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ELETROMIOGRAFIA DE SUPERFÍCIE DE MÚSCULOS MASSÉTERES E TEMPORAIS COM PERCENTUAL DE USO DURANTE A MASTIGAÇÃO EM CANDIDATOS À GASTROPLASTIA

RESUMO

Racional:

A eletromiografia de superfície identifica variações dos potenciais elétricos dos músculos durante cada contração realizada. O percentual de uso é uma forma de tratar valores possibilitando comparação entre grupos.

Objetivo:

Analisar a atividade elétrica e o percentual de uso dos músculos masséteres e temporais durante a mastigação em candidatos à gastroplastia.

Métodos:

Utilizado Eletromiógrafo de Superfície Miotool 200/400 (Miotec(r), Porto Alegre/RS, Brasil) integrado ao software Miograph 2.0 em pacientes entre 20-40 anos candidatos à gastroplastia. Foram incluídos dados relativos à atividade elétrica simultânea e em pares dos grupos musculares temporais e masséteres em repouso, máxima intercuspidação habitual e durante mastigação de alimento previamente classificado.

Resultados:

Foram analisados 39 pacientes (59% feminino), média de idade de 27,1+5,7. O percentual de uso se concentrou em musculatura temporal, em faixa de 11-20% no sexo feminino (n=11; 47,82%) referente à lateral esquerda e 15 (65,21%) na lateral direita. No masculino, nove (56,25%) na lateral esquerda e 12 (75,00%) na lateral direita. Em masséteres, também na faixa de 11-20% no sexo feminino (n=10; 43,48%) referente à lateral esquerda e 11 (47,83%) na lateral direita. No masculino, nove (56,25%) na lateral esquerda e oito (50,00%) na lateral direita.

Conclusão:

Entre 40-50% da amostra houve variação na atividade elétrica em masséteres e temporais, e, após transformação em valor percentual, facilitou-se a comparação da carga de atividade elétrica utilizada entre o grupo, bem como obteve-se percentual de uso de fibras musculares envolvendo valores de 11-20%, representando uma faixa que se considera como referencial para o grupo estudado. O gênero não constituiu variável em pacientes obesos mórbidos.

DESCRITORES:
Eletromiografia; Mastigação; Gastroplastia; Fonoaudiologia

ABSTRACT

Background:

Surface electromyography identifies changes in the electrical potential of the muscles during each contraction. The percentage of use is a way to treat values enabling comparison between groups.

Aim:

To analyze the electrical activity and the percentage of use of masseter and temporal muscles during chewing in candidates for gastric bypass.

Methods:

It was used Surface Electromyography Miotool 200,400 (Miotec (r), Porto Alegre/RS, Brazil) integrated with Miograph 2.0 software, involving patients between 20-40 years old. Were included data on electrical activity simultaneously and in pairs of temporal muscle groups and masseter at rest, maximum intercuspation and during the chewing of food previously classified.

Results:

Were enrolled 39 patients (59 women), mean age 27.1+/-5.7. The percentage of use focused on temporal muscle, in a range of 11-20, female literacy (n=11; 47.82) on the left side and 15 (65.21) on the right-hand side. In the male, nine (56.25) at left and 12 (75.00) on the right-hand side. In masseter, also in the range of 11 to 20, female literacy (n=10; 43.48) on the left side and 11 (47.83) on the right-hand side. In the male, nine (56.25) at left and eight (50.00) on the right-hand side.

Conclusion:

40-50% of the sample showed electrical activity in muscles (masseter and temporal) with variable values, and after processing into percentage value, facilitating the comparison of load of used electrical activity between the group, as well as usage percentage was obtained of muscle fibers 11-20% values involving, representing a range that is considered as a reference to the group studied. The gender was not a variable.

