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PROSTITUIÇÃO MASCULINA E INTERSECÇÕES DESEJANTES NAS RUAS DE CAMPO GRANDE (MS)* * O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.

MALE PROSTITUTION AND DESIRING INTERSECTION IN THE STREETS OF CAMPO GRANDE (MS)

PROSTITUTION MASCULINE ET INTERSECTIONS DE DÉSIR DANS LES RUES DE CAMPO GRANDE (MS)

Resumos

Este artigo é parte de uma pesquisa maior sobre a prostituição masculina em Campo Grande (MS). Iniciada em 2016, a pesquisa aciona categorias de diferenciação que se articulam com gênero e sexualidade. No presente texto, destacamos as particularidades da prostituição masculina exercida nas ruas da cidade. Para tanto, incialmente, fazemos uma contextualização da prostituição masculina de rua no Brasil com base em uma série de trabalhos que destacam o tema. Em seguida, problematizamos os pontos de prostituição masculina de rua em Campo Grande e indicamos suas particularidades à luz das noções de dispositivo da sexualidade e biopolítica. Por fim, baseados no caso de um garoto de programa que se prostitui nas ruas da cidade, refletimos sobre as idiossincrasias locais desse negócio.

Palavras-chave:
Prostituição masculina; Sexualidade; Rua; Campo Grande (MS)


This article is part of a larger research project on male prostitution in Campo Grande (MS). Starting in 2016, this research mobilizes categories of differentiation articulated with gender and sexuality. In this text, we highlight the particularities of male prostitution on the streets of the city. For this purpose, initially, we contextualize the street male prostitution in Brazil based on a series of works that discuss the subject. Then, we reflect upon the street male prostitution scenes in Campo Grande and point out their particularities, taking into account the concepts of apparatus of sexuality and biopolitics. At last, based on a case study of a male prostitute who works in the streets of the city, we analyze the local idiosyncrasies of this business.

Keywords:
Male prostitution; Sexuality; Street; Campo Grande (MS)


Cet article fait partie d’une enquête plus vaste sur la prostitution masculine à Campo Grande (MS). Entreprise en 2016, la recherche déclenche des catégories de différenciation articulées avec le genre et la sexualité. Dans ce texte, nous soulignons les particularités de la prostitution masculine exercée dans les rues de la ville. Nous proposons, ainsi, une contextualisation de la prostitution de rue masculine au Brésil à partir d’une série d’œuvres qui mettent en évidence ce sujet. Nous problématisons ensuite les points de prostitution masculine de rue à Campo Grande et nous indiquons leurs particularités à la lumière des notions de dispositif de la sexualité et de la biopolitique. En conclusion, sur la base du cas d’un prostitué qui se prostitue dans les rues de la ville, nous réfléchissons sur les particularités locales de cette affaire.

Mots-clés:
Prostitution masculine; Sexualité; Rue; Campo Grande (MS)


Introdução

Em nossas perambulações noturnas pelas ruas de Campo Grande, em Mato Grosso do Sul, seguindo os trajetos percorridos por garotos de programa no centro da cidade ou em um bairro da periferia, madrugada após madrugada, temos uma sensação impertinente: aqueles jovens, alguns com corpos hipertrofiados pelo excesso de exercício físico, outros sujos, quase mendicantes, são pontos fora da curva em uma sociedade tão “ordeira, crente e moralista” como a campo-grandense, como destacou um interlocutor de nossa pesquisa. Esses sujeitos aparecem como desviantes, segundo Howard S. Becker (2008)BECKER, Howard S. (2008), Outsiders: estudos de sociologia do desvio. Rio de Janeiro, Zahar., e verdadeiros outsiders noturnos.

Os homens que se prostituem nas ruas de Campo Grande estão, quase sempre, em “casa”. Logo, negociam distâncias e agenciam possibilidades de resistência. Para Michel Foucault (1995)FOUCAULT, Michel. (1995), “O sujeito e o poder”, in P. Rabinow e H. L. Dreyfus, Michel Foucault, uma trajetória filosófica: para além do estruturalismo e da hermenêutica, Rio de Janeiro, Forense Universitária, pp. 63-82., nas relações de poder, existe a possibilidade de resistir, mesmo que os processos de subjetivação docilizem os sujeitos, que podem criar rotas de fuga e exercer a positividade de se constituírem sujeitos de si. Esse parece ser o caso dos interlocutores de nossa pesquisa, em desenvolvimento desde 2016 na capital de Mato Grosso do Sul. Objetivamos buscar as particularidades do encontro entre gênero, sexualidade e outras categorias de diferenciação1 * O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001. relacionadas à prostituição masculina em uma cidade da região Centro-Oeste do Brasil não considerada um grande centro urbano nacional.

