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Análise de agrupamentos para a classificação de pacientes submetidos à cirurgia bariátrica Fobi-Capella

Resumos

RACIONAL: Indivíduos classificados como obesos mórbidos necessitam de tratamentos eficientes para promover a redução de peso. Em consequência da ineficácia dos tratamentos conservadores e medicamentos atuais, a operação de Fobi-Capella (gastric bypass) tem sido indicada para esse grupo de indivíduos. OBJETIVO: Identificar subgrupos de pacientes obesos com a finalidade de encontrar padrões que dificultem a perda de peso e a recuperação dele após essa operação. MÉTODO: Foram analisadas variáveis dos prontuários de 50 pacientes em dois momentos distintos: antes da operação bariátrica e após seis meses utilizando a metodologia estatística de Análise de Agrupamentos. RESULTADOS: A análise propiciou a divisão dos pacientes em dois grandes grupos. A variável IMC não influenciou na divisão dos pacientes. O grupo em piores condições metabólicas não foi necessariamente formado pelos indivíduos mais obesos, porém a Análise de Agrupamento associou os pacientes de acordo com quatro indicativos da síndrome metabólica. Houve clara relação entre as alterações metabólicas e de pressão arterial com a obesidade, porém neste estudo não se verificou dependência direta em relação ao IMC. CONCLUSÕES: As medidas que poderiam incrementar a recuperação após cirurgia bariátrica visam o controle da síndrome metabólica e não apenas a perda de peso, visto que o IMC foi reduzido em todos os pacientes e não foi o fator diferencial do pós-operatório.

Obesidade; Cirurgia bariátrica; Perda de peso; Síndrome metabólica


BACKGROUND: Individuals classified as morbidly obese require effective treatments to promote weight reduction. Due to the inefficacy of conservative treatments and current medications, bariatric surgery (gastric bypass) has been indicated for this group of individuals. AIM: To identify subgroups of obese patients in order to find patterns that hinder weight loss and recovery after the operation. METHOD: Variables from the medical records of 50 patients were analyzed at two different times: before bariatric surgery and six months after the surgery, utilizing statistical cluster analysis. RESULTS: The analysis led to dividing the patients into two groups. The body mass index - BMI variable did not influence the classification of the patients. The group in worse metabolic conditions was not necessarily composed of heavier subjects, but the cluster analysis grouped the patients according to four indicators of metabolic syndrome. Metabolic alterations and blood pressure were shown to have a clear correlation to obesity, relation to BMI was not confirmed by this study. CONCLUSIONS: Taking measures to manage metabolic syndrome and not focusing solely on weight loss could improve recovery after bariatric surgery, considering that the BMI was reduced in all patients and was not the distinguishing factor for the postoperative period.

Obesity; Bariatric Surgery; Weight Loss; Metabolic Syndrome


ARTIGO ORIGINAL

Análise de agrupamentos para a classificação de pacientes submetidos à cirurgia bariátrica Fobi-Capella

Fernando FreiI; Bráulio de Souza LessaII; Judith Cristina Gouveia NogueiraII; Renata ZopelloII; Samuel Ribeiro da SilvaII; Viviane A. Moreira LessaII

ITrabalho realizado no Departamento de Ciências Biológicas FCLassis, Universidade Estadual Paulista "Júlio Mesquita Filho", UNESP, Assis, SP

IIServiço de Cirurgia do Aparelho Digestivo, Hospital Heliópolis, São Paulo, SP, Brasil

Correspondência Correspondência: Fernando Frei E-mail: ffrei@assis.unesp.br

RESUMO

RACIONAL: Indivíduos classificados como obesos mórbidos necessitam de tratamentos eficientes para promover a redução de peso. Em consequência da ineficácia dos tratamentos conservadores e medicamentos atuais, a operação de Fobi-Capella (gastric bypass) tem sido indicada para esse grupo de indivíduos.

