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O Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros e o Estado: a profissionalização no Brasil e os limites dos modelos centrados no mercado

L'institut de l'Ordre des Avocats Brésiliens et l'État: la professionnalisation au brésil et les limites des modèles centrés sur le marché

The Institute of the Order of Brazilian Lawyers and the State: professionalization and the limits of market-centered models in brazil

Resumos

Focalizando a atuação do Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros (IOAB) entre 1843 e 1930, o artigo analisa as relações entre profissionalismo e Estado. Mostra que esta organização foi criada por um segmento de elite, composto de bacharéis em Direito, com objetivos que não se limitavam ao controle do mercado de trabalho, mas que se expandiam para o âmbito da construção do Estado, assessorando-o com sua expertise em questões de jurisprudência. Segundo a autora, a construção da moderna profissão de advogado no Brasil é um processo que começou no período imperial, a partir da abertura das Faculdades de Direito de São Paulo e de Olinda, em 1827, e da fundação IOAB, em 1843. Este processo expandiu-se com a criação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em 1930, e consolidou-se com as lutas pela preservação da autonomia da OAB, em face das tentativas de intervenção do Estado, em 1955, e novamente entre 1968 e 1978, sob o regime militar.

Profissões; Construção do Estado; Advogados; Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros; Mercado de trabalho


S'attachant au rôle joué par l'Institut de l'Ordre des Avocats Brésiliens (OAB) entre 1843 et 1930, le présent article analyse les relations entre le professionnalisme et l'État. Il cherche à montrer comment cette organisation a été créée par un segment de l'élite - des bacheliers en droit - suivant des objectifs qui ne se limitaient pas au contrôle du marché du travail, mais qui avaient en vue la construction de l'État. L'OAB a eu un rôle actif dans la formation de l'État grâce à son expertise sur des questions de jurisprudence. Ce travail considère la modernisation de la profession d'avocat au Brésil comme un processus qui a commencé pendant l'Empire, à la suite de la création des Facultés de Droit des villes de São Paulo et de Olinda en 1827 et de la fondation, en 1843, de l'IOAB. Ce processus s'est développé grâce à la création de l'Ordre des Avocats du Brésil (OAB) en 1930, et s'est consolidé à travers la lutte pour la préservation de l'autonomie de l'OAB face à des tentatives d'intervention de l'État en 1955 et, à nouveau, sous le régime militaire, entre 1968 et 1978.

Professions; Construction de l'État; Avocats; Institut de l'Ordre des Avocats Brésiliens; Marché de travail


Focusing on the Institute of the Order of Brazilian Lawyers between 1843 and 1930, the article analyzes relations between professionalism and the state. It argues that this organization was created by a segment of the elite trained at law schools who wanted to do more than just control the labor market. This group was also active in the construction of the state, providing expert advice on matters of jurisprudence. This paper treats the construction of the modern Brazilian law profession as a process that began under the monarchy with the foundation of law schools in São Paulo and Olinda in 1827 and the establishing of the IOAB in 1843. This process expanded with the creation of the Order of Brazilian Lawyers (OAB) in 1930 and was consolidated through struggles to preserve the OAB's autonomy against attempts at state intervention during 1955, and again between 1968 and 1978 under the military regime.

Professions; Construction of the State; Lawyers; Institute of the Order of Brazilian Lawyers (IOAB); Labor market


O INSTITUTO DA ORDEM DOS ADVOGADOS BRASILEIROS E O ESTADO:

a profissionalização no Brasil e os limites dos modelos centrados no mercado* * Este trabalho foi desenvolvido junto ao Núcleo de Pesquisa e Documentação José Albertino Rodrigues, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), e contou com recursos financeiros do CNPq e da FAPESP. Agradeço o apoio recebido do IAB, através de seus funcionários, em especial da bibliotecária Angela Ribeiro.

Maria da Gloria Bonelli

Este artigo apresenta uma análise do processo de profissionalização dos bacharéis-advogados no Brasil, durante o período imperial. Centra-se na investigação sobre o Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros (IOAB), fundado em 1843, na trajetória que esta organização percorreu até 1930,1 1 Ano de criação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), com poder de regulamentar a profissão, através de um decreto de Getúlio Vargas, que chegara à Presidência da República liderando a Revolução de 1930. perseguindo um projeto de profissionalização que articulava a influência sobre o Estado no âmbito técnico-jurídico com o monopólio profissional. Meu argumento é que a construção da profissão ocorreu simultaneamente à construção do Estado, no contexto posterior à Independência, como uma via de mão dupla interdependente. Partindo da visão de que profissão é um processo, pretendo mostrar como os bacharéis se foram demarcando de outras elites, tomando como referência a sua expertise para fundamentar a indispensabilidade de sua assessoria ao Estado. Outro aspecto central em meu argumento é apontar os limites tanto dos modelos que priorizam analisar as profissões no mercado de trabalho, quanto daqueles que as concebem como um projeto de mobilidade social coletiva, para a compreensão da experiência brasileira no campo do Direito.

A bibliografia da Sociologia das Profissões na década de 70 foi feita, em parte, por uma geração que viveu o clima de contestação de 1968. Daí o predomínio de um olhar que focalizava o fenômeno profissional de forma crítica, vinculando o ideal de serviço à construção de uma ideologia que fornecia as bases de legitimação dos poderes profissionais e do monopólio de mercado. Magali Larson (1977) expandiu esta visão para incluir no tipo ideal2 2 Profissão vem sendo pensada como um tipo ideal de organização social do trabalho que se diferencia de outras formas, como, por exemplo, a da livre-concorrência e a burocrática. Embora inserida no princípio ocupacional, ela contrasta com outras ocupações que se representariam na divisão social do trabalho por outros tipos ideais. Uma parte central da discussão envolve a construção de algum consenso sobre as características que definiriam as profissões, estabelecendo-se as fronteiras deste tipo ideal em relação às demais ocupações. de profissionalização um processo duplo de controle de mercado e de mobilidade social coletiva. Como meu propósito é apontar os limites da abordagem das profissões no mercado para a compreensão do caso brasileiro, vou detalhar minha crítica à perspectiva desta autora, que englobou os dois aspectos no modelo que propôs.

O estudo de Larson investigou a Medicina e a Engenharia nos Estados Unidos e na Inglaterra a partir do século XIX, quando, segundo a autora, ter-se-ia iniciado o processo de profissionalização moderno, centrado na organização de escolas superiores e de associações profissionais autônomas. Ambas introduziam uma nova forma de estruturar a divisão social do trabalho de dominação, desta vez apoiada no conhecimento abstrato para produzir profissionais e no monopólio do mercado. Larson vincula esta meta à expansão dos segmentos médios, que se teriam organizado desta forma para substituir o domínio das elites aristocráticas que controlavam clientelisticamente o acesso às credenciais, títulos e postos, obtidos tradicionalmente, até o século XVIII, em corporações como as guildas, Inns of Courts e Royal Colleges. As profissões seriam fenômenos modernos do século XIX, formados junto com o capitalismo, o início da industrialização e com a classe média nos países de origem anglo-saxã.

A autora também quer refinar o tipo ideal para a análise das profissões, tomando uma postura crítica em relação à proposta funcionalista. Esta basear-se-ia na investigação das variáveis necessárias para se completar com sucesso o processo de profissionalização, enquanto Larson pretenderia recorrer a um tipo ideal capaz de captar o que as profissões efetivamente são.

Meu argumento é que as motivações que Larson identifica para explicar a profissionalização — projeto de mobilidade coletiva de grupos médios e de controle de mercado — descaracterizam seu modelo como típico-ideal, por perder a dimensão de generalização que lhe é indispensável. O constructo de profissão como tipo ideal não pode se limitar a ficar excluindo uma multiplicidade de experiências do âmbito do modelo, como acontece com a visão que atrela o profissionalismo à ascensão social.

Um tipo ideal capaz de dar solidez teórica à definição de profissão3 3 Tomo como base para definir profissão: (1) a produção de saber abstrato, com monopólio sobre uma área especializada do conhecimento; (2) a autonomia profissional para realizar diagnósticos; (3) o controle do mercado através do credenciamento; (4) obtenção das credenciais no ensino superior. Essa definição considera as profissões como tipo ideal, respeitando as características weberianas de: ser genérico o suficiente para captar a diversidade das experiências, preservar o significado heurístico do termo, sistematizar a realidade histórico-empírica e possibilitar um processo permanente de reinterpretação. O processo reinterpretativo seria uma alternativa às visões que lidam com o tipo ideal como um enquadramento da realidade, rotulando se há um retrocesso ou esgotamento do fenômeno profissional em vez de reanalisar a formação do tipo ideal de profissão. Ver o capítulo "Definições de sociologia e de ação social" em Weber (1978) e Käsler (1988). tem de considerar experiências como a brasileira, onde a profissionalização dos bacharéis foi iniciada por segmentos sociais de elite (e não por setores médios querendo ascender coletivamente) com uma proposta de influenciar o Estado mediante o seu conhecimento sobre jurisprudência (e não apenas de controlar o mercado). No Brasil, no contexto pós-independência, foram criadas as faculdades de Direito de São Paulo e de Olinda, em 1827, e após a Regência, em 1843, um pequeno grupo da elite dos bacharéis fundou o IOAB, revelando a circulação internacional de idéias no universo das profissões, com a tendência à difusão da ideologia do profissionalismo, mesmo que adaptada aos limites e aos incentivos locais.4 4 Dezalay e Garth (1995) concebem a circulação internacional de idéias entre os profissionais como um condicionante do campo do Direito, atuando para estabelecer fronteiras, estruturas, e orientando as estratégias implementadas pelos atores nacionais. Se a ausência de um contingente médio com acesso ao ensino superior constrangeu o modelo de profissionalização motivado pela mobilidade, redirecionando-o para o âmbito do poder, a constituição do Estado brasileiro simultaneamente à constituição das profissões modernas colocou na pauta dessa elite a importância de se organizar para influenciar o processo político em curso, além da preocupação com o controle do mercado de trabalho e com a contenção da participação de outros segmentos sociais nesta carreira.

Ao reconhecer que a profissionalização é um processo, procuro analisar como ela se desenvolveu no campo do Direito no Brasil, conquistando espaços na consolidação do profissionalismo. O ponto de partida foi a criação dos cursos superiores e a fundação do IOAB, centrada no ideal de serviço e na proposta de auxiliar o Estado nas questões técnico-jurídicas. As lideranças dessa associação disputaram jurisdições para obter o monopólio do credenciamento profissional e a fiscalização do mercado de trabalho, não perdendo de vista seu mérito profissional e a sua autonomia quando esta questão entrou em pauta. Tal caminho foi percorrido lentamente e sofreu ameaças de reveses. Como se trata de um processo histórico de longa duração, desqualificar o início da trajetória da moderna experiência de profissionalização, como faz Barbosa (1998),5 5 "Nossos bacharéis, cuja formação acadêmica foi muito bem caracterizada por Sérgio Adorno (1988), não poderiam, a não ser muito grosseiramente, ser tratados como profissionais. A base de afirmação e de legitimação de seu poder, o ponto de partida da sua atuação não era o seu saber, o seu conhecimento dos meandros da legislação, como ocorre com seus colegas atuais, mas a sua situação de classe, o seu patrimônio familiar de relações sociais e políticas. No máximo, poderíamos aproximá-los das profissões de status (cf. Elliott, 1975), características da Inglaterra até o século XVIII. Nada a ver com as modernas profissões que são a base dos atuais sistemas de estratificação." (Barbosa, 1998, p. 133). tem como conseqüência ignorar parte desta história. Se hoje temos conhecimento dos resultados alcançados até agora em vários desses percursos, não podemos pressupor que a profissionalização era um projeto consciente desenvolvido conforme planejado por suas lideranças, que incluíam nele todos os atributos que os modelos analíticos construíram depois. Várias das características que hoje reconhecemos como relevantes para as profissões não foram pensadas assim quando o processo estava no início. O olhar prospectivo sobre a profissionalização dos advogados no Brasil dá transparência aos equívocos das análises retrospectivas, que acabam excluindo o período imperial do âmbito de sua investigação.

Por outro lado, limitar o fenômeno profissional aos países de origem anglo-saxã é mais uma evidência da fragilidade dos modelos analíticos centrados no mercado de trabalho, que não conseguem lidar com a diversidade das experiências de profissionalização. Desta forma, opta-se por uma definição estreita deste processo, visando proteger a abordagem de críticas e tornar a análise aparentemente consistente. Se este caminho resolve o problema da articulação interna de um trabalho ou modelo, ele não colabora para construir um conceito de profissão cujo poder de generalização se sobreponha a barreiras culturais, nacionais e geopolíticas. Na literatura internacional da Sociologia das Profissões é freqüente deparar-se com este subterfúgio, que reserva a aplicabilidade da terminologia a alguns países e a algumas profissões, assemelhando-se mais ao que Bourdieu chamou de disputa pelo poder de nomeação6 6 Neste caso, trata-se dos embates para a produção do senso comum douto sobre que atividades receberão o título de profissão e quais serão excluídas desta nomeação, garantindo legitimidade social a tal imposição. Ver "Espaço social e gênese das classes sociais" em Bourdieu (1989). do que à construção de um conceito científico.