Neste artigo, especificamente, nosso objeto de análise é a prostituição de rua em Campo Grande nos dois espaços em que se desenvolve com maior visibilidade. Vamos investigar transformações, estratégias e regulações que produzem novas gramáticas nesse negócio do desejo. O tema específico da prostituição masculina está inserido no grande campo de estudos de gênero e sexualidade, cujas problemáticas, nas últimas décadas, alcançaram os mais diversos olhares. Há uma produção consistente sobre os mercados do sexo, as economias sexuais e o uso tarifado do corpo de, entre autores como Adriana Gracia Piscitelli (2011)PISCITELLI, Adriana Gracia; ASSIS, Gláucia de Oliveira e OLIVAR, José Miguel Nieto. (2011), “Introdução: transitando através de fronteiras”, in A. G. Piscitelli, G. de O. Assis e J. M. N. Olivar (orgs.), Gênero, sexo, amor e dinheiro: mobilidades transnacionais envolvendo o Brasil, Campinas, Unicamp/Pagu, pp. 5-30., José Miguel Nieto Olivar (2013)OLIVAR, José Miguel Nieto. (2013), Devir puta: políticas da prostituição de rua na experiência de quatro mulheres militantes. Rio de Janeiro, EdUERJ., Fernando Altair Pocahy (2012)POCAHY, Fernando Altair. (2012), “‘Vem meu menino, deixa eu causar inveja’: ressignificações de si nas transas do sexo tarifado”. Sexualidad, Salud y Sociedad, (11): 122-154., Laura María Agustín (2005)AGUSTÍN, Laura María. (2005), Trabajar en la industria del sexo, y otros tópicos migratorios. San Sebastián, Tercera Prensa., entre outros.

Desse modo, parece profícuo elencar questões teóricas e também metodológicas sobre os homens envolvidos nesse processo. Não os homens como clientes ou agenciadores de mulheres e travestis, mas sim aqueles que performam como garotos de programa. Isso não apenas descortinaria uma nova seara de análise, ainda pouco investigada, como também problematizaria o lugar dos homens nesse processo, seus trânsitos e as possibilidades de agência.

Em pesquisa anterior, mapeamos 55 trabalhos publicados, desde os anos de 1980, sobre prostituição masculina no Brasil em diferentes áreas (Lopes, Passamani e Rosa, 2019LOPES, Tatiana Bezerra de Oliveira; PASSAMANI, Guilherme R. e ROSA, Marcelo Victor da. (2019), “Prostituição masculina no Brasil: o panorama da produção teórica desde ‘O negócio do michê’”, in T. Oliveira (org.), Homens nos mercados do sexo: reflexões sobre agentes, espaços e políticas, Salvador, Devires, pp. 19-49.). Ainda que exista essa produção nas últimas quatro décadas, o estudo da prostituição masculina está longe de ser consolidado. O trabalho mais destacado sobre o tema é o livro O negócio do michê: a prostituição viril em São Paulo, de Néstor O. Perlongher (1987)PERLONGHER, Néstor O. (1987), O negócio do michê: a prostituição viril. São Paulo, Brasiliense., fruto de sua dissertação de mestrado em antropologia social, defendida na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em São Paulo.

