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A DUPLA AGÊNCIA DO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL E A RESISTÊNCIA AFRICANA AO LEGADO DA COLONIALIDADE: A COMPLEXA RELAÇÃO ENTRE OS PAÍSES AFRICANOS E O MECANISMO INTERNACIONAL

THE DUAL AGENCY OF THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT AND AFRICAN RESISTANCE TO THE LEGACY OF COLONIALISM: THE COMPLEX RELATIONSHIP BETWEEN AFRICAN COUNTRIES AND THE INTERNATIONAL MECHANISM

Resumo

O Tribunal Penal Internacional foi criado para julgar crimes contra os direitos humanos, contando com amplo apoio e participação de países africanos desde sua criação até os primeiros casos referidos. Essa posição de apoio, contudo, tem se revertido recentemente em alguns Estados. Esta pesquisa busca evidenciar quais as razões mobilizadas para a mudança de uma postura de apoio para uma postura de rechaço ao mecanismo. Acredita-se que a natureza do Tribunal e sua dupla agência jurídica e política geram impasses que agravam o descontentamento de Estados marginalizados internacionalmente, e que é essencial a atenção a esses problemas pela literatura de Relações Internacionais. Para tanto, foi realizado um levantamento de documentos oficiais de Estados africanos contrários, como discursos, iniciativas políticas e normativas, os quais foram interpretados à luz da literatura recente sobre o tema e à luz da discussão sobre a colonialidade do direito.

Palavras-chave:
Tribunal Penal Internacional; África; Cooperação Internacional

Abstract

Created to judge crimes against human rights, the International Criminal Court has had broad participation and support from African countries since its inception until the first cases referred to it. This supportive stance, however, has been reversed recently in some states. This paper investigates the reasons for this change from a supportive position to that of rejecting the mechanism. It posits that the nature of the Court and its dual legal and political agency generate impasses that exacerbate the discontent of internationally marginalized states and that attention to these problems by the International Relations literature is essential. Hence, a survey of official documents from opposing African states, such as speeches, political and regulation initiatives, was carried out, which were interpreted in light of the recent literature on the subject and the discussion on the coloniality of law.

Keywords:
International Criminal Court; Africa; International Cooperation

Introdução

A criação do Tribunal Penal Internacional (TPI), um tribunal permanente e independente para julgar indivíduos pelos mais graves crimes contra os direitos humanos, contou com a ativa participação e pronta mobilização e adesão de vários Estados africanos. Seus representantes ocuparam posições de presidência e vice-presidência do comitê preparatório do Estatuto de Roma, contribuíram em sua construção e foram seus primeiros signatários. Apesar da pretensão de universalidade, a adesão dos Estados ao documento constitutivo do TPI não foi maciça. Ausências de peso merecem registro: Estados Unidos, China, Rússia, Índia e Israel. O Estatuto entrou em vigor em 2002, o que só foi possível após o instrumento alcançar o número de 60 ratificações, 22 das quais de países do continente africano.

Além disso, foram Estados africanos, como Uganda, Mali e República Democrática do Congo, que referenciaram os primeiros casos para análise do Tribunal, o que de um lado, pode ser interpretado como o reconhecimento da instância como, de fato, complementar à jurisdição doméstica, ou como a instrumentalização do mecanismo jurídico para responsabilizar criminalmente rebeldes e oponentes políticos ou pressionar grupos armados a participar de negociações de paz.

Parte da literatura que analisa a relação entre os Estados Africanos e o TPI no período inicial da sua criação sugere que algumas das lideranças estatais percebiam que a vinculação com o novo instrumento poderia ser benéfica para a inserção internacional, entre outras razões, pelo fato de o comprometimento com a impunidade de crimes contra os direitos humanos acenar para um cenário de estabilidade e cooperação, o que poderia melhorar a relação com Estados fora da África. Como os Estados do continente tiveram participação nos contornos do mecanismo, esse vínculo era também uma maneira de fortalecer a própria luta africana pelo bem-estar, pela paz e pelos direitos humanos no continente (Ba, 2017BA, Oumar. 2017. International justice and the postcolonial condition. Africa Today, v. 63, n. 4, pp. 45-62. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3kilGXH . Acesso em: 10 jul. 2020.
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; Elaigwu e Mazrui, 2010MAZRUI, Ali. 2010. Introdução. In: MAZRUI, Ali; WONDJI, Christophe (ed.). 2010. História geral da África, VIII: África desde 1935. Brasília: UNESCO . pp. 1-30.; Jeffery, 2019JEFFERY, John. 2019. Statement: General debate: 18th session of the assembly of states parties of the international criminal court. Disponível em: Disponível em: https://asp.icc-cpi.int/sites/asp/files/asp_docs/ASP18/GD.SOU.2.12.pdf . Acesso em: 6 ago. 2020.
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; Kodjo e Chanaiwa, 2010KODJO, Edem; CHANAIWA, David. 2010. Pan-africanismo e libertação. In: MAZRUI, Ali; WONDJI, Christophe (ed.). 2010. História geral da África, VIII: África desde 1935. Brasília: UNESCO . pp. 897-924.).

Os primeiros casos abertos pela promotoria do TPI (liderada por Luis Moreno Ocampo) e dois casos de iniciativa do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSONU) também tiveram como alvo situações de crimes cometidos em países da África. O indiciamento de duas lideranças estatais, Omar al-Bashir (do Sudão) e Uhuru Kenyatta (Quênia) e seus desdobramentos em outros espaços de cooperação internacional marcaram o início do movimento de alguns Estados-membros de rechaço ao mecanismo. Com esse objetivo, foram mobilizados argumentos que passaram, inclusive, a sustentar propostas de retirada em massa do Tribunal.

Nesse contexto, esta pesquisa busca evidenciar as razões mobilizadas para a mudança de uma postura de suporte para uma postura de rechaço ao mecanismo por parte de algumas lideranças africanas críticas ao papel que o TPI desempenha no continente. Para tanto, foi realizado um levantamento de fontes primárias e secundárias sobre Estados africanos que passaram a se manifestar contrariamente à jurisdição do TPI (em seus discursos, iniciativas políticas e normativas, entre outros). O material coletado a partir de páginas de órgãos dos diferentes níveis institucionais e de outras organizações internacionais foi interpretado à luz da literatura recente sobre o tema, que coloca no centro da reflexão a natureza do Tribunal e sua dupla agência jurídica e política, mas também a discussão sobre a colonialidade do direito.

Do apoio ao rechaço ao TPI

Com efeito, Estados africanos estiveram fortemente envolvidos nas reuniões preparatórias que antecederam a conferência diplomática de criação do TPI. Várias atividades foram organizadas no continente para a discussão da minuta do Estatuto. Estima-se que mais de noventa organizações governamentais e não governamentais baseadas no Quênia, África do Sul, Ruanda, Etiópia, Nigéria e Uganda foram parte da coalização que atuou no lobby para o estabelecimento da Corte. Em setembro de 1997, quatorze estados membros da Southern African Development Community (SADC) delinearam dez princípios básicos para inclusão no Estatuto do TPI. Em 1998, representantes de 25 Estados Africanos produziram uma resolução intitulada Dakar Declaration, com um chamado unânime para o estabelecimento de um tribunal penal internacional. Países como Lesoto, Malawi, Senegal, África do Sul e Tanzânia estiveram envolvidos diretamente nas discussões da Comissão de Direito Internacional nas Conferências Preparatórias do Estatuto do TPI (1993-1996). Em 1998, 47 países africanos compareceram à Conferência de Plenipotenciários, e a maioria votou pela adoção do Estatuto. Assim que o Estatuto foi aberto à ratificação, Senegal foi o primeiro Estado a depositar seu instrumento vinculativo.

Grupos da sociedade civil na África foram muito ativos na defesa do estabelecimento da Corte, inclusive promovendo coalizões que atuaram encorajando os governos a ratificar o Estatuto de Roma. Os fatos acima mencionados são evidências do apoio dos Estados Africanos ao TPI. No âmbito da União Africana, espaço que posteriormente se transformou no principal espaço de manifestações de governos de rechaço ao TPI, houve muitas declarações de apoio à criação e ao funcionamento do mecanismo. Além disso, os primeiros casos analisados pelo Tribunal foram autorreferenciados por Estados africanos.