Freidson (1996) está envolvido na construção de uma definição típico-ideal de profissão que dê densidade teórica ao conceito, que hoje não tem o refinamento de outros, como os de burocracia ou de classe. Este artigo inspira-se no quadro de referências que ele constrói, propondo, entretanto, cautela para não se rotular a organização e o controle jurisdicional da profissão como algo que ocorre necessariamente sem o envolvimento do Estado. É por não se investigar como os advogados interagiram com os governos para obter a regulamentação profissional através da criação da OAB que se avalia, equivocadamente, que o Estado no Brasil teve o controle sobre a jurisdição desta profissão, quebrando com a autonomia indispensável ao profissionalismo.

É com o objetivo de colaborar para a formação de um corpo teórico sólido, apoiado em estudos históricos comparados envolvendo uma gama maior de experiências, que concentro meu olhar na análise do processo de profissionalização dos bacharéis no Império e na Primeira República. A atuação dos juízes e bacharéis na construção do Estado brasileiro neste período histórico vem sendo alvo de múltiplas interpretações. Parte importante do embate atual entre Carvalho (1980 e 1997) e Graham (1997) sobre o papel desempenhado pelos juízes na construção da ordem imperial está relacionada com a problemática profissional e com a existência ou não de um ethos 7 7 Coradini (1996) faz uma discussão interessante em torno do ethos profissional e do ethos de classe para os médicos da Academia Nacional de Medicina no período imperial. Baseando-se em Monique Saint Martin, o autor propõe pensarmos o caso que ele estudou como uma situação de justaposição entre os dois modelos, resultando em um ethos híbrido, com a importação da filosofia e da tecnologia que cercam o ethos profissional para um contexto onde predominam as relações recíprocas baseadas em laços familiares e sociais típicos do ethos de classe. diferenciado para o mundo do Direito, em relação às outras elites. Além desses dois autores, Adorno (1988) focalizou os bacharéis da Faculdade de Direito de São Paulo durante o Império e Flory (1986) investigou os juízes de paz e suas relações com os juízes togados durante a Regência, estendendo sua análise até 1870.

Nenhum desses trabalhos recorreu à Sociologia das Profissões para captar o significado do processo de profissionalização para os grupos que estavam estudando.8 8 Os trabalhos de Carvalho e Adorno tomam como referência a noção de profissão como comunidade para analisar os juízes e os bacharéis. Carvalho (1980) identifica uma condição mais profissional entre os magistrados que participaram da construção do Estado imperial, diferenciando-os de outras elites. Para ele, a socialização comum no curso de Direito em Coimbra homogeneizou ideologicamente a magistratura, fator que atuou na unificação da elite e na preservação da integridade territorial brasileira diante de um contexto de fracionamento das ex-colônias espanholas da América Sul. Adorno (1988) segue na direção de Carvalho ao reconhecer como esses grupos se distinguem de outras elites, mas procura enfatizar que tal homogeneização não se deu nos bancos escolares da Faculdade de Direito de São Paulo, que na época não estava consolidada o suficiente para gerar tal identidade. Seu argumento é que foi por meio da socialização profissional nas atividades de publicista que os bacharéis partilharam valores comuns sobre o Estado e a sociedade, construindo um ideário liberal adaptado ao contexto escravocrata, com ênfase nos direitos individuais em detrimento da igualdade e com um projeto de civilizar a sociedade e superar a barbárie. Os trabalhos de Flory (1986) e de Graham (1997) vão no sentido oposto, descaracterizando a existência aqui de um ethos profissional centrado no mérito ou até mesmo de um ethos híbrido que pudesse diferenciar a conduta dos juízes daquela predominante nos outros grupos de elite, baseados nos interesses de classe, no clientelismo, nos laços familiares ou de amizade. O conhecimento especializado produzido por esta temática pode dar contribuições relevantes ao debate sobre profissões e Estado no Brasil imperial. Por outro lado, o caso brasileiro pode auxiliar a construção de um tipo ideal para a análise das profissões capaz de compreender experiências distintas e abrir suas definições, ainda presas ao modelo de profissão no mercado e ao projeto de mobilidade social coletiva de grupos médios.

As profissões do Direito e o Estado nos estudos históricos comparados

Na seção anterior foram relatadas as formas como o estudo do IOAB durante o Império e a Primeira República pode ser relevante para estabelecer os limites das concepções que centram o argumento profissional na esfera do mercado. Agora, tomaremos o caso brasileiro para problematizar algumas pré-noções existentes na literatura acerca das relações entre os advogados e o Estado. A primeira delas dificulta a comparação de experiências semelhantes às dos bacharéis no Brasil com aquelas de origem anglo-saxã a partir de um diagnóstico equivocado sobre o papel do Estado na organização da profissão. Muitos dos estudos que focalizaram o tema tomando o modelo analítico como um ideal adotaram como pressuposto que só seria considerado profissão aquelas ocupações que construíram sua força autonomamente, atribuindo um papel decisivo à associação profissional e à auto-organização do grupo (Siegrist, 1986).9 9 "The professionalization theories to which I attach most importance, as do many professionals themselves, assert that full professionalization exists only when professional organizations capable of social and political activity can themselves lay down and enforce professional regulations." (Siegrist, 1986, p. 268). Países como o Brasil, onde o Estado era visto como o instigador deste processo, não se encaixavam no modelo, o que levou ao diagnóstico de que não haviam concluído o projeto profissional.

Várias análises que focalizaram as experiências de profissionalização dos advogados nos países do Terceiro Mundo tiveram o intuito de enfatizar as aberrações que o projeto profissional criou em países não centrais.10 10 O estudo de Lynch sobre as profissões do Direito na Colômbia é uma das poucas exceções a este tipo de abordagem. A inclusão desses casos servia para ilustrar a desprofissionalização, a burocratização e a proletarização das profissões. Elas denunciavam tais condições, mas não criticavam o modelo que recorria ao poder de nomeação para caracterizar o profissionalismo.11 11 Os estudos de Luckham (1981), Dias, Luckham, Lynch e Paul (1981) e Perdomo (1981) podem ilustrar esta postura analítica. Eles também associaram o papel dos advogados nos países dependentes com a reprodução da dominação imperialista no Terceiro Mundo. Outro tipo de análise que seguiu a linha da denúncia e da crítica imperialista no campo do Direito para a América Latina focalizou os fracassos da transferência para o Brasil, durante os anos 60, do modelo norte-americano de se conceber, ensinar e praticar a advocacia, já que este obteve muito pouca receptividade entre os advogados brasileiros (Gardner, 1980).12 12 Venâncio Filho (1977) focaliza essa experiência de ajuda americana sob um prisma que prioriza as dificuldades locais, vistas pela perspectiva do participante brasileiro e não da crítica à ação estrangeira, como no olhar de Gardner. Neste contexto de enfatizar o redirecionamento da formação jurídica para áreas mais especializadas necessárias no mercado, Lima Jr., Klein e Martins (1970) realizaram a pesquisa Os advogados e o Estado.

Embora alguns destes trabalhos abordassem as relações dos advogados com o Estado, o poder de definir os conteúdos do profissionalismo tendo como base a existência de organizações autônomas com controle do mercado levou a se atribuir uma dimensão unilateral ao relacionamento com o Estado, enfatizando-se sua intervenção na autonomia dos profissionais. A investigação que desenvolvemos sobre a trajetória da organização dos advogados no Brasil revela uma relação muito mais dinâmica e complexa com o Estado do que a imaginada pela concepção acima. Fora desta polarização — ser submisso ao Estado ou controlar autonomamente a divisão do trabalho profissional —, os advogados brasileiros exploraram um amplo leque de possibilidades para influenciar o Estado nos últimos 150 anos.

Este quadro analítico começou a ser modificado com a realização de estudos comparados sobre as profissões e o Estado (Rueschmeyer, 1986). Estes estudos influíram decisivamente na abertura conceitual, favorecendo a troca mais efetiva entre as diferentes experiências de profissionalização e a produção da Sociologia das Profissões. Essa abordagem sobre as profissões do Direito quebrou com a associação exclusiva do fenômeno profissional com os países anglo-americanos, criando a oportunidade da inclusão e do reconhecimento de outras trajetórias que levaram à configuração das profissões na divisão social do trabalho, em países europeus de tradição romano-germânicas, pautados no Direito Civil. Entretanto, há visões sobre as relações entre Estado e profissões nos países do Terceiro Mundo que resistem em incluir os advogados no universo dos profissionais,13 13 O estudo das relações entre profissão e Estado na América Latina pode seguir reproduzindo os estereótipos vigentes sobre estes países na bibliografia das profissões. O trabalho de Cleaves (1987) sobre o México caracteriza as profissões mexicanas como estando em uma " preconsciousness era", rótulo que, se aplicado ao Brasil, revelará mais a violência simbólica da terminologia do que a realidade. por tomar como um ideal de modelo as experiências de sociedades desenvolvidas.

A ruptura com a concepção dualista de que, de um lado, se tem a autonomia profissional e, de outro, a intervenção do Estado, introduziu o reconhecimento de como ambos se formaram num processo interdependente em diversas experiências históricas (Johnson, 1982). A realização de estudos sobre as relações entre os advogados e o Estado norte-americano (Halliday, 1987), indo em sentido contrário à visão dominante que concebia a profissão em oposição ao Estado, vem tendo um papel decisivo na construção de uma teoria das profissões capaz de englobar uma gama maior de experiências internacionais.

Este redirecionamento do enfoque tem priorizado o papel que os advogados desempenharam e seguem desempenhando tanto na formação do Estado e na fabricação da esfera pública, quanto na inserção em comunidades e na defesa de perspectivas universalistas em diversos países (Karpik, 1988 e 1995; Halliday e Karpik, 1997; Dezalay e Garth, 1995 e 1996; Ledford, 1996), em contraste com o olhar que enfatizava apenas os advogados no mercado, mobilizados por seus interesses específicos.14 14 Esses trabalhos têm em comum um questionamento das visões que reduzem a ação dos advogados a motivações de cunho egoísta, centradas na busca de monopólios de poder, para domínios de mercados. Contrastam com o olhar sobre as profissões que caracterizou o funcionalismo por introduzirem a problemática das relações das profissões tanto com o Estado como com a política de uma maneira mais ampla. A questão, portanto, não se resume a um contraste entre altruísmo e egoísmo (preocupação com o cliente e com a qualidade do serviço versus controle e monopólio da atividade), mas ao mercado em oposição à política, ao Estado e à comunidade. O ponto a se enfatizar na atuação dos advogados diz respeito à diferença entre uma agenda voltada para pautas que representam ganhos exclusivos para o grupo e outra com propostas que visam a resultados mais universais.

A proposta analítica deste trabalho se junta a estes estudos. Utilizo as informações disponíveis sobre as relações entre profissões e Estado no Brasil para argumentar que ambos se construíram mutuamente, numa interação de mão dupla. Este olhar se diferencia daquele que identifica uma profissionalização vinda de cima como uma decorrência da relação entre Estado e profissões (Jarausch, 1990).15 15 "Instead of being inevitable, in Central Europe the progress of professionalization was repeatedly imperiled by overcrowding (among chemists) or reversed entirely by adverse policies, initiating a deprofessionalization (among lawyers and secondary-school teachers in the Third Reich). Transcending such distinctions, the evolution of the German professions differs from the Anglo-American model mainly in being state-sponsored, as `professionalization from above' in Hannes Siegrist's apt phrase. Although the bureaucratically created professions soon assumed a life of their own and began to resemble their western counterparts, their different genesis added a particular governmental flavor, which is found elsewhere on the continent as well." (Jarausch, 1990, p. 12). Nesta direção, busco reunir as evidências históricas necessárias ao enfrentamento das visões estereotipadas sobre uma quase permanente imutabilidade na trajetória desses grupos, no seu constante estágio de "professional preconsciousness" e de subserviência profissional.

Esta análise contrasta também com os diagnósticos, predominantes no Brasil no final dos anos 70, que atribuíam aos bacharéis a condição de ventríloquos dos interesses das elites econômicas ou políticas. Parte significativa das análises sociológicas desse período não identificou as profissões liberais como atores políticos com motivações próprias no contexto que estavam investigando. Pinheiro (1978), ao analisar a formação das classes médias na Primeira República (1889-1930), considerou os bacharéis como "representantes" das elites dominantes. Miceli (1981), ao examinar as elites políticas pós-30, identificou o Estado como promotor da cooptação profissional, apadrinhando os pessedistas com nomeações para postos públicos, e vinculou os bacharéis udenistas à defesa dos interesses dos grupos econômicos privados. Na perspectiva de Saes (1981), os advogados são como porta-vozes da classe média alta, sendo esta dependente da burguesia. Neste enfoque os bacharéis mudam de classe, mas não de relação.16 16 Os bacharéis são regularmente incluídos na elite dominante durante o Império. A estratificação social aparece dividida em três grupos: a classe dominante, com donos de terra e letrados; um grupo médio de homens livres, como artesãos, trabalhadores manuais, lavradores e pequenos comerciantes; e a massa subalterna de escravos (Torres, 1965). No início do período republicano já se esboça uma explicação sociológica que procura relacionar uma classe média um pouco mais numerosa com o apoio aos militares e a República que eles proclamaram. A análise de Pinheiro (1978) vai neste sentido, mas, embora ele reconheça mais estratificação, reduz a conduta política dos grupos médios às divisões internas da burguesia. Na primeira classificação acima, os bacharéis aparecem como membros da classe dominante. Na segunda, como membros de uma nova classe média, desempenhando atividades profissionais liberais, em contraste com uma classe média tradicional, da pequena produção e do pequeno comércio. Embora este conjunto de trabalhos permita identificar a estratificação interna da profissão, naquele momento, a incipiente literatura brasileira sobre o tema não estava abordando tal questão, sendo as profissões predominantemente identificadas como um bloco na estrutura de classes.

