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Percepção corporal e cirurgia bariátrica: o ideal e o possível

Resumos

RACIONAL: A cirurgia bariátrica favorece significativa perda de peso. Pouco se sabe se a mudança no tamanho e forma corporal é suficiente para suprir as expectativas criadas no pré-operatório. OBJETIVO: Avaliar as diferentes percepções de tamanho e forma corporal antes e após operação bariátrica. MÉTODO: Foram avaliados 423 pacientes utilizando-se a Escala de Desenhos de Silhuetas. Desses, 32% foram avaliados no pré-operatório (PreO), 20% entre 10 e 12 meses após a operação (PO-1), 13% entre 18 e 24 meses (PO-2), 15% entre 30 e 36 meses (PO-3) e 20% a partir de 42 meses da operação (PO-4). Os grupos foram comparados utilizando-se ANOVA (SPSS 17.0). RESULTADOS: Ao escolheram figuras representativas de um homem e de uma mulher de tamanho normal, não se observaram diferenças entre os grupos. Quanto às escolhas de figuras que representavam o próprio tamanho, o grupo PreO diferenciou-se de todos os grupos (p<0,001) escolhendo figuras maiores. Ao escolherem figuras representativas de um tamanho que acreditavam que poderiam alcançar, o grupo PreO se diferenciou de PO-1, PO-2 e PO-3 (p<0,001), mostrando tendência a escolha de figuras de silhuetas maiores depois da operação. Nas escolhas de figuras que representavam um tamanho que gostariam de ter, o grupo PO-4 se diferenciou de PO-1 e PO-2 (p<0,05), mostrando que no PO-4 houve tendência a escolha de figuras maiores. CONCLUSÃO: A percepção corporal parece estar de acordo com o próprio tamanho, inclusive após perda de peso. Quanto maior o tempo pós- operatório, maior a consciência das reais possibilidades de perda de peso. Observaram-se sinais de insatisfação com o tamanho e forma corporal, principalmente no PO-1 e PO-2, o que pode levar à frustração e pouco uso dos benefícios da operação para a saúde e qualidade de vida.

Cirurgia bariátrica; Imagem corporal; Obesidade; Perda de peso


BACKGROUND: Bariatric surgery helps significantly in weight loss. Little is known whether the change in body shape and size is enough to meet the expectations created preoperatively. AIM: To evaluate the different perceptions of body size and shape before and after bariatric surgery. METHOD: A total of 423 patients were evaluated by Nine-figure Outline Scale. Of these, 32% were pre-surgery (PreS), 20% were evaluated between 10 and 12 months after surgery (PO-1), 13% between 18 and 24 months (PO-2), 15% between 30 and 36 months (PO-3) and 20% after 42 months of operation (PO-4). Groups were compared using one-way analysis of variance. RESULTS: When choosing figures that represented a man and a woman of normal size, no differences were observed between groups. Regarding the choice of figures representing the own size, differences were observed between groups PreS and all other groups (p<0.001), and PreS chosen larger figures. In choosing figures that represented a size that believed they could achieve, PreS differed from the PO-1, PO-2 and PO-3 (p <0.001), showing a tendency to choose larger silhouettes after surgery. When choosing figures that represented a size that would like to have PO-4 differed from PO-1 and PO-2 (p <0.05), showing that in the PO-4 there was a tendency to choose larger figures. CONCLUSION: The body perception seems to comply with own body size, even after weight loss. As longer postoperative period, the participants were more aware of the real possibilities of weight loss. There were signs of dissatisfaction with the body size and shape, mainly in the PO-1 and PO-2, which can lead to frustration and little use of the benefits of the surgery for health and quality of life.

Bariatric surgery; Body image; Obesity; Weight loss


ARTIGO ORIGINAL

Percepção corporal e cirurgia bariátrica: o ideal e o possível

Body perception and bariatric surgery: the ideal and the possible

Graziela A. Nogueira de Almeida Ribeiro; Helenice B. Giampietro; Lídia B. Barbieri; Rita Guardini Pacheco; Rosana Queiroz; Reginaldo Ceneviva

Trabalho realizado no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Graziela A Nogueira de Almeida Ribeiro graziela.nogueiradealmeida@gmail.com

RESUMO

RACIONAL: A cirurgia bariátrica favorece significativa perda de peso. Pouco se sabe se a mudança no tamanho e forma corporal é suficiente para suprir as expectativas criadas no pré-operatório.