Os anos iniciais de funcionamento do Tribunal tiveram como marco uma atuação quase que exclusiva de análise de situações no continente. O problema é que os casos referenciados pelo CSONU e os casos abertos pela capacidade autônoma da promotoria também tiveram como alvo cidadãos de Estados africanos. Cardoso (2012CARDOSO, Elio. 2012. Tribunal Penal Internacional: conceitos, realidades e implicações para o Brasil. Brasília: FUNAG.) comenta em seu estudo que o primeiro promotor-chefe do TPI justificou o foco na África com o princípio da complementaridade. A fragilidade das instituições jurídicas do país, segundo Ocampo, fez com que ele priorizasse a abertura de casos no Congo, “que não tinha condições de fazer justiça com os próprios meios”, e não na Colômbia (situação de gravidade semelhante), onde o país iniciou investigações (Cardoso, 2012CARDOSO, Elio. 2012. Tribunal Penal Internacional: conceitos, realidades e implicações para o Brasil. Brasília: FUNAG.).

Manifestações dessa natureza, e o que a União Africana chamou de “inclinação do gabinete da promotoria para chamar atenção da mídia antes mesmo de iniciar processos judiciais” (Clothia, 2011CLOTHIA, Farouk. 2011. Africa’s Fatou Bensouda is new ICC chief prosecutor. BBC Africa, 12 dez. Disponível em: Disponível em: https://bbc.in/3xXKRqr . Acesso em: 12 fev. 2019.
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), foram mobilizadas por lideranças que passaram a criticar o TPI. Vozes na União Africana passaram a questionar por que não ocorria o referenciamento ou início de investigações em situações como as do Afeganistão, Geórgia, Iraque, entre outros, onde era possível identificar interesses geopolíticos de potências (Clothia, 2011CLOTHIA, Farouk. 2011. Africa’s Fatou Bensouda is new ICC chief prosecutor. BBC Africa, 12 dez. Disponível em: Disponível em: https://bbc.in/3xXKRqr . Acesso em: 12 fev. 2019.
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; Hirsch, 2012HIRSCH, Afua. 2012. Fatou Bensouda: the woman who could redeem the international criminal court. The Guardian, 14 jun. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3vl9fAL . Acesso em: 12 fev. 2019.
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; Lamu, 2011LAMU, John-Allan. 2011. Uganda: Fatou Bensouda - a lady fit to replace Moreno-Ocampo. AllAfrica, 12 dez. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3xY51Rw . Acesso em: 12 fev. 2019.
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). O Tribunal não deixou de se manifestar sobre as críticas. A também ex-chefe da promotoria Fatou Bensouda (gambiana), na ocasião membro da equipe do gabinete de Ocampo, se manifestou de forma a tentar apaziguar os ânimos, afirmando que o tribunal não tinha a intenção de concentrar suas ações exclusivamente na África (Cardoso, 2012CARDOSO, Elio. 2012. Tribunal Penal Internacional: conceitos, realidades e implicações para o Brasil. Brasília: FUNAG.).

Os principais Estados que passaram a encabeçar o movimento de rechaço ao TPI são Quênia, África do Sul, Burundi, Gâmbia, Uganda, Sudão, Costa do Marfim, Etiópia e Tunísia. A União Africana passou a ser um espaço importante dessas manifestações, mas também de ações diplomáticas concretas. Como será abordado a seguir, em ação inédita, a organização regional buscou aprovar uma medida de denúncia em massa do Estatuto de Roma. A mobilização de países africanos para o questionamento ou mesmo o rechaço ao TPI ganhou seus contornos especialmente nos debates no âmbito da União Africana em duas situações: (1) o encaminhamento pelo Conselho de Segurança do caso Omar al-Bashir; (2) o início das investigações pela promotoria no caso Uruhu Kenyatta.

O caso contra Omar al-Bashir e suas repercussões

A situação de Darfur (Sudão) é considerada emblemática por três razões: por ser a primeira a ser referenciada para o Tribunal Penal Internacional pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas; por ser a primeira investigação do Tribunal no território de um Estado não membro do Estatuto de Roma; e por conter o primeiro caso do órgão a lidar com acusações de crime de genocídio.

Em 30 de julho de 2004, o Conselho de Segurança adotou a Resolução 1556, que declarou que a situação em Darfur constituía uma ameaça à paz, segurança e estabilidade na região. Além disso, solicitou o desarmamento da milícia Janjaweed e o julgamento dos responsáveis pelas atrocidades. Dois meses depois, a Resolução 1574 demandou que as partes do conflito interrompessem qualquer tipo de violência. A Resolução 1564 criou a Comissão de Investigação com o objetivo de relatar as violações de direito internacional humanitário e de direitos humanos no conflito, bem como de identificar os perpetradores. Os resultados das investigações embasaram o encaminhamento da situação para o TPI (United Nations Security Council, 2004UNITED NATIONS SECURITY COUNCIL. 2004. Resolução nº 1556, de 30 de julho de 2004. Relativa ao relatório do Secretário-Geral sobre o Sudão. Disponível em: https://bit.ly/3kh63j8. Acesso em: 31 jun. 2021.
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).

A moção para o encaminhamento do caso ao TPI foi proposta pela França em março de 2005. Os Estados Unidos buscaram outra solução, inclusive sugerindo a criação de um tribunal de exceção ou misto, coerente com a política de combate ao órgão promovida pelo governo W. Bush. No entanto, o país se absteve na votação, o que permitiu a aprovação da Resolução 1593, de endereçamento do caso ao TPI. A não oposição da potência à resolução foi justificada pela “necessidade de a comunidade internacional trabalhar em conjunto para pôr fim à impunidade no Sudão” (Maia, 2012MAIA, Marrielle. 2012. O Tribunal Penal Internacional na Grande Estratégia norte-americana (1990-2008). Brasília: FUNAG ., p. 1888). Mas foi justificada, também, pelo fato de a resolução retirar (parágrafo 6 do documento) a possibilidade de investigação de cidadãos de Estados não-membros e que estivessem atuando no país sob mandato da ONU.

A resolução foi aprovada por onze votos favoráveis (Argentina, Benin, Dinamarca, França, Grécia, Japão, Filipinas, Reino Unido, Romênia, Rússia e Tanzânia) e 4 abstenções (Argélia, Brasil, Estados Unidos e China). A razão da abstenção da Argélia foi o reconhecimento do papel da União Africana no monitoramento e no cessar-fogo. Na visão declarada no Conselho de Paz e Segurança da União Africana, somente a União Africana seria capaz de persuadir as partes do conflito para que buscassem uma solução pacífica. Criticou-se também o padrão duplo do Conselho de Segurança em seu discurso de justiça universal. O Sudão recusou a decisão do Conselho de Segurança e criticou o TPI como um mecanismo para o exercício da cultura da superioridade e para impor a superioridade cultural ocidental (United Nations Security Council, 2004UNITED NATIONS SECURITY COUNCIL. 2004. Resolução nº 1556, de 30 de julho de 2004. Relativa ao relatório do Secretário-Geral sobre o Sudão. Disponível em: https://bit.ly/3kh63j8. Acesso em: 31 jun. 2021.
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).

Com efeito, o referenciamento do caso para o TPI foi uma das muitas medidas direcionadas ao Sudão pelo Conselho de Segurança com a justificativa do caso “constituir uma ameaça à paz e a segurança” (Conselho de Segurança das Nações Unidas, 2005). Inclusive, muitas sanções foram endereçadas ao país. No entanto, as soluções do Conselho de Segurança para o caso, com impacto para o papel do tribunal, não eram comungadas por parte da comunidade internacional, especialmente por parte de países membros da União Africana que, em âmbito regional, também colocaram o problema como relevante em sua agenda política.