A investigação sobre o IOAB procura mostrar uma constância histórica maior no significado da ação dos profissionais do mundo do Direito, não se resumindo a uma sombra de grupos econômicos, de oligarquias políticas ou de fenômenos como o desenvolvimento. Revela também sua dinâmica interna, detectando a gênese de tensões que são recorrentes nesses 150 anos e que inviabilizam conceber o Instituto de forma monolítica.

O Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros:17 17 Até a criação da OAB, em 1930, a entidade que é hoje o Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) era chamada de Instituto da Ordem dos Advogados do Brasil (IOAB). elites profissionais entre a política e a jurisprudência ¾ 1843-1930

O IOAB foi fundado em 1843, durante o período identificado por Larson como de organização das profissões modernas.18 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). Seu estatuto lhe conferia como objetivo único a criação da Ordem dos Advogados "em proveito geral da ciência da jurisprudencia".19 19 Estatuto do IOAB, publicado na RIOAB, ano I, tomo I, n. 1, jan.-mar. 1862. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). Baseava-se no saber jurídico para legitimar o grupo como possuidor da competência para fiscalizar o mercado e punir os charlatães. Os fundadores do IOAB precisavam distinguir-se por seus méritos profissionais, já que outras instituições também podiam ocupar este lugar. A Magistratura tinha a jurisdição punitiva e o credenciamento era realizado pelos deputados, pelo ministro da Justiça e pelo monarca.

Além deste objetivo, todos os estudos sobre os bacharéis no Império apontam sua participação ativa na construção do Estado após a Independência, fornecendo as bases dos projetos de nação em debate.20 20 Além de Fagundes (1995), ver Adorno (1988), Venâncio Filho (1977) e Falcão (1984). 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). Segundo Laura Fagundes (1995, p. 5), "a fundação do IOAB, seus passos iniciais, objetivos e propostas estavam intimamente articulados às especificidades e demandas da nova nação".

As estratégias implementadas a partir de sua criação indicam que as diretorias tinham como meta estreitar os laços e a influência da associação junto ao poder. A forma de fazê-lo oscilava. Ora eles forneciam seus quadros para cargos relevantes na gestão do Estado, ora elegiam para sua presidência membros já influentes ou encarregados dos ministérios. Entretanto, nas primeiras décadas, registra-se a preocupação de seus sócios com a falta de mobilização, de importância e de influência do IOAB junto ao imperador e seus gabinetes.21 21 "Entre as instituições que têm sido criadas entre nós, e que definham por falta de proteção do Governo, nota-se sobretudo o Instituto dos Advogados. [...] Quando comparamos este Instituto com o Instituto Histórico, lamentamos que se dê tanto a um e tão pouco ao outro, quando ambos merecem igualmente." Fagundes (1995) cita estas palavras de José Martiniano de Alencar, membro do Instituto, publicadas no Diário do Rio de Janeiro, 24/10/1857. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5).

As perspectivas técnica e política estão presentes no Instituto desde sua criação, atraindo para sócios tanto bacharéis com atuação exclusiva no campo jurídico quanto outros com cargos políticos. O grupo inicial que fundou o IOAB, no Rio de Janeiro, compunha-se de 26 advogados. Seu estatuto e seu regimento foram aprovados por d. Pedro II, com a intermediação do conselheiro Francisco Alberto Teixeira de Aragão, português, com carreira judiciária, então ministro do Supremo Tribunal de Justiça.

O tamanho do grupo parece pequeno se compararmos com as informações de Flory, baseadas em artigo de Evaristo da Veiga no jornal Aurora Fluminense de 8 de março de 1830, onde estimava que "[ ] desde los magistrados profesionales hasta los aguaciles más modestos, `más de dos mil personas viven de los embrollos em Río de Janeiro'" (Fleury, 1986, p. 70). As duas faculdades de Direito criadas em 1827, em Olinda e em São Paulo, contavam, já nas turmas de 1828, com 70 alunos. A primeira geração que se juntou ao IOAB reunia também bacharéis formados em Coimbra, o que aumentava o universo potencial de quadros para aderir à organização.

Os requisitos para pertencer ao Instituto ajudam a entender essa discrepância numérica. O regimento interno estabelecia que os candidatos deveriam ser advogados com grau acadêmico, ter cidadania brasileira, possuir probidade, conhecimentos profissionais e bons costumes e ser indicados mediante proposta escrita contendo a assinatura de três membros do Conselho Diretor, ao qual seu nome seria submetido, em escrutínio secreto. Depois de aprovado como sócio efetivo, deveria pagar uma jóia de 20 mil réis,22 22 Por 20 mil réis mensais, proprietários de escravos que sabiam cozinhar alugavam os serviços deles para os interessados. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). assumir o compromisso de contribuir mensalmente com 2 mil réis e ser apresentado à assembléia geral, diante da qual faria seu juramento.

A intenção do grupo fundador era dignificar seus membros. Era esta nata de advogados que auxiliaria o Estado com sua expertise e teria a jurisdição profissional, em disputa principalmente com juízes e deputados. Para diferenciar seus sócios, essas lideranças se comprometiam a afixar o quadro nominal dos filiados nas salas de audiência da Corte do Rio de Janeiro e na Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça. Esta distinção foi elevada quando d. Pedro II concedeu o direito de uso de veste talar e de assento dentro dos cancelos dos tribunais aos membros do IOAB, na comemoração de seu primeiro aniversário.

O Instituto se pensava como uma organização da elite dos advogados e implementou um formato que lhe permitia ter controle de sua expansão. A sistemática de filiação baseava-se nas redes dessa elite, mas o campo de atuação que queria atingir expandia-se para fiscalizar, regular e moralizar o mundo da justiça que Evaristo da Veiga descrevera.23 23 Flory cita um artigo do Jornal do Commercio de 5 de fevereiro de 1836, que ilustra o espírito que fundamentou as justificativas de criação do IOAB: "El jeito del litigante es rascarle la espalda al escribiente, alegrarle el día al paje del tribunal, soportar al abogado, absorber lo que dice el letrado, elegir el abogado indicado para la defensa de acuerdo con su venalidad o talento, ofrecer favores al juez, y nunca escatimar el dinero. Sobre todo, debe tener el ojo avizor y el pie rápido; mantener la bolsa abierta y la boca cerrada." (Flory, 1986, p. 70). 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). Para resolver este paradoxo, tinha como meta organizar a Ordem dos Advogados, com poderes reguladores e punitivos sobre o conjunto dos bacharéis. Como o IOAB só tinha recursos para se fazer acatar por seus membros, que constituíam a nata da profissão, não lhe bastava aprovar internamente regras ilibadas de conduta moral e profissional para enfrentar a dimensão daqueles problemas. Na visão deles, era preciso obter junto aos poderes estabelecidos a condição legal para o desempenho de tais atribuições.

Aprovado o Instituto, o conselheiro Aragão tornou-se seu presidente honorário e Francisco Gê Acaiaba de Montezuma (depois, Visconde de Jequitinhonha) foi eleito o primeiro presidente do IOAB, ficando no cargo de 1843 a 1851. Antes de exercer este posto, Montezuma24 24 Mulato baiano nascido em 1794, filho de um traficante de escravos. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). já havia sido constituinte pela Bahia em 1823, ministro da Justiça em 1837, acumulando as pastas de ministro dos Negócios Estrangeiros e ministro plenipotenciário na Inglaterra em 1840-41.

Os fundadores não somente se ocuparam com questões da profissão; pertenciam, em sua maioria, à "nova geração da elite política brasileira que chegara ao poder no Período Regencial" (Fagundes, 1995, p. 9). Dos dez membros que assinaram a representação enviada ao governo para aprovação dos estatutos, a autora encontrou informações biográficas para oito deles, possibilitando a construção do perfil social deste grupo inicial. A maioria estava no começo da carreira. Montezuma e Aragão se diferenciavam bastante do grupo nisso. Da geração mais madura fazia parte também Caetano Alberto Soares (terceiro presidente do IOAB, 1852-57).

Dos demais, três (Nascimento Silva, Pereira Pinto e Carvalho Moreira)25 25 Compunham a geração mais jovem, além dos presidentes Carvalho Moreira e Teixeira de Freitas, José Maria Frederico de Souza Pinto (Portugal, 1806, naturalizado em 1854), Josino Nascimento Silva (Campos, RJ, 1811) e Antônio Pereira Pinto (Rio de Janeiro, 1819). Os dados biográficos foram extraídos de IAB (1988), Fagundes (1995) e Silveira (1944). 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). ocuparam cargos executivos depois da fundação do IOAB, como presidente de província, diretor da Secretaria de Justiça e ministro plenipotenciário. Carvalho Moreira, o segundo presidente, filiou-se ao Instituto com apenas 28 anos e foi eleito para dirigi-lo aos 35 anos. Ele já representa a geração de bacharéis formados no Brasil, em contraste com a precedente. Moreira ficou à frente do Instituto por pouco mais de um ano, renunciando ao cargo para ser ministro plenipotenciário nos Estados Unidos. Em 1864, recebeu o título de Barão de Penedo, permanecendo na carreira diplomática até a queda do Império.

Teixeira de Freitas26 26 Nasceu na Bahia, em 1816, filho do Barão de Itaparica. Formou-se em Olinda em 1837 desenvolveu sua carreira jurídica no Rio de Janeiro, com um perfil técnico-jurídico, não se envolvendo com a carreira política. Jurisconsulto contratado pelo governo imperial em 1855 para elaborar a Consolidação das Leis Civis, teve uma gestão curta de apenas três meses na presidência do IOAB, renunciando ao cargo em novembro de 1857, após perder uma votação na instituição, sobre a interpretação que vigoraria a respeito da condição legal dos filhos de escravas alforriadas. Seu projeto de código civil influenciou muito a elaboração do Código Civil argentino.

Como já apontado anteriormente, o IOAB tinha como meta a criação da Ordem e queria para si o papel de auxiliar do governo, emitindo pareceres sobre a organização legislativa e judiciária e sobre questões de jurisprudência. Em seus primeiros anos, quando adotou a estratégia de eleger para a presidência membros diretamente relacionados com o Estado, o Instituto obteve este reconhecimento. Mas a relação com o governo imperial foi-se tornando mais tênue e irregular, o que parece associado tanto ao fato de a presidência do Instituto passar a ser ocupada por advogados mais distantes do poder de Estado quanto por eles se identificarem com propostas por vezes discordantes das dominantes.

Das gestões de Montezuma e Carvalho Moreira, ambos afastados voluntariamente da presidência do IOAB para ocupar postos do Estado, até as gestões de Urbano Sabino Pessoa27 27 Nasceu em Pernambuco, em 1811, filho de brigadeiro. Formou-se em Olinda em 1835, ingressando na magistratura. Entre 1843 e 1848 atuou como o líder parlamentar dos "praieiros", sem ter se vinculado aos grupos mais radicais da Revolta da Praia. Foi deputado por Pernambuco na legislatura de 1864-66, dominada pela Liga Progressista, mas logo rompeu com o ministério progressista de Zacarias, indo liderar a corrente dos liberais autênticos. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). (quinto presidente, 1857-61) e Perdigão Malheiros (sexto presidente, 1861-66), os vínculos e as relações do IOAB com o governo se fragilizam.28 28 Durante a gestão de Urbano Sabino, o Ministério da Justiça, sob a direção de Nabuco de Araújo, propôs pela primeira vez que o IOAB instituísse o serviço de defesa dos réus pobres nos julgamentos criminais. Nabuco esteve à frente do Ministério até 1857. Depois disso, inicia-se uma período de lamentações sobre a situação do IOAB nas relações com o Estado. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5).

Os discursos proferidos por Caetano Soares, em 1857, e por Perdigão Malheiros,29 29 Nasceu em Minas Gerais em 1824, filho de magistrado do Supremo Tribunal de Justiça. Formou-se em São Paulo em 1849. Além da atividade como advogado no Rio e em São Paulo, foi advogado do Conselho de Estado. Após sua gestão no IOAB, elegeu-se deputado pelo Partido Conservador de Minas, para a legislatura 1869-72 e novamente em 1877. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). em 1864, refletem as mudanças nessa relação. Caetano Soares, além de agradecer enfaticamente a presença do ministro da Justiça, Nabuco de Araújo, na sessão de instalação, reforçando os vínculos e a condição do Instituto de auxiliar do governo, solicitou que este outorgasse uma regulamentação criando a Ordem dos Advogados, projeto que o Senado aprovou mas que recebeu da Câmara de Deputados vigorosa oposição, adiando-se por prazo indeterminado a discussão. O projeto apoiava-se no modelo francês e procurava carregar no discurso das vantagens morais e dos elevados fins que a Ordem traria, ao "estabelecer uma vigilancia proctetora de sua propria dignidade, e guarda fiel das disposições legislativas, que lhes são especiaes e mais apropriadas" (RIOAB, ano IV, tomo III, ns. 1-3, jan.-out. 1865, p. 34).