OBJETIVO: Avaliar as diferentes percepções de tamanho e forma corporal antes e após operação bariátrica.

MÉTODO: Foram avaliados 423 pacientes utilizando-se a Escala de Desenhos de Silhuetas. Desses, 32% foram avaliados no pré-operatório (PreO), 20% entre 10 e 12 meses após a operação (PO-1), 13% entre 18 e 24 meses (PO-2), 15% entre 30 e 36 meses (PO-3) e 20% a partir de 42 meses da operação (PO-4). Os grupos foram comparados utilizando-se ANOVA (SPSS 17.0).

RESULTADOS: Ao escolheram figuras representativas de um homem e de uma mulher de tamanho normal, não se observaram diferenças entre os grupos. Quanto às escolhas de figuras que representavam o próprio tamanho, o grupo PreO diferenciou-se de todos os grupos (p<0,001) escolhendo figuras maiores. Ao escolherem figuras representativas de um tamanho que acreditavam que poderiam alcançar, o grupo PreO se diferenciou de PO-1, PO-2 e PO-3 (p<0,001), mostrando tendência a escolha de figuras de silhuetas maiores depois da operação. Nas escolhas de figuras que representavam um tamanho que gostariam de ter, o grupo PO-4 se diferenciou de PO-1 e PO-2 (p<0,05), mostrando que no PO-4 houve tendência a escolha de figuras maiores.

CONCLUSÃO: A percepção corporal parece estar de acordo com o próprio tamanho, inclusive após perda de peso. Quanto maior o tempo pós- operatório, maior a consciência das reais possibilidades de perda de peso. Observaram-se sinais de insatisfação com o tamanho e forma corporal, principalmente no PO-1 e PO-2, o que pode levar à frustração e pouco uso dos benefícios da operação para a saúde e qualidade de vida.

Descritores: Cirurgia bariátrica. Imagem corporal. Obesidade. Perda de peso.

ABSTRACT

BACKGROUND: Bariatric surgery helps significantly in weight loss. Little is known whether the change in body shape and size is enough to meet the expectations created preoperatively.

AIM: To evaluate the different perceptions of body size and shape before and after bariatric surgery.

METHOD: A total of 423 patients were evaluated by Nine-figure Outline Scale. Of these, 32% were pre-surgery (PreS), 20% were evaluated between 10 and 12 months after surgery (PO-1), 13% between 18 and 24 months (PO-2), 15% between 30 and 36 months (PO-3) and 20% after 42 months of operation (PO-4). Groups were compared using one-way analysis of variance.

RESULTS: When choosing figures that represented a man and a woman of normal size, no differences were observed between groups. Regarding the choice of figures representing the own size, differences were observed between groups PreS and all other groups (p<0.001), and PreS chosen larger figures. In choosing figures that represented a size that believed they could achieve, PreS differed from the PO-1, PO-2 and PO-3 (p <0.001), showing a tendency to choose larger silhouettes after surgery. When choosing figures that represented a size that would like to have PO-4 differed from PO-1 and PO-2 (p <0.05), showing that in the PO-4 there was a tendency to choose larger figures.

CONCLUSION: The body perception seems to comply with own body size, even after weight loss. As longer postoperative period, the participants were more aware of the real possibilities of weight loss. There were signs of dissatisfaction with the body size and shape, mainly in the PO-1 and PO-2, which can lead to frustration and little use of the benefits of the surgery for health and quality of life.

Headings: Bariatric surgery. Body image. Obesity. Weight loss.

INTRODUÇÃO

A obesidade pode ser definida como doença resultante do acúmulo anormal ou excessivo de gordura sob a forma de tecido adiposo, de forma que possa resultar em prejuízos à saúde23. Trata-se de um transtorno clínico, crônico, de difícil controle e que tem sua origem multifatorial, envolvendo diferentes aspectos na sua gênese e manutenção15,21,4,24,10.

Especificamente com relação à obesidade grau III, os prejuízos relacionados à saúde física e mental são bastante significativos, levando as pessoas a buscaram alternativas drásticas para perda de peso, como as cirurgias bariátricas. Nos últimos anos tem-se observado um crescente aumento na realização dessas operações, já que, após o procedimento e consequente perda de peso, as pessoas começam a vivenciar melhoras significativas, em especial na saúde2,8.

Do ponto de vista psicossocial os indivíduos obesos vivenciam prejuízos significativos os quais afetam múltiplos aspectos de suas vidas14. Em função desses diversos prejuízos, bem como das diferentes formas de discriminação, as pessoas obesas têm experimentado problemas relacionados à depreciação e à insatisfação com a imagem corporal11,15.