OBJETIVO: Identificar subgrupos de pacientes obesos com a finalidade de encontrar padrões que dificultem a perda de peso e a recuperação dele após essa operação.

MÉTODO: Foram analisadas variáveis dos prontuários de 50 pacientes em dois momentos distintos: antes da operação bariátrica e após seis meses utilizando a metodologia estatística de Análise de Agrupamentos.

RESULTADOS: A análise propiciou a divisão dos pacientes em dois grandes grupos. A variável IMC não influenciou na divisão dos pacientes. O grupo em piores condições metabólicas não foi necessariamente formado pelos indivíduos mais obesos, porém a Análise de Agrupamento associou os pacientes de acordo com quatro indicativos da síndrome metabólica. Houve clara relação entre as alterações metabólicas e de pressão arterial com a obesidade, porém neste estudo não se verificou dependência direta em relação ao IMC.

CONCLUSÕES: As medidas que poderiam incrementar a recuperação após cirurgia bariátrica visam o controle da síndrome metabólica e não apenas a perda de peso, visto que o IMC foi reduzido em todos os pacientes e não foi o fator diferencial do pós-operatório.

Descritores: Obesidade. Cirurgia bariátrica. Perda de peso. Síndrome metabólica.

INTRODUÇÃO

A obesidade pode ser definida como condição de acúmulo anormal ou excessivo de gordura que pode apresentar risco à saúde26. Diversas comorbidades tem sido associadas, entre elas destacam-se diabete tipo 2, hipertensão e doenças cardíacas10,25 .

O método mais simples para avaliar o excesso de peso e a obesidade é dado pela medida antropométrica resultante da avaliação do peso e da altura, denominada de IMC. Esta medida é útil, pois está correlacionada com a gordura corporal, morbidade e mortalidade2. Assim, IMC entre 25,0 e 29,9 kg/m2 é definido como sobrepeso e acima de 30,0 kg/m2 como obesidade24,17.

Na década de 1940, por conta da sexta revisão da Classificação Internacional de Doenças – CID, a Organização Mundial de Saúde já incorporava a obesidade como problema de saúde e esta situação tem sido mantida durante o processo de atualização com CID13.

De acordo com as estimativas realizadas em 2010– pela International Obesity Taskforce, um bilhão de adultos estão com sobrepeso e outros 475 milhões são obesos em todo o mundo. Globalmente estima-se que até 200 milhões de crianças em idade escolar estão com sobrepeso ou obesos12. Segundo a Pesquisa de Orçamentos Familiares realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, para o período de 2002 e 2003, a obesidade afetava 11,1% dos brasileiros em idade adulta - 8,9% dos homens e 13,1% das mulheres. Em números absolutos, a prevalência de obesidade entre os anos pesquisados atingia dois milhões de brasileiros11.

Entre a categoria de obesos, encontram-se indivíduos com IMC acima de 40,0 kg/m2, classificados como portadores de obesidade mórbida. Tais indivíduos devem ser tratados como portadores de um agravo à saúde que ameaça a vida e reduz a qualidade de vida27.

Tratamentos conservadores - dietas de baixa caloria, terapia comportamental e exercícios - devem ser os primeiros a serem postos em prática. No entanto, apenas entre 5-10% de indivíduos conseguem perder quantidade significativa de peso por um período maior que alguns anos3. Outras estratégias combinadas aos tratamentos conservadores foram testadas, como a utilização de medicamentos que demonstraram perda efetiva de peso (entre 5-10%). Segundo Zilberstein et al27 esses medicamentos apresentam efeitos colaterais aceitáveis e foram indicados por períodos prolongados tanto na indução quanto na manutenção da perda de peso; no entanto, observou-se que eles não podem manter a perda de peso, de forma específica em pacientes com obesidade mórbida3 .

Em consequência da ineficácia dos tratamentos conservadores e medicamentos atuais, a cirurgia bariátrica tem sido indicada para o grupo de pacientes com obesidade mórbida ou para aqueles obesos que apresentam comorbidades como hipertensão arterial sistêmica e diabete melito6,14. Dentre as várias modalidades cirúrgicas, aquela que apresenta os melhores resultados é a operação denominada de Fobi-Capella (Gastric bypass), a qual combina restrição gástrica com indução de má absorção27.

