seguridad, 1995, p.2). Como explica Soriano (2009, p.166): "A ideia de tropas mexicanas subordinadas a um mando estadunidense [foi] inaceitável na cultura estratégica dos militares mexicanos". .

O receio mexicano era justificado. Em primeiro lugar, a mais recente intervenção militar estadunidense na área havia ocorrido em 1989, com a invasão do Panamá, e Washington uma vez mais havia tentado legitimá-la – sem muito êxito – perante a OEA. Em segundo lugar, no processo de revisão da arquitetura da segurança hemisférica, os Estados Unidos encabeçavam um grupo de países que não aceitava desmantelar o velho mecanismo da segurança coletiva representado pelo Tratado do Rio, mas defendia, pelo contrário, a necessidade de revitalizá-lo13 13 Na Comissão de Segurança Hemisférica em 1999, por exemplo, os Estados Unidos propuseram que: "Para complementar e apoiar esses avanços na cooperação hemisférica, o sistema interamericano requer mecanismos revitalizados de segurança coletiva. Esses mecanismos deverão fortalecer os compromissos que já existem em matéria de segurança coletiva e facilitar respostas multilaterais a questões de segurança comum" (Comisión de Seguridad Hemisférica, 2000b). . Insistiam também em dar um novo protagonismo à Junta Interamericana de Defesa, integrando-a oficialmente como entidade da OEA. Assim, desse ponto de vista, a suposta transição para o paradigma da segurança cooperativa ficava, no melhor dos casos, incompleta. Em terceiro lugar, Washington forçou a participação das forças armadas em todo esse debate por meio da criação de um foro de diálogo intergovernamental paralelo, não vinculado legalmente à OEA (nem tampouco a suas regras): a Conferência dos Ministros de Defesa das Américas14 14 O México decidiu participar apenas como observador. Incorporou-se como membro pleno na V Conferência realizada em Santiago do Chile, em 2002. .

A representação mexicana na OEA resistiu o quanto pôde a essas iniciativas e recorreu às já conhecidas táticas da diplomacia parlamentar para obstruí-las, diluí-las ou adiá-las. O México postulou a presidência da Comissão de Segurança Hemisférica em 1996-1997, na qual se promoveu com grande energia a negociação da Cifta (veja-se adiante), favorecendo um enfoque muito lento e gradual às discussões relativas à defesa. Até o final da década, opôs-se consistentemente à celebração de uma Conferência Especial sobre Segurança, mesmo depois que isso foi acordado na Cúpula das Américas, realizada no Chile em 1998. Também resistiu à criação de um grupo de trabalho com o mandato de formular termos de referência para o funcionamento da JID, assim como à celebração de uma terceira conferência sobre medidas de fomento da confiança (Comisión de Seguridad Hemisférica, 2000b). Expressou ainda abertamente que o Tratado do Rio era já "inadequado e anacrônico", dando a entender que devia desaparecer. Não iniciou procedimentos para ratificar a Convenção Interamericana sobre Transparência nas Aquisições de Armas Convencionais (CITAAC) – ainda que esta estivesse alinhada com a clássica posição mexicana a favor do controle de armamentos – para expressar que os Estados Unidos não adotavam medidas para fazer sua parte15 15 O Senado mexicano ratificou a CITAAC onze anos depois, em setembro de 2010. Como explicou oportunamente Rosario Green, que foi chanceler entre 1997-2000: "A CITAAC, assinada em 1999, não foi ratificada pelo Senado [mexicano] [...] uma vez que os principais produtores de arma na América Latina, que certamente não somos nós, mostravam-se indiferentes ante a esta convenção tão importante" (Senado de la República, LXII Legislatura, 2010, s/p). .

Mesmo que a década tenha terminado sem nenhum acordo sobre a atualização ou derrogação do TIAR, na OEA abriu-se uma rota paralela para avançar na cooperação regional em temas concretos da nova e da velha agenda de segurança. Esta consistiu na adoção de uma nova geração de tratados interamericanos com a característica de enfocar assuntos concretos, como o tráfico e a aquisição de armas ou a luta contra o terrorismo. Os governantes mexicanos sentiram-se confortáveis com o enfoque de gerar regimes setoriais baseados em convenções que: (a) são de caráter técnico (em vez de político); (b) contemplam uma cooperação intergovernamental fundada na premissa do respeito à soberania – cada Estado faz sua parte dentro de seu território por meio de suas próprias instituições e autoridades nacionais.

O México, por exemplo, propôs e liderou o grupo de trabalho que redigiu a Convenção Interamericana contra a Fabricação e o Tráfico Ilícito de Armas de Fogo, Munições, Explosivos e outros Materiais Relacionados (Cifta), adotada em 1997. Como vizinho do maior e mais liberal mercado de armas do mundo, nos anos 1990, também cresceu a preocupação com esse fenômeno, que alimentava o narcotráfico e muitos outros tipos de violência criminosa. O fato de a OEA ter acolhido de bom grado a iniciativa mexicana – colocada originariamente no seio do Grupo do Rio – e de os Estados Unidos, nesse momento, se mostrarem dispostos a assinar a Convenção, foi um tipo de reivindicação da utilidade que a organização poderia ganhar para o país16 16 O governo de Clinton assinou a Cifta em novembro de 1997 e a submeteu ao Senado para sua ratificação em novembro de 1998; no entanto, o processo legislativo não avançou. . Pela primeira vez na história, um presidente do México apresentou-se ante a Assembleia Geral da OEA para participar como testemunha qualificada na cerimônia de adoção da Convenção.