Ao se tratar dos aspectos psicossociais relativos à percepção da imagem corporal antes e após a operação, ainda não sabe se as mudanças observadas logo após a perda de peso se mantêm ao longo do tempo pós-operatório. Não há dúvidas de que a cirurgia bariátrica traz benefícios psicossociais importantes para o paciente6. Com relação ao corpo, após alguns meses, as mudanças se tornam aparentes, evidenciadas pela perda de peso. Alguns estudos apontam para o fato de que, com a diminuição de peso, evidenciam-se também melhoras na percepção de tamanho e forma corporal12. Um estudo com 109 pacientes que fizeram operação bariátrica mostrou diminuição significativa na insatisfação corporal bem como diminuição de preocupação com o corpo após seis e 12 meses do procedimento cirúrgico, período este em que os pacientes ainda eram obesos6. Outro estudo com pacientes submetidos à cirurgia bariátrica, os autores buscaram compreender a relação entre os diferentes constructos da imagem corporal, além de procurar entender como a imagem corporal é construída dentro da personalidade de uma pessoa, bem como de que forma se dá a supervalorização da forma e do peso em pacientes obesos9. Os autores concluíram que com a cirurgia bariátrica os pacientes apresentaram diminuição dos índices de supervalorização de peso e forma corporais, insatisfação com o corpo, afeto negativo, além de melhora na autoestima.

No entanto, fica o questionamento acerca da manutenção destas mudanças ao longo do tempo pós-operatório. Não foram encontrados estudos que avaliassem tais mudanças com relação à percepção corporal dentro de um contínuo de tempo.

Assim, o objetivo deste estudo foi avaliar as diferentes percepções relativas à imagem corporal normal, real e ideal de pacientes que estavam no pré-operatório da cirurgia bariátrica comparativamente a pacientes advindos de diferentes momentos de pós-operatório.

MÉTODOS

Esta pesquisa obteve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (HCFMRP-USP), de acordo com o Processo HCRP n° 8763/2009. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Participantes

Participaram do estudo 423 indivíduos adultos, de ambos os sexos, todos do Centro de Cirurgia Bariátrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - USP. Destes, 71 (28%) ainda não tinham se submetido à cirurgia bariátrica (PreO); 66 (26%) tinham há pelo menos 12 meses (PO-1); 38 (15%) tinham entre 12 e 24 meses (PO-2); 36 (14%) entre 25 e 36 meses (PO-3); e 46 (18%) há mais de 37 meses (PO-4).

A Tabela 1 mostra a frequência e porcentagem dos participantes quanto ao gênero, bem como o Índice de Massa Corporal de acordo com os diferentes intervalos de tempo.

Materiais e instrumentos

Foram utilizados os seguintes materiais e instrumentos: a) balança de precisão e fita métrica, com o objetivo de aferir peso e altura das participantes; b) entrevista semi-estruturada, desenvolvida de acordo com os objetivos da pesquisa, utilizada como fonte complementar de informações dos dados demográficos; c) Escala de Desenhos de Silhuetas (Nine-figure Outline Scale; Stunkard, Sorensen & Schulsinger, 198320), com a finalidade de avaliar a percepção da imagem corporal.

A escala consiste de um conjunto de dezoito cartões, contendo nove desenhos de silhuetas femininas e nove masculinas, que representam figuras humanas com nove variações em ordem crescente de tamanho corporal. Cada cartão dispõe de uma numeração a qual corresponde a uma classe de IMC, assim definida: cartões 1 e 2 = não obesidade; 3 = sobrepeso; 4 e 5 = obesidade grau I; 6 e 7 = obesidade grau II; 8 e 9 = obesidade grau III.