HEADINGS
Electromyography; Mastication; Gastroplasty; Speech, language and hearing sciences

INTRODUÇÃO

A mastigação é o exercício fisiológico que envolve todos os sentidos2222. Santos AC, Moura Júnior LG. Atuação fonoaudiológica na cirurgia bariátrica e metabólica. In: KLEIN D. et al. Avaliação em motricidade orofacial: discussão de casos clínicos. São José dos Campos, SP: Pulso Editorial, 2013. p.117-27.,2323. Santos AC, Silva CAB. Força de mordida em pacientes candidatos à gastroplastia. ABCD, arq. bras. cir. dig. 2013; 26(4): 315-318. Doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-67202013000400012.
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sendo considerada função importante do sistema estomatognático1414. Nascimento GKBO, Lima LM, Rodrigues CBS, Cunha RA, Cunha DA, Silva HJ. Verificação da força de mordida e da atividade elétrica dos músculos masseteres durante a mastigação em laringectomizados totais. Rev. Bras. Odontol., Rio de Janeiro, v.68, n. 2, p. 175-9, jul/dez. 2011.. As estruturas envolvidas no ato mastigatório responsáveis por manter condições saudáveis de execução desta função, são consideradas fixas e móveis servindo como base nos movimentos e forças envolvidas nesse contexto55. Douglas CR. Fisiologia aplicada à fonoaudiológica. 2ª. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006..

O processo que envolve a função mastigatória é desenvolvido em três momentos: 1) incisão, onde o alimento é apreendido e cortado em região de dentes incisivos (fase que dura de 5-10% da mastigação), logo após, sendo levado à região de pré-molares para 2) trituração (65-70% da mastigação) e 3) molares, para pulverização, gerando pressão interoclusal, havendo a moenda do alimento durante o golpe mastigatório (25-30% do ato mastigatório)55. Douglas CR. Fisiologia aplicada à fonoaudiológica. 2ª. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006..

Durante a mastigação, a musculatura responsável por essa função, especialmente o masseter, o temporal e o bucinador proporciona força de trituração com grande importância nos ciclos mastigatórios1818. Rahal A, GOFFI-Gomez MVS. Avaliação eletromiográfica do músculo masseter em pessoas com paralisia facial periférica de longa duração. Rev. CEFAC, São Paulo, v.9, n.2, 207-12, abr-jun, 2007.,2020. Rahal A, Goffi-Gomez MVS. Eletromiografia dos músculos masseteres e supra-hióideos em mulheres com oclusão normal e com má oclusão classe I de Angle durante a fase oral da deglutição. Rev. CEFAC, São Paulo, v.6, n.4, 370-5, out-dez, 2004., bem como, se faz necessário que a concentração da movimentação muscular esteja reunida em região de pré-molares e molares2323. Santos AC, Silva CAB. Força de mordida em pacientes candidatos à gastroplastia. ABCD, arq. bras. cir. dig. 2013; 26(4): 315-318. Doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-67202013000400012.
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.

Diversos estudos advogam a função muscular responsável pelo ato mastigatório com o objetivo da eficiência para boa nutrição33. Canterji MB, Corrêa SPM, Vargas GS, Pereira JLR, Finard SA. Intervenção fonoaudiológica na cirurgia bariátrica do idoso: relato de caso. ABCD, arq. bras. cir. dig.; 28 (Suppl 1): 86-87. Doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-6720201500S100023.
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,77. Gonçalves RFM, Chehter EZ. Perfil mastigatório de obesos mórbidos submetidos à gastroplastia. Rev. CEFAC , São Paulo, v.14, n. 3, junho de 2012. Doi: http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462011005000137.
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,2323. Santos AC, Silva CAB. Força de mordida em pacientes candidatos à gastroplastia. ABCD, arq. bras. cir. dig. 2013; 26(4): 315-318. Doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-67202013000400012.
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e, apesar de considerar esta área da motricidade orofacial em sua relação com a atuação fonoaudiológica em equipe de cirurgia bariátrica, um campo de nova inserção, não contém comprovação de sua eficácia66. Gonçalves RFM, Zimberg E. Intervenção fonoaudiológica em obesos mórbidos submetidos à gastroplastia pela técnica de Fobi-Capella. ABCD, arq. bras. cir. digestiva.2016; 29 (1): 43-47. Doi: http://dx.doi.org/10.1590/0102-6720201600010011.
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, porém busca-se esse fim através das pesquisas científicas.

Encontram-se potenciais elétricos passíveis de aferição com tecnologia atual. Essa eletricidade ocorre baseando-se no princípio da capacidade celular em desencadear atividade elétrica através da existência de potencial elétrico entre suas membranas plasmáticas com a apresentação do citoplasma eletricamente negativo em relação ao meio extracelular2626. Silva HJ. Protocolos de eletromiografia de superfície em fonoaudiologia. Barueri, SP: Pró-Fono, 2013..