Em suma, durante os anos 1990, a relação México-Estados Unidos experimentou uma inclinação qualitativa caracterizada por maior disposição à cooperação, mas com uma série de limites políticos e, sobretudo, estratégicos. Preocupada em manter a salvo as margens de ação política autônoma que se foram estreitando a partir da entrada em vigor do TLCAN, a chancelaria recorreu, como no passado, aos foros multilaterais, como a OEA e a ONU, para gerar alguns contrapesos políticos à ação internacional estadunidense. Isso foi especialmente relevante no âmbito das definições conceituais e da geração de normas relativas à segurança hemisférica. Dado que, na era Clinton, Washington tendeu a desdobrar uma hegemonia cooperativa, a possibilidade de vincular os Estados Unidos, mediante uma nova geração de tratados internacionais interamericanos, perfilou-se como uma aposta razoável. Também contribuiu para isso o fato de que a organização incrementara seu perfil técnico e começara a ocupar-se da cooperação multilateral em assuntos de segurança de interesse imediato para o Estado mexicano, como o tráfico de narcóticos e de armas.

Século XXI: uma organização relevante

O sexênio de Vicente Fox (2000-2006)

Os ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001 significaram uma mudança de época para as relações interamericanas. A segurança voltou a ocupar o primeiro lugar entre as prioridades da política externa estadunidense e a nova Estratégia de Segurança Nacional, de 2002, oficializou a doutrina da "guerra preventiva", assim como a intenção de Washington de atuar unilateralmente cada vez que achar necessário. A América Latina foi marginalizada no panorama estratégico dos neoconservadores, e, portanto, deu-se pouca importância às instituições interamericanas. Ademais, no começo do século, a região latino-americana viveu o chamado "giro à esquerda", a ascensão ao poder de forças políticas que, em graus variáveis, questionaram a ortodoxia do Consenso de Washington, devolveram centralidade ao Estado nas tarefas de desenvolvimento e, em alguns casos, questionaram também a definição hemisférica da democracia representativa liberal. Além disso, diante da deriva imperialista da política exterior estadunidense, reviveu-se o tradicional antiamericanismo entre as populações latino-americanas. A harmonia dos anos 1990 ficou para trás e os Estados Unidos começaram a encontrar resistências cada vez maiores e mais abertas ao seu papel de líder hemisférico, sobretudo na América do Sul. As dinâmicas na OEA refletiram, decerto, esse estado de coisas decisivo. Em contraste com sua antiga estratégia de resistência, o México foi se colocando cada vez mais ao lado dos países próximos da organização continental e dispostos a investir recursos e capital político para impulsionar seu desenvolvimento. Como se explica essa transformação?

Em 2000, o novo governo do PAN (Partido da Ação Nacional) propôs abertamente que seu principal projeto de política externa seria aprofundar os laços políticos e econômicos com os Estados Unidos. No marco da estratégia de alinhamento geral (ou bandwagoning), os contrapesos não seriam estabelecidos pela vinculação com outros países, mas por uma participação protagonista nos organismos multilaterais: o México tentaria incidir mais nas "regras do jogo" internacional e, supostamente, isso ampliaria suas margens de negociação com Washington para tratar de assuntos no plano bilateral (Castañeda, 2001). Em todo caso, adotou-se, na OEA, uma atitude que pretendia ser mais propositiva. Foi precisamente nos debates sobre a arquitetura de segurança do hemisfério que o governo do México tomou a iniciativa. Numa importante mudança de direção, no dia 7 de setembro de 2001, o presidente Fox visitou o Conselho Permanente da OEA em Washington para anunciar pessoalmente a intenção do México de separar-se do TIAR. Pretendia com isso sublinhar a obsolescência do tratado e impulsionar a definição de novos critérios em matéria de segurança no continente americano. Ademais, o presidente propôs que o México sediasse a Conferência Especial sobre Segurança, que até então havia recusado.

Apenas quatro dias depois, ocorreu o ataque às Torres Gêmeas. A consequente reação do governo de George W. Bush tornaria não só importante, mas prioritário para o México o avanço das negociações sobre segurança na OEA. A declarada disposição desse governo para a ação unilateral, assim como os conceitos de "guerra preventiva" e "guerra global contra o terrorismo", ativaram antigos recursos defensivos em boa parte do governo e da sociedade mexicana. A despeito da opinião do então chanceler, tudo isso fez reviver a ideia de manter limites na associação política com o vizinho do norte, sobretudo na agenda da paz e segurança internacionais.

Enquanto no plano bilateral, respondeu-se cabalmente às pressões de Washington para incrementar a segurança da fronteira, os organismos multilaterais converteram-se, com efeito, em foros para a adoção de posições de equilíbrio de poder em matéria estratégica. Assim, o México decretou sua saída do TIAR em setembro de 2002, negou-se a autorizar a guerra contra o Iraque no Conselho de Segurança da ONU, no início de 2003, e, na OEA, seguiu adiante com a batalha normativa (em companhia de vários outros governos latino-americanos com que tinha convergências)17 17 Num foro sobre a Declaração sobre Segurança nas Américas, o embaixador Ruíz Cabañas (2003) explicou por que o México havia tomado a iniciativa nesse tema: "Seguindo a tradição jurídica da diplomacia mexicana, há uma lição de dois séculos aprendida da vizinhança com os Estados Unidos: quando há um vazio, gere normas; quando não estão suficientemente claras as normas, trate de dar-lhes publicidade, tente promover a defesa do sistema multilateral. [...] pelo menos desde 1945 até a data presente esta é uma posição a que meu país tem servido". . Tudo isso terminou por esfriar o vínculo bilateral com a administração Bush – deixando-se de falar de "relação especial –, mas, nessa medida, cresceu também o atrativo de envolver-se mais com a organização regional em que os Estados Unidos estavam representados. A maioria dos países da América do Sul fizeram justamente o contrário, ou seja, foram se distanciando da OEA e ensaiaram respostas defensivas ou contra-hegemônicas, como a criação da Alba e da Unasul (Tussie, 2011, p.3). Preso às cada vez mais densas redes de interdependência econômica e social dos Estados Unidos, no início do século XXI, o México dificilmente teria podido seguir um curso similar.