O trabalho de Perlongher, quando de sua publicação, foi inovador e, ainda hoje, continua basilar para pesquisas desenvolvidas sobre o tema. Sua etnografia com os michês, garotos de programa que ofereciam serviços sexuais no centro da cidade de São Paulo (SP), na região conhecida como Boca do Lixo, entre a Praça da República e o Largo do Arouche, resultou em mais que um trabalho sobre prostituição masculina. Sua investigação é uma contribuição significativa com relação a estudos de gênero e sexualidade, estudos urbanos e questões que envolvem método na pesquisa antropológica. O autor fez um debate consistente sobre gênero, sexualidade e outras categorias de diferenciação, nomeadas “tensores libidinais” (Perlongher, 1987PERLONGHER, Néstor O. (1987), O negócio do michê: a prostituição viril. São Paulo, Brasiliense., p. 241); foi possível então pensar gênero e sexualidade em intersecção com raça/etnia, classe, escolarização, região, território, entre outros. As abordagens desdobraram-se de um contato frequente com michês e permitiram compreender esses sujeitos além das performances desenvolvidas na rua, principalmente, tentando descortinar os meandros do negócio empreendido por eles.

Dito isso, este artigo está estruturado em três momentos. Primeiro, destacamos alguns elementos da trajetória de um garoto de programa que se prostitui nas ruas de Campo Grande, atentando para as idiossincrasias de seu negócio. Com base nessa trajetória, acionamos alguns trabalhos brasileiros sobre prostituição masculina de rua em diferentes cidades, quase sempre capitais turísticas. Esse mapeamento pode ser importante para compor uma espécie de estética da prostituição masculina2 1 Para Adriana Gracia Piscitelli (2008), categorias de diferenciação ampliam o escopo de análise de diferenças e compreensão das desigualdades resultantes de processos de hierarquização binária pelos quais os sujeitos desviantes das normas passam. de rua e todo um imaginário que a constituiu como tal. Por fim, apresentamos os principais locais de prostituição masculina nas ruas de Campo Grande, bem como suas particularidades analisadas segundo conceitos foucaultianos de dispositivo da sexualidade e biopolítica. Um dos pontos estudados, que denominamos Região Central, fica na região mais central da cidade; o outro ponto, neste artigo chamado Região Universitária, está localizado próximo da universidade de uma cidade.

A escrita de si mesmo: entre diálogos e tensões desejantes na madrugada

Dos quase dez garotos de programa que contatamos nos anos de pesquisa, conseguimos manter uma relação de forma mais continuada com Cristian.3 2 Aqui, a estética da prostituição masculina é entendida como um modo específico de apropriação da realidade com intersecções com outros modos de ser e estar no mundo baseados em elementos sociais, econômicos, culturais etc. Com 22 anos, considera-se branco, tem cabelos curtos castanho-claros, mede 1,75 metro e pesa 72 quilos. Tem um corpo levemente malhado; segundo ele, seu corpo é “definido”.

Em nossos primeiros encontros, Cristian se esforçava para falar de modo bastante correto, conjugando todos os verbos, mas acabava dando umas derrapadas no português. Isso chamou a nossa atenção. Ele contou que concluiu o ensino médio e que residia em um bairro da periferia, próximo ao aeroporto da cidade. Cristian estava em uma esquina do centro, na Região Central, quando o encontramos pela primeira vez, em uma madrugada de sexta-feira.4 3 Nome escolhido pelo interlocutor para ser identificado na pesquisa. Quando passamos lentamente de carro, ele sorriu e fez um gesto com a boca. Isso se repetiu nas outras duas vezes até que paramos o carro para o primeiro contato. “Boa noite, delícia, sou o Cristian. Sou baratinho: cinquentinha, uma carteira de cigarros e uma cerveja”,5 4 Conta que se prostitui exclusivamente nas ruas; não trabalha em saunas nem utiliza sites e aplicativos. foram suas primeiras palavras.

Ao descer do carro, conversamos amenidades, tentando não falar sobre o programa e ainda não revelando nossa pesquisa. Fizemos especulações genéricas. O movimento parecia fraco aquele dia. Éramos percebidos por ele, talvez, como clientes em potencial. Quando a conversa enveredava para a efetivação do programa, o que ele tentava de várias formas, revelamos nossa intenção de fazer uma pesquisa. Para nossa surpresa, isso não arrefeceu o assunto, e o garoto de programa não se afastou. Apenas disse: “Mas você pode me pagar um xis? Cincão para uma cerveja?”. A conversa seguiu fora do local, no estacionamento de um posto de gasolina, onde bebemos um pouco. Repetimos essas conversas em outras madrugadas e, às vezes, durante o dia. Cristian gostava de conversar e contava muitas histórias. Nossas conversas se realizaram por todo o ano de 2017, quase sempre durante a noite, depois das 23 horas.