Um músculo ou um grupo muscular, ao ser estimulado a mover-se em atividade, ocorre modificação do potencial de repouso, transformando-se em potencial de ação que, através de leitura eletromiográfica, apresenta-se a possibilidade de contagem cada vez mais objetiva2626. Silva HJ. Protocolos de eletromiografia de superfície em fonoaudiologia. Barueri, SP: Pró-Fono, 2013..

A eletromiografia de superfície (EMG'S) é a forma de mensuração da funcionalidade da musculatura mastigatória capaz de identificar variações dos potenciais elétricos dos músculos durante cada contração realizada, dando suporte na elaboração de diagnóstico e terapêutica de funções e distúrbios motores orofaciais, tanto na mastigação como na deglutição. Sua precisão nos registros da atividade elétrica de um músculo ou de um grupo muscular é que confere a essa tecnologia sua aplicabilidade em maior escala11. Amorim CF. Eletromiografia de superfície (EMG). In: SALGADO, A.S.I. Eletrofisioterapia manual clínico. São Paulo: Andreoli, 2013. pp. 241-50.,22. Bernardes DFF, Goffi-Gomez MVS, Bento RF. Eletromiografia de superfície em pacientes portadores de paralisia facial periférica. Rev. CEFAC. 2010 Jan-Fev; 12(1):91-96.,1414. Nascimento GKBO, Lima LM, Rodrigues CBS, Cunha RA, Cunha DA, Silva HJ. Verificação da força de mordida e da atividade elétrica dos músculos masseteres durante a mastigação em laringectomizados totais. Rev. Bras. Odontol., Rio de Janeiro, v.68, n. 2, p. 175-9, jul/dez. 2011.,2121. Rahal A, Lopasso FP. Eletromiografia dos músculos masseteres e supra-hióideos em mulheres com oclusão normal e com má oclusão classe I de Angle durante a fase oral da deglutição. Rev CEFAC, São Paulo, v. 6, n. 4, 370-5, out-dez, 2004.,2626. Silva HJ. Protocolos de eletromiografia de superfície em fonoaudiologia. Barueri, SP: Pró-Fono, 2013..

Como o sinal eletromiográfico apresenta grande variabilidade em processo de comparação a diferentes registros para o mesmo indivíduo ou indivíduos diferentes, buscou-se uma forma de comparação de um grupo de pessoas com semelhanças em seu sinal. As técnicas de normalização permitem a comparação de valores de sinais eletromiográficos, possibilitando o estudo interindivíduo11. Amorim CF. Eletromiografia de superfície (EMG). In: SALGADO, A.S.I. Eletrofisioterapia manual clínico. São Paulo: Andreoli, 2013. pp. 241-50..

Por meio de buscas na literatura, foi observada a utilização da EMG'S na fonoaudiologia; porém, pouco se encontrou, especificamente, no âmbito do tratamento cirúrgico da obesidade, onde se percebe que mais pessoas estão enfrentando esse procedimento por se tratar de algo com maior eficácia de manutenção do peso perdido por período bem mais prolongado1515. Christou NV, Sampalis JS, Liberman M, Look D, Auger S, McLean AP, MacLean LD. Surgery decreases long-term mortality, morbidity, and health care use in morbidly obese patients. Ann Surg. 2004 Sep;240(3):416-23. Doi 10.1097/01.sla.0000137343.63376.19.
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.

Este trabalho teve como objetivo analisar a atividade elétrica dos músculos masséteres e temporais com percentual de uso, durante a mastigação em pacientes obesos mórbidos candidatos à gastroplastia.

MÉTODOS

É estudo de abordagem quantitativa, transversal e descritiva. O período de coleta foi de outubro/2012 a março/2013. O projeto obteve aprovação pelo Comitê de Ética da Universidade de Fortaleza sob nº 114.609/2012.

Os sujeitos da pesquisa foram selecionados por conveniência e de forma voluntária no Núcleo do Obeso do Ceará, situado em Fortaleza, CE, Brasil.