Como havia prometido o presidente Fox, o México candidatou-se para exercer pela segunda vez a presidência da Comissão de Segurança Hemisférica (2002-2003) e de lá preparou a Conferência Especial sobre Segurança. Encabeçou também a negociação da Convenção Interamericana contra o Terrorismo (CIT). Os trabalhos da Conferência avançaram com muita dificuldade e, nesse marco, a diplomacia mexicana – como muitas outras chancelarias latino-americanas – quis evitar ao menos duas situações. A primeira era de que a agenda hemisférica ficasse dominada unicamente pelas preocupações de segurança estadunidenses, como sucedeu em 1945-1948. A segunda era de que a "guerra global contra o terrorismo" fosse uma nova desculpa para militarizar as estruturas de segurança da OEA, assim como para reviver o TIAR e/ou o conceito de segurança coletiva. Se foi possível alcançar o primeiro ponto, as preferências dos Estados Unidos tenderam a prevalecer no segundo caso.

A Declaração sobre Segurança nas Américas estabeleceu finalmente os princípios e o novo conceito de segurança que a região subscreveria no século XXI (OEA, 2003). À diferença de etapas anteriores, o Estado mexicano mostrou-se satisfeito com todos esses elementos conceituais. O México concordava agora com a visão da OEA em matéria de segurança em, ao menos, três sentidos importantes. Primeiro, em termos dos "valores democráticos", subscritos como base da concepção de segurança do hemisfério. Com efeito, a direção do PAN rompeu com a postura histórica de recusar a existência de um nexo entre as características do sistema político dos Estados e a segurança internacional. Em troca, abraçou o fato de que a democracia representativa e o respeito aos direitos humanos fossem reconhecidos como uma "condição indispensável" para a paz.

Em segundo lugar, o governo do México deu aval à adoção do conceito de "segurança multidimensional", aproximando-se da ideia de "segurança integral" que o país propunha e que transcendia a perspectiva exclusiva da defesa militar (Benítez Manaut, 2003, p.56). Ficava assim reconhecida a existência de ameaças tradicionais e não tradicionais. Nessas últimas, incluíam-se aspectos políticos, econômicos, sociais, de saúde e ambientais, entre os quais se encontravam muitos dos assuntos que realmente preocupavam o México e nos quais a cooperação intergovernamental poderia ser útil.

Em terceiro lugar, não se estabeleceu uma hierarquia entre as ameaças, mas se reconheceu o direito soberano de cada Estado para identificar suas prioridades nacionais e definir as ações para fazer-lhes frente "conforme seu ordenamento jurídico e com pleno respeito ao direito internacional e às normas da Carta da OEA". Com isso, procurava-se evitar que Washington impusesse suas prioridades e que o terrorismo passasse a ser o substituto do anticomunismo no século XXI.

Decerto, nem tudo correspondeu às expectativas mexicanas e Washington obteve o que realmente lhe interessava: a declaração legitimou a permanência do Tratado do Rio e da Conferência dos Ministros de Defesa das Américas, assim como o reposicionamento da JID. Durante os anos seguintes, a representação do México seguiria fazendo gestões na OEA para limitar o papel de todas essas instâncias, ainda que com menor veemência. A renúncia das Forças Armadas mexicanas à cooperação militar e sua recusa total aos exercícios combinados de defesa ou às operações conjuntas, tanto no âmbito bilateral como multilateral, mantiveram-se como o último bastião de distância dos Estados Unidos18 18 Em 2004, o general Vega, Secretário de Defesa Nacional (Sedena), explicou diante do Congresso que por nenhuma razão o México tomaria parte do Comando Norte: "Definitivamente nem sonhar, nem pensar; nós não vamos colocar de modo algum as tropas mexicanas sob o comando de um general americano. Jamais" (citado em Soriano, 2009, p.166). . Não obstante, nos demais títulos de cooperação em matéria de segurança, rompeu-se uma série de tabus. Replicar esse espírito no âmbito regional da OEA foi natural, já que, na organização, a agenda de ameaças transnacionais (terrorismo, drogas, lavagem de dinheiro etc.) seguiu se desenvolvendo e a organização foi multiplicando seus mandatos nesse campo.

Ao finalizar o sexênio foxista, o México havia rearticulado quase por completo sua posição na OEA. Exceto por certas questões de defesa, o país se mostrava em sintonia com a agenda desenvolvida em todos os pilares temáticos da organização e da Cúpula das Américas. Concordava com o novo conceito de segurança multidimensional, estava a favor do fortalecimento do sistema interamericano de direitos humanos, do ulterior aperfeiçoamento do sistema de proteção hemisférica da democracia e da concreção de uma área de livre-comércio continental. Resta assinalar a convergência que isso supunha com o espírito (ainda que não necessariamente nos detalhes) das posições estadunidenses em todos esses âmbitos. Como sinal dos tempos, o México postulou pela primeira vez na História um candidato – seu próprio chanceler – para ocupar o cargo de Secretário Geral da organização. E também como sinal da cambiante correlação de forças na OEA, apesar de contar com o respaldo dos Estados Unidos, a candidatura mexicana fracassou.

O sexênio de Felipe Calderón (2006-2012)

O presidente Felipe Calderón confirmou com acréscimo a disposição favorável do México em relação à OEA e a transformou num ativismo sem precedentes, precisamente no âmbito da segurança multidimensional. O impulso foi a declaração de "guerra contra o narcotráfico", que acabou consumindo toda a atenção e o capital político de seu governo. O país experimentou uma escalada de violência que alcançou níveis críticos: mais de 60 mil mortos, dezenas de milhares de desalojados internos e múltiplas violações dos direitos humanos. Isso teve ao menos duas consequências importantes em matéria de política exterior.

