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O ETANOL DE SEGUNDA GERAÇÃO NO BRASIL: POLÍTICAS E REDES SOCIOTÉCNICAS

SECOND GENERATION ETHANOL IN BRAZIL: POLICIES AND SOCIO-TECHNICAL NETWORKS

L’ÉTHANOL DE LA SECONDE GÉNÉRATION AU BRÉSIL : POLITIQUES ET RÉSEAUX SOCIO-TECHNIQUES

Resumos

O presente artigo propõe analisar as políticas e as iniciativas nacionais relacionadas com a produção, a pesquisa e o desenvolvimento de etanol de segunda geração (E2G) no Brasil. Utilizando a Teoria Ator-Rede como referencial teórico e metodológico, buscamos identificar, a partir de levantamento bibliográfico e documental, quais são as políticas imbricadas com o E2G, os principais atores que fazem parte dessa rede, suas alianças, as tecnologias relacionadas e as principais questões envolvidas nesse processo. Ao mapear essa rede e acompanhar suas controvérsias, tentamos demonstrar como o E2G ainda é uma caixa-preta aberta a associações de atores humanos e não humanos, políticas e (in)definições. Por fim, apontamos as implicações desse artefato com as políticas relacionadas, buscando contribuir com o debate atual sobre a política energética e a ciência e a tecnologia brasileira.

Etanol de segunda geração; Política energética; Teoria Ator-Rede


This article analyses the national policies and initiatives related to the production, research and development of the second generation ethanol (E2G) in Brazil. Using actor-network theory as the theoretical and methodological referential, we sought to identity, from a bibliographical and documentary survey, which are the policies interwoven with E2G, the main actors that form this network, its alliances, the related technologies and the main issues involved in this process. By mapping this network and tracking its controversies, we try to demonstrate how E2G is still a black box open to human and non-human actor associations, policies and (in)definitions. Finally, we point out the implications of this artefact with its related policies, seeking to contribute to the current debate on energy policy and Brazilian science and technology.

Second generation Ethanol; Energy policy; Actor-network theory


Cet article propose d’analyser les politiques et les initiatives nationales relatives à la production, à la recherche et au développement de l’éthanol de seconde génération (E2G) au Brésil. En utilisant la théorie de l’acteur-réseau comme cadre théorique et méthodologique, nous cherchons à identifier, à partir d’une enquête bibliographique et documentaire, quelles sont les politiques incorporées à l’E2G, les principaux acteurs qui font partie de ce réseau, leurs alliances, les technologies qui y sont associées et les principales questions impliquées dans ce processus. En cartographiant ce réseau et en traçant ses controverses, nous essayons de démontrer comment l’E2G est toujours une boîte noire ouverte aux associations d’acteurs humains et non-humains, politiques et (in)définitions. Enfin, nous indiquons les implications de cet artefact avec les politiques connexes, tout en cherchant à contribuer avec le débat actuel sur la politique énergétique, sur la science et sur la technologie brésilienne.

Étanol de seconde génération; Politique énergétique; Théorie de l’acteur-réseau


Introdução

Neste artigo, pretendemos discutir a formação da rede do etanol celulósico – ou etanol de segunda geração (E2G) – no Brasil, identificando os principais atores envolvidos em sua pesquisa, desenvolvimento e produção, como empresas, fornecedores, institutos de pesquisa e programas governamentais, além da parte técnica envolvida com esse objeto, como as tecnologias utilizadas e em desenvolvimento, seus potenciais, questões técnicas, dilemas, divergências e controvérsias. Utilizamos em nossa pesquisa a bibliografia existente sobre o assunto (teses, dissertações, livros, coletâneas e artigos que abordam o assunto), documentos oficiais (programas de governo, leis e projetos de lei), relatórios dos ministérios, empresas produtoras, instituições de financiamento e de pesquisa envolvidas com o E2G, entrevistas e cartas publicadas, bem como as notícias relativas ao tema em portais, jornais de grande circulação e revistas especializadas, entre outros materiais secundários. As controvérsias técnicas e políticas relacionadas com o E2G foram analisadas a partir de nosso referencial teórico, no caso a Teoria Ator-Rede (TAR), modelo de pesquisa e análise que tem como principais contribuidores Bruno Latour (2000LATOUR, B. (2000), Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora. São Paulo, Editora Unesp. ; 2012), Michel Callon (1986CALLON, M. (1986), “Some elements of a sociology of translation: domestication of the scallops and the fisherman of St. Brieuc Bay”. The Sociological Review , 32 (S1): 196-233. ; 1987) e John Law (1999; 2007).

Segundo os autores da TAR, os fatos científicos, tecnologias e ações sociais são resultado de uma rede formada sempre por uma coletividade de atores humanos e não humanos, portanto, necessariamente sociotécnica. As associações que formam uma rede se dão através de ações, alianças, negociações, disputas, resistências e adaptações dos atores humanos e não humanos envolvidos com algum objeto ou objetivo em comum. Esse processo também é chamado de mediação sociotécnica ou movimento de translação – termo que inclui a noção de movimento e de tradução ao mesmo tempo ( Latour, 2000LATOUR, B. (2000), Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora. São Paulo, Editora Unesp. ; 2001; 2012; Callon, 1980; 1986; 1991). Para os autores, nenhuma rede se sustenta sem a contribuição de atores não humanos, ou seja, elementos da natureza ou artefatos tecnológicos que, combinados, realizam alguma atividade que substitui o trabalho humano ou permite algo inteiramente novo e fundamental para o sucesso do projeto dos atores envolvidos e o funcionamento da rede.

Além disso, na perspectiva da TAR, todo ator é em si um “ator-rede”. Isso quer dizer que nenhum ator age sozinho, há sempre uma rede de atores conectada a todos os outros, que lhe dá apoio, legitimidade, instrumentos e influencia suas ações e decisões. Como Law (1999) aponta, os atores são na verdade efeitos da rede. Ou, ainda, “uma rede de atores é simultaneamente um ator, cuja atividade consiste em fazer alianças com novos elementos, e uma rede, capaz de redefinir a transformar seus componentes” ( Callon, 1987CALLON, M. (1987), “Society in the making: the study of technology as a tool for sociological analysis”. The social construction of technological systems . Londres, MIT Press. , p. 93).

Segundo Latour (2012)LATOUR, B. (2012), Reagregando o social: uma introdução à teoria do ator-rede . Salvador/São Paulo, Edufba/Edusc. , para colocar a TAR em prática é fundamental acompanhar as controvérsias sem se preocupar em tomar lados ou prever seus resultados, mas utilizá-las como fontes de informação (pois são nas controvérsias e problemas que um objeto ou fato científico expõe suas entranhas) para descobrir quem são os atores (humanos e não humanos) que fazem parte da rede relacionada objeto. A partir disso, o pesquisador deve acompanhar esses atores e observar como eles definem e tentam estabilizar seus objetos para só depois tecer uma conclusão sobre como esses grupos atuam e modificam o mundo social à sua volta. Aí também estaria uma das principais contribuições políticas da TAR, ao ajudar a revelar, através de sua descrição minuciosa, forças e grupos atuantes até então desconhecidos.

A ação aqui é tomada como um conglome- rado de outras ações, das quais participa uma infinidade de atores, como um enxame que aponta em determinada direção. O autor também enfatiza que existem diversas figurações (ou representações) para a mesma a ação ou evento, ou seja, diferentes atores narram ou descrevem os fatos cada um de acordo com a sua percepção, com pequenas ou grandes diferenças de um para o outro. Nenhuma dessas figurações deve ser tomada a princípio como mais ou menos importante ou confiável. Pelo contrário, a controvérsia deve ser utilizada como o principal combustível da análise, fornecendo os elementos que vão ajudar o analista a abrir a caixa-preta do objeto estudado, expondo seu interior – os elementos constituintes, como eles funcionam e qual o papel e a importância de cada um. Somente ao fim da análise, após se analisar o que há de comum ou convergente nesses relatos, é possível afirmar com alguma certeza as ações e elementos fundamentais do objeto estudado.

Isso nos leva aos elementos não humanos que fazem parte de uma rede. Para a TAR, qualquer coisa que interfira ou modifique o curso de uma ação deve ser considerada um ator, ou actante . Esses elementos, apesar de não serem humanos, atuam e influenciam de forma determinante no funcionamento de uma rede, sendo, na maior parte das vezes, peças fundamentais para a sua formação, funcionamento, estabilidade e sucesso. Os materiais e as tecnologias utilizadas têm, portanto, importância fundamental na análise, já que o tempo todo os atores humanos precisam deles para agir e realizar seus objetivos. Os atores não humanos que participam do fluxo da ação devem ser levantados e sua importância para a rede deve ser avaliada, apontando também a quem esses actantes estão relaciona- dos (empresas, instituições, programas etc). Esse ponto é fundamental quando se analisam inovações tecnológicas, dado que o comportamento até então desconhecido ou inexplorado dos atores não humanos é provavelmente o palco das controvérsias e da mudança em um processo de inovação ou construção de tecnologias sociais.

A partir disso, o observador que quiser acompanhar o desenvolvimento de um fato científico ou tecnologia deve se ater a quatro detalhes: observar o cenário em que se encontra a alegação ou proposição; des- cobrir quem são os atores (pessoas, instituições, empresas, grupos de interesses etc.) que estão lutando para transformá-la em fato ou realidade; verificar a direção para a qual a proposição está sendo empurrada; acompanhar os desdobramentos entre a alegação ou proposição original e os seus resultados.