Foram utilizados como critérios de inclusão pacientes na faixa etária entre 20-40 anos e candidatos à gastroplastia; e os de exclusão os que apresentassem deformidades faciais e/ou oclusais que impossibilitassem a coleta da execução da função mastigatória.

Utilizou-se para as aferições de atividade elétrica o aparelho de Eletromiografia de Superfície Miotool 200/400 - (Miotec(r), Porto Alegre/RS, Brasil) com quatro canais, sensor SDS500 e integrados ao software Miograph 2.0.

A técnica utilizada e as orientações foram previamente explanadas ao paciente para a coleta dos dados dos protocolos já publicados99. Mangilli LD, Sassi FC, Sernik RA, Tanaka C, Andrade CRF. Caracterização eletromiográfica e ultrassonográfica da função mastigatória em indivíduos com oclusão normal. J Soc Bras Fonoaudiol. 2012;24(3):211-7.,1414. Nascimento GKBO, Lima LM, Rodrigues CBS, Cunha RA, Cunha DA, Silva HJ. Verificação da força de mordida e da atividade elétrica dos músculos masseteres durante a mastigação em laringectomizados totais. Rev. Bras. Odontol., Rio de Janeiro, v.68, n. 2, p. 175-9, jul/dez. 2011.,1616. Oncis MC, Freire RMAC, Marchesan IQ. Mastigação: Análise pela eletromiografia e eletrognatografia. Seu uso na clínica fonoaudiológica. Rev. Distúrbios da Comunicação, São Paulo, 18(2): 155-165, agosto, 2006.,2323. Santos AC, Silva CAB. Força de mordida em pacientes candidatos à gastroplastia. ABCD, arq. bras. cir. dig. 2013; 26(4): 315-318. Doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-67202013000400012.
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,2626. Silva HJ. Protocolos de eletromiografia de superfície em fonoaudiologia. Barueri, SP: Pró-Fono, 2013.. Durante a mastigação habitual, foi padronizado como alimento, uma porção de pão francês de 5 cm33. Canterji MB, Corrêa SPM, Vargas GS, Pereira JLR, Finard SA. Intervenção fonoaudiológica na cirurgia bariátrica do idoso: relato de caso. ABCD, arq. bras. cir. dig.; 28 (Suppl 1): 86-87. Doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-6720201500S100023.
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e tempo de captação do sinal durante a mastigação; foram analisados todos os intervalos, sem exclusões, valendo-se do tempo total da amostra até a deglutição do alimento. Os pacientes realizaram mastigação habitual com ciclos próprios e deglutição espontânea.

Todos os exames de EMG'S foram realizados pelo mesmo observador (SAC) e nas mesmas condições ambientais.

Antes de cada coleta era realizada fricção local com gaze não estéril embebida em álcool a 70% com o intuito de minimizar artefatos1414. Nascimento GKBO, Lima LM, Rodrigues CBS, Cunha RA, Cunha DA, Silva HJ. Verificação da força de mordida e da atividade elétrica dos músculos masseteres durante a mastigação em laringectomizados totais. Rev. Bras. Odontol., Rio de Janeiro, v.68, n. 2, p. 175-9, jul/dez. 2011. e melhorar a captação do sinal. O eletrodo referência (terra) foi colocado na porção frontal da cabeça do paciente.

Foram captados dados relativos à atividade elétrica simultânea e em pares dos grupos musculares temporais e masséteres durante as tarefas: repouso, apertamento dentário máximo em máxima intercuspidação habitual (MIH) e durante o período de mastigação de alimento.

Os registros foram colhidos através da MIH mantida por 5 s e repetida por três vezes, com o acréscimo de intervalo de 1 min para repouso entre cada coleta e utilizada média para normalização de sinal, equivalente a 100% da atividade elétrica. Os sinais coletados durante a mastigação foram analisados em Root Mean Square (RMS) e expressos em microvolts (µV)99. Mangilli LD, Sassi FC, Sernik RA, Tanaka C, Andrade CRF. Caracterização eletromiográfica e ultrassonográfica da função mastigatória em indivíduos com oclusão normal. J Soc Bras Fonoaudiol. 2012;24(3):211-7.,1414. Nascimento GKBO, Lima LM, Rodrigues CBS, Cunha RA, Cunha DA, Silva HJ. Verificação da força de mordida e da atividade elétrica dos músculos masseteres durante a mastigação em laringectomizados totais. Rev. Bras. Odontol., Rio de Janeiro, v.68, n. 2, p. 175-9, jul/dez. 2011.,2626. Silva HJ. Protocolos de eletromiografia de superfície em fonoaudiologia. Barueri, SP: Pró-Fono, 2013..