A primeira é que a chancelaria recebeu a instrução de abrir vias de cooperação nos foros multilaterais e gerir todos os apoios internacionais disponíveis para fazer combater o que, de imediato, converteu-se numa aguda crise social. Isso se inscreveu no marco da Estratégia Nacional de Segurança, cujo quinto componente foi "Fortalecer a cooperação internacional". A segunda é que novamente propiciou-se, na relação com Washington, uma concentração obsessiva em assuntos de segurança, desta vez induzida pelo México19 19 Como dizem Blackmore e Pellicer (2011, p.51): os problemas de segurança no México "são o eixo em torno do qual tem girado a política do presidente Calderón e em torno do qual se está construindo uma etapa nova nas relações México-Estados Unidos [...] o aspecto que sobressai é a maior aproximação dos setores de ambos os países encarregados da segurança, em particular os comandos militares e os responsáveis pelos problemas de inteligência". . O governo adotou uma estratégia que militarizou a luta antinarcóticos e insistiu no princípio de corresponsabilidade e na necessidade de que os Estados Unidos se aplicassem mais para realizar sua parte. A soma desses dois elementos resultou em um máximo grau de colaboração entre as Forças Armadas na história da relação bilateral20 20 Em 2012, o general Charles Jacoby, chefe do Comando Norte, declarou diante do Congresso estadunidense que a relação militar entre Estados Unidos e México havia avançado a "níveis sem precedentes de coordenação" e os dois países se haviam convertido em "sócios estratégicos" com pleno respeito à soberania de cada um ("EUA y México planeam iniciar ejercicios militares conjuntos", 2012). Ver também a revista Ágora, financiada pelo Comando Norte e dedicada à celebração da crescente cooperação militar bilateral (Anderson, 2012). . De modo eloquente, em 2012, abriu-se uma barreira simbólica ao se realizar, pela primeira vez, um exercício militar conjunto entre o Comando Norte e a Sedena, assim como a primeira reunião trilateral de Ministros de Defesa Norte-Americanos21 21 Tratou-se de um exercício de simulacro, chamado Ardent Sentry 12, para o apoio de defesa a civis no caso de desastres naturais. . Tudo isso teve reflexo nas posições do México na OEA.

Por um lado, a crescente disposição das Forças Armadas mexicanas de romper com sua doutrina de defesa isolacionista na relação bilateral com os Estados Unidos foi reduzindo suas razões para se manterem distantes desses temas no marco da organização regional. Ademais, o México ficou sem argumentos para recusar o envolvimento de instâncias militares nos trabalhos das entidades de segurança, como o Comitê Interamericano Contra o Terrorismo (Cicte) e a Cicad. Por outro lado, o governo do México percebeu que a OEA poderia se converter num organismo cada vez mais útil para atender à dimensão internacional dos problemas de insegurança do país. Entre 2006 e 2012, a representação do México realizou um grande esforço para estimular o desenvolvimento institucional do pilar da segurança multidimensional: dedicou-se a patrocinar resoluções, impulsionou novos mecanismos, ofereceu-se como sede de numerosas reuniões22 22 Entre as quais se destacam Mispa I (2008) e a Reunião Hemisférica de Alto Nível contra a Delinquência Organizada Transnacional (2012). Ambas foram inauguradas pelo presidente Calderón, pessoalmente interessado nesse tema. e liderou politicamente os assuntos relacionados com a segurança pública.

Em suma, o México buscou primeiro posições de liderança que lhe dessem "poder de agenda". Foi eleito presidente da Comissão de Segurança Hemisférica pela terceira vez e daí promoveu a agenda de combate ao crime organizado transnacional23 23 O México é o único país até agora que ocupou tal cargo em três ocasiões: 1996-1997, 2002-2003, 2008-2009. O Chile, que desde os anos 1990 liderou entre os países latino-americanos a agenda de segurança na OEA, presidiu-a em duas ocasiões. Brasil e Argentina apenas em uma. . Esteve por dois períodos à frente da Secretaria Pro Tempore do Comitê Consultivo sobre Tráfico de Armas, do Cifta, para impulsionar a elaboração de legislação nessa matéria. Ocupou a presidência e a vice-presidência do Cicte, enfatizando sua agenda tradicional: a necessidade de fortalecer os controles fronteiriços para evitar o fluxo ilícito de dinheiro e de armas (Alcántara Soria, 2009).

Ao mesmo tempo, incentivou a criação de novas entidades, entre as quais duas se destacam: a Reunião de Ministros em Matéria de Segurança Pública (Mispa), órgão encarregado de discutir as políticas para prevenir e combater a delinquência organizada, e o Esquema Hemisférico de Cooperação contra a Delinquência Organizada Transnacional. Este último propôs estabelecer, pela primeira vez, no marco do sistema interamericano, uma instância de caráter operativo em assuntos de segurança – o Centro Coordenador das Américas –, que permitiria a articulação no terreno das ações de inteligência e de processo penal entre os países-membros24 24 O Centro teria sua sede no México e o primeiro(a) coordenador(a) seria mexicano(a). Apesar de ter sido criado de acordo com um mandato da Cúpula das Américas e com a assistência da Secretaria Geral, não seria em sentido estrito uma entidade da OEA, já que nem todos os países-membros teriam aceitado participar. . Dada a novidade e a complexidade que supõe esse tipo de cooperação prática, o futuro do Centro Coordenador deve ser objeto de cautela; no entanto, o simples fato de o México ter sido o artífice dessa proposta – apoiada por países como Chile, Guatemala e Colômbia – apontaria uma mudança na concepção da classe dirigente sobre o exercício da soberania em matéria de segurança nos organismos multilaterais. Deve-se assinalar, além disso, que essa iniciativa foi tendencialmente contrária à histórica recusa mexicana de militarização do regime interamericano, dado que, tanto no México como em outros países da região, a linha divisória entre as tarefas das polícias e das Forças Armadas no combate ao crime organizado é cada vez menos clara.