Caetano Soares responsabilizou a falta de regulamentação pelo esvaziamento do IOAB, e para reavivá-lo precisava da Ordem. A ela caberia, além de "cohibir os excessos e desvios dos Advogados", garantir-lhes seus direitos

[...] como o de que trata a citada Orden. L. 1o tit. 55 & 2, que dá direito ao Advogado que fôr da Relação por 4 annos, poder ser Dezembargador [direitos que] parecem desconhecidos ou olvidados indevidamente: mas um Regulamento claro, preciso, acomodado ao estado actual da civilisação moderna, que organise a corporação dos Advogados, como é de interesse publico, e se acha convenientemente estabelecido na Inglaterra, na França, e nas outras nações mais adiantadas nessa mesma civilisação, com os meios próprios de execução para fazer observar sua disciplina e Regimento interno, com as regras precisas para a manutenção de seus direitos, de suas prerogativas e privilegios inherentes ao seu cargo por interesse publico, e por isso mesmo dignos de ser mantidos na fórma da Constituição Art. 179 & 16, ainda não existe. E eis o que desejamos: o que o benemerito Ministro da Justiça presente nos póde outorgar em nome do governo, e que lhe pedimos. (RIOAB, n. 2, 1865, p. 37)

Em março de 1862, o IOAB contava com 70 membros efetivos, sendo 18 filiados na primeira década do Instituto (1844-54) e os demais matriculados a partir de 1857.30 30 "Reorganização do quadro de membros efetivos do Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, segundo a ordem de antiguidade das matrículas respectivas". RIOAB, n. 1, out.-dez. 1870. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5).

O discurso de Perdigão Malheiros voltou-se para problemas sociais como a escravidão e a liberdade individual, a imigração e a necessidade da igualdade entre brasileiros e estrangeiros no país. Defendia o equilíbrio entre os poderes Legislativo, Executivo, Moderador e Judiciário, criticando o governo por violar a independência do Judiciário e a vitaliciedade dos magistrados. Seu posicionamento diferencia-se do precedente não só na maior relevância das questões sociais introduzidas no Instituto e na crítica à "mão violenta do Poder Executivo", que "tem infringido esses preceitos,31 31 Refere-se à independência do Poder Judiciário e à perpetuidade dos magistrados. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). verdadeiros dogmas de nossa organização política", mas também numa concepção mais ampla para o papel social do IOAB (RIOAB, n. 3, 1865, p. 49).

Perdigão Malheiros renunciou à presidência do IOAB por considerar improfícua sua gestão em reavivar o Instituto. Tal decisão, contudo, é atribuída a um descontentamento seu com o fato de ter tentado apresentar seu trabalho A escravidão no Brasil nas reuniões do Instituto, "sendo constantemente dissuadido da idéia pelos colegas", que diziam que o trabalho sobre os africanos poderia "desagradar uma vontade augusta" (Fagundes, 1995, p. 97). Durante a sua gestão é fundada a Revista do Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros (RIOAB).

A mudança no padrão de relação do IOAB com o Estado aponta não só para uma questão de redes, mas também para uma postura política diferenciada e uma preocupação com questões sociais mais globais. A prática de buscar nomes de prestígio e poder junto ao Estado volta a ser implementada com a eleição de Nabuco de Araújo,32 32 Nasceu em 1813 na Bahia, filho de senador. Formou-se em Olinda em 1835. Foi magistrado, participou do jornalismo político, foi deputado em várias legislaturas, presidente da Província de São Paulo, senador pela Bahia e ministro da Justiça no Gabinete de Abaeté (1858-59) e no Gabinete de Olinda (1865-66), carreira anterior à sua presidência no IOAB. Foi nomeado conselheiro de Estado pelo Imperador. Era pai de Joaquim Nabuco. sétimo presidente do IOAB (1866-73). Sua escolha por unanimidade é justificada como um agradecimento por ele ter, durante sua estada à frente do Ministério da Justiça, encaminhado ao Legislativo a proposta de criação da Ordem dos Advogados, que seguiu encontrando dificuldades e resistências para ser aprovada pelo parlamento.

Na condição de presidente, Nabuco de Araújo viu-se com a tarefa de ajudar nas questões relativas à habilitação profissional, enquanto se aguardava a criação da Ordem. Neste sentido, propôs e encaminhou a jurisdição que reservou o exercício da profissão em juízo aos advogados e solicitadores de cidadania brasileira. Criou também a assistência judiciária, com o Instituto providenciando a defesa dos réus pobres. Foi ativo nos conflitos jurisdicionais com autoridades da Igreja, para garantir ao IOAB o papel de credenciador de advogados e solicitadores para o exercício de suas funções perante o juízo eclesiástico, que estava exigindo uma licença do bispo para habilitar advogados a atuarem nesse foro. A gestão de Nabuco de Araújo deu muita relevância à ampliação da jurisdição do IOAB, debatendo por várias reuniões um conflito entre acadêmicos advogados e um juiz-suplente municipal que havia transgredido os estatutos do IOAB, violando a liberdade de defesa, usando de força armada como coação e ofendendo "a seus collegas advogados e nelles a dignidade da classe que este Instituto é destinado a manter" (RIOAB, tomo VIII, Conferência de 21/12/1871). A decisão de censurar o juiz-suplente apoiou-se na interpretação majoritária de que ele estava sujeito ao regimento do Instituto e não só ao Poder Judiciário.

Mas, se a gestão de Nabuco ajudou o IOAB a expandir seu campo de domínio como órgão credenciador e regulador, a resistência à criação da Ordem permaneceu tanto na Câmara de Deputados, que via na Ordem quase uma concorrente, quanto em outros advogados adeptos da interpretação de que tal medida representava um atentado à condição liberal da profissão.

Nabuco de Araújo voltou a se afastar das reuniões do IOAB a partir de 1871, período marcado por mudanças no cenário político, como a criação do Partido Republicano, o realinhamento partidário e a difusão de idéias abolicionistas. Neste contexto, a direção das reuniões do IOAB foram assumidas por Saldanha Marinho,33 33 Pernambucano, nasceu em 1816, filho de capitão. Formou-se em Olinda em 1836. Iniciou carreira como promotor público no Ceará. Elegeu-se para a Câmara pela primeira vez em 1848, pelo Partido Liberal, reelegendo-se várias vezes, por diversos estados. Foi presidente da Província de São Paulo e conselheiro de Estado nomeado pelo Imperador. Foi membro ativo da Maçonaria e do movimento republicano. Com a República, elegeu-se senador e dedicou-se à Comissão de Redação da Constituição. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). que se elegeu oitavo presidente do Instituto em 1873. Se Nabuco de Araújo foi se ocupar do Partido Liberal, elegendo-se senador depois de extinta a coalizão progressista, Saldanha Marinho vai liderar o IOAB e o Partido Republicano.

A gestão de Saldanha Marinho contrasta com a anterior no que diz respeito às relações com o governo, ao peso atribuído às questões sociais e ao papel do Instituto. Saldanha Marinho presidiu o IOAB por 19 anos, participando da abolição da escravatura, do fim do Império e dos primeiros anos da República. Suas posições, distintas daquelas predominantes no âmbito do governo imperial, levavam-no a difundir uma visão do IOAB menos direcionada ao Estado e mais sintonizada com o clima político na sociedade. Trechos de seu discurso, proferido em 1875, ilustram isso:

Occupe-se elle [IOAB] sériamente das questões jurídico-sociaes que mais interessam ao paiz; trate de firmar em bases solidas a sciencia das leis, a jurisprudencia; representem aos poderes do Estado por bem de que sejam adoptadas as medidas indispensaveis á estabilidade dos direitos e á proscripção dos abusos; constitua-se vigilante do procedimento dos juizes e tribunaes — para, nas suas attribuições, stigmatisar o erro, ou o crime, e, se possivel fôr, representar ás autoridades competentes contra os que deixarem de honrar o seu encargo; esforce-se por constituir a profissão de advogado na altura e nobreza indispensaveis; esforce-se, dando o exemplo, por escoimar do fôro os mercadores da lei; satisfaça assim o fim principal de sua instituição — e bem merecerá do paiz. Senhores. São, na verdade, importantissimo e de melindrosissimo alcance, tão graves encargos, mas devem ser os do Instituto, sob pena de sua imprestabilidade, e de tornarem-se damnosos aos reaes interesses publicos. Não seja o Instituto, senhores, reduzido a uma palestra sem importancia, onde as causas perdidas, ou as pretenções desarrazoadas venham procurar amparo ou desabafo. O Instituto deve, com a maior hombridade, com o maior desinteresse, com abnegação mesmo, curar dos reparos de que o nosso direito necessita; discutir os pontos controversos e sobre os quaes se deve firmar uma regra invariável; estudar o que é mister constituir, e esforçar-se, pelos meios legaes, para que seja aperfeiçoado o corpo do nosso direito, colocando-o nas condições de bem satisfazer ás necessidades politicas e sociaes do paiz. (RIOAB, 1871 a 1880, tomo VIII, pp. 299-300)

Entretanto, muitas de suas opiniões não foram endossadas pelo Instituto, como é exemplo o debate da questão religiosa. A proposta de separação entre Igreja e Estado gerou polêmica já nos primeiros anos da gestão de Saldanha Marinho, discussão que prosseguiu até 1878. Embora ele tenha conseguido trazer o debate politizado para dentro do Instituto, o que Perdigão Malheiros tentara durante sua gestão, com a frustrada proposta de apresentar seu trabalho sobre a escravidão, o Instituto nunca deliberou sobre a questão religiosa.

O estilo crítico de Saldanha Marinho tentava quebrar com o predomínio das discussões doutrinárias no IOAB, procurando redirecionar a instituição para um papel mais ativo na sociedade. Apesar de ele ser republicano, o IOAB continuou sendo consultado pelo governo imperial até 1889, não perdendo esta atribuição. Saldanha Marinho queria alterar os estatutos da entidade, por discordar do artigo que estabelecia que a principal missão do IOAB era organizar a Ordem dos Advogados. Durante sua gestão, a reforma dos estatutos deixou o Instituto com um papel menos centrado no interesse em regulamentar a profissão, para incluir preocupações com a produção de conhecimento e de serviços para a sociedade.34 34 A versão de 1888 do Regulamento do Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros estabelece que o IOAB tem por objeto: "1) o estudo do Direito, na sua historia, no seu desenvolvimento, nas suas applicações praticas e comparação com os diversos ramos da legislação estrangeira; 2) a assistencia judiciaria". ( RIOAB, tomo XII, 1888). 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5).

A chegada da República, movimento que vinha mobilizando bacharéis desde a criação do Partido Republicano, em 1871, teve como conseqüência a desorganização do IOAB. Sua direção envolveu-se nas mudanças políticas na sociedade e as novas lideranças que vão reativá-lo são provenientes de grupos menos ocupados com a construção da nova ordem, seja por apoliticismo, seja por temerem as acusações de preservar laços com a ordem deposta.

Este período está associado a uma mudança gradual no perfil dos membros do IOAB, registrando-se a presença de sócios provenientes de segmentos sociais menos elitizados. Os discursos reforçando a distância da política e uma conduta com aparência mais técnica também favorecem a identificação dos advogados com um modelo mais próximo das "profissões modernas das classes médias" e da sua ênfase do apoliticismo e da competência científica.

Torres Neto35 35 Era fluminense, sobrinho do Visconde de Itaboraí. Graduou-se em São Paulo em 1864. Nunca exerceu cargo público, apesar do parentesco com o ministro conservador, dedicando-se à advocacia. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). foi eleito o nono presidente do IOAB (1892-93) e retomou intensamente as reuniões do Instituto durante o ano de 1892, em que se debateu a organização da justiça no Distrito Federal. A RIOAB, que foi interrompida entre 1888 e 1892,36 36 A publicação da revista do IOAB foi interrompida também entre 1894 e 1905 e novamente em 1908. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). volta a ser publicada em 1893. A partir de 1894, com Prudente de Morais na Presidência da República, a primeira gestão civil após a proclamação, os contatos do IOAB com o Estado novamente se estreitaram e o Instituto voltou a assumir a defesa dos réus pobres, facilitada pelo fato de o ministro da Justiça, Amaro Cavalcanti, ser membro do Instituto. Neste ano, sob a presidência de Machado Portella,37 37 Pernambucano, nascido em 1833, de família fidalga. Bacharelou-se em Olinda em 1855. No Império, foi presidente das províncias de Minas Gerais e da Bahia. Filiado ao Partido Conservador, foi membro da Câmara em duas legislaturas e ministro da Justiça do Gabinete de Cotegipe. Retirou-se da política com a República. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). o quadro de membros efetivos do IOAB contava com 126 matrículas. Os membros honorários eram 10 e os correspondentes eram 26.

As relações do IOAB com o governo republicano durante as presidências civis da Primeira República foram mais estreitas do que em alguns períodos do governo imperial. A prática do silêncio adotada pelo maioria dos membros do Instituto quando se enfrentava períodos de distanciamento em relação ao poder central, implementada já quando Perdigão Malheiros insistia em apresentar suas idéias sobre a escravidão, na década de 1860, foi reativada várias vezes, particularmente quando a República chega pelas mãos militares. Depois da gestão de Saldanha Marinho, esta conduta é oficializada na reforma do estatuto de 1895, que veta os pronunciamentos sob questões políticas e regulamenta a "neutralidade".38 38 O artigo 2 do Estatuto, aprovado nesta ocasião e só alterado em 1986, estabelecia:" O Instituto não emitirá juízo sobre questões de interesse privado, nem se pronunciará sobre assuntos de natureza religiosa, ou exclusivamente política". A redação em vigor hoje substituiu "exclusivamente política" por "política partidária". 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5).