As investigações foram iniciadas pelo TPI em 2005. Entre 2008 e 2009, o Conselho de Paz e Segurança da União Africana requisitou três vezes que o Conselho de Segurança usasse sua prerrogativa para suspender o processo no Tribunal sob a justificativa do imperativo da paz. Contatou-se também a promotoria do TPI com o mesmo propósito. Defendia-se que o processo contra al-Bashir prejudicaria os esforços de negociação de paz entre o governo e os grupos rebeldes. As repercussões poderiam se espalhar para além da região do Darfur, agravando o conflito dentro do país e causando ainda mais sofrimento (Mills, 2012MILLS, Kurt. 2012. “Bashir is dividing us”: Africa and the International Criminal Court. Human Rights Quarterly, v. 34, n. 2, pp. 404-447. DOI: 10.1353/hrq.2012.0030
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, pp. 420-421). De outro lado, vale lembrar que, à ocasião, al-Bashir era presidente do Sudão e participava ativamente dos debates nos foros internacionais.

A estratégia do Conselho de Paz e Segurança da União Africana remete a uma tática utilizada pelos Estados Unidos com vistas ao bloqueio de indiciamento de oficiais norte-americanos pelo mesmo órgão jurídico. A questão merece uma breve digressão. Logo que assumiu seu primeiro mandato, George W. Bush adotou uma política de forte oposição ao mecanismo, que foi seguida de políticas domésticas e externas que tinham como objetivo blindar oficiais do país. Três medidas merecem atenção: (1) tratados bilaterais de não entrega de oficiais norte-americanos para o TPI; (2) legislação que previu cortes de ajuda militar e ajuda externa para países membros do TPI, especialmente para os que recusassem os acordos de não entrega; (3) medidas no Conselho de Segurança de bloqueio do indiciamento de oficiais norte-americanos.

As primeiras duas medidas levaram inúmeros países africanos a acordarem uma espécie de imunidade especial para norte-americanos.1 1 Os Estados Africanos que assinaram esses acordos são: Argélia, Angola, Benin, Botsuana, Burkina Faso, Burundi, Camarões, Cabo Verde, Chade, Congo, Comores, Costa do Marfim, Djibuti, Egito, Eritréia, Etiópia, Gabão, Gâmbia, Gana, Guiné, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Madagascar, Marrocos, Moçambique, Nigéria, República Centro-Africana, República Democrática do Congo, Ruanda, Serra Leoa, Seychelles, Togo, Tunísia, Uganda, Zâmbia. África do Sul, Namíbia, Niger, Quênia e Tanzânia manifestaram-se abertamente contrários ao acordo norte-americano (Maia, 2012). As primeiras negociações no Conselho de Segurança visando imunidade para norte-americanos tiveram como pano de fundo negociações para renovação das missões de paz no Timor-Leste e na Bósnia e Herzegovina em junho de 2002. Os Estados Unidos declararam que não apoiariam novas missões de paz e a ampliação das existentes enquanto oficiais dessas operações não recebessem imunidade em face do TPI. Essa posição gerou controvérsia. Como tentativa de solução da questão, os representantes dos Estados Unidos sugeriram o uso do artigo 16 do Estatuto, que prevê direitos especiais ao Conselho de Segurança, inclusive de suspender julgamentos por períodos renováveis. Em julho de 2002 os Estados Unidos conseguiram a aprovação por unanimidade da Resolução 1422 que bloqueou antecipadamente o indiciamento de cidadãos provenientes de Estados que não ratificaram o TPI.

Durante a renovação do mandato da missão de paz híbrida em Darfur, foi aventada a possibilidade de suspensão dos procedimentos. O Conselho chegou a tomar nota de um comunicado da União Africana. Os Estados Unidos foram contrários. China e Rússia expressaram sérias preocupações com desdobramentos negativos da decisão da promotoria de indiciar o chefe de Estado do país. Reino Unido e França chegaram a cogitar uma negociação para a interrupção temporária do processo contra al-Bashir em busca de medidas cooperativas do governo.

Em reunião posterior da Assembleia Geral da ONU, a abordagem do tema gerava desconforto, uma vez que passou a ser interpretado como um item de negociação política entre os países do Ocidente e o Sudão. A falta de consenso gerou uma manifestação do Reino Unido, que afirmou não haver razões naquele momento (2008) para a suspensão dos trabalhos do tribunal. De toda forma, os Estados Unidos já haviam sinalizado que iriam vetar os esforços de membros do Conselho de Segurança que adiassem a prisão do presidente sudanês (Maia, 2012MAIA, Marrielle. 2012. O Tribunal Penal Internacional na Grande Estratégia norte-americana (1990-2008). Brasília: FUNAG .; Cardoso, 2012CARDOSO, Elio. 2012. Tribunal Penal Internacional: conceitos, realidades e implicações para o Brasil. Brasília: FUNAG.).

A decisão do TPI de emitir o mandado de prisão contra Omar al-Bashir no ano de 2009 irrompeu uma crise nas relações entre Estados Africanos e o TPI. No mesmo ano, Gaddafi (então chefe de Estado líbio) declarou que o mecanismo era uma tentativa do Ocidente de recolonização e atuou propondo uma medida de não cooperação coletiva com o TPI no âmbito da União Africana com base no artigo 98. A decisão de não cooperação com o TPI, justificada pelos acordos de imunidade no âmbito da União Africana, foi discutida novamente em 2010 na Conferência de Revisão do TPI em Kampala, ocasião em que se discutiu também a definição do crime de agressão.

Na ocasião, Estados não membros do TPI já haviam recebido al-Bashir em seus países. A promotoria do TPI informou ao Conselho de Segurança a recusa da cooperação por parte desses países. O presidente sul-africano Jacob Zuma afirmou que prenderiam o mandatário sudanês em situação de visita ao país com base no entendimento de que os termos aprovados no âmbito da União Africana não alterariam as obrigações dos países membros. Anos depois, esse entendimento não prosperou.

Em junho de 2015, uma crise diplomática que teve como centro a recusa da África do Sul em entregar Omar al-Bashir para o TPI acirrou ainda mais os ânimos. O país, considerado uma importante democracia no continente e um dos mais fortes defensores do TPI, passou a se manifestar sobre falhas do mecanismo. Em 19 de outubro de 2016, o governo enviou uma carta à ONU iniciando um processo de retirada no TPI. Em 21 do mesmo mês, o anúncio do Ministro da Justiça do país enfatizou que o TPI criou um impasse ao “inibir as capacidades da África do Sul de honrar as suas obrigações relativas à imunidade diplomática” (Govender, 2017GOVENDER, Subry. 2017. Saída da África do Sul do TPI é inconstitucional. DW, 23 fev. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/37OQSLB . Acesso em: 30 jun. 2021.
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). Afirmou também que: “a solução de conflitos internacionais é incompatível com as atuações do tribunal”. Em outra manifestação, ressaltou que “há a visão na África de que o TPI, na escolha de quem processar, aparentemente prefere líderes africanos”.

A decisão do governo sul-africano gerou controvérsias internas importantes. Em 2017, a Suprema Corte do país considerou inconstitucional a ação unilateral do executivo, sem ouvir o parlamento. A ação na Suprema Corte do país foi iniciada pela Aliança Democrática, formação política de oposição ao governo. Várias organizações não governamentais internacionais e de países africanos se manifestaram contrárias à decisão e preocupadas com o impacto para a realização da justiça internacional do ponto de vista das inúmeras vítimas (Govender, 2017GOVENDER, Subry. 2017. Saída da África do Sul do TPI é inconstitucional. DW, 23 fev. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/37OQSLB . Acesso em: 30 jun. 2021.
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).

De todo modo, a África do Sul se somou a outros atores regionais em fortes manifestações de oposição ao TPI, especialmente no âmbito da União Africana. As reações aos mandados de prisão contra al-Bashir variaram entre pressão para que Estados denunciassem o tratado (feita por Líbia, Camarões e Djibouti, por exemplo), apoio aos apelos de suspensão dos mandados de prisão e apoio ao direito de al-Bashir transitar nos territórios africanos.