Coleta de dados

Os pacientes foram contatados no próprio serviço de cirurgia bariátrica do HCFMRP-USP na ocasião do seu retorno para acompanhamento com o médico e/ou nutricionista. As avaliações ocorreram em sessão única. Procurou-se manter ambiente adequado quanto à privacidade e iluminação para a aplicação dos instrumentos. Primeiramente foram feitas as medidas antropométricas através da aferição do peso e altura dos participantes a fim de se calcular o índice de massa corporal. Em seguida foram feitas as entrevistas e a aplicação da Escala de Desenhos de Silhuetas. Nesta, os participantes deveriam fazer escolhas frente às cinco assertivas propostas, uma de cada vez, como se segue:

1. Escolha uma figura que represente um homem de tamanho normal (HTN).

2. Escolha uma figura que represente uma mulher de tamanho normal (MTN).

3. Escolha uma figura que represente o seu próprio tamanho (PT).

4. Escolha uma figura que represente um tamanho que você acredita que pode alcançar se quiser mudar o seu peso (TPA).

5. Escolha uma figura que represente um tamanho que, na verdade, você gostaria de ter (TGT).

Os analisados eram convidados a participar do protocolo de pesquisa que incluiu avaliação mais extensa. Assim, vale ressaltar que os dados aqui apresentados tratam-se de um recorte de uma avaliação mais ampla.

Tratamento dos dados

Para a codificação da Escala de Desenhos de Silhuetas, estabeleceram-se os critérios utilizados por Nogueira de Almeida, dos Santos, Pasian e Loureiro (2005)7. Para as diferentes assertivas o número do desenho escolhido corresponderia à pontuação atribuída às escolhas com os valores de 1 a 9. Após a codificação, calculou-se a frequência de ocorrência dos escores e os grupos foram comparados utilizando-se análise de variância - Anova (SPSS 17.0)

RESULTADOS

Na escolha relativa ao HTN, não houve diferença entre os grupos. Observou-se em todos os períodos ampla distribuição de escolhas em especial entre os tamanhos "eutrófico", "sobrepeso" e "obesidade grau I" (Figura 1).


Entre as escolhas de figuras de silhuetas representativas de uma mulher de tamanho normal, também não foram observadas diferenças significativas entre os grupos. No entanto, em todos os períodos observaram-se mais escolhas de figuras "eutróficas" (Figura 2).


Nas escolhas representativas do próprio tamanho, o grupo PreO se diferenciou de todos os grupos (p < 0,001), mostrando concentração maior de escolhas entre as figuras maiores (Figura 3).


Quanto às escolhas representativas de um tamanho que os participantes acreditavam que poderiam alcançar, o grupo PreO se diferenciou do grupo PO-1, PO-2 e PO-3 (p < 0,05), mostrando uma tendência a escolher figuras de tamanho maior após a operação (Figura 4).


Nas escolhas de figuras representativas de um tamanho que os participantes gostariam de ter, a maioria deles, independente do período (pré ou pós-operatório), escolheu mais figuras representativas de eutrofia, sem diferença entre os grupos (Figura 5).


DISCUSSÃO

Este estudo objetivou avaliar as diferentes percepções relativas à imagem corporal normal, real e ideal de pacientes atendidos de um centro de cirurgia bariátrica. Utilizou-se para tal a Escala de Desenhos de Silhuetas que foi aplicada tanto antes quanto após a realização da operação em diferentes períodos.

Quando os pacientes escolheram uma figura que representava homem de tamanho normal, a maioria das escolhas nos diferentes períodos foi representativa de figuras eutróficas. A única exceção ocorreu no grupo PO-1 quando a maioria escolheu figuras representativas de obesidade grau I como sendo figura de homem de tamanho normal, apontando para um aspecto de menor cobrança em relação ao homem com relação ao que é considerado normal. Estas escolhas ocorreram exatamente em período em que as pessoas estavam perdendo maior quantidade de peso. Levanta-se a hipótese de que, ao se verem mais magros, a exigência pareceu diminuir em relação à percepção de normalidade de tamanho e peso corporal de um homem. Além disso, pode-se considerar que a exigência quanto ao tamanho corporal de um homem é diferente em relação à mulher. Em geral, as mulheres se exigem e também são mais exigidas a terem corpos mais magros para serem consideradas "normais"1,5. Isso pode ser mostrado nas escolhas de figuras relativas à mulher de tamanho normal, quando, em todos os períodos, a maioria das escolhas relativas à mulher de tamanho normal foi de figuras representativas de eutrofia.

Nas escolhas relacionadas ao próprio tamanho, os dados sugerem que a percepção dos pacientes depois da operação estava de acordo com a perda de peso vivenciada e com as consequentes mudanças no tamanho e forma corporal. Esse resultado chama a atenção para a acurácia da percepção corporal quando esses pacientes estão em franco processo de mudança em relação ao tamanho e à forma do corpo. Considerando que os obesos têm tendência a superestimar o tamanho do seu próprio corpo19, supõe-se que a percepção mais adequada do próprio tamanho neste momento pode estar relacionada às expectativas deste momento. Ou seja, já que essas pessoas estão em processo de perda de peso, neste momento seria aceitável para elas se verem como de fato estão. Tal postura poderia ser inclusive sentida como um estímulo para perda de peso mais significativa.