Ante tão prolífica atividade, que vantagens obteve o governo do México para seguir esse curso de ação na OEA? A mais óbvia deriva da natureza includente de sua participação. A OEA aporta um campo de negociação adicional com os Estados Unidos, país sem o qual resulta impossível articular respostas eficazes aos problemas mais graves de segurança pública enfrentados pelo México, que estão relacionados à sua extensa fronteira norte. Para enfrentar essas questões, o país necessita de foros que incluam, não que excluam seu vizinho. Mesmo que o México e os Estados Unidos sustentem mecanismos de cooperação bilateral (como a Iniciativa Mérida) e sub-regional (como a Aspan – Aliança para a Segurança e a Prosperidade da América do Norte), a OEA supõe um terceiro nível de coordenação intergovernamental que permite ampliar o alcance geográfico, diversificar as visões políticas e incorporar mais atores. Isso é importante para o México não apenas em termos de eficácia – as redes de droga, armas, lavagem de dinheiro e tráfico de pessoas chegam hoje até a Terra do Fogo25 25 Na inauguração do Mispa I, por exemplo, o presidente Calderón (2008, p.4) disse: "Para o México é o momento para que a Iniciativa Mérida abra caminho para uma nova etapa na guerra contra o crime organizado transnacional. É importante que iniciativas como essas se transfiram também para o nível continental, porque é continental o problema da criminalidade e da delinquência organizada". Em particular, propôs que os países latino-americanos se somassem a uma base de dados sobre a criminalidade semelhante à Plataforma México. – mas também pela possibilidade de somar o apoio político de outros países às posições que o México sustenta perante Washington. Numa relação bilateral assimétrica, geralmente convém à parte mais frágil multilateralizar os assuntos que provocam tensão ou dissenso. Foi este o caso da já mencionada substituição do processo unilateral de certificação do combate ao narcotráfico pelo Mecanismo de Avaliação Multilateral do Cicad. Constitui outro exemplo a iniciativa pela qual, em 2012, o México uniu-se à Colômbia e à Guatemala para pedir à OEA e à ONU uma avaliação da estratégia punitiva de combate às drogas ou, em outras palavras, para planejar um debate sobre sua possível despenalização26 26 A questão foi introduzida na VI Cúpula das Américas celebrada na Colômbia em abril de 2012 e depois nas sessões da 67ª Assembleia Geral da ONU em outubro desse ano (Langner, 2012). . A mesma lógica funciona no caso do tráfico ilícito de armas: com exceção dos Estados Unidos, Canadá e Jamaica, todos os demais membros da OEA já ratificaram o Cifta, o que deu argumentos ao governo do México para requerer que o vizinho também o faça27 27 Algo que Calderón pediu a Obama desde sua primeira visita ao México, em abril de 2009, e foi tema central no discurso que pronunciou diante do Congresso dos Estados Unidos em 2010. .

Outra vantagem é que, como organização internacional, a OEA propicia não só o diálogo político e a produção normativa como também, intermediada por sua Secretaria Geral, tem a capacidade de prover assistência técnica aos Estados. Nesse sentido, pode ser uma fonte de insumos úteis para a formulação de políticas públicas em matéria de segurança interna. Sua burocracia solicita informação entre os membros e produz estatísticas regionais, estudos comparativos e estratégias de ação; relaciona-se, além disso, com uma rede continental de centros de investigação e ONGs, que aportam seus conhecimentos especializados. Também divulga boas práticas, monta programas de capacitação a funcionários públicos (policiais e juízes), desenha leis e organiza mecanismos de avaliação. Ainda que há tempo atravesse uma crise financeira, a Secretaria Geral da OEA conta com orçamento, infraestrutura física e humana e capacidade para executar mandatos concretos que não são comparáveis com as secretarias dos outros esquemas multilaterais de participação ampla que contam com o México (Celac e Cúpula Ibero-americana). Esses são os ativos próprios de uma organização que, por um lado, tem mais de seis décadas de existência e, por outro, recebeu respaldo financeiro de uma superpotência. Em todo caso, diante da desesperada situação em matéria de segurança, parece que o governo de Calderón viu na OEA um organismo multilateral capaz de produzir e operar respostas mais concretas para combater as atividades do crime organizado.

Finalmente, do ponto de vista geopolítico, com a evolução da estrutura de poder internacional, no século XXI, fica cada vez mais claro que o Departamento de Estado já não pode entender a organização hemisférica como um instrumento que manipula a seu bel prazer. No último quinquênio, por exemplo, a OEA tomou várias decisões que, promovidas pelos países latino-americanos, não se ajustam aos interesses de Washington e, ao que parece, os Estados Unidos aceitaram com o propósito de manter a salvo a organização28 28 Entre as quais se encontra a anulação da resolução que suspendeu Cuba em 1962, a suspensão de Honduras depois do golpe de Estado em 2009, a resolução que deu respaldo ao Equador em sua querela com o Reino Unido pelo asilo diplomático dado a Julian Assange em 2012. .

Considerações finais

No transcurso dos 65 anos de fundação da OEA, o México transitou entre vê-la como um foro para conter os Estados Unidos e percebê-la como um espaço para melhorar a coordenação interestatal na solução de problemas compartilhados. Nos dois casos, o Estado mexicano manteve-se atento aos trabalhos da organização, destinando usualmente destacados diplomatas para cuidar dos interesses do país nesse domínio. Apesar dos interesses de natureza diversa, o tom geral da relação com a organização hemisférica, ou melhor, a maior ou menor proximidade com ela fixou-se em função da agenda de segurança, por ser esta uma área fundamental na relação com os Estados Unidos.