Questões com conteúdo político são debatidas, mas com um discurso "científico, legal, desapaixonado". Transformam-se em problemáticas focalizadas sob o prisma do Direito, demarcando claramente a distinção com a perspectiva partidária. Os membros que vão colaborar com o Instituto e que tiveram uma participação político-partidária no Império são "purificados" deste passado, sendo apresentados como indivíduos que abandonaram a vida política e que darão contribuições relevantes para o Direito. Esta estratégia foi intensamente adotada em relação a Machado Portella, dado o seu vínculo passado com o Partido Conservador e com o Império. Nessa reconstrução das histórias individuais, enfatiza-se as experiências ilustres da trajetória acadêmica e profissional desses membros para afastar o risco de hostilização e perseguição política ao IOAB.

Temas como a Constituição, o estado de sítio, a intervenção nos estados são debatidos no Instituto, que redige suas teses ao governo, sempre com a aparência de neutralidade e rigor no cumprimento estrito da função de estudar o Direito. O discurso proferido por Bulhões de Carvalho39 39 Carioca, nasceu em 1852. Iniciou o bacharelado em São Paulo, concluindo-o em Recife em 1874. Foi professor, advogado, magistrado e político. Elegeu-se deputado provincial várias vezes e deputado geral em 1885, sempre pelo Partido Conservador. Afastou-se da política partidária com a República. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). na celebração do aniversário do Instituto e seu relatório sobre a ordem constitucional da República, ambos publicados na RIOAB, exemplificam como o IOAB passou a lidar com as questões políticas.40 40 "Esta illustre corporação, affastando cuidadosamente do seu seio todas as paixões partidarias, nunca se conservou estranha á corrente das idéas e dos sentimentos, que transformaram as nossas instituições na agitação destes ultimos annos da vida nacional. Sem retrahir-se na indifferença, tem procurado sempre esclarecer com a luz do direito os passos dos que dirigem os destinos da Nação. Não poderia envolver-se na politica sem offensa dos seus estatutos, mas não poderia tambem eximir-se do exame das questões relativas aos direitos politicos e á ordem constitucional da Republica sem perda do seu prestigio, além de faltar ao fim principal da sua missão, porque é desses direitos que dependem todos os outros. [ ] O que nos deve importar não são as theorias dos sectarios de fórmas de governo, mas sermos governados por uma constituição que faça apparecer por toda parte a ordem e não permita desapparecer em parte alguma a liberdade [ ]" ( RIOAB, tomo XVI, jul.-set. 1905). O discurso comemorativo do aniversário do IOAB está em RIOAB, tomo XVIII, out.-dez. 1906. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5).

Em substituição à estratégia implementada várias vezes durante o Império, de eleger para o Instituto membros influentes do governo com o objetivo de estreitar as relações da profissão com o Estado, durante a Primeira República, a aparência de desapego às paixões partidárias foi o recurso que predominou para se levar adiante o projeto institucional de influir nas decisões do governo. Os líderes que assumem a presidência do IOAB após Saldanha Marinho ou são advogados sem vínculos políticos-partidários, como Torres Neto, ou são ex-políticos, despidos das "paixões" de seu passado, como Machado Portella e Alvares de Azevedo. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). 41 41 Augusto Alvares de Azevedo, carioca, matriculou-se na Faculdade de Direito de São Paulo em 1863. Atuou na advocacia do Rio de Janeiro, tendo sido deputado provincial do Rio no Império. Não se tem informação se era parente do poeta Alvares de Azevedo. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5).

Entretanto, se este é o critério adotado para estreitar relações com o novo Estado, o apoliticismo não se consolida como um valor que dê identidade ao grupo. Ao analisarmos as homenagens que o Instituto faz aos sócios falecidos, temos a impressão de que as paixões pela política continuam bem vivas. Estas homenagens também fornecem algumas pistas sobre a mudança no perfil dos membros do IOAB. Em 1897, na seção "Necrologia" recentemente criada na RIOAB, a diretoria homenageia Luiz Alvares de Azevedo Macedo.42 42 Luiz Alvares de Azevedo Macedo filiou-se ao IOAB em 1857, aos 30 anos. Nasceu em Itaboraí, na então Província do Rio de Janeiro. Com a morte de seu pai, que era sargento-mór, sua mãe entregou sua educação ao Visconde de Itaboraí, de quem ele era parente. Começou o curso de bacharel em São Paulo, concluindo-o em Olinda em 1850. Deputado provincial no Rio de Janeiro entre 1854 e 1863, pelo Partido Conservador, foi juiz municipal e provedor de capelas e resíduos até a extinção destes postos, com a reforma judiciária de 1871. Foi presidente da Província de Sergipe e, em 1881, foi nomeado procurador e advogado da Câmara Municipal, aposentando-se em 1890, imediatamente após o fim do Império. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). Em 1898, elogia o conselheiro Dr. Tito Franco de Almeida43 43 Tito Franco de Almeida filiou-se ao IOAB aos 41 anos. Nasceu em Belém, em 1829, filho de um advogado português. Formou-se em Olinda em 1850. Escreveu em jornais do Norte e Nordeste. Foi deputado provincial no Pará e membro da Câmara dos Deputados entre 1856 e 1863, passando a dirigi-la quando Zacarias de Góes foi para o Ministério e Teófilo Otoni para o Senado. Em 1864 foi nomeado diretor da Secretaria de Justiça e redator do Diário Oficial, demitindo-se dessas posições em 1866. Entre 1883 e 1885 presidiu o Club da Amazônia, "criado para impulsionar a abolição". Quando da proclamação da República, era deputado e não aderiu, declarando-se monarquista. Só participou do IOAB até 1879, quando mudou-se do Rio. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). e Graciliano Aristides do Prado Pimentel.44 44 Graciliano Aristides do Prado Pimentel nasceu em Sergipe e foi membro da Câmara dos Deputados, além de presidente da Província do Maranhão. Era vinculado ao Partido Liberal e colaborava escrevendo em órgãos de imprensa ligados ao partido no Nordeste. Retirou-se da política com a proclamação da República. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). A quantidade de informações relatadas sobre os falecidos é indicativa da importância que o Instituto atribuiu a seu homenageado, o que tem paralelo com seu prestígio na sociedade. Assim, constantemente os dados disponíveis sobre os sócios falecidos são desiguais.

Os três homenageados tiveram atuação política no Império e se afastaram dos cargos públicos com a República, fato destacado nas necrologias. Os elogios de 1904-05 já começam a se referir aos falecidos que ingressaram no IOAB depois da República ou que assumiram sua liderança depois deste movimento. Assim, além das homenagens aos ex-presidentes Barão de Penedo e Torres Neto, reservam amplo espaço para celebrar as memórias do conselheiro Carlos Augusto de Carvalho45 45 Carlos de Carvalho, nascido no Rio em 1851, já havia sido, no Império, chefe de polícia e presidente da Província do Paraná, ambos entre 1878 e 1885. Seu pai fora tenente-coronel e chefiara a comissão de engenheiros na Guerra do Paraguai. Formou-se em São Paulo em 1871. Foi ministro das Relações Exteriores por 15 dias, no governo do marechal Floriano Peixoto, em 1893, renunciando ao cargo por discordâncias com o governo. Ainda em 1893 filiou-se ao IOAB, com 41 anos. Prudente de Moraes o reconduziu ao mesmo posto quando assumiu a Presidência da República. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). e de José Izidoro Martins Junior,46 46 José Izidro Martins Filho nasceu em Pernambuco em 1860. Vinha de uma família de menos recursos. Seu avô materno, que era professor, o educou durante os estudos primários. Formou-se em Recife em 1883. Com dificuldades financeiras para sobreviver da advocacia, começou a lecionar em colégios e no ensino particular, conseguindo, em 1888, dar algumas aulas como lente na Faculdade de Direito. Com a República, foi efetivado nesta posição e nomeado depois para o cargo de chefe de polícia. Foi diretor da Faculdade de Direito de Olinda e representou Pernambuco na Câmara de Deputados. No Rio, foi professor da Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais, além de deputado e advogado. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). que tiveram participação política na Primeira República. Recebem elogios menores outros seis membros falecidos. Entre eles, observa-se o destaque àquele que teve atuação acadêmica, dando-se relevância à cultura jurídica.47 47 É o caso da homenagem a João Pereira Monteiro, genro do membro honorário de São Paulo, conselheiro Manoel Antonio Duarte de Azevedo. João Pereira Monteiro nasceu no Rio e formou-se em São Paulo em 1872. Advogou no Rio até 1882, quando se mudou para São Paulo e prestou concurso para lente substituto da Faculdade de Direito. Em 1883 foi nomeado professor catedrático de Teoria e Prática Forense. Foi vice-diretor e diretor da Faculdade de Direito de São Paulo. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). Para José Bonifacio Burlamaqui Moura, a necrologia só noticia o falecimento "(d)este nosso digno collega, ainda joven e desejoso de distinguir-se nas lides forenses". Lydio M. de Albuquerque é apresentado como um advogado proveniente de família numerosa e sem recursos que, superando muitas dificuldades, conseguiu "adiantado em anos" formar-se na Faculdade de Direito de Recife.

Apesar da ênfase no discurso apolítico e nas distinções da cultura jurídica, os membros com carreiras políticas durante a Primeira República são os que recebem mais reverência e homenagem quando falecem. A composição social do IOAB nesse contexto em que se enfatizam o brilhantismo, a erudição, o cultivo das belas letras, os recursos oratórios e a escrita magistral mostra-se mais aberta aos novos ares da República, materializada no registro do esforço de ascensão social entre alguns de seus membros.

Neste clima, a figura de Teixeira de Freitas, que desapareceu da história do IOAB por 50 anos,48 48 A admiração pela vasta cultura jurídica de Teixeira de Freitas, muito difundida na Argentina, só começou a ser divulgada no IOAB em 1905, quando lhe homenagearam com um monumento. Por meio século ele ficou apagado da memória institucional. Em 1929 Levi Carneiro criou a Medalha Teixeira de Freitas, distinguindo anualmente o jurista de maior destaque. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). não sendo incluída na lista de seus ex-presidentes, vai ser revigorada como um símbolo de jurisconsulto de dimensão internacional. Ele volta a ganhar destaque no Instituto em dois momentos marcados pela necessidade de se enfatizar a relevância do IOAB como fomentador da cultura jurídica, identidade e imagem pública que estavam buscando consolidar.

O regulamento a favor da neutralidade seguiu predominando e gerando conflitos internos até o final do período. Quando, em função da Primeira Guerra Mundial, 21 membros propuseram que o IOAB manifestasse seu apoio ao governo da República na declaração do estado de guerra entre Brasil e Argentina, o então presidente Rodrigo Otávio49 49 Nasceu em Campinas em 1866, filho de advogado. Formou-se em São Paulo em 1886. Ingressou no IOAB aos 26 anos. Advogou no Rio de Janeiro. Com a mudança de regime, ingressou na Procuradoria da República no Distrito Federal e foi secretário da Presidência, com Prudente de Moraes, até 1896. Em 1911, foi nomeado consultor-geral da República pelo marechal Hermes da Fonseca, permanecendo no cargo até ir para o Supremo, nomeado por Washington Luiz, em 1929. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). não submeteu a questão a decisão por considerá-la anti-regimental (Fagundes, 1995, p. 151). Essa postura de não se votar questões políticas vai estar sujeita a manipulações ideológicas sobre seu conteúdo. Em alguns contextos, posicionar-se sobre a Constituição será tido como função técnica do IOAB; em outros momentos, será considerado anti-regimental.

Os elogios aos mortos vão seguir destacando aqueles que ocuparam cargos políticos na República, mas o tom agora está impregnado de sentimentos de desilusão com a política, dando ênfase ainda maior ao conhecimento e à inteligência dos falecidos. Os relatos sobre as origens sociais dos membros vão deixando de ser mencionados com mais freqüência, dando-se destaque ao brilhantismo jurídico e às posições ocupadas na carreira, o que evidencia o avanço da participação dos advogados provenientes dos estratos médios. As homenagens tentam consolidar uma identidade do grupo em que a cultura jurídica predomina sobre a atividade política, mas o que esses elogios manifestam é uma desilusão muito mais freqüente com os cargos eletivos do que com a carreira de nomeações para cargos públicos. As nomeações são associadas ao mérito do falecido.

Na trajetória do IOAB percebe-se uma tendência a priorizar a construção da organização nos momentos em que ele se encontra menos ocupado com sua participação na política, o que coincide com as suas desilusões nesta esfera. Nessas ocasiões, o IOAB intensifica sua ação em prol da Ordem dos Advogados. Durante todo o Império, a tentativa de criá-la fracassou porque predominara entre os parlamentares uma visão de que tal iniciativa se assemelhava à organização de um novo Senado vitalício. Com a retomada dos governos civis na Primeira República, o Instituto obtém apoio para a OAB junto ao Executivo, mas novamente vê seu projeto adiado indefinidamente pelo Congresso. A proposta fora considerada incompatível com o sistema constitucional vigente, dada sua ênfase na liberdade, na autonomia dos estados e na descentralização.