O governo sudanês passou a defender que o Tribunal era uma corte política, enfatizando o fato de cidadãos estadunidenses serem exonerados da responsabilização, enquanto sudaneses, cujo Estado também não é membro do tribunal, figuraram como acusados. Argumentou, ainda, que a decisão do TPI havia impactado a segurança do país ao descreditar a autoridade do chefe de Estado diante dos grupos armados (Dealey, 2009DEALEY, Sam. 2009. Omar al-Bashir Q&A: ‘in any war, mistakes happen on the ground’. TIME, 14 ago. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/38tSfiX . Acesso em: 19 fev. 2019.
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; Mills, 2012MILLS, Kurt. 2012. “Bashir is dividing us”: Africa and the International Criminal Court. Human Rights Quarterly, v. 34, n. 2, pp. 404-447. DOI: 10.1353/hrq.2012.0030
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, p. 423; Taylor, 2015TAYLOR, Adam. 2015. Why so many African leaders hate the International Criminal Court. The Washington Post, 15 jun. Disponível em: Disponível em: https://wapo.st/36WanBy . Acesso em: 12 fev. 2019.
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).

Reverberou também o discurso de que o CSONU e o Gabinete do Promotor do TPI teriam ignorado os apelos anteriores para a suspensão das investigações, o que também acirrou os ânimos e deu mais eco às vozes que já apontavam a seletividade do mecanismo de justiça. Outro argumento que passou a ser mobilizado na fala de alguns dos líderes de Estado (especialmente África do Sul, Burundi, Gâmbia, Uganda, Sudão, Quênia, Costa do Marfim e Túnisia) é que organizações não africanas desconhecem as realidades políticas do continente e a justiça internacional aplicada pelo TPI desconsidera a necessidade de paz e reconciliação nos locais de conflito (Grovogui, 2015GROVOGUI, Siba. 2015. Intricate entanglement: The ICC and the pursuit of peace, reconciliation and justice in Libya, Guinea, and Mali. Africa Development, v. 40, n. 2, pp. 99-122.).

Segundo Mills (2012MILLS, Kurt. 2012. “Bashir is dividing us”: Africa and the International Criminal Court. Human Rights Quarterly, v. 34, n. 2, pp. 404-447. DOI: 10.1353/hrq.2012.0030
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), os episódios de descortesia e desprezo por parte do Gabinete do Promotor do TPI e do Conselho de Segurança deram expressão a uma narrativa de que o tribunal possuía um viés imperialista ocidental e de que o foco da justiça penal internacional sobre africanos (o que inclui também os tribunais de exceção e mistos do Conselho de Segurança para Ruanda e Serra Leoa) afetava a estabilidade de governos, os esforços de paz e o progresso institucional. Passou a ser comum ver nas resoluções da União Africana chamamentos aos Estados de fortalecerem suas justiças nacionais e também o fortalecimento de um tribunal africano de justiça e direitos humanos, como uma solução africana para problemas africanos.

A própria União Africana, por meio de manifestação de seu secretário, reprovou a atitude do gabinete da promotoria liderado por Ocampo. Segundo a organização, o TPI perdeu oportunidades importantes de investigar violações em locais como o Afeganistão, Colômbia, Geórgia e Iraque, mantendo foco exclusivo nos países africanos, inclusive atraindo a mídia antes de iniciar os procedimentos judiciais (Clothia, 2011CLOTHIA, Farouk. 2011. Africa’s Fatou Bensouda is new ICC chief prosecutor. BBC Africa, 12 dez. Disponível em: Disponível em: https://bbc.in/3xXKRqr . Acesso em: 12 fev. 2019.
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; Hirsch, 2012HIRSCH, Afua. 2012. Fatou Bensouda: the woman who could redeem the international criminal court. The Guardian, 14 jun. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3vl9fAL . Acesso em: 12 fev. 2019.
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; Lamu, 2011LAMU, John-Allan. 2011. Uganda: Fatou Bensouda - a lady fit to replace Moreno-Ocampo. AllAfrica, 12 dez. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3xY51Rw . Acesso em: 12 fev. 2019.
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).

O caso contra Kenyatta e suas repercussões

O primeiro caso de iniciativa autônoma da promotoria do Tribunal também foi motivo de descontentamento de governos africanos. Em 5 de novembro de 2009, Moreno Ocampo iniciou investigações sobre as lideranças políticas quenianas que, posteriormente, ascenderam à posição de chefia do executivo no país. Em 2008, o próprio governo queniano criou duas comissões de inquérito para investigar a violência durante a acirrada eleição presidencial em 2007 que colocou em lados opostos Mwai Kibaki e Raila Odinga, pertencentes a dois grupos étnicos rivais. Ondas de protestos se tornaram ondas de assassinatos que levaram 1.400 pessoas a óbito (Augustyn et al., 2015AUGUSTYN, Adam et al. 2015 Kikuyu. Encyclopædia Britannica. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3vMuH0p . Acesso em: 6 ago. 2020.
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; Brownsell, 2013BROWNSELL, James. 2013. Kenya: what went wrong in 2007? Aljazeera, 3 mar. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3rWEbVN . Acesso em: 6 ago. 2020.
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; IRB, 2018; Verini, 2016VERINI, James. 2016. The Prosecutor and the President. The New York Times Magazine, 22 jun. Disponível em: Disponível em: https://nyti.ms/3MCEVXY . Acesso em: 19 fev. 2019.
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).

Os resultados dos trabalhos das Comissões foram utilizados para a abertura da investigação pelo TPI. Os principais suspeitos, entre os quais estava Uhuru Kenyatta, foram acusados de crimes contra a humanidade: homicídio, deportação ou transferência forçada de população, agressão sexual, perseguição e outros atos desumanos. Segundo Verini (2016VERINI, James. 2016. The Prosecutor and the President. The New York Times Magazine, 22 jun. Disponível em: Disponível em: https://nyti.ms/3MCEVXY . Acesso em: 19 fev. 2019.
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), o anúncio dos réus pelo TPI gerou receio de renovar as perseguições étnicas no país. De fato, ameaças generalizadas foram dirigidas a pessoas que apoiaram as investigações. O autor também argumenta que o apoio interno ao TPI sofreu abalo, uma vez que os réus Kenyatta e Ruto eram vistos como heróis pelos seus respectivos grupos étnicos (International Criminal Court, 2015INTERNATIONAL CRIMINAL COURT. 2015. The Prosecutor v. Uhuru Muigai Kenyatta. Case Information Sheet. Haia: ICC. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3vk3qDA . Acesso em: 24 out. 2019. Acesso em: 24 out. 2019.
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; Verini, 2016VERINI, James. 2016. The Prosecutor and the President. The New York Times Magazine, 22 jun. Disponível em: Disponível em: https://nyti.ms/3MCEVXY . Acesso em: 19 fev. 2019.
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).

As interferências do governo, somadas às controvérsias internas sobre o papel do TPI, trouxeram dificuldades para a cooperação com o órgão jurídico nas investigações. Três testemunhas elencadas tiveram sua isenção contestada. A condução de Moreno Ocampo foi bastante criticada, e o encerramento dos procedimentos de investigação em 2012 indicou falta de evidências suficientes para a acusação (Verfuss, 2016VERFUSS, Thomas. 2016. Claims of ICC bias and double standards at ASP annual meeting. The East African, 28 nov. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3EQXaGK . Acesso em: 12 fev. 2019.
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; Verini, 2016VERINI, James. 2016. The Prosecutor and the President. The New York Times Magazine, 22 jun. Disponível em: Disponível em: https://nyti.ms/3MCEVXY . Acesso em: 19 fev. 2019.
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).