O etanol celulósico é o álcool extraído das fibras de um vegetal. No caso da cana-de-açúcar, principal insumo utilizado no Brasil para a produção de etanol e alvo da nossa pesquisa, o E2G é obtido através do processamento do bagaço após a extração do caldo ou mesmo da palha. Por meio de um processo chamado de hidrólise – que liquefaz as fibras de um vegetal com o uso de ácidos ou enzimas específicas – o bagaço e a palha tornam-se aproveitáveis, produzindo-se mais etanol (até 50% mais) a partir desse caldo hidrolisado. Como cerca de metade dos açúcares e da energia da cana-de-açúcar estão presentes nas suas fibras lignocelulósicas (bagaço e palha), seria possível produzir muito mais etanol e energia com a mesma quantidade de material e área plantada. Isso coloca o E2G como uma possível resposta a diversos desafios contemporâneos, como a busca por alternativas energéticas renováveis que não contribuem com o aquecimento global, alternativa aos derivados do petróleo e a dependência externa que vários países têm dele, assim como a demanda crescente no mundo todo por etanol e o uso eficiente de terras (BNDES/CGEE, 2008).

Muito tem se falado do futuro do E2G desde 2011, quando o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social e a Financiadora de Estudos e Projetos lançaram o Plano BNDES-Finep de Apoio à Inovação dos Setores Sucroenergético e Sucroquímico (Paiss) e algumas usinas e centros de pesquisa – como o Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), a GranBio, a Raízen e a Odebrecht Agroindustrial – anunciaram seus programas de pesquisa, desenvolvimento e produção em escala comercial do combustível. A previsão dessas empresas e institutos de pesquisa, como o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos ( CGEE, 2009CGEE – Centro de Gestão e Estudos Estratégicos. (2009), Bioetanol combustível: uma oportunidade para o Brasil. Brasília, CGEE. ) era de que o E2G se tornasse parte significativa da matriz energética nacional e revolucionasse o setor sucroenergético, com a expectativa de que mais de uma dezena de usinas de segunda geração entrassem em operação até 2025.

No entanto, sete anos após o lançamento do Paiss e depois de duas usinas de escala comercial terem sido construídas e entrado em operação (da GranBio e da Raízen, além da usina piloto do CTC), nenhuma das metas ou expectativas foram atingidas. Houve diversos problemas, especialmente na fase de pré-tratamento, o que causou grandes paralisações nessas usinas, além de a produção ter ficado abaixo dos 10% da capacidade em todos os anos de operação, o que indica problemas graves no processo e uma enorme incerteza quanto ao futuro do etanol celulósico ( NovaCana, 2016NOVACANA. (2016), “Futuro brilhante do etanol celulósico está ameaçado”, Revista NovaCana , 1 mar. Disponível em www.novacana.com/n/etanol/2-geracao-celulose/futuro-brilhante-etanol-celulosico-ameacado-010316, consultado em 2/8/2017.
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; 2017).

A partir do nosso referencial, nos esforçamos em considerar o etanol celulósico um actante, ou seja, uma tecnologia em construção em torno da qual se realizam diversos esforços e disputas, numa verdadeira corrida pelo seu domínio. Da mesma forma, diversas outras tecnologias e elementos não humanos que fazem parte dessa rede (como a palha, colhedeiras, novas variedades de cana, micro-organismos, enzimas, processos de transformação, cogeração etc.) também devem ser considerados actantes para que possamos compreender sua importância e influência no funcionamento da rede, além das questões e controvérsias ligadas relacionados ao E2G no Brasil. Ao levarmos em consideração em nossa pesquisa não somente as empresas, instituições, políticas e programas de pesquisa relacionados ao etanol de segunda geração, mas também as questões e desafios técnicos que estão em jogo, buscamos fazer uma análise multidimensional sobre o assunto, relacionando essa inovação com questões mais complexas da política energética nacional e de ciência, tecnologia e inovação (CT&I).

Em nossa pesquisa encontramos diversos dilemas e controvérsias relacionados ao E2G, como os problemas técnicos relacionados ao processo de produção, as enormes decepções do setor e, também, outras questões como a disputa entre o E2G e a geração e exportação de energia elétrica através de processos e equipamentos de cogeração, programas governamentais controversos e disputas envolvendo o setor sucroenergético e a Petrobrás, além das principais questões técnicas, ou actantes, que figuram tanto como um desafio quanto uma oportunidade para as empresas brasileiras, como por exemplo o desenvolvimento de processes de pré-tratamento mais eficientes, enzimas hidrolisantes mais baratas e variedades mais robustas e produtivas de cana-de-açúcar, caso da cana-energia.

Actantes: os atores não humanos do E2G e sua atuação

Como dissemos, o E2G é o álcool extraído das fibras lignocelulósicas de um vegetal. No caso da cana-de-açúcar, ele é obtido a partir do bagaço após a extração do caldo ou ainda da palha. Para isso, primeiramente o material (bagaço ou palha) precisa ser tratado fisicamente ou quimicamente para limpar o material e expor suas fibras, o que é chamado de pré-tratamento. Em seguida, é necessário realizar um processo nesse material chamado de hidrólise que, de forma simplificada, decompõe as fibras desses vegetais através do uso de ácidos, enzimas específicas, ou ainda outros meios, transformando o material sólido num caldo. Por fim, o material hidrolisado é submetido à fermentação por meio da ação de bactérias ou fungos específicos, gerando etanol a partir dos açúcares ali presentes (Hamelinck et al ., 2005).

Existem muitas rotas (hidrólise básica, ácida, com ácido diluído, enzimática etc.) e configurações (por exemplo, hidrólise e fermentação realizadas no mesmo reator ou não, fermentação separada com os diferentes açúcares no mesmo reator ou não, produção das enzimas no mesmo reator ou não etc.) que podem ser utilizadas para se produzir E2G, sendo que cada combinação possui vantagens e desvantagens em relação às demais.1 1 Para mais detalhes sobre esses processos, ver Seabra (2008) , Ogeda e Petri (2010) , Galbe e Zacchi (2010) e Albarelli (2013) . Atualmente, a rota mais utilizada e desenvolvida é a rota enzimática, na qual enzimas específicas são utilizadas para hidrolisar o material após o pré-tratamento ( Murakami, 2015MURAKAMI, T. G. L. (2015) Trajetórias tecnológicas na etapa de hidrólise enzimática para a produção de bioetanol de 2ª geração . Tese de doutorado. Campinas (SP), Unicamp. ).

Produzir essas enzimas de forma barata ainda é um dos principais entraves e desafios dessa tecnologia. Poucas empresas no mundo as produzem de forma comercial, além da dificuldade em reaproveitar esses organismos. De acordo com pesquisas recentes, essa etapa do processo é atualmente a mais pesquisada mundo afora, apesar de o Brasil ainda engatinhar nessas pesquisas e as poucas empresas que possuem usinas de segunda geração ainda precisarem importar esse material ( Idem ).

Entretanto, não são somente as enzimas que representam entraves nesse processo. Apesar de simples em teoria, o pré-tratamento é uma etapa fundamental do processo e provavelmente a mais problemática até agora. O maior obstáculo relacionado com o pré-tratamento refere-se à diversidade de matérias-primas utilizadas nas nascentes usinas de E2G (que importam a maior parte de suas tecnologias). Esses diferentes materiais acarretam diferentes processos de pré-tratamento e na maior parte das vezes é a própria empresa que precisa adaptá-lo ou aperfeiçoá-lo. No Brasil, o problema se deve principalmente ao excesso de areia que persiste após o pré-tratamento ( Oliveira Filho, 2017OLIVEIRA FILHO, A. A. (2017), Mudanças e permanências no Sistema Setorial de Inovação da cana-deaçúcar: o caso do etanol celulósico . Tese de doutorado. Campinas (SP), Unicamp. ), o que prejudica a eficiência das etapas posteriores e pode danificar os equipamentos. Por mais que os engenheiros que desenvolvem e adaptam os processos de pré-tratamento se esforcem para retirar a areia dessa rede, ela insiste em permanecer. Isso tem causado diversos atrasos, paralisações, adiamentos e baixíssima produtividade nas usinas de E2G no Brasil. Esse fato demonstra a capacidade de atuação e resistência dos actantes, que não se dobram facilmente às tentativas de conformação dos atores humanos em domesticá-los.

A matéria-prima é um dos principais fatores quanto à viabilidade do E2G, quesito em que o Brasil desponta na liderança, pois a cana-de-açúcar é muito mais produtiva que outros materiais utilizados em outros países, como o milho ou a beterraba. Além disso, a situação que visualizamos é de quebra do paradigma de cana-de-açúcar para produção de açúcar, tendo a energia (etanol, energia elétrica) como subproduto, e a migração para o conceito de cana-energia, que seria o desenvolvimento de variedades de cana visando à maximização da energia primária e o processamento desta matéria-prima de forma otimizada para produção de energias secundárias úteis, como a energia elétrica e o E2G ( CGEE, 2009CGEE – Centro de Gestão e Estudos Estratégicos. (2009), Bioetanol combustível: uma oportunidade para o Brasil. Brasília, CGEE. ).

A cana-energia (ou “supercana”) é um conjunto de variedades de cana em desenvolvimento com um grau mais elevado de energia primária por tonelada ou por hectare comparado às variedades comuns. Seus componentes (açúcares e fibras) são mais adequados para o processamento de tecnologias de segunda geração devido a maiores concentrações de fibra, o que representa mais celulose e hemicelulose para produção de E2G e lignina para uso nas caldeiras ( Leal, 2010LEAL, M. V. (2010), “Cana-energia”, in L. B. Cortez (org.), Bioetanol de cana-de-açúcar: P&D para produtividade e sustentabilidade , São Paulo, Blucher. ). Essa variedade produz menos sacarose que as espécies tradicionais (cerca de 40% menos), mas possui muito mais fibras (aproximadamente 80% a mais por tonelada do colmo), não sendo, portanto, ideal para a produção de açúcar, mas sim para a produção de energia elétrica e etanol de segunda geração devido a maior quantidade de bagaço. Ela foi pensada para as regiões áridas, com défice hídrico, podendo superar assim as adversidades e aumentar a produção por área plantada (Milanez et al ., 2015).