Em 1917 o IOAB decide criar um Conselho da Ordem, com um papel regenerador da profissão, antecipando, na prática, a função que oficialmente caberia à OAB, com poderes disciplinares limitados a seus sócios e não ao contingente dos bacharéis. Tal mecanismo de auto-regulação foi implementado inicialmente como uma deliberação voluntária de seus membros. Como a OAB é criada, em 1930, por Getúlio Vargas, ela acaba sendo tratada na bibliografia apenas como uma iniciativa da política corporativa de seu governo, e não como uma proposta de profissionais que, finalmente, obtêm sucesso na estratégia que vinham implementando por várias décadas. No discurso de instalação do primeiro Conselho da Ordem, o presidente do IOAB, Rodrigo Otávio, afirmaria:

Nesses mezes ultimos, esta benemerita Associação viu consideralmente augmentado o numero de seus membros; e o movimento não cessou, numa intensidade de que a nossa historia não registra exemplo, mesmo approximado. E a cirscunstancia de coincidir esse tão consideravel numero de adhesões com a constituição do Conselho da ordem, que vem exercer acção disciplinar sobre os advogados que se inscreverem no quadro do Instituto, bem denota que estaes animados do são espirito de vos orientardes no desenvolvimento de vossa actividade profissional pelas linhas tradicionaes da correcção proverbial de nossos maiores. Ereis inteiramente livres no exercicio de vossa profissão; viestes voluntariamente vos abrigar a esta casa; e esse abrigo se vos traz a procteção da vida commum, do esforço conjuncto; do prestigio da confraternidade, vos submette ao mesmo tempo á autoridade disciplinar do Conselho, á censura dos mais velhos, á sancção dos mais experimentados. (RIOAB, vol. III, n. 5, 1927)

Há uma clara intencionalidade por parte dos membros do IOAB em criar uma corporação com poder de controlar o mercado antes de Vargas chegar à Presidência da República. A fundamentação para a instalação da Ordem é de caráter moral, embora trouxesse ganhos materiais. Tal como durante o Império, a OAB continuou dependendo de uma medida legal não aprovada no Congresso, nem efetivamente encaminhada pelo governo. Em 1910, o Instituto aumentou as exigências para o ingresso em seus quadros. Seu regimento é alterado, passando de dois para quatro anos o período de exercício profissional necessário para ingressar no IOAB. Mesmo assim, o contingente de filiados em 1930 já era um grupo maior, com 328 membros efetivos, 61 avulsos,50 50 Levi Carneiro propôs uma reforma dos estatutos em 1928, criando os sócios avulsos, para expandir o quadro do IOAB. Nesta categoria entraram aqueles membros da magistratura ou juristas que não estavam exercendo a advocacia. 18 "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5). 135 correspondentes (82 nacionais e 53 estrangeiros) e 69 sócios honorários

O que dificultava muito a aprovação da proposta de criação da Ordem era o fato de ela vir a atuar num campo onde o Legislativo e o Judiciário já ocupavam espaços, com forte resistência a ceder sua jurisdição. O IOAB seguiu enfatizando sua competência nesta área. Na Primeira República, protestou contra a prática de credenciamento de advogados pela Câmara, acusando-a de "forjar bacharéis por simples ato legislativo [...] nascidos dos arranjos da politicagem". (RIOAB, n. 5, 1927, p. 16). Quanto à fiscalização do exercício profissional, propunha o conselho de disciplina dos advogados como auxiliar da autoridade judiciária para o efetivo desempenho da tarefa que não estava sendo executada. O Instituto buscava o apoio da magistratura enfatizando a autonomia da classe, sujeita a seu próprio controle. O código de ética profissional, aprovado em 1926, deu muita atenção às relações entre advogados e juízes.

A proposta da Ordem era entendida, em alguns grupos, como incompatível com a Constituição que enfatizava a liberdade. Aprofundando a interpretação mais liberal destes princípios, o Rio Grande do Sul vetava a obrigatoriedade de diploma para a prática profissional. Neste clima, a direção do IOAB procurou pôr em prática a alternativa da Federação dos Advogados Brasileiros, apoiada na adesão dos institutos estaduais. A proposta, reavivada na celebração do 86o aniversário do IOAB, em 1929, contava com o apoio dos institutos estaduais existentes, que eram os do Rio Grande do Sul, Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia, Pernambuco, Sergipe e Maranhão.

A OAB vai surgir, pois, quase 90 anos depois da fundação do IOAB, que tinha como meta principal a sua criação, num contexto onde se articulam (a) a substituição de uma linha política descentralizada e mais hostil à proposta da Ordem por uma política centralizadora e corporativa, (b) as redes de relações do Instituto com Vargas e Oswaldo Aranha e (c) o crescimento da estrutura organizacional dos advogados.

André de Faria Pereira, membro do IOAB, assume a paternidade da OAB, muitas vezes atribuída a Levi Carneiro, que, nomeado consultor-geral da República por Vargas, emitiu o parecer que regulamentou a Ordem em 1931.

[ ] Surpreendido com a minha reintegração, por decreto da Junta Governativa de 30 de outubro de 1930, no cargo de Procurador-Geral do Distrito Federal, de que fora ilegalmente exonerado pelo Presidente Washington Luiz, sugeri a Oswaldo Aranha, logo que ele assumiu o cargo de Ministro da Justiça, do Governo Provisório, a necessidade de se modificar a organização da então Corte de Apelação, visando normalizar os seus serviços e aumentar a produtividade de seus julgamentos. Concordando com a idéia, pediu-me o Ministro que organizasse um projeto de decreto e eu, conhecendo bem, como antigo sócio do Instituto dos Advogados, a velha aspiração dos advogados e as baldadas tentativas para sua realização, bem como, impressionado com o desprestígio a que descera a classe, preparei o projeto e incluí nele o dispositivo do art. 17, criando a Ordem dos Advogados, e o submeti à crítica de um único colega, hoje respeitado Ministro do Supremo Tribunal Federal — Edgar Costa, que sugeriu algumas medidas, que foram adotadas, entre elas, a de supressão do julgamento secreto, na Corte de Apelação, antes introduzida na legislação.

Levei o projeto a Oswaldo Aranha, que lhe fez uma única restrição, exatamente no artigo 17, que criava a Ordem dos Advogados, dizendo não dever a Revolução conceder privilégios, ao que ponderei que a instituição da Ordem traria, ao contrário, restrições aos direitos dos advogados e que, se privilégio houvesse, seria o da dignidade e da cultura.

Discutíamos, o Ministro e eu, esse ponto, do projeto, quando chegou Solano Carneiro da Cunha, como eu, depositário da amizade e confiança de Oswaldo Aranha, que, felicitando-me pela oportunidade da idéia, reforçou meus argumentos, aceitando o Ministro, integralmente, o projeto, levando-o, na mesma tarde, ao Chefe do Governo Provisório, que o assinou, imediatamente, sem modificação de uma vírgula[...] 51 51 Carta endereçada a Haroldo Valladão, presidente da OAB, em 21/11/1950, por André de Faria Pereira, com o objetivo de tornar público o episódio acima. Extraído de Venâncio Filho (1977, pp. 23-24).

Com a Revolução de 1930, as relações do IOAB com o Estado, a questão do posicionamento político da instituição, sua pauta de interesses específicos e de propostas universalistas vão ser mediadas pela criação da Ordem, o que altera o quadro organizacional dos advogados no Brasil. Esta nova configuração vai articular uma estrutura da elite da profissão com outra voltada para o conjunto dos diplomados, interligando-as de várias formas.

Conclusões

O fato de o IOAB ser uma organização de participação restrita e seletiva lhe impedia de fiscalizar o conjunto dos profissionais sem estreitar suas relações com o Estado e obter dele o poder de garantir a qualidade do exercício profissional. Este formato IAB-OAB viabilizaria uma associação de elite e uma outra com controle massivo dos advogados, que a ela se filiariam obrigatoriamente. Tal arranjo institucional preservaria o padrão de profissionalismo que o IOAB valorizava e, ao mesmo tempo, englobaria o conjunto dos bacharéis, diferenciando-o da nata dos advogados.

Neste sentido, o modelo institucional adotado no Brasil inova em relação aos que foram tomados como referência, particularmente a associação portuguesa e a americana. Levi Carneiro considerou também as organizações da Itália, da França e da Bulgária. O formato aprovado aqui se diferenciava do português porque este desativara a Associação dos Advogados com a criação da Ordem, e aqui se manteve as duas organizações. Por outro lado, se os americanos criaram associações autogovernadas, de adesão voluntária e com estatutos estaduais, a OAB contaria com a adesão obrigatória, com uma regulamentação nacional, tendo a função de um serviço público federal que preservava seu autogoverno.

Após a estruturação da OAB, a autonomia profissional entra na agenda dos advogados como parte inseparável de seu projeto de profissionalização, dadas as ameaças de intervenção do Estado. Por duas vezes a OAB sofreu essas tentativas de controle e enfrentou judicialmente essas batalhas. A primeira delas ocorreu ainda no período democrático, sob o governo de Dutra, em 1955. Interpretando a condição da OAB de ser um serviço público federal, o Tribunal de Contas da União tentou submetê-la à sua fiscalização, perdendo a disputa na Justiça. A última ameaça foi sob o regime militar, em 1968, quando se propôs que a OAB fosse controlada pelo Ministério do Trabalho, como ocorreu com outras organizações profissionais. Tal processo se estendeu por quase dez anos, com a vitória da preservação da autonomia da OAB. O sucesso das estratégias de profissionalização dos bacharéis no Brasil reafirma-se diante da capacidade de manter o autogoverno da OAB em um contexto de relações adversas com o Estado.

O processo de profissionalização que se iniciou junto com a construção do Estado imperial, pelas mãos da elite dos bacharéis, articulou o controle do mercado com um projeto de Estado e de nação. Embora os segmentos médios não tenham tido participação neste período, isto não descaracteriza o IOAB e sua campanha pela criação da OAB como parte de uma história mais longa para sedimentar o profissionalismo e seu ethos no Brasil. Da mesma forma, as relações com o Estado não desfiguraram a condição profissional deste grupo. Os aspectos centrais do ethos profissional — a expertise do saber abstrato, a ênfase no mérito e a autonomia para realizar diagnósticos técnico-jurídicos — estiveram presentes desde a criação do Instituto.52 52 Coelho (1995) apresenta uma visão distinta sobre a relevância do saber abstrato e da expertise para o sucesso da profissionalização dos médicos. Em seu olhar, eles não tinham domínio do conhecimento científico nem a preferência do consumidor quando estavam reivindicando o monopólio do mercado da Medicina, no século XIX, ao combater o charlatanismo (as práticas alternativas que não se submetiam à autoridade cultural dos médicos regulares). A conquista do monopólio do mercado médico estaria relacionada às estratégias de controle das credenciais e da jurisdição profissional independente de um mérito especial. Neste cenário, a existência de um ethos profissional não estaria centrada nestas questões.

Por último, durante o período imperial e a Primeira República, alguns presidentes do IOAB trouxeram a perspectiva social e o discurso universalista para o âmbito da instituição. Desta forma, tentavam atribuir-lhe um papel mais amplo do que aquele identificado constantemente na literatura sobre o tema, que procura limitar a ação desses grupos aos seus interesses específicos ou aos interesses das elites econômicas, vinculando a sua participação no âmbito da política à exclusiva subserviência ao Estado.

As tentativas de ligar a instituição à fabricação da esfera pública foram mais intensas no Império do que na Primeira República. Neste período predominou a perspectiva de estreitar as relações com o Estado, sob uma aparente despolitização. Foi neste contexto que os bacharéis provenientes de segmentos médios ingressaram no IOAB. O Instituto chega aos anos 30 sem uma identidade definida nesta polaridade. A ênfase na sua atuação no campo da cultura jurídica, na elaboração de pareceres cultos, fundamentados, com domínio da jurisprudência, é o caminho ao qual seus membros recorrem para consolidar sentimentos comuns no grupo sempre que se desiludem com a política. Isto se coaduna também com a imagem que as profissões modernas estavam construindo nesse contexto, de se voltarem para o saber e o mérito sem apego às paixões partidárias, caracterizadas como externas à razão e ao conhecimento científico.

O IOAB lida de forma ambígua com a polaridade entre a atuação política e a ênfase na cultura jurídica despolitizada desde sua origem, tensão que se manifesta até hoje. O perfil institucional do IAB¾OAB engendra esta disputa que sofre reveses, altera-se na correlação de forças entre seus pólos constitutivos, mas não tem como desaparecer dentro desta estrutura.

Embora vários trabalhos que focalizam as profissões no Brasil tendam a identificar os advogados como o grupo "político", em contraste com os profissionais de competência mais técnica, como os economistas e os engenheiros (Schneider, 1994; Gomes, 1994; Loureiro, 1997), o embate entre essas duas tendências é originário das disputas que caracterizam o profissionalismo, no âmbito das competições intraprofissionais ou interprofissionais. Apesar de os advogados se diferenciarem de outras carreiras menos ativas na constituição da esfera pública, as tensões entre correntes políticas e técnico-jurídicas são inerentes ao IAB e hoje estão consolidadas em sua identidade institucional, legitimando tanto uma atuação político-social quanto uma atuação voltada para as questões da profissão e da jurisprudência. O debate contemporâneo no Instituto apresenta uma atualização dos conflitos do passado, com disputas entre essas duas concepções, agora marcadas, respectivamente, por uma visão de esquerda, que prega a democracia econômica e critica o Estado neoliberal, e uma visão que quer preservar para o IAB a condição de assessor do Estado, auxiliando-o com pareceres técnicos competentes. Neste embate, como os grupos politizados têm obtido bom desempenho nas eleições internas, o mérito é utilizado como recurso diferenciador, criticando-se a qualidade dos pareceres emitidos pelos profissionais com maior vínculo político e a baixa visibilidade pública das lideranças atuais.