Um ano depois (2013), Kenyatta e seu antigo adversário Ruto, em coalizão, venceram as eleições no Quênia. Como chefe de Estado, passou a ser uma voz forte de oposição ao TPI na União Africana - principal espaço de ataque ao mecanismo. O fato de aquelas eleições terem ocorrido de forma pacífica foi mobilizado por Kenyatta para reforçar uma narrativa de que ele e Ruto, lutadores pela independência da política queniana, haviam sido injustiçados por uma organização de característica colonial. Declarou-se, por exemplo, que, embora o país acreditasse fortemente no sistema internacional de justiça, sua experiência diante da Corte havia abalado sua fé no mecanismo. Kenyatta seguiu declarando o Tribunal Penal Internacional como “o brinquedo de poderes imperialistas em declínio” (Verini, 2016VERINI, James. 2016. The Prosecutor and the President. The New York Times Magazine, 22 jun. Disponível em: Disponível em: https://nyti.ms/3MCEVXY . Acesso em: 19 fev. 2019.
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).

A intensificação do movimento contra o TPI a partir de 2013 foi perceptível. A situação do Quênia também passou a ser mobilizada como argumento para a não cooperação com o Tribunal no âmbito da União Africana. Em 2013, o Primeiro-Ministro da Etiópia, também presidente da União Africana, acusou o TPI de realizar uma perseguição racial aos africanos. Na mesma cúpula foi proposta a criação de uma seção penal no Tribunal Africano dos Direitos dos Povos e dos Homens e foi rejeitada a instalação de uma representação do Tribunal em Adis Abeba (Ambos, 2015AMBOS, Kai. 2015. Tribunal Penal Africano ou Tribunal Penal Internacional? In: MENDES, Paulo de Sousa et al. (org.). 2015. Direito Penal Internacional: TPI e a Perspectiva da África de Língua Oficial Portuguesa. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda. pp. 79-113.).

Movimentações dos governos da África do Sul, Burundi e Gâmbia para denunciarem o Estatuto de Roma ganharam repercussão.2 2 Vale observar que a retirada de países do Estatuto não ficou circunscrita ao continente africano. Em 2016, a Rússia, em um gesto altamente simbólico, retirou formalmente sua assinatura do Estatuto de Roma (gesto semelhante ao de George W. Bush no início de seu mandato em 2001). Destaca-se o indicativo à época das investigações do caso da Georgia, que impactaria os interesses do país. O presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, declarou que o Tribunal Penal Internacional é “inútil” e ameaçou seguir os passos da Rússia, enraivecido pelas críticas internacionais às suas medidas de guerra às drogas (Russia…, 2016; Bryant, 2018). Em 2016, durante a 28ª Cúpula da União Africana, Kenyatta propôs o desenvolvimento de um plano de retirada em massa das nações africanas do TPI (Addley, 2016ADDLEY, Esther. 2016. Fatou Bensouda, the woman who hunts tyrants. The Guardian, 5 jun. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3rPgA9y . Acesso em: 12 fev. 2019.
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; Africa Confidential, 2016AFRICA CONFIDENTIAL. 2016. More talk talk thank walk walk. Africa Confidential, v. 57, n. 22. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/37H9gWS . Acesso em: 15 fev. 2019.
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; Verfuss, 2016VERFUSS, Thomas. 2016. Claims of ICC bias and double standards at ASP annual meeting. The East African, 28 nov. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3EQXaGK . Acesso em: 12 fev. 2019.
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; Oneko, 2017ONEKO, Sella. 2017. Will AU members really withdraw from the ICC? DW, 1 fev. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3rSEkK8 . Acesso em: 12 fev. 2019.
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).

Angola (país não membro do TPI) argumentou que a solução é o futuro Tribunal de Justiça dos Povos Africanos, uma vez que o TPI “não corresponde aos interesses dos países, particularmente africanos, que têm sido, no geral, vítimas do tribunal” (Melo e Santos, 2017MELO, Marta; SANTOS, Nélio dos. 2017. Cabo Verde contra abandono coletivo do TPI, Angola defende tribunal africano. DW, 1 fev. Disponível em: https://bit.ly/3vO3VVx. Acesso em: 31 jun. 2021
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). Etiópia reforçou a ideia de tribunais africanos para africanos. Tanzânia declarou lamentar a relação tumultuosa do Tribunal com a África e pediu o diálogo sem sermões por parte do Tribunal e sem pretensão de estar em um nível moral superior ao dos africanos (Melo e Santos, 2017MELO, Marta; SANTOS, Nélio dos. 2017. Cabo Verde contra abandono coletivo do TPI, Angola defende tribunal africano. DW, 1 fev. Disponível em: https://bit.ly/3vO3VVx. Acesso em: 31 jun. 2021
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).

Botsuana, Costa do Marfim, Nigéria, Senegal e Tunísia realizaram um manifesto de oposição expressa à convocação da União Africana de saída coletiva do TPI. Burkina Faso, Cabo Verde, República Democrática do Congo e Senegal fizeram também reservas à decisão da Cúpula. Vários grupos ativistas e Organizações Não Governamentais convocaram os governos africanos a apoiar e fortalecer o mecanismo, ao invés de enfraquecê-lo (Addley, 2016ADDLEY, Esther. 2016. Fatou Bensouda, the woman who hunts tyrants. The Guardian, 5 jun. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3rPgA9y . Acesso em: 12 fev. 2019.
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; Africa Confidential, 2016AFRICA CONFIDENTIAL. 2016. More talk talk thank walk walk. Africa Confidential, v. 57, n. 22. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/37H9gWS . Acesso em: 15 fev. 2019.
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; Verfuss, 2016VERFUSS, Thomas. 2016. Claims of ICC bias and double standards at ASP annual meeting. The East African, 28 nov. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3EQXaGK . Acesso em: 12 fev. 2019.
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; Oneko, 2017ONEKO, Sella. 2017. Will AU members really withdraw from the ICC? DW, 1 fev. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3rSEkK8 . Acesso em: 12 fev. 2019.
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).

O Presidente de Cabo Verde declarou na Rádio de Cabo Verde não estar de acordo com o abandono coletivo dos Estados africanos do TPI e completou: “somos um Estado de direito democrático. Pugnamos pela justiça internacional” (Melo e Santos, 2017MELO, Marta; SANTOS, Nélio dos. 2017. Cabo Verde contra abandono coletivo do TPI, Angola defende tribunal africano. DW, 1 fev. Disponível em: https://bit.ly/3vO3VVx. Acesso em: 31 jun. 2021
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). Durante a cúpula o presidente cabo verdiano afirmou:

Pode haver divergências, críticas e reservas quanto ao melhor funcionamento deste tribunal. Nós defendemos que a melhor maneira de contrariar isso é lutar, propor e sugerir melhorias para que o Tribunal Penal Internacional seja um tribunal isento, ao serviço da comunidade internacional e que se guie por princípios de equidade e justiça. (Melo e Santos, 2017MELO, Marta; SANTOS, Nélio dos. 2017. Cabo Verde contra abandono coletivo do TPI, Angola defende tribunal africano. DW, 1 fev. Disponível em: https://bit.ly/3vO3VVx. Acesso em: 31 jun. 2021
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)

Sem consenso, a decisão tomada na cúpula da União Africana tornou-se não vinculativa. Mesmo assim, o documento é polêmico, até porque, não há precedentes sobre um órgão regional decidir a denúncia de um tratado internacional. Sobre isso, o antigo Primeiro-Ministro da República Centro Africana, Nicolas Tiangaye, afirmou:

Cada país aderiu ao TPI. Não foi uma decisão coletiva. Por que agora deverá ocorrer uma saída coletiva? O TPI deve continuar seu trabalho tendo em conta que existem ainda vítimas centro-africanas que esperam justiça pelos males cometidos no país. Há vítimas de guerra e de crimes contra a humanidade cometidos na República Centro-Africana. Sou contra. (Melo e Santos, 2017MELO, Marta; SANTOS, Nélio dos. 2017. Cabo Verde contra abandono coletivo do TPI, Angola defende tribunal africano. DW, 1 fev. Disponível em: https://bit.ly/3vO3VVx. Acesso em: 31 jun. 2021
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)

Vale comentar que as vozes mais fortes contra o TPI ou eram de Estados não membros (Etiópia, Angola, Costa do Marfim, Líbia e Sudão, os três últimos com casos analisados no TPI) ou de Estados membros alvos de investigação ou de investigações preliminares da promotoria (Quênia, Uganda e Burundi). Alguns Estados se viram indiferentes à questão, não vendo vantagens de aderirem ao chamado da União Africana, porém, procurando manter suas opções abertas (Africa Confidential, 2016AFRICA CONFIDENTIAL. 2016. More talk talk thank walk walk. Africa Confidential, v. 57, n. 22. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/37H9gWS . Acesso em: 15 fev. 2019.
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; Govender, 2017GOVENDER, Subry. 2017. Saída da África do Sul do TPI é inconstitucional. DW, 23 fev. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/37OQSLB . Acesso em: 30 jun. 2021.
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).