Outro elemento essencial da rede do etanol celulósico é a palha. Tradicionalmente queimada no processo de colheita manual ou deixada para se decompor no campo com a colheita mecanizada, a palha contém um terço da energia total da cana, numa proporção semelhante ao bagaço ( Leal, 2010LEAL, M. V. (2010), “Cana-energia”, in L. B. Cortez (org.), Bioetanol de cana-de-açúcar: P&D para produtividade e sustentabilidade , São Paulo, Blucher. ; Magalhães e Braunbeck, 2010MAGALHÃES, P. G. & BRAUNBECK, O. A. (2010), “Colheita de cana-de-açúcar e palha”, in L. B. Cortez (org.), Bioetanol de cana-de-açúcar: P&D para produtividade e sustentabilidade , São Paulo, Blucher. ). Ao mesmo tempo, a palha serve de insumo tanto para produção de etanol de segunda geração quanto para produzir eletricidade nas caldeiras. Definir qual desses usos é mais vantajoso depende de diversos aspectos da usina e do desenvolvimento tanto das tecnologias de recolhimento da palha (ainda muito deficiente) quanto da viabilidade do E2G em relação à cogeração. De qualquer forma, a palha deve se tornar cada vez mais um ator essencial para a produção de E2G e bioeletricidade (Cortez et al. , 2010; Magalhães e Braunbeck, 2010MAGALHÃES, P. G. & BRAUNBECK, O. A. (2010), “Colheita de cana-de-açúcar e palha”, in L. B. Cortez (org.), Bioetanol de cana-de-açúcar: P&D para produtividade e sustentabilidade , São Paulo, Blucher. ; CGEE, 2009CGEE – Centro de Gestão e Estudos Estratégicos. (2009), Bioetanol combustível: uma oportunidade para o Brasil. Brasília, CGEE. ).

Podemos citar também as pentoses (açúcares formados por cinco carbonos) resultantes da hidrólise da hemicelulose, que representam quase metade do potencial produtivo do caldo hidrolisado, mas são de difícil fermentação, exigindo organismos muito específicos que ainda precisam ser importados. São, portanto, actantes com relevância para serem traduzidos e incorporados a essa rede em processos que estão em vias de desenvolvimento.

Todos esses elementos técnicos ou não humanos – a cana-de-açúcar (e a cana-energia), as enzimas, a palha, a colhedora, as caldeiras, as pentoses, as tecnologias que compõem os processos de pré-tratamento e produção etc. – formam o que na perspectiva da teoria do ator-rede é chamado de tecnograma, ou seja, a parte técnica de uma rede ( Latour, 2000LATOUR, B. (2000), Ciência em ação: como seguir cientistas e engenheiros sociedade afora. São Paulo, Editora Unesp. ). Porém, fica evidente a partir desse levantamento que o tecnograma é parte fundamental e determinante dessa rede, especialmente quando falamos de tecnologia e inovação. O que nem todos os analistas percebem é que o sucesso de uma inovação, como o E2G, depende tanto de programas de financiamento, agente públicos, empreendedores (os atores humanos ou sociograma da rede), quanto da domesticação dos atores não humanos, na mesma proporção. Portanto, os elementos acima citados atuam como actantes nessa rede, influenciado e direcionando as ações dos demais atores como, por exemplo, incentivando mais investimentos e pesquisas em variedades específicas de cana, recolhimento da palha, processo de fermentação de pentoses, direcionamento de recursos para produção de E2G ou bioeletricidade, adoção de modificações no processo de pré-tratamento, ou ainda alterando completamente as perspectivas de produção e os planos de instalação de novas usinas. As tecnologias em desenvolvimento e as questões técnicas que continuam sem uma solução definitiva mostram como o etanol de segunda geração ainda é uma caixa-preta aberta.

As políticas e programas da rede do E2G no Brasil

A partir de nossa pesquisa, identificamos que o programa de financiamento à pesquisa e inovação de tecnologias relacionadas ao etanol e ao E2G que mais se destacou durante o período de nossa análise foi o Paiss. O plano foi criado em 2011 como parte do Programa de Aceleração do Crescimento (Pacti, 2007-2010), do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), que foi então sucedido pelo programa Estratégia Nacional para Ciência, Tecnologia e Inovação (Encti, 2012-2015). O Paiss contou a princípio com R$ 1 bilhão para financiamento e subvenção de pesquisas e projetos de inovação para o setor sucroenergético e sucroquímico entre 2011 e 2014, com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), da Finep, e do Fundo Tecnológico (Funtec), do BNDES. Porém, devido ao sucesso do programa e o alto número de propostas recebidas (dezesseis aprovados), o valor foi atualizado para R$ 3,3 bilhões ( Soares, 2016SOARES, G. A. (2016), O avanço das tecnologias de segunda geração e seus impactos na indústria do etanol . Dissertação de mestrado. Rio de Janeiro, UFRJ. ).

Após o sucesso do primeiro Paiss foi lançado em 2014 o Paiss Agrícola, ou Paiss 2, já como parte das iniciativas previstas no Encti, focado no incentivo à produtividade agrícola do setor sucroenergético como desenvolvimento de novas variedades, mecanização agrícola, plantio e colheita, desenvolvimento de máquinas e sistemas integrados etc. Para isso, foi reservado um total de R$ 1,48 bilhão somando os recursos do BNDES e da Finep entre financiamentos (R$ 1,4 bilhão) e subvenção econômica (R$ 80 milhões) a serem disponibilizados até 2018.

Podemos considerar o Paiss um dos mediadores mais importantes da rede do etanol celulósico no Brasil, sendo seu principal financiador. Somados, os programas Paiss 1 e 2 foram responsáveis pela injeção de mais de R$ 4,7 bilhões no setor sucroenergético entre 2011 e 2018. Esses recursos foram fundamentais para a construção das plantas e os projetos de segunda geração da GranBio, da Raízen e do CTC, que juntas utilizaram mais de R$ 1,7 bilhão entre financiamento, participação acionária e subvenções pelo programa.

No dia 26 de dezembro de 2017 foi sancionado pelo então presidente Michel Temer a Lei n. 13.576, referente a um novo programa governamental para os biocombustíveis, o Renovabio. Em discussão desde meados de 2016, a proposta do programa foi lançada pelo Ministério de Minas e Energia (MME) em dezembro, em um encontro que envolveu, além do MME, o presidente, o Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e diversos representantes do setor sucroenergético (MME, 2016). A proposta de Lei Complementar n. 160/2017 sofreu pouquíssimas alterações e na Câmara dos Deputados e nenhuma alteração no Senado, tendo sido votada em regime de urgência. Isso demonstra a força do setor sucroenergético dentro do parlamento, pressionado pela aprovação imediata da lei2 2 Para mais detalhes sobre os tramites do programa, ver Lorenzi (2018) . através de associações representativas do setor como a União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica, 2017) e seis frentes parlamentares.3 3 Conforme carta encaminhada ao Senado em 5 de dezembro de 2017 e assinada pelas seguintes frentes parlamentares: Frente Parlamentar da Agropecuária; Frente Parlamentar pela Valorização do Setor Sucroenergético; Frente Parlamentar Mista do Biodiesel; Frente Parlamentar da Indústria de Máquinas e Equipamentos; Frente Parlamentar em Defesa do Cooperativismo; Frente Parlamentar Mista em Defesa das Energias Renováveis, Eficiência e Portabilidade da Conta de Luz (Unica, 2017).

Os objetivos principais do programa, conforme a Lei n. 13.576/2017, são: 1) promover o aumento de produção dos biocombustíveis (com destaque para o etanol e o biodiesel); 2) garantir mercado no longo prazo, assim como garantir previsibilidade da matriz energética; 3) diminuir as emissões de gases de efeito estufa (GEEs) para cumprir metas estabelecidas na Contribuição Nacionalmente Determinada (CND) proposta na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP-21 ( ONU, 2015ONU – Organização das Nações Unidas. (2015), “Adoption of the Paris Agreement”. Disponível em unfccc.int/resource/docs/2015/cop21/eng/l09r01.pdf, consultado em 17/7/2017. ) – no caso, diminuir as emissões de GEEs em 43% em relação a 2005. Para isso, o MME (2016)MME – Ministério de Minas e Energia. (2016), “Diretrizes estratégicas: proposta para consulta pública”. Disponível em www.mme.gov.br/web/guest/consultas-publicas?p_auth=3JfL4OQN&p_p_id=consultapublicaexterna_WAR_consultapublicaportlet&p_p_lifecycle=1&p_p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id=column-1&p_p_col_count=1&_consultapublicaexterna_WAR_consultapublicaportlet_consultaIdNormal=26&_consultapublicaexterna_WAR_consultapublicaportlet_javax.portlet.action=downloadArquivo, consultado em 12/5/2017.
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sugere manter a produção de bioenergia equivalente a pelo menos 18% de toda a energia consumida, elevando a produção de etanol de 28 bilhões de litros (2017) para 54 bilhões até 2030.

Para atingir esses objetivos, o programa pretende utilizar os seguintes mecanismos: gerar créditos de descarbonização para os produtores de biocombustíveis certificados que contribuírem positivamente com a redução de GEEs, os chamados CBios; certificação de produção eficiente de biocombustíveis através da Nota de Eficiência Energético-Ambiental emitida por firma inspetora; obrigação das distribuidoras de combustível de comprar esses créditos de descarbonização de acordo com a sua produção de combustíveis fósseis; por fim, metas e incentivos fiscais e financeiros (Projeto de Lei Complementar n. 160/2017).