Para a análise do percentual de uso (PU), foi utilizada a seguinte fórmula:

O PU é forma de normalizar o percentual de utilização da musculatura em atividade, tratado dentro do grupo pesquisado, para possibilitar a comparação dos resultados.

Avaliação estatística

Na análise e interpretação dos dados utilizou-se estatística descritiva com o emprego de medidas de tendência central, representada pela média, desvio-padrão e os valores máximos e mínimos. Para a realização dos cálculos utilizou-se o software Excel v. 2010 (Microsoft, 2010). Elegidos 39 pacientes e o planejamento envolvendo a faixa etária ocorreu de forma a torná-la mais concisa e reduzida em determinada condição muscular com o objetivo de grupo bem mais homogêneo, visto que com a amplitude de idade e diferenças muito efetivas, desagrega a condição de comparação de atividade muscular. Para esse fato, a idade crescente exerce influência na modificação do padrão de musculatura, bem como o envelhecimento pode alterar aspectos relacionados à tonicidade, influenciando nos resultados obtidos2121. Rahal A, Lopasso FP. Eletromiografia dos músculos masseteres e supra-hióideos em mulheres com oclusão normal e com má oclusão classe I de Angle durante a fase oral da deglutição. Rev CEFAC, São Paulo, v. 6, n. 4, 370-5, out-dez, 2004..

RESULTADOS

O grupo efetivamente estudado foi composto de 39 pacientes, sendo 23 (59%) mulheres e 16 (41%) homens e apresentando média de idade, para as mulheres 27,1+5,7 anos e para os homens, 26,1+5,2 anos.

Máxima intercuspidação habitual (MIH)

Observou-se que a média geral da população estudada para a MIH em musculatura temporal expressa em microvolts (µV), apresentou 230,1 µV para a musculatura à esquerda e 225,4 µV para a direita. Nos valores médios, encontrados durante a função mastigatória, foram observados 28,0 µV para o lado esquerdo, enquanto que a direita apresentou 27,3 µV, o que resultou em percentual de uso das fibras musculares com médias de 15,5% à esquerda e 14,6% à direita (Tabela 1).

TABELA 1
Valores de média MIH, da função mastigatória e percentual de uso durante a mastigação dos músculos temporais esquerdo e direito

A média geral para a MIH nos músculos masséteres expressa em microvolts, apresentou 157,2 µV para a musculatura à esquerda e 181,6 µV à direita. Nos valores médios encontrados durante a função mastigatória foram observados 22,8 µV para o lado esquerdo, enquanto que a direita apresentou 24,9 µV, o que resultou em percentual de uso das fibras musculares com médias de 20,0% à esquerda e 21,2% à direita (Tabela 2).

TABELA 2
Valores de média MIH da função mastigatória e percentual de uso durante a mastigação dos músculos masséteres esquerdo e direito

Percentual de uso (PU)

Quando existe a apresentação dos valores para os gêneros em temporais esquerdo e direito, demonstraram-se médias, mínimos e máximos (Tabela 3), além da categorização do PU de fibras musculares requeridas para o exercício durante a função de mastigação.

Nas mulheres os resultados foram para a lateral esquerda 47,82% (n=11) com PU entre 11-20%; 34,79% (n=9) entre 0-10% e 17,39% (n=4) entre 21-30%. Em musculatura lateral direita, 65,21% (n=15) com o PU entre 11-20%; 21,74% (n=5) entre 0-10% e 13,05% (n=3) entre 21-30%.

TABELA 3
Valores de MIH, mastigação e percentual de uso com diferenciação entre gêneros para musculatura temporal

Nos homens em musculatura lateral esquerda 56,25% (n=9) apresentaram o PU entre 11-20%; 31,25 (n=5) entre 0-10% e 6,25% (n=1) com PU em 21-30% e 6,25% (n=1) entre 91-100%. Em musculatura lateral direita observou-se 75,00% (n=12) com PU entre 11-20%; 18,75% (n=3) entre 0-10% e 6,25% (n=1) entre 91- 100%.