Com efeito, toda essa mobilização em torno do abandono em massa do TPI gerou uma preocupação sobre uma possível debandada. No entanto, somente Burundi conseguiu concluir o processo de retirada. O governo sul-africano teve sua iniciativa questionada pela Suprema Corte local e a Gâmbia mudou seu posicionamento após a mudança de governo no país. Gabão, país cujo presidente Jean Ping manifestou fortes críticas ao TPI, passou a defendê-lo quando permitiu o encaminhamento de situação do próprio país para investigação. Zâmbia realizou uma consulta pública sobre a retirada do TPI, 93% dos eleitores optaram pela permanência. Em 2020, o governo sudanês decidiu entregar al-Bashir (deposto no Sudão em 2019, cumpriu pena de dois anos no país por crimes de enriquecimento ilícito), porém, sua entrega ainda está pendente (Africa Confidential, 2016AFRICA CONFIDENTIAL. 2016. More talk talk thank walk walk. Africa Confidential, v. 57, n. 22. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/37H9gWS . Acesso em: 15 fev. 2019.
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; Govender, 2017GOVENDER, Subry. 2017. Saída da África do Sul do TPI é inconstitucional. DW, 23 fev. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/37OQSLB . Acesso em: 30 jun. 2021.
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; Agência Lusa, 2021AGÊNCIA LUSA. 2021. Sudão decide extraditar para o TPI antigos líderes acusados de crimes no Darfur. DW, 27 jun. Disponível em: https://bit.ly/37H9BJ8. Acesso em: 31 jun. 2021.
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).

Dupla agência e colonialidade do direito

Observa-se que as principais razões mobilizadas para sustentar o rechaço ao TPI por lideranças de Estados do continente africano são: a seletividade (vinculada à dupla natureza jurídica e política da organização internacional) e a percepção de que o mecanismo constitua ferramenta judicial do neocolonialismo e do imperialismo.

Destacam-se considerações sobre o “alvejamento pela justiça internacional de Estados africanos”, devido ao desbalanço causado pela ação hegemônica de outras potências para se eximirem da responsabilidade internacional (Grovogui, 2015GROVOGUI, Siba. 2015. Intricate entanglement: The ICC and the pursuit of peace, reconciliation and justice in Libya, Guinea, and Mali. Africa Development, v. 40, n. 2, pp. 99-122., p. 105).

De fato, os primeiros anos de atuação do TPI foram claramente marcados pela estratégia de não confronto com os Estados Unidos do governo W. Bush. Inclusive, foi somente após o anúncio de que o TPI não investigaria a situação do Iraque que se notou um abrandamento da política de confrontação e considerações de altos funcionários de que o TPI poderia desempenhar papel relevante na situação do Sudão e no norte de Uganda. Os Estados Unidos passaram a adotar um posicionamento pragmático com relação ao TPI (que ganhou seus contornos no governo Obama e somente foi quebrado no governo Trump com a retomada da política anti-TPI). Essa abordagem instrumentalizava o TPI para os casos de interesse do país, ao mesmo tempo que adotava uma postura forte de garantia de isenção com relação aos cidadãos estadunidenses.

O endereçamento ao TPI por parte do Conselho de Segurança de duas situações de países africanos (Sudão e Líbia), também escancarou a isenção de certas lideranças da justiça penal internacional de acordo com os interesses das potências. Bassiouni e Hansen (2013BASSIOUNI, Mahmoud Cherif; HANSEN, Douglas. 2013. The inevitable practice of the office of the prosecutor. ICC Forum, mar. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3LpHywd . Acesso em: 18 fev. 2019.
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) argumentam que a discussão provocada por líderes políticos africanos deveria ser sobre o papel do Conselho de Segurança nos conflitos do continente, e não sobre o TPI. De toda forma, os primeiros casos encaminhados para processamento por iniciativa autônoma do promotor também se referiam a situações no continente. Além disso, entre 2002 e 2021, trinta casos de oito situações foram julgados, todas do continente africano.

Autores como Kamari Clarke (2013CLARKE, Kamari Maxine. 2013. Is the ICC targeting Africa inappropriately or are there sound reasons and justifications for why all the situations currently under investigation or prosecution happen to be in Africa? ICC Forum, mar. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/37Hrac4 . Acesso em: 10 jul. 2021.
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) defendem que o foco da justiça na África tem relação com o princípio da complementaridade. Para a autora, a fragilidade das instituições jurídicas dos países africanos e as instabilidades políticas e sociais que permeiam a história da região ensejam uma atuação mais presente nos países da região. A alegação é a mesma de Ocampo para justificar suas escolhas de iniciativa autônoma. No entanto, as iniciativas da promotoria a partir de 2016 refutam o argumento.

Em 2016, a primeira investigação fora do continente africano foi sobre a situação da Georgia que tinha como objeto forças do país, forças da Ossétia do Sul e também russas. No mesmo ano, a Rússia anulou a assinatura do TPI, a mesma ação simbólica de George W. Bush em 2001. Em 5 de março de 2020, o TPI autorizou abertura de investigações no caso do Afeganistão. Em abril de 2019, os juízes haviam negado o pedido da promotoria sob a alegação de que as investigações não serviam aos interesses da justiça. Na ocasião, houve fortes pressões por parte do governo Trump, inclusive com medidas de retaliação aos funcionários do TPI que estivessem à frente do processamento do caso.

Se fica clara a tentativa e, até mesmo o alcance, da instrumentalização do TPI pelas potências ocidentais, também merece consideração a possibilidade de instrumentalização do órgão pelos próprios Estados membros quando endereçam casos ao órgão. Líderes políticos podem tentar usar o TPI como ferramenta para atacar adversários políticos. De toda forma, em grande parte das situações já analisadas pelo TPI é possível identificar a propensão dos governos de cooperarem quando seus adversários são os alvos da justiça internacional. As alegações da União Africana no Conselho de Segurança visando à suspensão do julgamento de al-Bashir, e mesmo a justificativa de não cooperação, para não entregar indiciados de vários Estados, tem se baseado na preocupação de que a pacificação deve prevalecer acima da justiça.

Com efeito, a atividade jurisdicional dificilmente estará livre de questões políticas internacionais e nacionais, até porque a política é fundamental para a implementação da justiça internacional. A origem da criação do TPI é política, o mecanismo precisa usar recursos estatais de política para garantir sua missão, os crimes que estão sob a jurisdição do TPI têm natureza de disputas políticas pelo poder (Maia e Hama, 2013MAIA, Catherine; HAMA, Kadidiatou. 2013. O Tribunal Penal Internacional visto desde a África: órgão jurisdicional ou órgão político? ULP Law Review - Revista de Direito da ULP, v. 3, n. 3, pp. 116-144.).

Fatou Bensouda assume que o Gabinete da Promotoria opera em ambientes políticos, o que desafia investigadores a preservarem sua independência, imparcialidade e credibilidade, principalmente quando se trata de casos em que o acusado é chefe de Estado. Para ela, como para o Estatuto de Roma, não se concedem privilégios a chefes de Estado. Casos que os envolvem costumam causar instabilidades em seus países e colocar em xeque o poder do Tribunal e a confiança da comunidade internacional nele depositada. Nesse contexto, a promotora-chefe até 2021 enfatiza que a Corte deve, a todo custo, evitar a politização, assegurando que suas ações sejam conduzidas apenas conforme evidências e as normas do Estatuto de Roma (Massarenti, 2014; Massarenti, 2016MASSARENTI, Joshua. 2016. Exclusive. Fatou Bensouda: The threat of withdrawal from ICC is a regression for the continent. Afronline, 20 de maio. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3w45Pl1 . Acesso em: 12 fev. 2019.
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; Unfair…, 2017UNFAIR to Africa? Not ICC! 2017. The East African, 25 abr. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3vmhigJ . Acesso em: 12 fev. 2019.
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).