O programa funcionaria da seguinte forma: as usinas receberiam notas de zero a dez de acordo com critérios que ainda não foram estabelecidos, que devem levar em conta a quantidade de carbono emitida na produção dos biocombustíveis, desde o plantio até o seu uso final. Quanto menores forem as emissões do produtor primário, maiores as notas das usinas ( MME, 2016MME – Ministério de Minas e Energia. (2016), “Diretrizes estratégicas: proposta para consulta pública”. Disponível em www.mme.gov.br/web/guest/consultas-publicas?p_auth=3JfL4OQN&p_p_id=consultapublicaexterna_WAR_consultapublicaportlet&p_p_lifecycle=1&p_p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id=column-1&p_p_col_count=1&_consultapublicaexterna_WAR_consultapublicaportlet_consultaIdNormal=26&_consultapublicaexterna_WAR_consultapublicaportlet_javax.portlet.action=downloadArquivo, consultado em 12/5/2017.
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).

Em contrapartida, as distribuidoras de combustíveis terão mandatos de redução de carbono dos combustíveis comercializados por elas como diesel e gasolina, através da compra desses créditos. O valor dos CBios seria definido pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) de acordo com a quantidade total de créditos disponíveis e o uso de combustíveis fósseis previsto para aquele ano. Ainda não está clara a forma como esses créditos devem ser obtidos pelas distribuidoras, mas atualmente a proposta é de que, se em um ano sejam gerados, por exemplo, 10 milhões de CBios, esse total seja divido entre as distribuidoras de acordo com a sua participação no mercado (e não de acordo com a produção absoluta) ( MME, 2016MME – Ministério de Minas e Energia. (2016), “Diretrizes estratégicas: proposta para consulta pública”. Disponível em www.mme.gov.br/web/guest/consultas-publicas?p_auth=3JfL4OQN&p_p_id=consultapublicaexterna_WAR_consultapublicaportlet&p_p_lifecycle=1&p_p_state=normal&p_p_mode=view&p_p_col_id=column-1&p_p_col_count=1&_consultapublicaexterna_WAR_consultapublicaportlet_consultaIdNormal=26&_consultapublicaexterna_WAR_consultapublicaportlet_javax.portlet.action=downloadArquivo, consultado em 12/5/2017.
www.mme.gov.br/web/guest/consultas-publi...
). Por exemplo, se a Petrobrás for responsável por 50% da distribuição, teria de comprar metade dos créditos existentes (5 milhões).

Dependendo dos critérios adotados para classificar as usinas e o preço desses créditos, o etanol de segunda geração poderá ser muito beneficiado por ser um biocombustível avançado (de baixo carbono). Por ser muito mais sustentável e produzir proporcionalmente menos GEEs, incentivaria as usinas a investir em E2G em detrimento do etanol de primeira geração. Porém, a proposta tem muitos pontos controversos e indefinições.

Em abril de 2017, a Petrobrás divulgou uma nota com diversas críticas e apontamentos contundentes sobre o programa (Petrobrás, 2017). Segundo a empresa, há diversas maneiras de o Brasil cumprir o acordo da CND com menores impactos ao setor de combustíveis tradicionais, como regulações e modelações nos setores florestal, agropecuário, industrial e de transportes.

Segundo a Petrobrás (2017), a proposta ignora diversos fatores que devem contribuir com a diminuição das emissões de GEEs sem a necessidade de políticas custosas por parte do governo, ou que prejudiquem o setor de combustíveis tradicionais, como a diminuição do ritmo das vendas de automóveis no Brasil verificada desde 2012, aumento da eficiência dos motores (seguindo a tendência mundial), melhoramento dos serviços coletivos de transporte e a hibridização dos veículos nacionais (automóveis que possuirão tanto um motor elétrico quanto um motor convencional à combustão, utilizados alternadamente ou simultaneamente), previsto pelas montadoras para 2021 em diante, o que por sua natureza implicaria um menor consumo de combustíveis fósseis, especialmente a gasolina.

Além disso, a Petrobrás aponta que o programa estaria em desacordo com o também recentemente lançado Programa Combustível Brasil ( MME, 2017MME – Ministério de Minas e Energia. (2017), “Combustível Brasil: ministro lança iniciativa para repensar refino e abastecimento”. Disponível em www.mme.gov.br/web/guest/pagina-inicial/outras-noticas/-/asset_publisher/32hLrOzMKwWb/content/combustivel-brasil-ministro-lanca-iniciativa-para-repensar-refino-e-abastecimento, consultado em 29/6/2018.
www.mme.gov.br/web/guest/pagina-inicial/...
), apresentado em fevereiro de 2017 pelo MME e que visa atrair investimentos (principalmente externos) ao setor de refino de combustíveis derivados do petróleo no Brasil. Segundo a Petrobrás (2017), o Renovabio criaria incertezas em relação à participação de cada segmento no mercado de combustíveis automotivos, prejudicando os investimentos. De acordo com representantes da Associação das Distribuidoras de Combustíveis (Brasilcom), a obrigação de compra de créditos de carbono pelas distribuidoras prejudicaria especialmente as distribuidoras menores, que possuem menor poder de reestruturação, o que pode agravar ainda mais a concentração das distribuidoras.

Do ponto de vista teórico, há um claro conflito de interesses em relação ao programa como está formulado atualmente, colocando em disputa o setor sucroenergético e o setor de combustíveis fósseis, especialmente as usinas de etanol e a Petrobrás. No caso, esses atores disputam a representação (figuração) da situação ambiental e energética brasileira, com a Petrobrás defendendo a manutenção da dinâmica atual enquanto o setor sucroenergético insiste na necessidade de novos incentivos para se atingir as metas definidas na CND.

A criação dos CBios significa a entrada um novo actante poderoso a essa rede, interferindo de maneira decisiva na dinâmica atual e favorecendo os atores do setor sucroenergético em detrimento do setor de combustíveis tradicionais e das distribuidoras. Dependendo dos critérios estabelecidos para a nota das usinas e do valor atribuído aos CBios, o volume de recursos que será transferido das distribuidoras para o setor sucroenergético pode ser significativo, capaz de alterar os preços dos combustíveis tradicionais e renováveis e fortalecendo o setor sucroenergético. Portanto, a figuração desse actante – cuja definição encontra-se atualmente em disputa, já que ainda não foi definida a regulamentação referente à classificação das usinas e o valor dos créditos – é fundamental no delineamento da futura dinâmica do setor de combustíveis como um todo.

Principais iniciativas de produção no Brasil e seus dilemas

Através da pesquisa que realizamos, constatamos que a rede formada pelas empresas em torno do etanol celulósico no Brasil é bastante complexa e heterogênea, incluindo diversos atores de diferentes setores, como setor financeiro público (BNDES), laboratórios e universidades públicas – Laboratório de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE), Instituto Agronômico de Campinas, Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor Sucroenergético (Ridesa) –, empresas de tecnologia e pesquisa privadas – CTC, Vignis –, empresas do setor sucroenergético – GranBio, Raízen –, grupos internacionais – Beta Renewables, Novozymes, DSM etc. –, associações representativas – Unica4 4 “A União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) é a maior organização representativa do setor de açúcar e bioetanol do Brasil. Sua criação, em 1997, resultou da fusão de diversas organizações setoriais do estado de São Paulo, após a desregulamentação do setor no País” (informação disponível no site da organização, www.unica.com.br/historico-e-missao , consultado em 29/6/2018). – e diversos atores não humanos – leveduras, enzimas, cana-energia, cogeração, bagaço, palha etc. Esses atores são fundamentais para o sucesso do E2G e é difícil dizer quais são os mais importantes.

As tentativas de se produzir E2G no país até o momento partem da GranBio, da Raízen e do CTC. Somadas, essas empresas possuem plantas com uma capacidade instalada de 125 milhões de litros de E2G por ano (ver Tabela 1 ), o que torna o Brasil o quarto país do mundo em capacidade instalada de segunda geração, atrás somente dos Estados Unidos, China e Canadá. Entretanto, apenas uma pequena fração (cerca de 10% ou menos) desse potencial anual foi produzida até agora, e o maior problema para a operação dessas plantas ainda são dificuldades na etapa de pré-tratamento. Mais de uma vez essas usinas tiveram suas atividades paralisadas devido a problemas com o pré-tratamento do material, o que adiou suas expectativas e criou uma grande incerteza com relação ao futuro do etanol celulósico até o momento desta publicação. Pelo que acompanhamos pelas notícias em revistas especializadas, o clima é de grande incerteza, apesar de essas empresas seguirem apostando no E2G e afirmarem que são apenas problemas temporários.

Tabela 1
Principais Iniciativas de Produção de E2G no Brasil

A GranBio é uma empresa de biotecnologia industrial com sede em São Paulo (SP). Fundada em 2010, a empresa conta com cerca de 264 funcionários e é 100% nacional, controlada majoritariamente pela GranInvestimentos SA ( Corrêa, 2014CORRÊA, Camila Bastos. (2014), Parcerias estratégicas tecnológicas em projetos de etanol celulósico: oportunidades e desafios para as firmas nacionais . Dissertação de mestrado. Campinas (SP), Unicamp. ). Em setembro de 2014, a GranBio anunciou que começara a produzir etanol de segunda geração em nível comercial em sua usina – a BioFlex1 – localizada em São Miguel dos Campos (AL). A unidade custou US$ 190 milhões e demorou vinte meses para ser construída. Ela é capaz, segundo a GranBio, de produzir 82 milhões de litros de etanol de segunda geração por ano, e com isso tornou-se a primeira empresa a produzir etanol celulósico em nível comercial do hemisfério Sul, apesar de utilizar tecnologias importadas ( Corrêa, 2014CORRÊA, Camila Bastos. (2014), Parcerias estratégicas tecnológicas em projetos de etanol celulósico: oportunidades e desafios para as firmas nacionais . Dissertação de mestrado. Campinas (SP), Unicamp. ).