Apresentando os valores para os gêneros em masséteres esquerdo e direito, demonstraram-se médias, mínimos e máximos (Tabela 4), além da categorização do PU de fibras musculares requeridas para o exercício durante a função de mastigação.

TABELA 4
Valores de MIH, mastigação e percentual de uso com diferenciação entre gêneros para musculatura de masséteres

Nas mulheres os resultados para a lateral esquerda 43,48% (n=10) com PU entre 11-20%; 26,09% (n=6) entre 21-30%; 17,40% (n=4) entre 0-10%; 8,70% (n=2) entre 31-40% e 4,33% (n=1) entre 81-90%. Em musculatura lateral direita, 47,83% (n=11) com o PU entre 11-20%; 26,09% (n=6) entre 0-10%; 13,05% (n=3) entre 21- 30% e 4,33% (n=1) entre 91-100%.

Nos homens em musculatura lateral esquerda 56,25% (n=9) apresentaram o PU entre 11-20%; 25,00% (n=4) entre 0-10%; 12,50% (n=2) entre 21-30% e 6,25% (n=1) com PU em 61-70%. Em musculatura lateral direita observou-se 50,00% (n=8) com PU entre 11-20%; 31,25% (n=5) entre 0-10%; 6,25% (n=1) entre 21-30%; 6,25% (n=1) entre 41-50% e 6,25% (n=1) entre 91-100%.

Na Figura 1A e 1B, abordando os resultados de pacientes dos respectivos gêneros em sua musculatura de temporais esquerdo e direito, observou-se traçado bem linear, com apresentação variando entre 6,1-22,6% para os homens e de 5,7-25,9% de uso para as mulheres. Mostrou exceção nos valores em uma única pessoa com pior condição elétrica muscular em temporal esquerdo, 98,8% das fibras musculares para o exercício mastigatório e 65,1% delas para temporal direita.

FIGURA 1
A) Delineamento pelo uso de músculos temporais do grupo masculino; B) delineamento pelo uso de músculos temporais do grupo feminino

Na Figura 2A e 2B, abordando os resultados de pacientes dos respectivos gêneros, em sua musculatura de masséteres esquerdo e direito, observou-se traçado bem linear, com apresentação variando entre 6,7-41,0% para os homens e de 7,6-40,6% de uso para as mulheres, porém também apresentando exceção. Houve também uma exceção em seus valores, coincidindo com o mesmo paciente do sexo masculino da Figura 1A, apresentando em masseter esquerdo o valor de 67,4% e em direito, chegando aos 100% de utilização das fibras para a função mastigatória.

Quanto às mulheres, uma paciente apresentou pior condição elétrica muscular em masseter esquerdo, 82,1% e em masseter direito, 98,8% para a mesma função executada.

FIGURA 2
A) Delineamento pelo uso de músculos masséteres do grupo masculino; B) delineamento pelo uso de músculos masséteres do grupo feminino

DISCUSSÃO

Sabe-se que a atividade elétrica é um número pessoal e intransferível, representado pelo valor de 100% para a coleta de carga máxima de cada indivíduo. Ao se estabelecer essa máxima e transformá-la em PU adquiriu-se a constatação do fato de que os pacientes, quando analisados em seu percentual de uso para a mastigação, encontrou-se faixa de concentração envolvendo de 11-20%, fato este que possibilita a comparação entre grupos sem descaracterizar o valor único coletado de cada indivíduo.

Diante dos resultados apresentados fica evidente o número maior de pacientes em atividade elétrica de fibras musculares dentro de percentual de uso variando entre 11-20%, coincidindo esse valor em ambos os gêneros.