Cristian não se compreende como homossexual, ainda que a totalidade de seus programas sejam, segundo ele, com homens. Em todos os seus programas, é o ativo da relação. Implicitamente, talvez, tinha a intenção de dizer que isso confirmaria que não era homossexual. Afinal, é possível que se depreenda desse pormenor que homossexuais não seriam ativos. Ele se referia a seus clientes como viados.6 5 Todas as falas de Cristian apresentadas no texto foram autorizadas por ele. Os clientes de Cristian, eram, como nos contou, casados e mais velhos. “Como pode um viado casado com mulher? Pai de família? Aliançona no dedo. Nunca vou entender. Deve ser corno. Quem come a mulher dele?”; ele voltava a estas questões de maneira recorrente.

Esse discurso nos remete ao dispositivo de aliança e suas imbricações com o dispositivo de sexualidade. Para Foucault (1998)FOUCAULT, Michel. (1998), História da sexualidade I: a vontade de saber. Rio de Janeiro, Edições Graal., o primeiro dispositivo está ligado a questões de parentesco, transmissão dos nomes e bens e deu condições para que o segundo pudesse ser valorizado, no século XVIII. Tal valorização resultou em um revés no momento em que o dispositivo de sexualidade passou a sustentar o dispositivo de aliança. É nesse sentido que podemos abordar o discurso moral de Cristian direcionado aos clientes casados, uma vez que se espera que sejam monogâmicos, heterossexuais, pais de família e patronos do lar. Entretanto, Cristian só teve condições de emitir tal enunciado porque passou a buscar clientes em razão de seu trabalho sexual. Dito de outra forma, a prática do sexo tarifado na posição de passivo fragiliza o lugar de marido que compõe o dispositivo de aliança.

Ainda no campo das confirmações de sua heterossexualidade, Cristian conta que tem um relacionamento sério com uma mulher, que não sabe de seus extras e bicos como garoto de programa. Para essa companheira, ele conta que faz trabalhos extras como garçom em festas pela cidade, nunca definindo um local específico. Inclusive, carrega na mochila uma camisa branca, uma calça e um sapato.

Como ouvimos na Região Universitária, a qual abordamos adiante, na Região Central, os programas quase sempre eram rápidos e ocorriam dentro dos carros, conforme conta nosso interlocutor. Eram raras as vezes em que os programas se davam em motéis ou na casa dos clientes. “Só um, uma vez, me chamou pra casa dele. Cara muito bacana. Pagou bebida cara. Mulher viajando. E ainda me deu duzentão.” Tal situação, no entanto, conforme ratifica, é exceção diante da regra, isto é, “Os viado só choram o preço. Querem pagar merreca. Por merreca, só mamada mesmo”.

Nosso interlocutor conta que o mercado de Campo Grande é bastante restrito nesse campo, por essa razão o número de garotos de programa é pequeno. Ele fala em algo esporádico e flutuante. No entanto, diz ter uma clientela fixa. Esses clientes mais regulares costumam ser mais generosos na hora do pagamento, não barganhando muito o valor do negócio. Cristian disse que um elemento decisivo é ser bem-dotado: “Tenho 21 cm, pow. Os viado adora”.

Chama a atenção, nas conversas que tivemos, a dinâmica da negociação. De Perlongher (1987)PERLONGHER, Néstor O. (1987), O negócio do michê: a prostituição viril. São Paulo, Brasiliense. à produção nacional posterior sobre prostituição de maneira geral e prostituição masculina em especial, o processo que envolve a precificação do prazer tem sido um elemento significativo. É a tensão entre o desejo e o produto. A flutuação do mercado é muito presente, e a negociação envolve a tentativa de reduzir o preço do programa. Isso faz com que a oferta do prazer também seja reduzida, variando (diminuindo) o que pode ser adquirido pelo valor disponível.

Como já mencionado, Cristian não considera a prostituição uma profissão. Ele diz que se prostitui como forma de “fazer um extra, um bico”. Sua profissão, soubemos depois de algum tempo de campo, era eletricista. Em vista disso, sua presença nas ruas da Região Central, assim como a de outros garotos de programa, não é contínua. Ele está ali quando consegue, quando pode. Conta que “faz a quadra” quando tem mais movimento: “Tô aqui de quarta a sexta. Sábado só às vezes. Movimento mesmo é de quarta a sexta”.