A parceria com o BNDES é uma das alianças mais importante da GranBio. Como principal parceiro financeiro do projeto, o banco aportou R$ 280 milhões na forma de financiamentos e mais R$ 600 milhões por meio de participação acionária via BNDES Participações (BNDESPar), em troca de 15% de suas ações, num total de R$ 880 milhões. Além desse valor, correspondente ao primeiro Paiss, em 2014, a GranBio teve quatro projetos aprovados pelo Paiss Agrícola (Paiss 2), incluindo três que envolvem especificamente o desenvolvimento da cana energia, o que representou cerca de R$ 345 milhões em financiamento ( Soares, 2016SOARES, G. A. (2016), O avanço das tecnologias de segunda geração e seus impactos na indústria do etanol . Dissertação de mestrado. Rio de Janeiro, UFRJ. ).

Outro ator fundamental nessa rede é a empresa italiana Beta Renewables.5 5 A BetaRenewables é uma multinacional de capital aberto com sede na Itália (Milão) cujo o maior acionista é a Biochemtex (italiana). Desenvolvedora de biocombustíveis, produtos químicos renováveis e licenciadora das tecnologias que desenvolve. A empresa é parceira da Novozymes, que fornece as enzimas para a tecnologia Proesa, licenciada pela empresa para a produção de E2G e utilizada pela GranBio em sua usina de segunda geração ( Corrêa, 2014 ). O processo adotado pela GranBio utiliza a tecnologia Proesa, licenciada pe- la empresa. A Proesa engloba todas as etapas do processo, desde o pré-tratamento da matéria-prima até a hidrólise e a fermentação. O processo utiliza bagaço e palha como insumo (trata-se da única empresa no Brasil a utilizar a palha), alta temperatura e pressão para o pré-tratamento da biomassa, enzimas da dinamarquesa Novozymes6 6 A Novozymes é uma empresa multinacional de capital aberto com sede em Bagsværd, na Dinamarca. Seu principal acionista é a dinamarquesa Novo Holdings A/S. A empresa é líder no ramo de enzimas no mundo, fornecendo 48% do mercado de enzimas industriais. Emprega mais de 6 mil pessoas e possui diversas unidades espalhadas pelo mundo, inclusive no Brasil (informação disponível no site da empresa, www.novozymes.com , consultado em 28/3/2018). para a hidrólise e leveduras da holandesa DSM7 7 A Royal DSM é uma multinacional holandesa com sede em Heerlen, empregando mais de 25 mil pessoas em mais de cinquenta países e um faturamento anual superior a 10 bilhões de euros (informação disponível no site da empresa, www.dsm.com , consultado em 28/3/2018). Atua na indústria química (saúde, nutrição e materiais) e é a fornecedora das leveduras utilizadas para a fermentação dos açúcares na usina de segunda geração da GranBio. para a fermentação de ambos os açúcares (pentoses e hexoses). Porém, a GranBio não tem participação nas pesquisas, desenvolvimento e resultados dessas tecnologias ( Corrêa, 2014CORRÊA, Camila Bastos. (2014), Parcerias estratégicas tecnológicas em projetos de etanol celulósico: oportunidades e desafios para as firmas nacionais . Dissertação de mestrado. Campinas (SP), Unicamp. ; Soares, 2016SOARES, G. A. (2016), O avanço das tecnologias de segunda geração e seus impactos na indústria do etanol . Dissertação de mestrado. Rio de Janeiro, UFRJ. ).

A rede formada pela GranBio para o desenvolvimento do E2G também inclui, além do BNDES, outros atores-rede brasileiros. No caso, a empresa está desenvolvendo sua própria variedade de cana-energia, denominada Cana-Vertix, em parceria com a BioVertis, subsidiária da Vignis.8 8 A VignisBionergia Ltda. é uma empresa de tecnologia do setor sucroenergético fundada em 2015 com sede em Campinas (SP) e pioneira no desenvolvimento de variedades de cana-energia – foi a primeira empresa no Brasil a desenvolver uma variedade de cana-energia, em 2008. Sua produção deve chegar a 1 milhão de toneladas na safra 2018-2019 ( Cherubin, 2016 ). Essa variedade é capaz, segundo a empresa, de crescer em áreas degradadas (como pastos), com menos água e insumos, além de ser até três vezes mais produtiva comparada às variedades comuns plantadas no mesmo espaço. Ela deve ser utilizada principalmente para a produção de etanol de segunda geração da empresa ( Idem ).

Porém, a operação da usina não tem sido tranquila e ininterrupta. Desde sua inauguração, a usina já foi paralisada duas vezes, dois meses no final de 2015 e entre abril e outubro de 2016. O motivo das duas paralisações foram os mesmos: problemas na etapa de pré-tratamento. Apesar de sua capacidade de produção de 82 milhões de litros por ano de E2G, em 2015 a empresa produziu apenas 4 milhões de litros, correspondentes a apenas 4% de sua capacidade instalada. O principal problema que afetou a produção e causou as paralisações foi o excesso de areia restante após a etapa de pré-tratamento, o que prejudica o material e as peças da instalação ( Soares, 2016SOARES, G. A. (2016), O avanço das tecnologias de segunda geração e seus impactos na indústria do etanol . Dissertação de mestrado. Rio de Janeiro, UFRJ. ; Oliveira Filho, 2017OLIVEIRA FILHO, A. A. (2017), Mudanças e permanências no Sistema Setorial de Inovação da cana-deaçúcar: o caso do etanol celulósico . Tese de doutorado. Campinas (SP), Unicamp. ).

Essa situação alterou radicalmente os planos da empresa. A GranBio tinha planos de construir mais dez unidades de E2G, sendo que a segunda usina iniciaria sua construção em 2016. Porém, esses projetos foram abandonados e a construção da segunda usina está adiada por tempo indeterminado. A empresa ficou sem produzir E2G durante o ano de 2017 inteiro, e sua estimativa de produzir 1 bilhão de litros de E2G até 2020 também foi postergada para ao menos 2030 (NovaCana, 2017c).

A Raízen é uma empresa privada de capital fechado fundada em 2011. Ela é fruto de uma joint venture entre a empresa brasileira Cosan e a anglo-holandesa Shell. A empresa conta com mais de 30 mil funcionários e é uma das maiores produtoras de etanol de cana-de-açúcar no país, com um volume anual de cerca de 2 bilhões de litros. Atua ainda no segmento de distribuição de combustíveis (logística e infraestrutura) por meio da Shell, o que permite uma integração vertical da cadeia desde a matéria-prima (cana-de-açúcar) até a distribuição (postos de gasolina), com ampla penetração no país. A Raízen ainda é sócia do CTC e estabelece parcerias tecnológicas com o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) e com diversas universidades ( Corrêa, 2014CORRÊA, Camila Bastos. (2014), Parcerias estratégicas tecnológicas em projetos de etanol celulósico: oportunidades e desafios para as firmas nacionais . Dissertação de mestrado. Campinas (SP), Unicamp. ).

Um mês após a inauguração da planta da GranBio, a Raízen inaugurou sua planta industrial em Piracicaba (SP), capaz de produzir, segundo a empresa, cerca de 40 milhões de litros de etanol celulósico por ano. O investimento somou um total de R$ 231 milhões, dos quais R$ 207 milhões foram financiados por meio de crédito do BNDES através do programa Paiss ( Corrêa, 2014CORRÊA, Camila Bastos. (2014), Parcerias estratégicas tecnológicas em projetos de etanol celulósico: oportunidades e desafios para as firmas nacionais . Dissertação de mestrado. Campinas (SP), Unicamp. ).

O processo utilizado nessa usina utiliza tecnologia desenvolvida pela canadense Iogen Corporation,9 9 A Iogen Corporation é uma empresa canadense de capital fechado com sede em Ottawa. Ela desenvolve tecnologias de produção de biocombustíveis e, como mencionamos, possibilitou a construção e operação da usina de segunda geração da Raízen através de uma joint venture com a Cosan-Shell, (informação disponível no site da empresa, www.iogen.ca , consultado em 28/3/2018). o qual foi licenciado para a joint venture ( Corrêa, 2014CORRÊA, Camila Bastos. (2014), Parcerias estratégicas tecnológicas em projetos de etanol celulósico: oportunidades e desafios para as firmas nacionais . Dissertação de mestrado. Campinas (SP), Unicamp. ). O processo utiliza somente o bagaço como matéria-prima, explosão a vapor para o pré-tratamento, hidrólise enzimática com enzimas da dinamarquesa Novozymes e fermentação de ambos os açúcares (pentose e hexoses). A empresa conta com o uso exclusivo dessa tecnologia e terá propriedade integral sobre todo o desenvolvimento resultante do projeto ( Corrêa, 2014CORRÊA, Camila Bastos. (2014), Parcerias estratégicas tecnológicas em projetos de etanol celulósico: oportunidades e desafios para as firmas nacionais . Dissertação de mestrado. Campinas (SP), Unicamp. ).

Em 2015, a empresa projetou produzir 9,84 milhões de litros de E2G, entretanto, estima-se que apenas 1 milhão de litros tenham sido produzidos ( Soares, 2016SOARES, G. A. (2016), O avanço das tecnologias de segunda geração e seus impactos na indústria do etanol . Dissertação de mestrado. Rio de Janeiro, UFRJ. ). Assim como a GranBio, a Raízen também enfrenta problemas com a fase de pré-tratamento, apesar de não terem sido divulgados detalhes. A Raízen tinha planos de construir mais sete plantas de segunda geração após os custos de produção de E2G se igualarem aos de primeira geração, planos que foram radicalmente alterados em função dos imprevistos mencionados, sem que haja previsões para a ampliação da operação atualmente ( Oliveira Filho, 2017OLIVEIRA FILHO, A. A. (2017), Mudanças e permanências no Sistema Setorial de Inovação da cana-deaçúcar: o caso do etanol celulósico . Tese de doutorado. Campinas (SP), Unicamp. ).