O presente trabalho teve por objetivo identificar subgrupos de pacientes obesos com a finalidade de encontrar padrões que dificultem a perda de peso e a recuperação dele após operação de Fobi-Capella.

MÉTODO

O estudo teve a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Heliópolis (Registro CEP nº 785/2011).

Foram analisados os dados dos prontuários dos pacientes atendidos pelo Hospital Heliópolis, situado na cidade de São Paulo, SP, Brasil, entre os anos de 2001 a 2010 em dois momentos distintos: antes da operação bariátrica Fobi-Capella e após seis meses dela.

Foram selecionados 50 pacientes do total de 335 submetidos à procedimento cirúrgico no período. Os demais prontuários não puderam ser incluídos na amostra dado que não apresentavam o preenchimento de uma ou mais variáveis selecionadas para o estudo. A amostra de 50 pacientes representa 15% dos prontuários. Diferente das técnicas estatísticas inferenciais - em que o tamanho da amostra é calculado em função dos níveis de significância e erros adotados -, a Análise de Agrupamentos, técnica estatística multivariada exploratória não define qualquer regra para o tamanho mínimo necessário para a sua aplicação; no entanto, regras práticas indicam que o tamanho da amostra deve ser no mínimo maior que o número de variáveis ou ainda calculada como 2×k onde k representa o número de variáveis em estudo. Ambos os casos estão contemplados pela amostra aqui selecionada. Elas foram: IMC, proteínas de baixa densidade – LDL, proteínas de alta densidade – HDL, lipoproteínas de muito baixa densidade – VLDL, hemoglobina – Hb, plaquetas, leucócitos, triglicerídeos, glicose e bilirrubina.

Para a classificação de pacientes operados foi utilizada a Análise de Agrupamentos (Cluster Analysis), nome genérico atribuído à extensa variedade de métodos estatísticos que procuram elaborar critérios para agrupar objetos (seres humanos, animais, plantas, municípios). São técnicas estatísticas multivariadas com conotação exploratória. Os resultados deste conjunto de técnicas podem contribuir para: 1) definição de um esquema formal de classificação; 2) sugerir um conjunto de regras para classificar novos pacientes em novas classes com fins de diagnósticos; 3) apresentar sugestões de modelos estatísticos para descrever populações; 4) encontrar pacientes que possam representar grupos ou classes, e obter subgrupos na população de risco em relação a agravos norteando prevenções segundo características geográficas, sociais e de saúde. Desta forma, os resultados obtidos pela Análise de Agrupamentos podem auxiliar equipes médicas e gestoras na tomada de decisão para diagnósticos, intervenções, ações preventivas, campanhas educativas, entre outras23. Dado que as métricas diferem para as variáveis em estudo, adotou-se a padronização utilizando a função normal padronizadaz e a distância Euclidiana para a obtenção das dissimilaridades entre os pacientes.

Foram utilizadas medidas de tendência central, variabilidade e intervalo de confiança para média. A análise de variância para um fator foi utilizada para determinar a significância estatística entre os possíveis grupos nas diversas variáveis e Teste post hoc Bonferroni. As suposições de normalidade e homocedasticidade foram verificadas pelos teste de Shapiro-Wilk e Leneve, respectivamente (nível de significância adotado 0,05).

A análise estatística utilizou o aplicativo computacional SPSS® versão 19.

RESULTADOS

A amostra composta foi composta por 48 mulheres e dois homens com idade variando de 21 a 61 anos.

A Análise de Agrupamentos utilizando algoritmos hierárquicos aglomerativos (Figura 1), propiciou para a situação pré-operatória a divisão dos pacientes em dois grandes grupos. As variáveis que apresentam diferenças estatísticas para cada grupo foram: glicose, LDL, VLDL, triglicerídeos, bilirrubina. Para a situação pós-operatória as variáveis que apresentam diferenças foram glicose, VLDL e triglicerídeos.