Sobre o ponto, a rua e os donos dos pontos, parece que existem especificidades na prostituição masculina diferentes da prostituição de mulheres e travestis, como Cristian nos contou.7 6 Sobre essa hierarquia de modelos de classificação das sexualidades brasileiras, já é clássico o trabalho de Peter Fry (1982). Ele disse que não tem um ponto fixo na rua e que percorre um trajeto minimamente definido. O fechamento do negócio se dá quando as partes se acertam em termos de preço a ser pago e do que é ofertado por esse preço dentro de um tempo estipulado; isso ocorre, geralmente, em uma rua de menor movimento.

Com base nas informações de nosso interlocutor, parece não haver um cafetão ou cafetina que seja dono ou dona dos pontos dos garotos de programa. Com mulheres e travestis que se prostituem, a situação é diferente, o que pode ser verificado na literatura nacional sobre o tema e nas ruas de Campo Grande (Piscitelli, 2008PISCITELLI, Adriana Gracia. (2008), “Interseccionalidades, categorias de articulação e experiências de migrantes brasileiras”. Sociedade e Cultura, 11 (2): 263-274.; Pelúcio, 2009PELÚCIO, Larissa. (2009), Abjeção e desejo: uma etnografia travesti sobre o modelo preventivo de aids. São Paulo, Fapesp/Annablume.; Olivar 2013OLIVAR, José Miguel Nieto. (2013), Devir puta: políticas da prostituição de rua na experiência de quatro mulheres militantes. Rio de Janeiro, EdUERJ.; Benedetti, 2005BENEDETTI, Marcos Renato. (2005), Toda feita: o corpo e o gênero das travestis. Rio de Janeiro, Garamond.). Esse tipo de prostituição é muito mais ostensivo, além de demandar estrutura (casa, comida, roupas etc.). Cristian nos contou que essa figura que cobraria para que pudessem estar em certo local e, em troca, daria alguma segurança e estrutura, ainda que precária, não existia. Talvez faça sentido, afinal a prostituição masculina no centro da cidade é de poucos e flutuantes garotos, ou seja, há diferentes garotos, em poucos momentos e apenas em alguns dias. Não parece ser um negócio muito lucrativo a ponto de ser explorado por uma empresa de cafetinagem.

Um ponto sensível em nossas conversas com Cristian e que só conseguimos avançar quase no final do trabalho de campo, já em 2018, quando as conversas tinham deixado de ser mais frequentes em função de ele ter conseguido um emprego em tempo integral, foi sobre infecções sexualmente transmissíveis (IST). Ele sempre evitava esses assuntos. Apenas se limitava a dizer: “Eu não tenho HIV. Sou limpo”. Como muitas pessoas, desde os primeiros tempos da pandemia, nosso interlocutor também associa o vírus HIV a sujeira e comportamentos indevidos. Das infecções mais comuns, ele disse ter tido blenorragia (gonorreia) e papilomavírus humano (HPV). Na altura de nossa conversa, dizia fazer exames periódicos no Centro de Testagem e Amostragem (CTA) e praticar sexo seguro com os clientes.8 7 Disse que parece não haver uma concorrência entre os garotos de programa nas ruas do centro da cidade. Ele os consideraria como amigos e companheiros de trabalho na noite: “Não tem disputa ou briga. Professor, tem espaço pra todo mundo. É paz”.

O que aparece nas falas de Cristian são as tentativas, reiteradas, de os clientes quererem fazer sexo sem camisinha; comenta: “Eles querem a todo momento”. Essa é uma parte importante da negociação, pois os clientes ofertam mais dinheiro para que não usem camisinha. Cristian conta que é sempre uma iniciativa do cliente e que “o cara precisa ser forte pra resistir. Os viado querem pagar mais. Se a gente tá duro, vacila na deles mesmo”. Apesar disso, sempre reafirmou que não fez sexo desprotegido; porém, suas respostas eram vagas, ele começava a olhar para o lado e, supomos, tentava desconversar. Em razão da reação de Cristian ao assunto, é possível sugerir que já tenha feito sexo desprotegido e que essa questão o incomoda.