Como apontamos em seção anterior, a interferência dos actantes não humanos (especialmente o processo de pré-tratamento) se revelou decisiva em relação às projeções e planos das empresas produtoras, alterando significativamente o cenário previsto. Além disso, os atores descritos (em sua maioria fornecedores de equipamentos ou materiais) dão uma ideia da complexidade e heterogeneidade da rede do E2G no Brasil, com diversas alianças internacionais, todas relacionadas com algum ator não humano que apresenta dificuldades de controle e domesticação por parte das empresas brasileiras no momento, as quais se veem obrigadas a importá-los.

Por sua vez, o CTC atua na pesquisa de toda a cadeia produtiva da cana-de-açúcar, em temas como administração rural, melhoramento e desenvolvimento de novas variedades, fitossanidade, sistemas de plantio e colheita, processos de extração e fermentação e sistemas de energia para as usinas de açúcar e bioetanol, tendo sido a principal base de inovações para as usinas paulistas e importante suporte técnico em temas agrícolas e industriais (BNDES/CGEE, 2008). Em 2005, o CTC passou por uma reestruturação, deixando de ser um centro de pesquisa particular (pertencente à Copersucar) e tornando-se uma organização da sociedade civil de interesse público (Oscip), sem fins lucrativos. Em 2011, mudou de novo sua constituição jurídica e passa a ser uma sociedade anônima, de capital aberto e com fins lucrativos. Os antigos sócios tornaram-se então acionistas da empresa. Depois disso, sua fonte de renda e lucros consiste exclusivamente na venda de suas tecnologias, através dos royalties pagos pelas empresas pelo licenciamento de suas propriedades de patentes. Atualmente, conta com doze polos regionais e mais de 350 profissionais entre gestores e pesquisadores.10 10 Informação disponível no site do CTC, new.ctc.com.br, consultado em 28/3/2018.

As rotas escolhidas pelo CTC foram a hidrólise enzimática, utilizando o bagaço e a palha como matéria-prima e vapor com catalizadores para o pré-tratamento, integrado a usinas de primeira geração. As enzimas são fornecidas por uma parceria com a Novozymes e os equipamentos foram fornecidos pela Andritz. O processo como um todo é de propriedade do próprio CTC, constituindo o único processo nacional para produção de etanol de segunda geração já instalado e com potencial de comercialização. Segundo a direção de Etanol de Segunda Geração do CTC, a unidade tem como principal objetivo mostrar a investidores, acionistas e clientes o potencial da tecnologia de segunda geração desenvolvida pelo centro ( Corrêa, 2014CORRÊA, Camila Bastos. (2014), Parcerias estratégicas tecnológicas em projetos de etanol celulósico: oportunidades e desafios para as firmas nacionais . Dissertação de mestrado. Campinas (SP), Unicamp. ).

A construção da usina de segunda geração recebeu investimentos da ordem de R$ 80 milhões por meio de financiamento do Paiss 1. Além disso, em 2014 o CTC recebeu um investimento de mais R$ 300 milhões na forma de participação acionária pelo programa, via BNDESPar, para suas pesquisas ( Soares, 2016SOARES, G. A. (2016), O avanço das tecnologias de segunda geração e seus impactos na indústria do etanol . Dissertação de mestrado. Rio de Janeiro, UFRJ. ).

Essas informações revelam que ao mesmo tempo que o E2G brasileiro está fortemente conectado a uma rede global, como os fornecedores de enzimas, celulases e tecnologias de processamento, ele também depende muito do esforço dos atores locais e do setor público de financiamento e pesquisa. Os problemas relacionados com o pré-tratamento não devem ser superados sem um grande envolvimento e conhecimento das próprias empresas produtoras e de atores locais, como os fornecedores de equipamentos e o CTC, que têm um profundo conhecimento sobre cana-de-açúcar. Além disso, a parte mais significativa dos custos de produção do etanol, tanto de primeira quanto segunda geração, se refere à matéria-prima (Milanez et al. , 2015), e a cana-energia, que tem recebido bastante atenção e investimento de diversos atores, deve baratear significativamente esses custos.

A partir de nossa pesquisa sobre as iniciativas nacionais, também pudemos constatar que as empresas brasileiras ainda investem pouco em pesquisas e no desenvolvimento de enzimas, preferindo licenciar essas tecnologias e importar as enzimas de empresas estrangerias como BetaRenewables, Novozymes, Iogen Corporation e DSM. O CTC é o único ator que investe no desenvolvimento de um processo próprio de hidrólise enzimática, e a GranBio, o único que investe no desenvolvimento de enzimas, apesar dos resultados ainda tímidos.

Outros atores importantes já fizeram parte dessa rede, como a Petrobrás e a Odebrecht Agroindustrial. Porém, com os prejuízos recentes, a Petrobrás abandonou seu projeto para se concentrar nos combustíveis fósseis, e a Odebrecht, em crise desde 2015, também não tem previsões de continuidade do projeto. Isso torna as três empresas que ainda investem no E2G ainda mais impor- tantes e fortes dentro dessa rede.

Os pontos fortes e fracos da rede do E2G no Brasil

A variedade de atores humanos e não humanos envolvidos na rede do etanol celulósico, como as diferentes matérias-primas, micro-organismos, configurações e processos, implica uma grande variedade também de comportamentos e resultados à rede do etanol celulósico. Diversos atores não humanos (ou actantes) dessa rede estão ainda num momento de construção e definição, como a mecanização da colheita e utilização da palha, a cana-energia, as enzimas e leveduras, o processo de pré-tratamento, entre outros processos e tecnologias que ainda estão em desenvolvimento. Esses actantes são fundamentais e interferem diretamente no desempenho do etanol celulósico. É o caso do pré-tratamento, que está atrasando projetos no mundo todo; das enzimas, que representam grande parte dos custos; ou da cana-energia, que pode alavancar a produção de segunda geração no Brasil. Por esses motivos, o E2G também se mostra uma caixa-preta ainda aberta, com diversos actantes sem uma figuração definida, abertos a novas associações por parte de empresas, governos e tecnologias, o que representa uma grande oportunidade para as empresas nacionais.

A rede do etanol celulósico brasileiro, especialmente em relação aos atores não humanos (ou actantes), está ligada a uma rede internacional, parceira ou fornecedora de muitas das tecnologias, das quais as empresas brasileiras são de certa forma dependentes, já que ainda não há fornecedores nacionais de enzimas. Por enquanto, a maior parte dessas empresas estão mais focadas em dominar o processo de produção, muitas vezes investindo na adaptação para a cana-de-açúcar de processos importados que utilizavam outras matérias-primas, em vez de desenvolver tecnologias próprias.

A cana-de-açúcar já é a matéria-prima mais produtiva para o E2G. Seu rendimento deve se elevar ainda mais com o desenvolvimento, em fase de comercialização, de variedades de cana-energia: sua produtividade por hectare é muito maior se comparada à das variedades tradicionais, ela pode ser plantada em solo mais degradado, com menor uso de água e produzir uma porção muito maior de fibras lignocelulósicas (bagaço), o que a torna ideal para a geração de E2G e bioeletricidade. Esse actante e suas possíveis figurações podem contribuir não só com o desempenho das usinas brasileiras, mas também representam uma grande oportunidade para empresas e institutos tecnológicos que desenvolvem variedades de cana, como a Vignis, o CTC, o IAC e a Ridesa.

Além disso, os programas e políticas públicas dedicados ao desenvolvimento do setor sucroenergético e do etanol de segunda geração, como os programas Paiss 1 e 2 e o recente Renovabio, podem ser considerados pontos fortes da rede do E2G no Brasil. Os programas Paiss 1 e 2 contribuíram com mais de R$ 4 bilhões em recursos de financiamento ao setor, o que possibilitou a construção das usinas de segunda geração em escala comercial da GranBio e Raízen, e o Renovabio deve garantir uma grande quantidade de recursos e estabilidade de mercado ao setor sucroenergético nos próximos anos, o que pode colaborar com o E2G de forma indireta e também direta (ao valorizar, através dos CBios, combustíveis renováveis avançados).

No entanto, a rede do etanol de segunda geração brasileira possui certas fraquezas, como as escassas iniciativas de produção (somente três usinas), o baixo nível de investimento privado (pois a maior parte do total investido partiu do BNDES), pouca pesquisa e desenvolvimento (realizados quase exclusivamente pelo CTBE), baixíssimo patenteamento, grande dependência das empresas estrangeiras para fornecimento de material e tecnologias de produção, além dos muitos problemas em seu funcionamento, especialmente na fase de pré-tratamento, com as expectativas de produção cada vez mais baixas e distantes.

As análises e indicadores apontam que as empresas e os pesquisadores brasileiros têm realizado poucos esforços de pesquisa e desenvolvimento referente aos processos básicos de segunda geração, no caso a hidrólise, a síntese de celulase (enzimas) e a fermentação das pentoses. Apesar dos esforços identificados principalmente no caso do CTC e do CTBE, seus resultados ainda são pouco expressivos em comparação com o resto do mundo, com o depósito de poucas patentes nacionais e a quase ausência de patentes internacionais ( Felipe e Rossel, 2010FELIPE, M. A. & ROSSEL, C. V. (2010), “Roadmap tecnológico para o etanol”, in L. B. Cortez (org.), Bioetanol de cana-de-açúcar: P&D para produtividade e sustentabilidade , São Paulo, Blucher. ; Corrêa, 2014CORRÊA, Camila Bastos. (2014), Parcerias estratégicas tecnológicas em projetos de etanol celulósico: oportunidades e desafios para as firmas nacionais . Dissertação de mestrado. Campinas (SP), Unicamp. ; Murakami, 2015MURAKAMI, T. G. L. (2015) Trajetórias tecnológicas na etapa de hidrólise enzimática para a produção de bioetanol de 2ª geração . Tese de doutorado. Campinas (SP), Unicamp. ). O CTC depositou somente três patentes junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), relacionadas com o processo de hidrólise e produção integrada de primeira e segunda geração, as quais se juntam à patente depositada em 2008, referente ao processo fermentativo compreendendo a etapa de pré-tratamento e hidrólise enzimática utilizando biomassa (PI 0802153-8), concedida em 2016. GranBio e Raízen ainda não possuem depósito de patentes relacionadas ao E2G. Já o CTBE possuía catorze depósitos de patente até 2017, sendo cinco depósitos relacionados ao desenvolvimento de enzimas e hidrólise enzimática (não licenciados), três relativos ao desenvolvimento de micro-organismos e fermentação, e o restante voltado à colheita e ao processamento da cana ( Idem ).