Durante a Guerra Fria, o México adotou na OEA uma atitude defensiva, resistiu ao fortalecimento da organização, a seu desenvolvimento institucional e à expansão de seus mandatos. Foi o único grande país latino-americano que não quis a Secretaria Geral, nem se ofereceu como sede das grandes conferências hemisféricas. Nos temas relativos a paz e segurança internacionais pretendeu a todo momento neutralizar a OEA: sempre defendeu a primazia da ONU e, por vezes, estimulou alternativas multilaterais "para dar soluções latino-americanas aos problemas latino-americanos". Essa distância e desconfiança ante a organização hemisférica explica-se como resultado de uma doutrina de política externa que, por razões históricas, identificou os Estados Unidos como uma ameaça, ou seja, como uma fonte potencial de agressões abertas ou encobertas. E, de fato, a conduta estadunidense durante tal período encarregou-se de deixar em suspense a hipótese de uma intervenção estrangeira na mente dos dirigentes mexicanos.

Nesse contexto, a diplomacia do México desenvolveu-se sobre a base de premissas realistas e nacionalistas. Favoreceu um multilateralismo estritamente intergovernamental e viu as organizações internacionais como foros para "amarrar" institucionalmente as grandes potências mediante normas e procedimentos, aumentando seu custo de atuar arbitrariamente. Nesses anos, o principal objetivo do México na OEA foi defender a autonomia nacional concebida de modo antagônico diante dos Estados Unidos; ou seja, esforçou-se para demonstrar sua não subordinação (real e/ou simbólica) aos interesses e preferências de Washington. Isso foi especialmente importante no campo da paz e segurança internacionais, ou seja, em assuntos relativos ao uso da força militar. O México resistiu a fortalecer uma organização regional, que se concentrava numa agenda de segurança hegemonizada pelos Estados Unidos e alheia às verdadeiras preocupações mexicanas. O que, no entanto, não deve se confundir com uma atitude indiferente. Inclusive nos momentos em que os Estados Unidos utilizaram a OEA mais grosseiramente como instrumento de dominação, esse espaço multilateral foi útil para o México porque: (a) lhe deu um marco para pôr em prática sua estratégia geral de contenção demarcada ou equilíbrio de poder suave; (b) funcionou como um amplificador para expressar seus desacordos políticos com Washington e defender sua própria visão; (c) foi um cenário para afirmar recorrentemente a norma do respeito à soberania, definida do modo mais restritivo possível.

A relação do México com a OEA começou a se modificar nos anos 1990 graças às transformações no sistema internacional, ao avanço no processo de globalização e à consequente mudança de estratégia mexicana perante os Estados Unidos. O país optou por identificar o vizinho como sócio e, diferente do passado, o discurso governamental sublinhou os interesses em comum mais que as diferenças. Produziu-se, nessa década, um claro alinhamento em termos econômicos, mas a diplomacia mexicana foi seletiva em assuntos políticos e manteve evidente distância dos temas de defesa ou estratégicos. Tudo isso se traduziu em uma posição ambígua na OEA. Por um lado, o governo do México desconfiou das duas grandes agendas da década: o impulso do regime interamericano de defesa da democracia e a reforma da velha arquitetura de segurança hemisférica. Fez o possível para dificultar o progresso de ambas. Por outro lado, no entanto, a natureza transnacional das novas ameaças foi gerando a consciência de que seria inútil tratá-las de maneira isolada. No marco de uma relação mais cooperativa com Washington e na medida em que a OEA se encarregou dessa nova agenda de riscos, especialmente do narcotráfico e das atividades criminosas conexas, a relevância da organização cresceu aos olhos mexicanos. Nesse âmbito específico, o México começou a demonstrar vontade de liderança e a contribuir para o desenvolvimento normativo e institucional do sistema interamericano.

Com a mudança de século, essa tendência se fortaleceu. O governo de Vicente Fox tomou a decisão política de alinhar-se aberta e explicitamente com os Estados Unidos, mas, além disso, a cada vez mais alta densidade das redes de interdependência social geradas pela migração, as remessas, o comércio, o narcotráfico e o crime organizado contribuíram para modificar a lógica da relação com o vizinho setentrional. Em matéria de segurança, em particular, tornou-se imperativa a cooperação bilateral e isso facilitou sua consequente translação para o plano multilateral. A diplomacia mexicana começou a recorrer às organizações internacionais não mais para defender a autonomia do Estado mexicano perante os Estados Unidos, mas para fortalecer sua capacidade de preservá-la diante do crescente poderio dos atores criminosos não estatais que operam em seu território. Nesse sentido, durante a última década, o México apostou em outro papel para a OEA: que a organização desempenhasse funções que os liberais atribuem aos organismos internacionais, a saber, que facilitem na prática as respostas coletivas aos urgentes problemas de segurança pública que o país enfrenta. E também naquelas funções enfatizadas pelos construtivistas, ou seja, que a OEA se constitua como agente produtor de normas e resoluções interamericanas, capaz de socializar a urgência de frear o tráfico de armas, combater a lavagem de dinheiro e aumentar a cooperação contra o crime organizado transnacional. Tudo isso tendo como pano de fundo um jogo geopolítico que não desaparece e no qual o México necessita somar apoios latino-americanos para melhorar suas posições de negociação diante de Washington. A OEA é o único cenário regional em que tudo isso é possível e, por fim, não é de se estranhar que, nos tempos atuais, a organização possa contar com o México como aliado.