A Análise de Agrupamentos reuniu os pacientes em dois grupos distintos, cuja variável discriminatória não foi o IMC; desta forma, o grau de obesidade não contribuiu para a formação dos grupos, quando compararam-se os resultados de Gr 1 Pré com Gr 2 Pré, o mesmo ocorrendo para os grupos pós-operatórios (Figura 2A).






Os índices Calinski-Harabaaz e Silhueta confirmaram que a melhor solução para o conjunto de pacientes era a divisão em dois grupos.

Posteriormente, utilizando o índice de Silhueta, foram feitas reclassificações mediante a análise do índice para cada sujeito. Desta forma, pacientes classificados em um dos dois grupos tiveram seus índices individuais avaliados. Para aqueles com valores negativos, realizava-se a mudança de grupo e posteriormente a avaliação do índice de Silhueta, e assim sucessivamente.

Como resultado final, dois grupos emergiram das análises, o grupo denominado de "Grupo 1" apresentava 30 pacientes, enquanto o grupo denominado de "Grupo 2" 20 na condição pré-operatória (denominados de Gr 1 Pré e Gr 2 Pré). Essa mesma situação se verificava na condição pós-operatória (denominados de Gr 1 Pós e Gr 2 Pós). O Grupo 1 incorporou, após a operação, quatro pessoas que originariamente pertenciam ao Grupo 2, que por sua vez manteve os mesmos pacientes, exceto pelos quatro mencionados.

DISCUSSÃO

Uma das maiores dificuldades da Análise de Agrupamentos é a determinação do número de grupos. Outrossim, agrupamentos diferenciados surgem quando usa-se diferentes algoritmos. Desta forma, recomendação é a utilização de vários algoritmos. Se os resultados apresentam subestruturas semelhantes, uma partição natural foi obtida, caso contrário, é pouco provável que os dados apresentem grupos naturais distintos. Para isso, são utilizados os algoritmos distância máxima (complete linkage), distância média (average linkage) e método de Ward.

Outra estratégia para a determinação do número de grupos, em associação aos algoritmos, é o uso de índices para medir a qualidade dos agrupamentos obtidos. No trabalho em foco foram utilizados dois índices, o de Calinski-Harabasz - também conhecido por Pseudo F -, que realiza a comparação entre a soma da distância quadrática dentro dos grupos e compara com a soma da distância quadrática entre dos grupos, e o índice Silhueta. Este define a qualidade dos agrupamentos com base na proximidade entre os objetos de um determinado grupo e na proximidade desses objetos ao grupo mais próximo. Para a obtenção do índice de Silhueta deve-se utilizar os grupos obtidos mediante a aplicação de algum dos algoritmos de agrupamento e da matriz de distância entre os objetos21. O resultado do valor do índice de Silhueta varia entre -1 e 1. Quanto mais próximo de 1 melhor a alocação do objeto no grupo; porém, quanto mais próximo de -1, pior a alocação, dado que o objeto está, em média, mais próximo dos elementos do grupo vizinho. Desta forma, pode-se realocar o objeto ao seu vizinho mais próximo e verificar o valor do índice, melhorando a classificação sem alterar o melhor número de grupos20.

Existe diversidade de métodos e algoritmos para realizar o agrupamento dos pacientes após a mensuração da similaridade ou dissimilaridade. Neste trabalho utilizou-se o método hierárquico aglomerativo, que tem demonstrado ser ferramenta útil na descoberta de subestruturas inerentes a um determinado conjunto de dados. Os algoritmos hierárquicos aglomerativos pertencem aos sistemas de reconhecimento de padrões não supervisionados e são caracterizados por não apresentarem número de grupos preestabelecidos.