Historicamente, o setor sucroalcooleiro não tem uma tradição de pesquisa industrial, sendo a maior parte das inovações do setor realizada pelos fornecedores de equipamentos através de simples aquisição de equipamentos ou de caráter incremental, as quais, em sua grande maioria, se dão por meio de projetos de engenharia e processos de aprendizados associados a mecanismos de know-how , know-who e learning-by-doing , nos quais prevalece o conhecimento tácito e sem atividades de pesquisa e desenvolvimento propriamente ditas ( Varrichio, 2012VARRICHIO, P. C. (2012), Uma análise dos condicionantes e oportunidades em cadeias produtivas baseadas em recursos naturais: o caso do setor sucroalcooleiro no Brasil . Tese de doutorado. Campinas (SP), Unicamp. ). A exceção fica por conta da área de agricultura, com diversas instituições de pesquisa, como o IAC, a Ridesa e o CTC, que juntos já desenvolveram centenas de variedades de cana-de-açúcar mais produtivas e resistentes, além de variedades de cana-energia nas quais o Brasil é pioneiro e avança rapidamente, já produzida em escala comercial e utilizada para a produção de E2G.

Porém, o setor sucroenergético vive um momento difícil desde 2011, quando entrou em vigor a política de contenção de preços da gasolina para controle da inflação, encerrada somente no final de 2014, que reduziu a competitividade do etanol frente à gasolina e causou grande prejuízo e endividamento do setor. Esse fato somou-se à recessão econômica iniciada em 2009 no Brasil e à falta de uma política governamental clara de longo prazo para o etanol, levando a uma estagnação da produtividade sucroenergética, a qual pode se estender até 2030 segundo recentes análises (EPE, 2017a; 2017b). Esse cenário atinge inclusive o BNDES, principal investidor do etanol celulósico na rede brasileira, que em janeiro de 2017 informou um prejuízo de R$ 568 milhões com o setor sucroenergético em sua carteira de investimentos (NovaCana, 2017a).

Não podemos esquecer também os problemas relacionados com o pré-tratamento. As empresas no mundo todo estão tendo muitas dificuldades com essa etapa do processo, o que tem reduzido significativamente o rendimento das usinas de segunda geração e adiando, ano após ano, as expectativas das empresas e investidores. Entretanto, por se tratar da primeira etapa, as dificuldades com o pré-tratamento podem estar camuflando problemas talvez tão graves ou maiores nas etapas posteriores de hidrólise e fermentação, o que ressalta a importância das pesquisas e das plantas experimentais. No Brasil, esses problemas fizeram a produção das usinas de segunda geração despencar para menos de 10% da capacidade e minaram os planos das empresas pioneiras de construir mais de dez novas de usinas até 2025.

Uma última questão refere-se à controvérsia envolvendo o E2G e a cogeração de bioeletricidade sucroenergética. A maioria das usinas é autossuficiente, produzindo sua própria força motriz ou eletricidade a partir da queima do bagaço em caldeiras de cogeração. Há um grande potencial de se produzir energia excedente, o que significa que essa energia pode ser exportada para o sistema elétrico. Muitas usinas, especialmente as mais novas e modernas, já realizam essa função. Em 2015, a oferta de energia para o sistema interligado obtida através da biomassa de cana-de-açúcar totalizou mais de 20 TWh (Unica, 2016). Isso é praticamente duas vezes o montante oferecido através dos parques eólicos no mesmo ano e representa quase 4% do total produzido de energia elétrica no Brasil. Se for considerado o autoconsumo das usinas, que não entra como um dado positivo nos balanços de eletricidade, mas representa uma economia de energia por parte do sistema produtivo, podemos somar mais 15 TWh ( EPE, 2016EPE – Empresa de Pesquisa Energética. (2016), “Análise de Conjuntura dos Biocombustíveis Ano 2015”. Disponível em http://epe.gov.br/sites-pt/publicacoes-dados-abertos/publicacoes/PublicacoesArquivos/publicacao-167/An%C3%A1lise%20de%20Conjuntura%20dos%20Biocombust%C3%ADveis%20-%20Ano%202015.pdf, consultado em 19/5/2017.
http://epe.gov.br/sites-pt/publicacoes-d...
).

Além disso, a energia elétrica obtida por meio da biomassa da cana revela-se ainda mais interessante por ser complementar ao regime hídrico, ou seja, o período de colheita e processamento da cana-de-açúcar se dá justamente no período de estiagem. De forma regular, a safra sucroenergética nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, onde se concentram a maior parte da produção de cana no Brasil e mais de 70% da capacidade dos reservatórios brasileiros, ocorre entre os meses de abril e novembro, coincidindo exatamente com o período de estiagem nessa região (Castro, Brandão e Dantas, 2010). A oferta de 20 TWh em bioeletricidade para o sistema elétrico em 2015 representou uma economia de 14% das águas nos reservatórios do submercado elétrico Sudeste/Centro-Oeste (Unica, 2016).

Porém, a controvérsia se dá na medida em que E2G e a cogeração de bioeletricidade utilizariam o mesmo material, no caso, o bagaço e a palha excedente das usinas de etanol, disputando, portanto, os recursos materiais e os investimentos das usinas. Além das vantagens já citadas, a cogeração ainda é um conjunto de tecnologias muito mais barato e desenvolvido, no qual as empresas brasileiras são líderes no mundo e exportam equipamentos ( CGEE, 2009CGEE – Centro de Gestão e Estudos Estratégicos. (2009), Bioetanol combustível: uma oportunidade para o Brasil. Brasília, CGEE. ).

O incentivo à produção de bioeletricidade nas usinas de etanol poderia contribuir com a descentralização da matriz elétrica e com a desconcentração da produção de cana e etanol no Brasil. Ao tornar o investimento em usinas de cana-de-açúcar mais rentável devido à produção complementar de bioeletricidade (sem a necessidade de grandes investimentos como o E2G), novas usinas poderiam se instalar espalhadas pelo Brasil, longe do Centro-Sul.

É importante ressaltar que o E2G ainda é uma aposta muito arriscada, e comparando o nível de recursos que as empresas investiram com o que o BNDES investiu, fica claro que este último é o ator que está assumindo os riscos, não as empresas. Esses dados demonstram que o setor sucroenergético não é uma exceção à regra quando o assunto é in- vestimento em pesquisa, o que reforça mais uma vez a importância do Estado para o desenvolvimento da ciência e da tecnologia brasileiras.

Podemos dizer que a cogeração e o E2G são actantes que fazem parte da mesma rede, disputando nas usinas a figuração dos mesmos elementos (no caso, o bagaço e a palha enquanto combustível para um ou outro), o que torna essa rede ainda mais complexa e heterogênea. Análises recentes da Empresa de Pesquisa Energética ( EPE, 2015EPE – Empresa de Pesquisa Energética. (2015), “Plano Decenal de Expansão de Energia 2024”. Disponível em www.epe.gov.br/pt/publicacoes-dados-abertos/publicacoes/Plano-Decenal-de-Expansao-de-Energia-2024, consultado em 10/8/2016.
www.epe.gov.br/pt/publicacoes-dados-aber...
) apontam que as usinas mais novas ou modernas investiram pesado em cogeração, o que deve comprometer o investimento e a produção de E2G nessas usinas no curto prazo, algo visto ainda com receio pela maior parte dos produtores ( Oliveira Filho, 2017OLIVEIRA FILHO, A. A. (2017), Mudanças e permanências no Sistema Setorial de Inovação da cana-deaçúcar: o caso do etanol celulósico . Tese de doutorado. Campinas (SP), Unicamp. ). Por se tratar de um investimento muito elevado e arriscado, as tecnologias de segunda geração devem ser adotadas no início somente por grandes empresas ou parcerias entre grandes usinas (como nos revelou em entrevista o assessor técnico do CTC), dividindo assim os recursos das usinas com os processos de cogeração.

Considerações finais

Em nossa pesquisa, procuramos mapear a rede do E2G no Brasil a partir do material analisado e do nosso referencial teórico (TAR), ou seja, buscamos identificar quais eram os principais atores, humanos e não humanos, envolvidos no desenvolvimento e produção de E2G, assim como a atuação de cada um desses atores, suas conexões, alianças e disputas. Com base nisso, pudemos constatar que a rede do etanol de segunda geração no Brasil envolve diversos setores (parte do setor sucroenergético, fornecedores de equipamentos, instituições governamentais de financiamento e pesquisa como o BNDES e o CTBE, empresas de tecnologia e melhoramento genético etc.), além de fornecedores de material, equipamentos e tecnologias de outros países. A partir desse mapeamento pudemos entender melhor as disputas e controvérsias envolvendo esses atores, decisivas no delineamento da trajetória do E2G no Brasil e no seu futuro.

Procuramos também demonstrar a importância e atuação dos atores não humanos como cana-de-açúcar e suas variações – em especial a cana-energia –, a palha da cana, os equipamentos e processos de pré-tratamento, hidrólise e fermentação, as enzimas e leveduras, os açúcares resultantes (pentoses e hexoses) etc.