Pesquisas corroboram com a ideia de que a média de atividade muscular, coletada através da eletromiografia de superfície, aumenta proporcionalmente à resistência do alimento oferecido para a mastigação88. Horio T, Kawamura Y. Effects of texture of food on chewing patterns in the human subject. J Oral Rehabil. 1989 Mar; 16 (2):177-83.,1010. Mioche L, Bourdiol P, Martin JF, Noël Y. Variations in human masseter and temporalis muscle activity related to food texture during free and side-imposed mastication. Arch Oral Biol. 1999 Dec; 44(12):1005-12.,1111. Mioche L, Bourdiol P, Monier S. Gum formation behavior during chewing and meatloaf with different textures. Arch Oral Biol. 2003 Mar; 48 (3):193-200.,1212. Muñoz GC, Silva C, Misaki JK, Gomes ICD, Carvalho ARR. Análise dos potenciais elétricos do músculo masseter durante a mastigação de alimentos com rigidez variada. Rev. CEFAC, São Paulo, v. 6, n. 2, 127-34, abr-jun, 2004.,1717. Peyron MA, Lassauzay C, Woda A. Effects of increased hardness on jaw movement and muscle activity during chewing of visco-elastic model foods. Exp Brain Res. 2002 Jan; 142 (1):41-51.,2525. Shiau YY, Peng CC, Hsu CW. Evaluation of biting performance with standardized test foods. J Oral Rehabil. 1999 May; 26(5):447-52.. Observou-se ainda que há variação dos valores da atividade muscular do masseter de acordo com o volume de alimento administrado44. Diaz-Tay J, Jayasinghe N, Lucas PW, McCallum JC, Jones JT. Association between surface electromyography of human jaw closing muscle and quantified food breakdown. Arch Oral Biol. 1991; 36 (12):893-8..

Estudos relatam a abordagem da utilização da EMG'S na fonoaudiologia em pacientes com alterações dentofaciais que demonstraram redução de potenciais elétricos durante o ato mastigatório, diminuição da força máxima de contração e reduzidas performances dos músculos envolvidos na função mastigatória1313. Nakata Y, Ueda HM, Kato M, Tabe H, Shikata-Wakisaka N, Matsumoto E, Koh M, Tanaka E, Tanne K. Change in stomatognathic function induced by orthognathic surgery in patients with mandibular prognathism. J Oral Maxillofac Surg. 2007;65(3):444-51.,2424. Sforza C, Peretta R, Grandi G, Ferronato G, Ferrario VF. Soft tissue facial planes and masticatory muscle function in skeletal class III patients before and after orthognatic surgery treatment. J Oral Maxillofac Surg. 2008;66(4):691-8..

Já foi constatado1919. Rahal A, Goffi-Gomez MVS. Estudo eletromiográfico do músculo masseter durante o apertamento dentário e mastigação habitual em adultos com oclusão dentária normal. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009; 14(2):160-4. que a diferença média entre masséteres (direito e esquerdo) durante a máxima intercuspidação, foi de 20,0 µV e para a mastigação habitual, 10,3 µV.

Em todos esses achados atentou-se a existência de diversos estudos com a mensuração da atividade elétrica tanto em população sem sintomas e disfunções como em doenças odontológicas; porém, não alcançou nenhum dado que fizesse correlação entre pacientes obesos mórbidos e seu desempenho muscular durante a mastigação, como proposto neste estudo. Pode-se, inclusive, mencionar que os métodos são diferentes, o que dificulta a comparação de resultados para que se possa delinear algo em torno do normal ou do apresentável em uma população com obesidade mórbida.

Esses dados reforçam a caracterização de aprimoramento de exercício muscular para efetivação da função mastigatória tanto na preparação como no benefício da evolução no pós-operatório de gastroplastia. Os resultados presentes devem suscitar novos estudos relacionados à gênese, manutenção e terapia, em busca de efetivação da função mastigatória, tanto no tratamento cirúrgico da obesidade como na manutenção do peso perdido em médio e longo prazo.

CONCLUSÃO

Entre 40-50% da amostra houve atividade elétrica em musculatura de masséteres e temporais com valores variáveis, e que, após transformação desse valor único e intransferível em um valor percentual, facilitou-se a comparação da carga de atividade elétrica utilizada entre o grupo, bem como obteve-se percentual de uso de fibras musculares envolvendo valores de 11-20%. Esse resultado representa uma faixa que se pode chama-la de referencial para o grupo estudado. O gênero não constituiu variável em pacientes obesos mórbidos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    18 Fev 2016
  • Aceito
    17 Maio 2016
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