A redução de IMC, de glicose, colesterol total, LDL e VLDL é esperada e decorrente da operação, pela menor ingestão alimentar, menor absorção de glicose e colesterol e por mecanismos hormonais que são ativados pelo fato do alimento passar mais rápido pelo tubo digestivo. O que não se deseja, e pode-se caracterizar como "efeito colateral", é a redução do número das hemácias, leucócitos e plaquetas. Isso ocorre pela menor absorção de ferro e vitaminas no tubo digestivo. Assim, todos os pacientes precisam tomar polivitamínicos por toda a vida depois de operados, pois esse é o ônus de absorver menos gordura e glicose, mas também absorver menos nutrientes essenciais. É por esta razão que os profissionais da área médica realizam acompanhamento pós-operatório vigilante. Acrescenta-se a este fato, que a maioria dos pacientes do Hospital Heliópolis submetidos à cirurgia bariátrica é de mulheres, e necessitam de mais ferro na dieta.

É fato que todos os indivíduos incluídos no estudo são obesos mórbidos, porém o IMC variou entre 35 e 69. Na amostra são encontrados obesos Grau III e superobesos, com IMC maior do que 50; no entanto, essas características não estão presentes naquelas responsáveis pela discriminação dos pacientes. Por outro lado, as variáveis discriminatórias responsáveis pela reunião dos pacientes no Grupo 1 e no Grupo 2 foram a glicemia de jejum (Figura 2E), os triglicerídeos (Figura 2J), as frações de colesterol LDL (Figura 2G) e VLDL (Figura 2H).

Quanto às variáveis colesterol HDL (Figura 2F), hemoglobina (Figura 2B), leucócitos (Figura 2C), bilirrubinas (Figura 2I) e plaquetas (Figura 2D), elas não foram discriminatórias para a formação dos Grupos 1 e 2. Assim, o Grupo 2 é o que apresenta as mais altas medidas de glicemia, triglicerídeos, VLDL e LDL, independente do peso corporal. O grupo em piores condições metabólicas não é necessariamente formado pelos indivíduos mais obesos, porém a Análise de Agrupamento associou os pacientes de acordo com quatro indicativos da síndrome metabólica, expressão utilizada para designar um conjunto de alterações orgânicas relacionadas com um maior risco de doenças cardiovasculares, segundo o Third National Cholesterol Education Program (NCEP III)1. De acordo com esses critérios, a síndrome metabólica inclui a obesidade, principalmente com concentração de gordura visceral abdominal, triglicerídeos igual ou maior do que 150 mg/dl, HDL menor do que 40 mg/dl para homens e menor do que 50 mg/dl para mulheres, glicemia de jejum maior ou igual a 110 mg/dl e pressão arterial maior ou igual a 130 mmHg x 85 mmHg. Há clara relação entre as alterações metabólicas e de pressão arterial com a obesidade; porém, neste estudo não se verificou dependência direta em relação ao IMC. Assim, pacientes com IMC menor podem ter síndrome metabólica mais grave e os com superobesidade podem não apresentar evidências clínicas ou laboratoriais da síndrome. Isso não quer dizer que a obesidade não seja um fator de risco para essas alterações, porém não é o único elemento implicado em sua gênese19, 22, 7.

A Análise de Agrupamentos apresenta resultados que do ponto de vista biológico são coerentes uma vez que os Grupos 1 e 2 foram definidos de acordo com a síndrome metabólica, que pode ser caracterizada ainda que nem todas as alterações que a definam estejam presentes19. O Grupo 2 foi o que apresentou os piores parâmetros metabólicos (Figuras 2E, 2H e 2J) , mantendo-se pior do que o Grupo 1 mesmo no período de seis meses após a operação, quando ambos os grupos já haviam perdido peso.

Em relação à glicemia, no período pós-operatório, o Grupo 2 apresentou níveis semelhantes ao Grupo 1 antes da operação (Figura 2E). É evidente que houve melhora importante para esses indivíduos, mas os resultados mostram desenho interessante: 80% dos pacientes do Grupo 2 continuaram no mesmo Grupo 2, discriminados pelas mesmas variáveis que, todavia, diminuíram em ambos os grupos.