No entanto, balancear fatores políticos e ambições jurídicas não é simples. A mesma promotora sugeriu em entrevista que, em alguma medida, as ameaças de retirada do TPI de alguns Estados africanos tinham como objetivo, valendo-se da vulnerabilidade do órgão, extrair concessões em espaços de negociação sobre a atuação do TPI e com ele próprio (Africa Confidential, 2016AFRICA CONFIDENTIAL. 2016. More talk talk thank walk walk. Africa Confidential, v. 57, n. 22. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/37H9gWS . Acesso em: 15 fev. 2019.
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). De fato, em 2013, o Estado do Quênia foi até a Assembleia de Estados Membros do Tribunal e conseguiu que os delegados alterassem algumas regras do órgão, por exemplo, de permissão para a ausência de oficiais sêniores com responsabilidades excepcionais durante seus processamentos, a menos que houvesse requisição especial pelos juízes (Africa Confidential, 2016AFRICA CONFIDENTIAL. 2016. More talk talk thank walk walk. Africa Confidential, v. 57, n. 22. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/37H9gWS . Acesso em: 15 fev. 2019.
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; Massarenti, 2016MASSARENTI, Joshua. 2016. Exclusive. Fatou Bensouda: The threat of withdrawal from ICC is a regression for the continent. Afronline, 20 de maio. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3w45Pl1 . Acesso em: 12 fev. 2019.
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).

Outro exemplo de considerações políticas presentes na decisão do órgão no próprio continente africano foi o duplo padrão adotado pelos juízes com relação à falha de cooperação da África do Sul na entrega de al-Bashir. Em 2017BA, Oumar. 2017. International justice and the postcolonial condition. Africa Today, v. 63, n. 4, pp. 45-62. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3kilGXH . Acesso em: 10 jul. 2020.
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, os juízes do tribunal condenaram a atitude do país, entretanto, consideraram que não seria necessário reportar a situação para o Conselho de Segurança, uma vez que a justiça nacional já havia repreendido o governo e que a medida não seria do interesse da justiça, pois não promoveria a melhoria das relações de cooperação com o país. Ocorre que, até então, todos os casos de não cooperação de outros países africanos haviam sido reportados ao Conselho de Segurança ou à Assembleia Geral, ou ainda a ambos os órgãos (Govender, 2017GOVENDER, Subry. 2017. Saída da África do Sul do TPI é inconstitucional. DW, 23 fev. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/37OQSLB . Acesso em: 30 jun. 2021.
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).

Ainda sobre as razões africanas de rechaço ao TPI, merece nossa atenção o vínculo estabelecido nos argumentos entre a seletividade da justiça e uma justiça racista, colonial e imperialista ocidental. A mobilização desses argumentos, especialmente no espaço da União Africana, tem um sentido maior: o desafio que o continente enfrenta desde os processos de independência de romper com estruturas coloniais, buscar inovações nas relações diplomáticas, redefinir suas relações com o restante da comunidade internacional, inclusive com as potências. Dessa forma, pretende-se lutar contra a dominação estrangeira, valorizar a realidade africana e buscar pela identidade pós-colonial.

Não é uma inverdade que muitos dos líderes que mobilizaram argumentos vinculados ao pan-africanismo são verdadeiros violadores dos direitos humanos. São pessoas que, com objetivo de manutenção de poder local, promovem verdadeiros massacres, mutilações, crimes sexuais, entre outras violações caracterizadas como crimes de guerra, crimes contra a humanidade e até genocídio. Claro que isso enfraquece a credibilidade do discurso, mas não se pode perder de vista a luta histórica desses povos para a reconstrução da memória coletiva e o resgate das tradições africanas. Ali Mazrui (2010MAZRUI, Ali. 2010. Introdução. In: MAZRUI, Ali; WONDJI, Christophe (ed.). 2010. História geral da África, VIII: África desde 1935. Brasília: UNESCO . pp. 1-30.) é um dos importantes politólogos da região que defendem que as soluções para a África não podem ser puramente exógenas, inclusive no campo do direito.

As discussões sobre o resgate da tradição africana também permeiam a preocupação sobre a relação dos países africanos com instituições internacionais. No campo dos direitos humanos, Elaigwu e Mazrui, (2010ELAIGWU, Jonah Isawa; MAZRUI, Ali. 2010. Construção da nação e evolução das estruturas políticas. In: MAZRUI, Ali; WONDJI, Christophe (ed.). 2010. História geral da África, VIII: África desde 1935. Brasília: UNESCO. pp. 519-564.) afirmam que a construção e o desenvolvimento dos direitos humanos e deveres dos cidadãos africanos era vista como uma forma de garantir autonomia e identidades nacionais fortes aos novos Estados africanos, ancoradas nas tradições africanas. Nesse contexto, foi igualmente importante a adesão africana às convenções internacionais de direitos humanos como uma forma de contribuir para a cooperação internacional. A entrada em vigor da Declaração dos Direitos do Homem e dos Povos (1986) é um marco do ideal do “dever de ser livre” da África (no sentido dos padrões ocidentais), mas também de buscarem seus próprios meios para lutar contra o apartheid e o colonialismo (Kodjo e Chanaiwa, 2010KODJO, Edem; CHANAIWA, David. 2010. Pan-africanismo e libertação. In: MAZRUI, Ali; WONDJI, Christophe (ed.). 2010. História geral da África, VIII: África desde 1935. Brasília: UNESCO . pp. 897-924., pp. 914-915).

Nesse aspecto, diferentemente de outras convenções internacionais de direitos humanos, os países africanos tiveram apenas a oportunidade de aderir. O Estatuto de Roma foi negociado com a maciça participação do continente. Mesmo assim, se faz presente a discussão da colonialidade do direito internacional, que, segundo essa perspectiva, constitui “um sistema de hierarquias racializadas de normas e instituições internacionais”. (Grovogui, 2015GROVOGUI, Siba. 2015. Intricate entanglement: The ICC and the pursuit of peace, reconciliation and justice in Libya, Guinea, and Mali. Africa Development, v. 40, n. 2, pp. 99-122., p. 103) Conforme Oumar Ba, condicionada à colonialidade, a justiça internacional acaba por considerar que atrocidades penais só podem ser cometidas por determinados povos, aqueles não ocidentais. Enquanto isso, o Ocidente segue sendo o bastião da legalidade e moralidade internacional e é exonerado da capacidade de cometer tais crimes. Dessa forma, a justiça penal internacional “se tornou uma arena de transações políticas em que imunidades são garantidas a alguns, favores são concedidos a amigos, enquanto o restante se torna alvo de punição com ávida acusação” (Ba, 2017BA, Oumar. 2017. International justice and the postcolonial condition. Africa Today, v. 63, n. 4, pp. 45-62. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3kilGXH . Acesso em: 10 jul. 2020.
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, p. 52).

Como fruto da colonialidade no direito, a jurisprudência positivista é reproduzida no direito internacional, e há uma “persistência do legado intelectual colonial nas disposições alegadamente neutras e universais de produção de conhecimento e elaboração de políticas” (Ba, 2017BA, Oumar. 2017. International justice and the postcolonial condition. Africa Today, v. 63, n. 4, pp. 45-62. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3kilGXH . Acesso em: 10 jul. 2020.
https://bit.ly/3kilGXH...
, p. 53), assim como normas internacionais. Dessa maneira, o Tribunal Penal Internacional carregaria características, discursos e práticas da colonialidade, um projeto político de exclusão e apagamento de civilizações não ocidentais; contudo, o Tribunal não é o único mecanismo a fazê-lo. Ele foi engendrado na justiça internacional como um todo, enraizado no direito internacional, o qual está fundado na colonialidade e carrega seu legado intelectual (Ba, 2017BA, Oumar. 2017. International justice and the postcolonial condition. Africa Today, v. 63, n. 4, pp. 45-62. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3kilGXH . Acesso em: 10 jul. 2020.
https://bit.ly/3kilGXH...
, pp. 50-53).