NOTAS

BIBLIOGRAFIA

RESUMOS / ABSTRACTS / RÉSUMÉS

O INSTITUTO DA ORDEM DOS ADVOGADOS BRASILEIROS E O ESTADO: A PROFISSIONALIZAÇÃO NO BRASIL E OS LIMITES DOS MODELOS CENTRADOS NO MERCADO

Palavras-chave Profissões; Construção do Estado; Advogados; Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros; Mercado de trabalho.

Focalizando a atuação do Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros (IOAB) entre 1843 e 1930, o artigo analisa as relações entre profissionalismo e Estado. Mostra que esta organização foi criada por um segmento de elite, composto de bacharéis em Direito, com objetivos que não se limitavam ao controle do mercado de trabalho, mas que se expandiam para o âmbito da construção do Estado, assessorando-o com sua expertise em questões de jurisprudência. Segundo a autora, a construção da moderna profissão de advogado no Brasil é um processo que começou no período imperial, a partir da abertura das Faculdades de Direito de São Paulo e de Olinda, em 1827, e da fundação IOAB, em 1843. Este processo expandiu-se com a criação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em 1930, e consolidou-se com as lutas pela preservação da autonomia da OAB, em face das tentativas de intervenção do Estado, em 1955, e novamente entre 1968 e 1978, sob o regime militar.

THE INSTITUTE OF THE ORDER OF BRAZILIAN LAWYERS AND THE STATE: PROFESSIONALIZATION AND THE LIMITS OF MARKET-CENTERED MODELS IN BRAZIL

Key words Professions; Construction of the State; Lawyers; Institute of the Order of Brazilian Lawyers (IOAB); Labor market.

Focusing on the Institute of the Order of Brazilian Lawyers between 1843 and 1930, the article analyzes relations between professionalism and the state. It argues that this organization was created by a segment of the elite trained at law schools who wanted to do more than just control the labor market. This group was also active in the construction of the state, providing expert advice on matters of jurisprudence. This paper treats the construction of the modern Brazilian law profession as a process that began under the monarchy with the foundation of law schools in São Paulo and Olinda in 1827 and the establishing of the IOAB in 1843. This process expanded with the creation of the Order of Brazilian Lawyers (OAB) in 1930 and was consolidated through struggles to preserve the OAB's autonomy against attempts at state intervention during 1955, and again between 1968 and 1978 under the military regime.

L'INSTITUT DE L'ORDRE DES AVOCATS BRÉSILIENS ET L'ÉTAT: LA PROFESSIONNALISATION AU BRÉSIL ET LES LIMITES DES MODÈLES CENTRÉS SUR LE MARCHÉ

Mots-clé Professions; Construction de l'État; Avocats; Institut de l'Ordre des Avocats Brésiliens; Marché de travail.

S'attachant au rôle joué par l'Institut de l'Ordre des Avocats Brésiliens (OAB) entre 1843 et 1930, le présent article analyse les relations entre le professionnalisme et l'État. Il cherche à montrer comment cette organisation a été créée par un segment de l'élite — des bacheliers en droit — suivant des objectifs qui ne se limitaient pas au contrôle du marché du travail, mais qui avaient en vue la construction de l'État. L'OAB a eu un rôle actif dans la formation de l'État grâce à son expertise sur des questions de jurisprudence. Ce travail considère la modernisation de la profession d'avocat au Brésil comme un processus qui a commencé pendant l'Empire, à la suite de la création des Facultés de Droit des villes de São Paulo et de Olinda en 1827 et de la fondation, en 1843, de l'IOAB. Ce processus s'est développé grâce à la création de l'Ordre des Avocats du Brésil (OAB) en 1930, et s'est consolidé à travers la lutte pour la préservation de l'autonomie de l'OAB face à des tentatives d'intervention de l'État en 1955 et, à nouveau, sous le régime militaire, entre 1968 et 1978.