Recebido: 26/04/2013

Aprovado: 15/08/2013

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  • *
    Este artigo, " México en la OEA: de la contención a la coordinación", foi traduzido por Fernando Pinheiro.
  • 1
    A chanceler Patricia Espinosa reiterou esse conceito na 42ª Assembleia Geral ocorrida na Bolívia em 2012: "Sigamos construindo uma OEA forte, com base em nossas coincidências e aspirações [...] Tenho a certeza de que esse processo de reflexão nos levará à conclusão de que, em certos âmbitos e para algumas tarefas, nossa organização continua sendo indispensável e insubstituível".
  • 2
    A Doutrina Estrada buscou evitar o uso do (não) reconhecimento diplomático como uma arma contra regimes supostamente indesejáveis, por exemplo, aqueles que haviam chegado ao poder mediante uma revolução social como a mexicana (ou a bolchevique). Foi uma reação ao modo pelo qual os Estados Unidos utilizaram, em princípios do século XX, sua política de reconhecimento internacional para arrancar concessões dos governos mexicanos pós-revolucionários.
  • 3
    Segundo Bartra (1990, p.147), ao menos até os anos 1980, tanto no México como em Washington assumia-se que "a segurança nacional do México era protegida por uma dura crosta que impermeabilizava o país de possíveis contaminações comunistas".
  • 4
    Com efeito, o México não só recusou reconhecer à OEA a função de guarda anticomunista, como foi um dos poucos países latino-americanos que, durante a Guerra Fria, não estabeleceu acordos bilaterais de segurança ou defesa com os Estados Unidos (em todo caso, ofereceu a Washington cooperação informal com sua estratégia anticomunista, velada e com limites próprios).
  • 5
    Ou seja, em contraste com uma concepção de "soberania limitada". A esse respeito, Olga Pellicer (1983, p.190) sustentava: "À primeira vista, poderia parecer que o resto das nações latino-americanas defendeu tal princípio com a mesma determinação. De fato, não o fizeram porque o advento da Guerra Fria e do medo da subversão interna, auxiliada pelo estrangeiro, puseram vários governos do hemisfério cara a cara com a necessidade de revisar as interpretações existentes. Viram-se obrigados a aceitar a tese da 'soberania limitada' e, em consequência, a justificar atos de intervenção unilateral ou coletiva".
  • 6
    Em 1946, Truman planejou, pela primeira vez, a criação de um exército único das "repúblicas americanas" aprovisionado e liderado por autoridades estadunidenses. Em 1951, os Estados Unidos levaram o tema à OEA e, com o apoio de Brasil, Paraguai, Colômbia, Cuba e Uruguai, propôs a criação de uma Força Armada Interamericana. O México, junto com Argentina e Guatemala, votou contra. Na Décima Reunião de Consulta de 1965, suscitada pela crise na República Dominicana, Washington forçou a criação de uma Força Interamericana de Paz para legalizar
    ex post sua presença militar na ilha. O México novamente votou contra essa resolução, junto com Chile, Equador, Uruguai e Peru.
  • 7
    De acordo com Robert A. Pape (2005, p.10), o
    soft balancing consiste em ações que "não desafiam diretamente a primazia militar" das potências, mas que "usam ferramentas não militares para retardar, frustrar e debilitar" suas políticas e sua capacidade para impor preferências.
  • 8
    A ONU ofereceu certamente outro cenário, mas o México evitou o mais possível encontrar-se na situação de contradizer os Estados Unidos no cenário estratégico global, razão pela qual, por exemplo, durante a Guerra Fria não tentou ocupar um assento não permanente no Conselho de Segurança. Pode-se pensar, ademais, que as posições do México no sistema regional – onde o número de membros é menor e o peso relativo do país é maior – eram mais visíveis e mais influentes.
  • 9
    Tanto assim que, nos anos 1960, Pellicer (1965-66, p.294) escrevia: "Os únicos objetivos da política mexicana (se é que a isto se pode chamar política) têm sido permanecer à margem das atividades do organismo regional e manter por razões de tradição e prestígio uma oposição que não comprometa demais o governo mexicano".
  • 10
    O México, ademais, voltou a tocar ocasionalmente o tema da reincorporação de Cuba à OEA como uma forma de reivindicar na organização o princípio de autodeterminação dos povos. Em 1998, por exemplo, o embaixador mexicano na OEA manifestou que o México rechaçava a exclusão de qualquer estado dos foros internacionais e a imposição de condições para sua participação neles. Disse que o México apoiava "o afiançamento da democracia como instituição básica do sistema interamericano" mas "não compartilha posições que, sob o pretexto de preservar esse regime, intervém nos assuntos internos de outros Estados e violam, em consequência, o direito de autodeterminação dos povos" ("Piden que Cuba se reintegre a OEA", 1998).
  • 11
    Michelena (1995, p.10) explica que "a segurança cooperativa é a segurança baseada no princípio de prevenir a guerra evitando o desenvolvimento dos instrumentos e meios de agressão. Nesse sentido, evita o desenvolvimento da contra-preparação que os EUA devem fazer no contexto do balanço de poder e promove os meios para evitar que as ameaças surjam, tornando a preparação para a agressão mais difícil".
  • 12
    Em 1995, por exemplo, a embaixadora Moreno disse: "O México sempre se opôs e continuará opondo-se ao estabelecimento de uma força multinacional de caráter militar na OEA para enfrentar supostas novas ameaças. Também recusaremos qualquer tentativa de desnaturar o conteúdo da Carta da OEA ou de eliminar o caráter voluntário da participação dos exércitos nas operações de manutenção da paz" (Conferencia Regional sobre Medidas de Fomento de la Confianza y de la Seguridad, 1995, p.2). Como explica Soriano (2009, p.166): "A ideia de tropas mexicanas subordinadas a um mando estadunidense [foi] inaceitável na cultura estratégica dos militares mexicanos".