Não estão deslocadas desses debates as lideranças que propuseram a saída em massa do TPI e a criação de uma seção penal no Tribunal Africano como uma solução africana para problemas africanos. Ocorre que essas alternativas políticas podem ser utilizadas como meios para garantir a impunidade de elites locais, o que coloca em descrédito um importante debate, necessário no campo das Relações Internacionais. Outro problema é perder a perspectiva das vítimas. Sobre isso, merece atenção o fato de o TPI ser a primeira jurisdição penal internacional a conceder às vítimas um lugar no processo e uma reparação (Arsanjani, 1999ARSANJANI, Mahnoush. 1999. The Rome Statute of the international Criminal court. The American Journal of International Law, v. 93, n. 1, pp. 22-43.; Wierda e Greiff, 2004WIERDA, Marieke; GREIFF, Pablo de. 2004. Reparations and the International Criminal Court: a prospective role for the trust fund for victims. International Center for Transitional Justice. New York: ICTJ. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3KoC4Aq . Acesso em: 7 de out. 2017.
https://bit.ly/3KoC4Aq...
).

Organizações Não Governamentais Africanas de Direitos Humanos, muitas vezes acusadas pelas lideranças de vinculação aos interesses ocidentais, alertam para a relevância do TPI desse ponto de vista, ou seja, do papel da busca de uma justiça equitativa e restaurativa, e da relevância de ouvir as vozes das vítimas que iniciam seu processo de cura ao expressar suas dores, estabelecer a verdade e participar do julgamento de seus algozes e receber reparação pelo que sofreram.

Considerações finais

O Tribunal Penal Internacional, assim como outras organizações internacionais, sofre constante pressão para demonstrar imparcialidade, mesmo quando se envolve em questões inerentemente políticas. Sua legitimidade e sua credibilidade no meio internacional dependem fundamentalmente de sua reputação enquanto instituição neutra, que defenda os valores acordados em sua criação, e que não favoreça politicamente nenhum Estado em detrimento de outro (Barnett e Finnemore, 2004BARNETT, Michael; FINNEMORE, Martha. 2004. Rules for the world: international organizations in global politics. Ithaca: Cornell University Press.).

No entanto, não há como dissociar a característica política e jurídica de um mecanismo de justiça internacional que está inserido em um sistema internacional marcado, de um lado, pela igualdade jurídica dos Estados, e, por outro, pela forte desigualdade de poder entre eles. Desse ponto de vista, é impossível para o TPI “tomar decisões substanciais no âmbito do direito que não implicariam nenhuma escolha política” (Koskenniemi, 2018KOSKENNIEMI, Martti. 2018. Entre a apologia e a utopia: a política do Direito Internacional. Revista de Direito Internacional, v. 15, n. 1, pp. 5-29., p. 25). Emprestando as palavras de Koskenniemi (2018KOSKENNIEMI, Martti. 2018. Entre a apologia e a utopia: a política do Direito Internacional. Revista de Direito Internacional, v. 15, n. 1, pp. 5-29., p. 26), “não é uma questão de aplicar formalmente regras neutras”, uma vez que isso depende “daquilo que se considera politicamente certo ou justo”.

Na visão de Ba, a desconsideração das condições geopolíticas e sociopolíticas de uma região em conflito pode ser entendida como claro ato político e carregado de colonialidade do direito internacional, pois, subjuga-se a região e os indivíduos ao crivo da justiça internacional sem medidas de reconciliação e de garantia da paz no local, como se a única maneira de solução fosse exógena a ele e suas vozes endógenas não fossem capazes ou não quisessem, de acordo com o padrão imposto, solucionar os conflitos ou questões inflamadas como conflitos. O autor afirma que, quando se coloca a atuação do Tribunal no contexto mais abrangente da justiça penal internacional, é possível identificar padrões históricos de exclusão de grandes partes da humanidade, sujeitando-as ao direito sem, em troca, usá-lo para protegê-las (Ba, 2017BA, Oumar. 2017. International justice and the postcolonial condition. Africa Today, v. 63, n. 4, pp. 45-62. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3kilGXH . Acesso em: 10 jul. 2020.
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, p. 46).

Com efeito, é inadmissível a imposição unilateral e seletiva da justiça penal internacional, especialmente quando é carregada de conteúdo próprio de uma história de dominação, segundo a qual modelos ocidentais são a régua para medir o comportamento. Por outro lado, também não se pode lançar mão desse argumento como escusa para encobrir comportamentos bárbaros que constituem verdadeiras atrocidades contra a vida e dignidade humana. Não se pode desconsiderar as profundas discrepâncias e a marginalidade econômica e social de populações que as colocam vulneráveis a abusos de seus direitos.

Tais discrepâncias e desigualdades no cenário internacional, exacerbadas na aplicação da justiça internacional, são percebidas quando se analisam todas as medidas para garantia de isenção de responsabilização de cidadãos estadunidenses por violações de direitos humanos perante o TPI que foram tomadas pelos Estados Unidos da América; principalmente se comparadas à movimentação e aos apelos africanos quanto aos riscos de agravação do conflito no Sudão caso fosse emitido mandado de prisão contra Omar al-Bashir. As medidas estadunidenses foram estabelecidas sem grandes represálias internacionais, ao passo que as medidas da União Africana foram ignoradas. Esse e outros episódios mencionados neste trabalho, como a predominância de casos julgados no TPI exclusivamente africanos até o ano de 2021, enquanto casos fora da África só começaram a ser abertos em 2016 e permanecem, até então, sem julgamentos, demonstram que a experiência do Tribunal Penal Internacional coloca desafios à democratização da ordem política e econômica internacional em um contexto de profundas assimetrias.

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    » https://bit.ly/3KoC4Aq
  • 1
    Os Estados Africanos que assinaram esses acordos são: Argélia, Angola, Benin, Botsuana, Burkina Faso, Burundi, Camarões, Cabo Verde, Chade, Congo, Comores, Costa do Marfim, Djibuti, Egito, Eritréia, Etiópia, Gabão, Gâmbia, Gana, Guiné, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Madagascar, Marrocos, Moçambique, Nigéria, República Centro-Africana, República Democrática do Congo, Ruanda, Serra Leoa, Seychelles, Togo, Tunísia, Uganda, Zâmbia. África do Sul, Namíbia, Niger, Quênia e Tanzânia manifestaram-se abertamente contrários ao acordo norte-americano (Maia, 2012MAIA, Marrielle. 2012. O Tribunal Penal Internacional na Grande Estratégia norte-americana (1990-2008). Brasília: FUNAG .).
  • 2
    Vale observar que a retirada de países do Estatuto não ficou circunscrita ao continente africano. Em 2016, a Rússia, em um gesto altamente simbólico, retirou formalmente sua assinatura do Estatuto de Roma (gesto semelhante ao de George W. Bush no início de seu mandato em 2001). Destaca-se o indicativo à época das investigações do caso da Georgia, que impactaria os interesses do país. O presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, declarou que o Tribunal Penal Internacional é “inútil” e ameaçou seguir os passos da Rússia, enraivecido pelas críticas internacionais às suas medidas de guerra às drogas (Russia…, 2016RUSSIA withdraws from ICC as Philippines threatens to follow suit. 2016. The East African, 17 nov. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3ETseWi . Acesso em: 15 fev. 2019.
    https://bit.ly/3ETseWi...
    ; Bryant, 2018BRYANT, Lisa. 2018. Hague tribunal remains deeply controversial after 20 years. VOA News, 4 mar. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/39md6VM . Acesso em: 15 fev. 2019.
    https://bit.ly/39md6VM...
    ).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    13 Set 2021
  • Aceito
    14 Mar 2022
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