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  • WEBER, Max. (1978), Economy and society. Berkeley, The University of California Press.
  • 1
    Ano de criação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), com poder de regulamentar a profissão, através de um decreto de Getúlio Vargas, que chegara à Presidência da República liderando a Revolução de 1930.
  • 2
    Profissão vem sendo pensada como um tipo ideal de organização social do trabalho que se diferencia de outras formas, como, por exemplo, a da livre-concorrência e a burocrática. Embora inserida no princípio ocupacional, ela contrasta com outras ocupações que se representariam na divisão social do trabalho por outros tipos ideais. Uma parte central da discussão envolve a construção de algum consenso sobre as características que definiriam as profissões, estabelecendo-se as fronteiras deste tipo ideal em relação às demais ocupações.
  • 3
    Tomo como base para definir profissão: (1) a produção de saber abstrato, com monopólio sobre uma área especializada do conhecimento; (2) a autonomia profissional para realizar diagnósticos; (3) o controle do mercado através do credenciamento; (4) obtenção das credenciais no ensino superior. Essa definição considera as profissões como tipo ideal, respeitando as características weberianas de: ser genérico o suficiente para captar a diversidade das experiências, preservar o significado heurístico do termo, sistematizar a realidade histórico-empírica e possibilitar um processo permanente de reinterpretação. O processo reinterpretativo seria uma alternativa às visões que lidam com o tipo ideal como um enquadramento da realidade, rotulando se há um retrocesso ou esgotamento do fenômeno profissional em vez de reanalisar a formação do tipo ideal de profissão. Ver o capítulo "Definições de sociologia e de ação social" em Weber (1978) e Käsler (1988).
  • 4
    Dezalay e Garth (1995) concebem a circulação internacional de idéias entre os profissionais como um condicionante do campo do Direito, atuando para estabelecer fronteiras, estruturas, e orientando as estratégias implementadas pelos atores nacionais.
  • 5
    "Nossos bacharéis, cuja formação acadêmica foi muito bem caracterizada por Sérgio Adorno (1988), não poderiam, a não ser muito grosseiramente, ser tratados como profissionais. A base de afirmação e de legitimação de seu poder, o ponto de partida da sua atuação não era o seu saber, o seu conhecimento dos meandros da legislação, como ocorre com seus colegas atuais, mas a sua situação de classe, o seu patrimônio familiar de relações sociais e políticas. No máximo, poderíamos aproximá-los das profissões de
    status (cf. Elliott, 1975), características da Inglaterra até o século XVIII. Nada a ver com as modernas profissões que são a base dos atuais sistemas de estratificação." (Barbosa, 1998, p. 133).
  • 6
    Neste caso, trata-se dos embates para a produção do senso comum douto sobre que atividades receberão o título de profissão e quais serão excluídas desta nomeação, garantindo legitimidade social a tal imposição. Ver "Espaço social e gênese das classes sociais" em Bourdieu (1989).
  • 7
    Coradini (1996) faz uma discussão interessante em torno do
    ethos profissional e do
    ethos de classe para os médicos da Academia Nacional de Medicina no período imperial. Baseando-se em Monique Saint Martin, o autor propõe pensarmos o caso que ele estudou como uma situação de justaposição entre os dois modelos, resultando em um
    ethos híbrido, com a importação da filosofia e da tecnologia que cercam o
    ethos profissional para um contexto onde predominam as relações recíprocas baseadas em laços familiares e sociais típicos do
    ethos de classe.
  • 8
    Os trabalhos de Carvalho e Adorno tomam como referência a noção de profissão como comunidade para analisar os juízes e os bacharéis. Carvalho (1980) identifica uma condição mais profissional entre os magistrados que participaram da construção do Estado imperial, diferenciando-os de outras elites. Para ele, a socialização comum no curso de Direito em Coimbra homogeneizou ideologicamente a magistratura, fator que atuou na unificação da elite e na preservação da integridade territorial brasileira diante de um contexto de fracionamento das ex-colônias espanholas da América Sul. Adorno (1988) segue na direção de Carvalho ao reconhecer como esses grupos se distinguem de outras elites, mas procura enfatizar que tal homogeneização não se deu nos bancos escolares da Faculdade de Direito de São Paulo, que na época não estava consolidada o suficiente para gerar tal identidade. Seu argumento é que foi por meio da socialização profissional nas atividades de publicista que os bacharéis partilharam valores comuns sobre o Estado e a sociedade, construindo um ideário liberal adaptado ao contexto escravocrata, com ênfase nos direitos individuais em detrimento da igualdade e com um projeto de civilizar a sociedade e superar a barbárie. Os trabalhos de Flory (1986) e de Graham (1997) vão no sentido oposto, descaracterizando a existência aqui de um
    ethos profissional centrado no mérito ou até mesmo de um
    ethos híbrido que pudesse diferenciar a conduta dos juízes daquela predominante nos outros grupos de elite, baseados nos interesses de classe, no clientelismo, nos laços familiares ou de amizade.
  • 9
    "The professionalization theories to which I attach most importance, as do many professionals themselves, assert that full professionalization exists only when professional organizations capable of social and political activity can themselves lay down and enforce professional regulations." (Siegrist, 1986, p. 268).
  • 10
    O estudo de Lynch sobre as profissões do Direito na Colômbia é uma das poucas exceções a este tipo de abordagem.
  • 11
    Os estudos de Luckham (1981), Dias, Luckham, Lynch e Paul (1981) e Perdomo (1981) podem ilustrar esta postura analítica. Eles também associaram o papel dos advogados nos países dependentes com a reprodução da dominação imperialista no Terceiro Mundo.
  • 12
    Venâncio Filho (1977) focaliza essa experiência de ajuda americana sob um prisma que prioriza as dificuldades locais, vistas pela perspectiva do participante brasileiro e não da crítica à ação estrangeira, como no olhar de Gardner. Neste contexto de enfatizar o redirecionamento da formação jurídica para áreas mais especializadas necessárias no mercado, Lima Jr., Klein e Martins (1970) realizaram a pesquisa Os advogados e o Estado.
  • 13
    O estudo das relações entre profissão e Estado na América Latina pode seguir reproduzindo os estereótipos vigentes sobre estes países na bibliografia das profissões. O trabalho de Cleaves (1987) sobre o México caracteriza as profissões mexicanas como estando em uma "
    preconsciousness era", rótulo que, se aplicado ao Brasil, revelará mais a violência simbólica da terminologia do que a realidade.
  • 14
    Esses trabalhos têm em comum um questionamento das visões que reduzem a ação dos advogados a motivações de cunho egoísta, centradas na busca de monopólios de poder, para domínios de mercados. Contrastam com o olhar sobre as profissões que caracterizou o funcionalismo por introduzirem a problemática das relações das profissões tanto com o Estado como com a política de uma maneira mais ampla. A questão, portanto, não se resume a um contraste entre altruísmo e egoísmo (preocupação com o cliente e com a qualidade do serviço
    versus controle e monopólio da atividade), mas ao mercado em oposição à política, ao Estado e à comunidade. O ponto a se enfatizar na atuação dos advogados diz respeito à diferença entre uma agenda voltada para pautas que representam ganhos exclusivos para o grupo e outra com propostas que visam a resultados mais universais.
  • 15
    "Instead of being inevitable, in Central Europe the progress of professionalization was repeatedly imperiled by overcrowding (among chemists) or reversed entirely by adverse policies, initiating a deprofessionalization (among lawyers and secondary-school teachers in the Third Reich). Transcending such distinctions, the evolution of the German professions differs from the Anglo-American model mainly in being state-sponsored, as `professionalization from above' in Hannes Siegrist's apt phrase. Although the bureaucratically created professions soon assumed a life of their own and began to resemble their western counterparts, their different genesis added a particular governmental flavor, which is found elsewhere on the continent as well." (Jarausch, 1990, p. 12).
  • 16
    Os bacharéis são regularmente incluídos na elite dominante durante o Império. A estratificação social aparece dividida em três grupos: a classe dominante, com donos de terra e letrados; um grupo médio de homens livres, como artesãos, trabalhadores manuais, lavradores e pequenos comerciantes; e a massa subalterna de escravos (Torres, 1965). No início do período republicano já se esboça uma explicação sociológica que procura relacionar uma classe média um pouco mais numerosa com o apoio aos militares e a República que eles proclamaram. A análise de Pinheiro (1978) vai neste sentido, mas, embora ele reconheça mais estratificação, reduz a conduta política dos grupos médios às divisões internas da burguesia. Na primeira classificação acima, os bacharéis aparecem como membros da classe dominante. Na segunda, como membros de uma nova classe média, desempenhando atividades profissionais liberais, em contraste com uma classe média tradicional, da pequena produção e do pequeno comércio.
  • 17
    Até a criação da OAB, em 1930, a entidade que é hoje o Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) era chamada de Instituto da Ordem dos Advogados do Brasil (IOAB).
  • 18
    "In England and in the United States, to which I am limiting my analysis, the principal professional associations were formed in the span of two generations. In England, of the thirteen contemporary professions listed by Harold Wilensky as `established' or `in process', ten acquired an association of national scope between 1825 to 1880 — a fifty-five year span. In the United States, eleven of the same thirteen were similarly organized into national associations in forty-seven years, from 1840 to 1887." (Larson, 1977, p. 5).
  • 19
    Estatuto do IOAB, publicado na
    RIOAB, ano I, tomo I, n. 1, jan.-mar. 1862.
  • 20
    Além de Fagundes (1995), ver Adorno (1988), Venâncio Filho (1977) e Falcão (1984).
  • 21
    "Entre as instituições que têm sido criadas entre nós, e que definham por falta de proteção do Governo, nota-se sobretudo o Instituto dos Advogados. [...] Quando comparamos este Instituto com o Instituto Histórico, lamentamos que se dê tanto a um e tão pouco ao outro, quando ambos merecem igualmente." Fagundes (1995) cita estas palavras de José Martiniano de Alencar, membro do Instituto, publicadas no
    Diário do Rio de Janeiro, 24/10/1857.
  • 22
    Por 20 mil réis mensais, proprietários de escravos que sabiam cozinhar alugavam os serviços deles para os interessados.
  • 23
    Flory cita um artigo do
    Jornal do Commercio de 5 de fevereiro de 1836, que ilustra o espírito que fundamentou as justificativas de criação do IOAB: "El jeito del litigante es rascarle la espalda al escribiente, alegrarle el día al paje del tribunal, soportar al abogado, absorber lo que dice el letrado, elegir el abogado indicado para la defensa de acuerdo con su venalidad o talento, ofrecer favores al juez, y nunca escatimar el dinero. Sobre todo, debe tener el ojo avizor y el pie rápido; mantener la bolsa abierta y la boca cerrada." (Flory, 1986, p. 70).
  • 24
    Mulato baiano nascido em 1794, filho de um traficante de escravos.
  • 25
    Compunham a geração mais jovem, além dos presidentes Carvalho Moreira e Teixeira de Freitas, José Maria Frederico de Souza Pinto (Portugal, 1806, naturalizado em 1854), Josino Nascimento Silva (Campos, RJ, 1811) e Antônio Pereira Pinto (Rio de Janeiro, 1819). Os dados biográficos foram extraídos de IAB (1988), Fagundes (1995) e Silveira (1944).
  • 26
    Nasceu na Bahia, em 1816, filho do Barão de Itaparica. Formou-se em Olinda em 1837
  • 27
    Nasceu em Pernambuco, em 1811, filho de brigadeiro. Formou-se em Olinda em 1835, ingressando na magistratura. Entre 1843 e 1848 atuou como o líder parlamentar dos "praieiros", sem ter se vinculado aos grupos mais radicais da Revolta da Praia. Foi deputado por Pernambuco na legislatura de 1864-66, dominada pela Liga Progressista, mas logo rompeu com o ministério progressista de Zacarias, indo liderar a corrente dos liberais autênticos.
  • 28
    Durante a gestão de Urbano Sabino, o Ministério da Justiça, sob a direção de Nabuco de Araújo, propôs pela primeira vez que o IOAB instituísse o serviço de defesa dos réus pobres nos julgamentos criminais. Nabuco esteve à frente do Ministério até 1857. Depois disso, inicia-se uma período de lamentações sobre a situação do IOAB nas relações com o Estado.
  • 29
    Nasceu em Minas Gerais em 1824, filho de magistrado do Supremo Tribunal de Justiça. Formou-se em São Paulo em 1849. Além da atividade como advogado no Rio e em São Paulo, foi advogado do Conselho de Estado. Após sua gestão no IOAB, elegeu-se deputado pelo Partido Conservador de Minas, para a legislatura 1869-72 e novamente em 1877.
  • 30
    "Reorganização do quadro de membros efetivos do Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, segundo a ordem de antiguidade das matrículas respectivas".
    RIOAB, n. 1, out.-dez. 1870.
  • 31
    Refere-se à independência do Poder Judiciário e à perpetuidade dos magistrados.
  • 32
    Nasceu em 1813 na Bahia, filho de senador. Formou-se em Olinda em 1835. Foi magistrado, participou do jornalismo político, foi deputado em várias legislaturas, presidente da Província de São Paulo, senador pela Bahia e ministro da Justiça no Gabinete de Abaeté (1858-59) e no Gabinete de Olinda (1865-66), carreira anterior à sua presidência no IOAB. Foi nomeado conselheiro de Estado pelo Imperador. Era pai de Joaquim Nabuco.
  • 33
    Pernambucano, nasceu em 1816, filho de capitão. Formou-se em Olinda em 1836. Iniciou carreira como promotor público no Ceará. Elegeu-se para a Câmara pela primeira vez em 1848, pelo Partido Liberal, reelegendo-se várias vezes, por diversos estados. Foi presidente da Província de São Paulo e conselheiro de Estado nomeado pelo Imperador. Foi membro ativo da Maçonaria e do movimento republicano. Com a República, elegeu-se senador e dedicou-se à Comissão de Redação da Constituição.
  • 34
    A versão de 1888 do Regulamento do Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros estabelece que o IOAB tem por objeto: "1) o estudo do Direito, na sua historia, no seu desenvolvimento, nas suas applicações praticas e comparação com os diversos ramos da legislação estrangeira; 2) a assistencia judiciaria". (
    RIOAB, tomo XII, 1888).
  • 35
    Era fluminense, sobrinho do Visconde de Itaboraí. Graduou-se em São Paulo em 1864. Nunca exerceu cargo público, apesar do parentesco com o ministro conservador, dedicando-se à advocacia.
  • 36
    A publicação da revista do IOAB foi interrompida também entre 1894 e 1905 e novamente em 1908.
  • 37
    Pernambucano, nascido em 1833, de família fidalga. Bacharelou-se em Olinda em 1855. No Império, foi presidente das províncias de Minas Gerais e da Bahia. Filiado ao Partido Conservador, foi membro da Câmara em duas legislaturas e ministro da Justiça do Gabinete de Cotegipe. Retirou-se da política com a República.
  • 38
    O artigo 2 do Estatuto, aprovado nesta ocasião e só alterado em 1986, estabelecia:" O Instituto não emitirá juízo sobre questões de interesse privado, nem se pronunciará sobre assuntos de natureza religiosa, ou exclusivamente política". A redação em vigor hoje substituiu "exclusivamente política" por "política partidária".
  • 39
    Carioca, nasceu em 1852. Iniciou o bacharelado em São Paulo, concluindo-o em Recife em 1874. Foi professor, advogado, magistrado e político. Elegeu-se deputado provincial várias vezes e deputado geral em 1885, sempre pelo Partido Conservador. Afastou-se da política partidária com a República.
  • 40
    "Esta illustre corporação, affastando cuidadosamente do seu seio todas as paixões partidarias, nunca se conservou estranha á corrente das idéas e dos sentimentos, que transformaram as nossas instituições na agitação destes ultimos annos da vida nacional. Sem retrahir-se na indifferença, tem procurado sempre esclarecer com a luz do direito os passos dos que dirigem os destinos da Nação. Não poderia envolver-se na politica sem offensa dos seus estatutos, mas não poderia tambem eximir-se do exame das questões relativas aos direitos politicos e á ordem constitucional da Republica sem perda do seu prestigio, além de faltar ao fim principal da sua missão, porque é desses direitos que dependem todos os outros. [ ] O que nos deve importar não são as theorias dos sectarios de fórmas de governo, mas sermos governados por uma constituição que faça apparecer por toda parte a ordem e não permita desapparecer em parte alguma a liberdade [ ]" (
    RIOAB, tomo XVI, jul.-set. 1905). O discurso comemorativo do aniversário do IOAB está em
    RIOAB, tomo XVIII, out.-dez. 1906.
  • 41
    Augusto Alvares de Azevedo, carioca, matriculou-se na Faculdade de Direito de São Paulo em 1863. Atuou na advocacia do Rio de Janeiro, tendo sido deputado provincial do Rio no Império. Não se tem informação se era parente do poeta Alvares de Azevedo.
  • 42
    Luiz Alvares de Azevedo Macedo filiou-se ao IOAB em 1857, aos 30 anos. Nasceu em Itaboraí, na então Província do Rio de Janeiro. Com a morte de seu pai, que era sargento-mór, sua mãe entregou sua educação ao Visconde de Itaboraí, de quem ele era parente. Começou o curso de bacharel em São Paulo, concluindo-o em Olinda em 1850. Deputado provincial no Rio de Janeiro entre 1854 e 1863, pelo Partido Conservador, foi juiz municipal e provedor de capelas e resíduos até a extinção destes postos, com a reforma judiciária de 1871. Foi presidente da Província de Sergipe e, em 1881, foi nomeado procurador e advogado da Câmara Municipal, aposentando-se em 1890, imediatamente após o fim do Império.
  • 43
    Tito Franco de Almeida filiou-se ao IOAB aos 41 anos. Nasceu em Belém, em 1829, filho de um advogado português. Formou-se em Olinda em 1850. Escreveu em jornais do Norte e Nordeste. Foi deputado provincial no Pará e membro da Câmara dos Deputados entre 1856 e 1863, passando a dirigi-la quando Zacarias de Góes foi para o Ministério e Teófilo Otoni para o Senado. Em 1864 foi nomeado diretor da Secretaria de Justiça e redator do
    Diário Oficial, demitindo-se dessas posições em 1866. Entre 1883 e 1885 presidiu o Club da Amazônia, "criado para impulsionar a abolição". Quando da proclamação da República, era deputado e não aderiu, declarando-se monarquista. Só participou do IOAB até 1879, quando mudou-se do Rio.
  • 44
    Graciliano Aristides do Prado Pimentel nasceu em Sergipe e foi membro da Câmara dos Deputados, além de presidente da Província do Maranhão. Era vinculado ao Partido Liberal e colaborava escrevendo em órgãos de imprensa ligados ao partido no Nordeste. Retirou-se da política com a proclamação da República.
  • 45
    Carlos de Carvalho, nascido no Rio em 1851, já havia sido, no Império, chefe de polícia e presidente da Província do Paraná, ambos entre 1878 e 1885. Seu pai fora tenente-coronel e chefiara a comissão de engenheiros na Guerra do Paraguai. Formou-se em São Paulo em 1871. Foi ministro das Relações Exteriores por 15 dias, no governo do marechal Floriano Peixoto, em 1893, renunciando ao cargo por discordâncias com o governo. Ainda em 1893 filiou-se ao IOAB, com 41 anos. Prudente de Moraes o reconduziu ao mesmo posto quando assumiu a Presidência da República.
  • 46
    José Izidro Martins Filho nasceu em Pernambuco em 1860. Vinha de uma família de menos recursos. Seu avô materno, que era professor, o educou durante os estudos primários. Formou-se em Recife em 1883. Com dificuldades financeiras para sobreviver da advocacia, começou a lecionar em colégios e no ensino particular, conseguindo, em 1888, dar algumas aulas como lente na Faculdade de Direito. Com a República, foi efetivado nesta posição e nomeado depois para o cargo de chefe de polícia. Foi diretor da Faculdade de Direito de Olinda e representou Pernambuco na Câmara de Deputados. No Rio, foi professor da Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais, além de deputado e advogado.
  • 47
    É o caso da homenagem a João Pereira Monteiro, genro do membro honorário de São Paulo, conselheiro Manoel Antonio Duarte de Azevedo. João Pereira Monteiro nasceu no Rio e formou-se em São Paulo em 1872. Advogou no Rio até 1882, quando se mudou para São Paulo e prestou concurso para lente substituto da Faculdade de Direito. Em 1883 foi nomeado professor catedrático de Teoria e Prática Forense. Foi vice-diretor e diretor da Faculdade de Direito de São Paulo.
  • 48
    A admiração pela vasta cultura jurídica de Teixeira de Freitas, muito difundida na Argentina, só começou a ser divulgada no IOAB em 1905, quando lhe homenagearam com um monumento. Por meio século ele ficou apagado da memória institucional. Em 1929 Levi Carneiro criou a Medalha Teixeira de Freitas, distinguindo anualmente o jurista de maior destaque.
  • 49
    Nasceu em Campinas em 1866, filho de advogado. Formou-se em São Paulo em 1886. Ingressou no IOAB aos 26 anos. Advogou no Rio de Janeiro. Com a mudança de regime, ingressou na Procuradoria da República no Distrito Federal e foi secretário da Presidência, com Prudente de Moraes, até 1896. Em 1911, foi nomeado consultor-geral da República pelo marechal Hermes da Fonseca, permanecendo no cargo até ir para o Supremo, nomeado por Washington Luiz, em 1929.
  • 50
    Levi Carneiro propôs uma reforma dos estatutos em 1928, criando os sócios avulsos, para expandir o quadro do IOAB. Nesta categoria entraram aqueles membros da magistratura ou juristas que não estavam exercendo a advocacia.
  • 51
    Carta endereçada a Haroldo Valladão, presidente da OAB, em 21/11/1950, por André de Faria Pereira, com o objetivo de tornar público o episódio acima. Extraído de Venâncio Filho (1977, pp. 23-24).
  • 52
    Coelho (1995) apresenta uma visão distinta sobre a relevância do saber abstrato e da
    expertise para o sucesso da profissionalização dos médicos. Em seu olhar, eles não tinham domínio do conhecimento científico nem a preferência do consumidor quando estavam reivindicando o monopólio do mercado da Medicina, no século XIX, ao combater o charlatanismo (as práticas alternativas que não se submetiam à autoridade cultural dos médicos regulares). A conquista do monopólio do mercado médico estaria relacionada às estratégias de controle das credenciais e da jurisdição profissional independente de um mérito especial. Neste cenário, a existência de um
    ethos profissional não estaria centrada nestas questões.
  • *
    Este trabalho foi desenvolvido junto ao Núcleo de Pesquisa e Documentação José Albertino Rodrigues, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), e contou com recursos financeiros do CNPq e da FAPESP. Agradeço o apoio recebido do IAB, através de seus funcionários, em especial da bibliotecária Angela Ribeiro.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Maio 2000
    • Data do Fascículo
      Fev 1999
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