  • 13
    Na Comissão de Segurança Hemisférica em 1999, por exemplo, os Estados Unidos propuseram que: "Para complementar e apoiar esses avanços na cooperação hemisférica, o sistema interamericano requer mecanismos revitalizados de segurança coletiva. Esses mecanismos deverão fortalecer os compromissos que já existem em matéria de segurança coletiva e facilitar respostas multilaterais a questões de segurança comum" (Comisión de Seguridad Hemisférica, 2000b).
  • 14
    O México decidiu participar apenas como observador. Incorporou-se como membro pleno na V Conferência realizada em Santiago do Chile, em 2002.
  • 15
    O Senado mexicano ratificou a CITAAC onze anos depois, em setembro de 2010. Como explicou oportunamente Rosario Green, que foi chanceler entre 1997-2000: "A CITAAC, assinada em 1999, não foi ratificada pelo Senado [mexicano] [...] uma vez que os principais produtores de arma na América Latina, que certamente não somos nós, mostravam-se indiferentes ante a esta convenção tão importante" (Senado de la República, LXII Legislatura, 2010, s/p).
  • 16
    O governo de Clinton assinou a Cifta em novembro de 1997 e a submeteu ao Senado para sua ratificação em novembro de 1998; no entanto, o processo legislativo não avançou.
  • 17
    Num foro sobre a Declaração sobre Segurança nas Américas, o embaixador Ruíz Cabañas (2003) explicou por que o México havia tomado a iniciativa nesse tema: "Seguindo a tradição jurídica da diplomacia mexicana, há uma lição de dois séculos aprendida da vizinhança com os Estados Unidos: quando há um vazio, gere normas; quando não estão suficientemente claras as normas, trate de dar-lhes publicidade, tente promover a defesa do sistema multilateral. [...] pelo menos desde 1945 até a data presente esta é uma posição a que meu país tem servido".
  • 18
    Em 2004, o general Vega, Secretário de Defesa Nacional (Sedena), explicou diante do Congresso que por nenhuma razão o México tomaria parte do Comando Norte: "Definitivamente nem sonhar, nem pensar; nós não vamos colocar de modo algum as tropas mexicanas sob o comando de um general americano. Jamais" (citado em Soriano, 2009, p.166).
  • 19
    Como dizem Blackmore e Pellicer (2011, p.51): os problemas de segurança no México "são o eixo em torno do qual tem girado a política do presidente Calderón e em torno do qual se está construindo uma etapa nova nas relações México-Estados Unidos [...] o aspecto que sobressai é a maior aproximação dos setores de ambos os países encarregados da segurança, em particular os comandos militares e os responsáveis pelos problemas de inteligência".
  • 20
    Em 2012, o general Charles Jacoby, chefe do Comando Norte, declarou diante do Congresso estadunidense que a relação militar entre Estados Unidos e México havia avançado a "níveis sem precedentes de coordenação" e os dois países se haviam convertido em "sócios estratégicos" com pleno respeito à soberania de cada um ("EUA y México planeam iniciar ejercicios militares conjuntos", 2012). Ver também a revista
    Ágora, financiada pelo Comando Norte e dedicada à celebração da crescente cooperação militar bilateral (Anderson, 2012).
  • 21
    Tratou-se de um exercício de simulacro, chamado Ardent Sentry 12, para o apoio de defesa a civis no caso de desastres naturais.
  • 22
    Entre as quais se destacam Mispa I (2008) e a Reunião Hemisférica de Alto Nível contra a Delinquência Organizada Transnacional (2012). Ambas foram inauguradas pelo presidente Calderón, pessoalmente interessado nesse tema.
  • 23
    O México é o único país até agora que ocupou tal cargo em três ocasiões: 1996-1997, 2002-2003, 2008-2009. O Chile, que desde os anos 1990 liderou entre os países latino-americanos a agenda de segurança na OEA, presidiu-a em duas ocasiões. Brasil e Argentina apenas em uma.
  • 24
    O Centro teria sua sede no México e o primeiro(a) coordenador(a) seria mexicano(a). Apesar de ter sido criado de acordo com um mandato da Cúpula das Américas e com a assistência da Secretaria Geral, não seria em sentido estrito uma entidade da OEA, já que nem todos os países-membros teriam aceitado participar.
  • 25
    Na inauguração do Mispa I, por exemplo, o presidente Calderón (2008, p.4) disse: "Para o México é o momento para que a Iniciativa Mérida abra caminho para uma nova etapa na guerra contra o crime organizado transnacional. É importante que iniciativas como essas se transfiram também para o nível continental, porque é continental o problema da criminalidade e da delinquência organizada". Em particular, propôs que os países latino-americanos se somassem a uma base de dados sobre a criminalidade semelhante à Plataforma México.
  • 26
    A questão foi introduzida na VI Cúpula das Américas celebrada na Colômbia em abril de 2012 e depois nas sessões da 67ª Assembleia Geral da ONU em outubro desse ano (Langner, 2012).
  • 27
    Algo que Calderón pediu a Obama desde sua primeira visita ao México, em abril de 2009, e foi tema central no discurso que pronunciou diante do Congresso dos Estados Unidos em 2010.
  • 28
    Entre as quais se encontra a anulação da resolução que suspendeu Cuba em 1962, a suspensão de Honduras depois do golpe de Estado em 2009, a resolução que deu respaldo ao Equador em sua querela com o Reino Unido pelo asilo diplomático dado a Julian Assange em 2012.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Jan 2014
    • Data do Fascículo
      Dez 2013

    Histórico

    • Recebido
      26 Abr 2013
    • Aceito
      15 Ago 2013
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