Essa reação pode ser entendida, entre outras possiblidades, como a relação entre homens e saúde, como expõem Rosele Ciccone Paschoalick, Maria Ribeiro Lacerda e Maria de Lourdes CentaPASCHOALICK, Rosele Ciccone; LACERDA, Maria Ribeiro e CENTA, Maria de Lourdes. (2006), “Gênero masculino e saúde”. Cogitare Enfermagem, 11 (1): 80-86.:

Sentir-se fraco, ficar doente, ser traído pela mulher, perder o emprego, ser estéril ou impotente, não são simplesmente coisas desagradáveis, mas sinais que podem ameaçar o referencial de virilidade. É justamente tentando ser forte que ele se torna vulnerável e passa a sofrer consequências do papel que ele se propõe a representar na sociedade (2006, p. 83).

Além disso, ainda nos pareceu inusitado, ao longo do trabalho de campo, a ausência de uma categoria presente em outros ramos da prostituição: os relatos sobre violência física. Trabalhos sobre prostituição de mulheres e travestis (Olivar, 2013OLIVAR, José Miguel Nieto. (2013), Devir puta: políticas da prostituição de rua na experiência de quatro mulheres militantes. Rio de Janeiro, EdUERJ.; Benedetti, 2005BENEDETTI, Marcos Renato. (2005), Toda feita: o corpo e o gênero das travestis. Rio de Janeiro, Garamond.) apontam, constantemente, a violência física como uma presença indelével. Em nossa pesquisa, isso não apareceu. Os interlocutores não relataram agressão física de clientes, contra clientes nem do aparato repressivo do Estado. Cristian, por exemplo, conta que têm algumas estratégias para evitar a violência. Diz que fica o menor tempo possível parado e que se insinua apenas quando um carro passa lentamente e o motorista faz algum tipo de insinuação ou contato visual diferenciado; daí ele em geral põe a mão no pênis, morde lascivamente os lábios e olha diretamente para o homem no carro.

Analisando os dois pontos de prostituição masculina de rua na cidade de Campo Grande e as conversas reiteradas com Cristian, verificamos uma série de elementos que se repetem e parecem dar corpo à construção social do desejo nessa dimensão do mercado sexual daquele local. Nesse sentido, a intersecção entre algumas categorias de diferenciação pode nos ajudar a elucidar melhor as tramas que aproximam sujeitos, corpos, economias sexuais, agência e desejo nas noites dessa cidade. É um pouco disso que aparece na produção nacional sobre a temática, conforme apresentamos a seguir.

Algumas investigações sobre prostituição masculina de rua no Brasil

Como mencionamos na introdução, desde os anos de 1980, o trabalho de Perlongher (1987)PERLONGHER, Néstor O. (1987), O negócio do michê: a prostituição viril. São Paulo, Brasiliense. tem sido a referência mais visível no campo da prostituição masculina brasileira. Até a segunda metade da década de 1990, era praticamente o único trabalho. Depois desse período, nos anos de 2000, começaram a ser divulgadas outras pesquisas, geralmente dissertações, teses e artigos, sobre prostituição masculina em diferentes regiões do Brasil. Tais trabalhos – apresentamos alguns neste artigo – tinham a rua como o locus privilegiado de análise. Algumas dessas pesquisas repetiam as observações do antropólogo argentino enfocando outras cidades.

A década de 2000 trouxe uma novidade sobre os espaços ocupados pela prostituição masculina: uma migração para locais privados, especialmente, as saunas. A prostituição de rua começou a sofrer um refluxo e, no âmbito privado e comercial, houve um aumento de oferta desse negócio em tais espaços, sobretudo nos grandes centros urbanos do Sudeste e do Nordeste do Brasil.