Os resultados da literatura evidenciam a indicação da cirurgia bariátrica não só para perda de peso, mas para o tratamento do diabete melito tipo 2 (não dependente de insulina)9,4. Não há dúvidas de que a obesidade desencadeia a síndrome metabólica em muitos indivíduos19 e que o emagrecimento é fundamental para seu controle 4.

Os resultados obtidos não contrariam os benefícios da operação, tampouco a eficácia em relação ao tratamento da síndrome metabólica. Mesmo com as diferenças estatísticas, todos os pacientes tiveram melhora importante em todos os aspectos estudados.

Outro fato importante a ser ressaltado é o tempo de observação do período pós-operatório, que foi de seis meses. É provável que avaliação em prazo mais longo mostre um outro perfil estatístico, uma vez que os pacientes continuam emagrecendo e podem apresentar outras mudanças em seus perfis metabólicos. Segundo Lemanu et al15, os dados da literatura sobre incremento da recuperação pós-operatória evidenciam que há poucos trabalhos investigando especificamente esse tema, embora a literatura seja vasta nos casos de recuperação de operações não bariátricas16.

Deve-se salientar como limitação do estudo, que a amostra em pauta apresenta preponderância no que diz respeito à pacientes do sexo feminino; desta forma, não se pode generalizar os resultados para homens. No entanto, observando esses mesmos resultados e comparando-os ao estudo de Lemanu et al15 pode-se sugerir que a identificação prévia dos pacientes discriminados como Grupo 2 e medidas pré-operatórias intensivas no sentido de minimizar os efeitos da síndrome metabólica possam ser úteis para o incremento da recuperação pós-operatória, principalmente a curto e médio prazos. Não obstante, não foram encontradas características que dificultem a perda de peso para ambos os grupos Figura 2A), motivo pelo qual esse aspecto não foi incluído entre as medidas discutidas como potencialmente incrementadoras da recuperação pós-operatória18.

Quanto à questão da raridade de estudos sobre pós-operatório a curto prazo, visando o incremento da recuperação, a Análise de Agrupamentos propiciou informações sobre a evolução clinica dos pacientes e, consequentemente, seu prognóstico em termos de melhora da síndrome metabólica. Conforme já discutido, é conhecido o perfil de melhora dos pacientes a longo prazo, porém o trabalho em pauta realizado com dados de seis meses após a operação, pode acrescentar um dado sobre o intervalo de tempo necessário para controle completo da síndrome metabólica, ou seja, quanto tempo o Grupo 2 precisará para atingir níveis considerados normais. Neste ponto o agrupamento pode qualificar o prognóstico: os dois grupos terão melhora, porém o grupo 1, no mesmo período avaliado, aproximou-se mais dos parâmetros metabólicos desejados.

A partir deste estudo, pode-se realizar a análise de agrupamento com os mesmos pacientes, dois anos de pós-operatório, pois entende-se que as observações em tempos diferentes auxiliarão a conhecer o perfil e o ritmo de alterações metabólicas desses pacientes, indicando intervenções que possam otimizar a recuperação pós-operatória.

CONCLUSÃO

As medidas que podem incrementar a recuperação após cirurgia bariátrica devem focar o controle da síndrome metabólica e não apenas a perda de peso, visto que o IMC foi reduzido em todos os pacientes e não foi o fator diferencial do pós-operatório.

AGRADECIMENTOS

Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), pelo auxílio financeiro. Processo no.. 2011/10258-0.

Fonte de financiamento: FAPESP

Conflito de interesses: não há

Recebido para publicação: 06/02/2013

Aceito para publicação: 01/04/2013

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  • Correspondência:
    Fernando Frei
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jan 2014
    • Data do Fascículo
      2013

    Histórico

    • Recebido
      06 Fev 2013
    • Aceito
      01 Abr 2013
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