Os problemas com o pré-tratamento, bem como as dificuldades em produzir as enzimas de forma viável e fermentação dos açúcares resultantes da hidrólise de forma eficiente (em especial as hexoses), demonstram a dificuldade em se domesticar e controlar os atores não humanos e fazê-los participar dessa rede como desejado pelos pesquisadores e produtores. A interferência da areia no processo de pré-tratamento, um imprevisto que à primeira vista parecia irrelevante para os produtores e fornecedores de equipamentos (acostumados com outras matérias-primas), revelou-se determinante na operação das usinas e em seu resultado final, alterando completamente as primeiras previsões nacionais que fomentaram o financiamento dessas usinas pioneiras. Isso mostra que esses atores atuam e modificam o curso da ação de forma muitas vezes imprevisíveis aos atores humanos, o que justifica o fato de a TAR chamar essas entidades não humanas de actantes.

Também procuramos demonstrar como essas iniciativas, mesmo quando partem de setores privados da economia, necessitam de uma série de apoios e recursos públicos para operar. No caso da produção de E2G no Brasil, o financiamento do BNDES foi fundamental. E daqui para frente, muito vai depender do sucesso do programa Renovabio para a construção e continuidade da operação das usinas de segunda geração. Isso confirma o que a TAR insiste em afirmar que a ciência e a tecnologia são inseparáveis e praticamente indistinguíveis do restante da sociedade (a não ser por um recurso discursivo), o que aproxima o papel dos cientistas e engenheiros ao do empreendedor e dos políticos tradicionais.

As controvérsias envolvendo o desenvolvimento do E2G no Brasil – como os problemas com o pré-tratamento (que as empresas insistem em dizer que são só contratempos, enquanto os pesquisadores da área apontam como grande entrave), a competição por recursos com a cogeração, assim como as disputas envolvendo o setor sucroenegético e as distribuidoras de combustíveis – também foram essenciais para elucidar os atores não humanos e processos que poderiam passar despercebidos, assim como os atores principais dessa rede e os seus interesses. Com isso, esperamos ter trazido uma discussão mais rica sobre o assunto do que seria uma análise que não levasse em conta os não humanos, além do embate entre os atores envolvidos – com diversos pontos de vista e expectativas quanto ao desenvolvimento e às possibilidades do E2G em relação a outras alternativas energéticas.

Ao final dessa pesquisa, ficou claro para nós que as primeiras expectativas e promessas para o E2G no Brasil eram precipitadas, prometendo muito para muito cedo. Problemas e atrasos são comuns a quase todos os grandes projetos tecnológicos, especialmente no setor de energia, como foram inicialmente os projetos de energia solar e energia eólica nos anos de 1980, o que não significou seu fracasso ou abandono. As expectativas atuais apontam que o E2G deve se tornar um paradigma no setor sucroenergético a partir de 2030 se a maior parte dos problemas apontados for contornada. De qualquer forma, ele deve dividir com a bioeletricidade os recursos materiais e financeiros das usinas.

Muita coisa vai depender ainda do desenvolvimento dessa rede sociotécnica, ou seja, dos atores não humanos como as enzimas, matérias-primas, processos de pré-tratamento, da continuidade e do aumento dos financiamentos públicos para pesquisa e produção, da inclusão de novos atores do setor de pesquisa e de universidades, além do sucesso ou do fracasso das políticas energéticas e tecnológicas ligadas ao setor, especialmente o Renovabio.

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Notas

  • 1
    Para mais detalhes sobre esses processos, ver Seabra (2008)SEABRA, J. E. A. (2008), Análise de opções tecnológicas para uso integral da biomassa no setor de cana-de-açúcar e suas implicações . Tese de doutorado. Campinas (SP), Unicamp. , Ogeda e Petri (2010)OGEDA, T. L. & PETRI, D. F. S. (2010), “Hidrólise enzimática de biomassa”. Química Nova , 33 (7): 1549-1558. , Galbe e Zacchi (2010)GALBE, M. & ZACCHI, G. (2010), “Produção de etanol a partir de materiais lignocelulósicos” , in L. B. Cortez (org.), Bioetanol de cana-de-açúcar: P&D para produtividade e sustentabilidade , São Paulo, Blucher. e Albarelli (2013)ALBARELLI, J. Q. (2013), Produção de açúcar e etanol de primeira e segunda geração: simulação, integração energética e análise econômica . Tese de doutorado. Campinas (SP), Unicamp. .
  • 2
    Para mais detalhes sobre os tramites do programa, ver Lorenzi (2018)LORENZI, B. (2018), Etanol de segunda geração no Brasil: política e translações . Tese de doutorado. São Carlos (SP), UFSCar. .
  • 3
    Conforme carta encaminhada ao Senado em 5 de dezembro de 2017 e assinada pelas seguintes frentes parlamentares: Frente Parlamentar da Agropecuária; Frente Parlamentar pela Valorização do Setor Sucroenergético; Frente Parlamentar Mista do Biodiesel; Frente Parlamentar da Indústria de Máquinas e Equipamentos; Frente Parlamentar em Defesa do Cooperativismo; Frente Parlamentar Mista em Defesa das Energias Renováveis, Eficiência e Portabilidade da Conta de Luz (Unica, 2017).
  • 4
    “A União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) é a maior organização representativa do setor de açúcar e bioetanol do Brasil. Sua criação, em 1997, resultou da fusão de diversas organizações setoriais do estado de São Paulo, após a desregulamentação do setor no País” (informação disponível no site da organização, www.unica.com.br/historico-e-missao , consultado em 29/6/2018).
  • 5
    A BetaRenewables é uma multinacional de capital aberto com sede na Itália (Milão) cujo o maior acionista é a Biochemtex (italiana). Desenvolvedora de biocombustíveis, produtos químicos renováveis e licenciadora das tecnologias que desenvolve. A empresa é parceira da Novozymes, que fornece as enzimas para a tecnologia Proesa, licenciada pela empresa para a produção de E2G e utilizada pela GranBio em sua usina de segunda geração ( Corrêa, 2014CORRÊA, Camila Bastos. (2014), Parcerias estratégicas tecnológicas em projetos de etanol celulósico: oportunidades e desafios para as firmas nacionais . Dissertação de mestrado. Campinas (SP), Unicamp. ).
  • 6
    A Novozymes é uma empresa multinacional de capital aberto com sede em Bagsværd, na Dinamarca. Seu principal acionista é a dinamarquesa Novo Holdings A/S. A empresa é líder no ramo de enzimas no mundo, fornecendo 48% do mercado de enzimas industriais. Emprega mais de 6 mil pessoas e possui diversas unidades espalhadas pelo mundo, inclusive no Brasil (informação disponível no site da empresa, www.novozymes.com , consultado em 28/3/2018).
  • 7
    A Royal DSM é uma multinacional holandesa com sede em Heerlen, empregando mais de 25 mil pessoas em mais de cinquenta países e um faturamento anual superior a 10 bilhões de euros (informação disponível no site da empresa, www.dsm.com , consultado em 28/3/2018). Atua na indústria química (saúde, nutrição e materiais) e é a fornecedora das leveduras utilizadas para a fermentação dos açúcares na usina de segunda geração da GranBio.
  • 8
    A VignisBionergia Ltda. é uma empresa de tecnologia do setor sucroenergético fundada em 2015 com sede em Campinas (SP) e pioneira no desenvolvimento de variedades de cana-energia – foi a primeira empresa no Brasil a desenvolver uma variedade de cana-energia, em 2008. Sua produção deve chegar a 1 milhão de toneladas na safra 2018-2019 ( Cherubin, 2016CHERUBIN, N. (2016), “A cana energia e sua versatilidade”. RPAnews , nov. Disponível em revistarpanews.com.br/ed/70-edicao2015/edicao-185/1910-a-cana-energia-e-sua-versatilidade, consultado em 21/3/2019.
    revistarpanews.com.br/ed/70-edicao2015/e...
    ).
  • 9
    A Iogen Corporation é uma empresa canadense de capital fechado com sede em Ottawa. Ela desenvolve tecnologias de produção de biocombustíveis e, como mencionamos, possibilitou a construção e operação da usina de segunda geração da Raízen através de uma joint venture com a Cosan-Shell, (informação disponível no site da empresa, www.iogen.ca , consultado em 28/3/2018).
  • 10
    Informação disponível no site do CTC, new.ctc.com.br, consultado em 28/3/2018.
  • Siglas utilizadas
    BNDES – Banco Nacional do Desenvolvimento Ecônomico e Social
    BNDESPAR – BNDES Participações
    CGEE – Centro de Gestão e Estudos Estratégicos
    CND – Contribuição Nacionalmente Determinada
    CNPE – Conselho Nacional de Política Energética
    COP – Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas
    CT&I – Ciência, Tecnlogia e Inovação
    CTBE – Laboratório de Ciência e Tecnologia do Etanol
    CTC – Centro de Tecnologia Canavieira
    E2G – Etanol de Segunda Geração
    ENCTI – Estratégia Nacional para Ciência, Tecnologia e Inovação
    EPE – Empresa de Pesquisa Energética
    FINEP – Financiadora de Estudos e Projetos
    FNDCT – Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
    GEES – Gases de Efeito Estufa
    IAC – Instituto de Açúcar e Álcool
    MAPA – Minsitério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
    MCTI – Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação
    MME – Ministério de Minas e Energia
    ONU – Organização das Nações Unidas
    OSCIP – organização da sociedade civil de interesse público
    PACTI – Programa de Aceleração do Crescimento
    PAISS – Plano BNDES-Finep de Apoio à Inovação dos Setores Sucroenergético e Sucroquímico
    RIDESA – Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor Sucroenergético
    TWH – Terawatt hora

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Set 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    19 Out 2017
  • Aceito
    11 Mar 2019
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