Quando os pacientes fizeram escolhas de figura que representasse um tamanho que eles acreditavam que podiam alcançar, eles pareceram se mostrar conscientes acerca das reais possibilidades de alcance em relação ao tamanho e forma corporal, em especial no período PreO quando escolheram mais figuras representativas de obesidade grau I. Talvez neste período os pacientes tenham sido mais cuidadosos com as suas expectativas. Contudo, quando escolheram figuras que deveriam representar tamanho que eles gostariam de ter, os dados apontaram para sentimentos de insatisfação e descontentamento com a imagem corporal, além de um desejo de serem diferentes da maneira como estavam.

A diferença entre o julgamento de uma pessoa com obesidade grau III antes de se submeter à cirurgia bariátrica e de outra já operada parece estar associada à atitude desta pessoa frente ao seu próprio corpo - de aceitação ou rejeição, positiva ou negativa - e não necessariamente ao seu tamanho e forma corporal. Neste sentido, os padrões sociais e culturais perpetuados pela sociedade podem ser considerados responsáveis por exercer forte influência sobre a avaliação da imagem corporal, que parece assim não se manter estáveis ao longo do tempo pós-operatório.

O excesso de peso corporal e a obesidade propriamente dita são condições que sempre acompanharam a história da humanidade, havendo períodos de valorização destas condições, quando os corpos redondos eram sinônimos de padrões de beleza, e outros de extrema desvalorização e cobranças. Atualmente, de todas as condições estigmatizadas pela cultura ocidental, o estigma do sobrepeso parece ser o mais debilitante, já que, por ser condição visível a todas as pessoas, pode afetar, em grande proporção, as interações sociais dos indivíduos. A sociedade de maneira geral pode ser identificada como importante fonte de normas sociais de magreza, em especial entre as mulheres, no sentido em que ela perpetua o estereótipo da associação entre magreza e atitudes positivas, como senso de controle, sucesso e atratividade11,13,18.

Os resultados aqui encontrados apontam para o fato de que muitas vezes esses pacientes não consideram que o alcance do tamanho e forma corporal ideal possível depois da cirurgia bariátrica é bastante diferente daquele tamanho e forma anteriormente idealizado ou aspirado. Essa incoerência de percepção pode contribuir para que as pessoas experimentem falhas no processo pós-operatório, que pode levar a sentimentos de insatisfação em relação a si próprios ou à própria cirurgia. Neste sentido, esses pacientes passam a fazer pouco uso dos reais benefícios que podem advir desse procedimento, como por exemplo dos ganhos relativos à saúde e à qualidade de vida2,8,16,17,18.

A insatisfação com o corpo é frequentemente expressada pela discrepância entre a percepção e o desejo relativo ao tamanho corporal. Neste sentido, a Escala de Desenho das Silhuetas tem contribuído para a discriminação entre as percepções de imagem corporal real e ideal. Isto pode ser útil na prática clínica, já que permite uma aproximação de adaptação perceptiva em relação ao idealizado e ao possível no que diz respeito às mudanças na percepção de imagem corporal6.

CONCLUSÃO

A percepção corporal parece estar de acordo com o próprio tamanho, inclusive após perda de peso. Quanto maior o tempo pós- operatório, maior a consciência das reais possibilidades de perda de peso. Observaram-se sinais de insatisfação com o tamanho e forma corporal, principalmente no PO-1 e PO-2, o que pode levar à frustração e pouco uso dos benefícios da operação para a saúde e qualidade de vida.

AGRADECIMENTO

Os autores agradecem à Fundação de Apoio ao Ensino, Pesquisa e Assistência (FAEPA) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo pelo apoio prestado.

15. Särlio-Lahteenkorva S, Stunkard A, Rissanen A. Psychosocial factors and quality of life in obesity. Int J Obes Relat Metab Disord. 1995; nov;19 Suppl 6:S1-5.

Recebido para publicação: 03/12/2012

Aceito para publicação: 22/01/2013

Fonte de financiamento: não há

Conflito de interesses: não há

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  • Endereço para correspondência:

    Graziela A Nogueira de Almeida Ribeiro
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 2013

    Histórico

    • Recebido
      03 Dez 2012
    • Aceito
      22 Jan 2013
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