Segundo Miguel Angelo Ribeiro (2015)RIBEIRO, Miguel Angelo. (2015), “Dinâmica, espacialidade e relações homocomerciais: o exemplo das saunas de boys na urbe carioca”. Revista Latino-americana de Geografia e Gênero, 6 (2): 213-234., até os anos de 1980, a prostituição masculina se dava quase que exclusivamente nas ruas. Com as pesquisas de Margareth Rago (1991)RAGO, Margareth. (1991), Os prazeres da noite: prostituição e códigos da sexualidade feminina em São Paulo (1890-1930). Rio de Janeiro, Paz e Terra. sobre prostituição feminina, foi construído um entendimento de que a prostituição de rua é um fenômeno urbano-industrial. Ainda vigorava uma lógica de que o encontro erótico e sexual entre dois homens precisava ser marcado por alteridades radicais, segundo uma série de categorias de diferenciação, em que classe, geração e performances de gênero poderiam ser as mais destacadas. Além disso, esse ramo do ainda precário mercado sexual deveria ser caracterizado por um encontro rápido, anônimo, secreto e quase sempre desprovido de qualquer tipo de afeto. Para tanto, os únicos espaços propícios a esses encontros eram, de fato, ruas escuras, praças, becos e ruelas. Havia uma aproximação sintomática entre prazer e perigo. Quando a violência de michês, de clientes e do aparato policial se transformou na tônica do processo, surgiram as primeiras saunas, no final dos anos de 1980. A ideia de segurança e anonimato parece ser predominante nesse processo de mudança (Ribeiro, 2015RIBEIRO, Miguel Angelo. (2015), “Dinâmica, espacialidade e relações homocomerciais: o exemplo das saunas de boys na urbe carioca”. Revista Latino-americana de Geografia e Gênero, 6 (2): 213-234.).

Nas pesquisas de Normando José Queiroz Viana (2009VIANA, Normando José Queiroz. (2009), “Uma pesquisa exploratória sobre os sentidos do prazer e da excitação sexual entre homens com práticas sexuais homossexuais (michês) de caráter comercial na cidade de Recife”. XV Encontro Nacional da Associação Brasileira de Psicologia Social, Maceió, 30 out.-2 nov.; 2010VIANA, Normando José Queiroz. (2010), “É tudo psicológico! Dinheiro… Pruuu! Fica logo duro”: desejo, excitação e prazer entre boys de programa com práticas homossexuais em Recife. Dissertação de mestrado. Universidade Federal de Pernambuco, Recife.), é dada certa relevância à busca pelo prazer e pela excitação sexual no contexto da prostituição masculina. O corpo malhado, produzido e deixado à mostra pelo michê nas ruas do centro do Recife (PE), está sujeito ao deleite dos clientes mediante determinado montante financeiro. Em outra pesquisa no Recife, Epitacio Nunes de Souza Neto (2010)SOUZA NETO, Epitacio Nunes de. (2010), “Quem come é quem engole: a subjetividade na construção das performances de gênero entre os boys de programa de Recife”. Fazendo Gênero 9, Florianópolis, 23-26 ago. Disponível em http://www.fazendogenero.ufsc.br/9/resources/anais/1277817374_ARQUIVO_QUEMCOMEEQUEMENGOLE.pdf, consultado em 5/12/2019.
http://www.fazendogenero.ufsc.br/9/resou...
, ao investigar as performances de gênero de boys que se prostituem, conta que havia essa prática em todos os cantos do Recife. Com base em categorias êmicas, percebe-se que havia uma busca incessante pelo boy verdadeiro por parte dos frangos, as bichas locais. É interessante verificar que o frango, uma categoria socialmente desprestigiada no universo da prostituição, porque visivelmente passiva, era percebida pelos michês como a categoria do controle. Esse controle exercido pelos frangos se dava em função de deterem a posse do dinheiro. Segundo alguns michês, interlocutores de Souza Neto, “quem paga é quem define as regras, ainda que esteja sendo passivo para um dotado” (2010, p. 75). Ser passivo diante de um dotado é percebido como uma condição de subalternidade; ainda assim, nas tramas desejantes das noites do Recife, essa condição pode ser relativizada desde que o frango detenha o dinheiro e consiga agenciar outro lugar, submetendo seu boy verdadeiro a suas exigências.

A rua também aparece como um espaço de negócio para os michês de Fortaleza (CE), pesquisados por Maria Lourdes dos Santos (2009SANTOS, Maria Lourdes dos. (2009), “O michê no palco sem holofotes”. XIV Congresso Brasileiro de Sociologia, Rio de Janeiro, 28-31 jul.; 2011SANTOS, Maria Lourdes dos. (2011), “Esmiuçando vidas de homens prostitutos em Fortaleza”. XV Congresso Brasileiro de Sociologia, Curitiba, 26-29 jul.; 2013SANTOS, Maria Lourdes dos. (2013), Da batalha na calçada ao circuito do prazer: um estudo sobre prostituição masculina no centro de Fortaleza. Tese de doutorado. Universidade Federal do Ceará, Fortaleza.). A autora destaca os territórios desejantes da cidade que estão alocados no centro, muito próximos às regiões turísticas da capital cearense.9 8 Essa é uma recorrência na produção nacional sobre o tema. A maior parte dos garotos de programa diz fazer apenas sexo com preservativo. Afirmam que os “outros” fazem sexo desprotegido. Aliás, a prostituição masculina local, conforme destaca Santos, está bastante associada ao turismo. Isso se aplica a outras modalidades de prostituição, como destacara Piscitelli (2011)PISCITELLI, Adriana Gracia; ASSIS, Gláucia de Oliveira e OLIVAR, José Miguel Nieto. (2011), “Introdução: transitando através de fronteiras”, in A. G. Piscitelli, G. de O. Assis e J. M. N. Olivar (orgs.), Gênero, sexo, amor e dinheiro: mobilidades transnacionais envolvendo o Brasil, Campinas, Unicamp/Pagu, pp. 5-30.; 2013PISCITELLI, Adriana Gracia. (2013), Trânsitos: brasileiras nos mercados transnacionais do sexo. Rio de Janeiro, EdUERJ.) e suas pesquisas no estado. Portanto, há uma espécie de circuito negociado do prazer em praças, esquinas e avenidas do entorno do centro de Fortaleza. Nos territórios do desejo, em que se desenvolvia a prostituição masculina, a autora percebeu algumas categorias de diferenciação que marcavam os lugares sociais distintos de michês e clientes. Notadamente, elencou como mais relevantes classe, performances sexuais, idade e porte físico. A conjugação dessas categorias construía algo como o michê ideal e o cliente potencial.

Como em outros trabalhos, como o de Fernanda Burbulhan (2014)BURBULHAN, Fernanda. (2014), A experiência michê: um estudo fenomenológico. Dissertação de mestrado, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto., em São Paulo (SP), e o de Alan de Loiola Alves (2011)ALVES, Alan de Loiola. (2011), “Homens que se prostituem e as diferentes identidades”. III Seminário Nacional Gênero e Práticas Culturais: olhares diversos sobre a diferença, João Pessoa, 26-28 out. Disponível em http://www.itaporanga.net/genero/3/03/05.pdf, consultado em 5/12/2019.
http://www.itaporanga.net/genero/3/03/05...
, no Rio de Janeiro (RJ), Santos (2013)SANTOS, Maria Lourdes dos. (2013), Da batalha na calçada ao circuito do prazer: um estudo sobre prostituição masculina no centro de Fortaleza. Tese de doutorado. Universidade Federal do Ceará, Fortaleza. percebe que a prostituição masculina é marcada por encontros intergeracionais (michê jovem e cliente mais velho) e por uma relação sexual estabelecida entre dois homens, pelo menos socialmente, tidos como heterossexuais.10 9 Prostituição masculina de rua e turismo também se aproximam nas pesquisas de Miguel Angelo Ribeiro (1997) realizadas no Rio de Janeiro (RJ). O autor destaca o encontro de michês e gringos em Copacabana. O que também aproxima alguns dados produzidos nas capitais do Ceará, de São Paulo e do Rio de Janeiro, é a compreensão da prostituição como um bico, ou seja, uma atividade temporária. Nessas pesquisas, não é vista como a profissão dos sujeitos nem mesmo como a ocupação laboral principal. É sempre acionada como algo passageiro ou como um extra, uma complementação de renda.

O porte físico, algo que Santos destaca em seus trabalhos, é recorrente em outras pesquisas, como as de Viana (2010)VIANA, Normando José Queiroz. (2010), “É tudo psicológico! Dinheiro… Pruuu! Fica logo duro”: desejo, excitação e prazer entre boys de programa com práticas homossexuais em Recife. Dissertação de mestrado. Universidade Federal de Pernambuco, Recife., Daniel Rogers de Souza Ferreira (2011)FERREIRA, Daniel Rogers de Souza. (2011), Prazer com segurança? As relações entre michês e polícia num ponto de prostituição do centro de Fortaleza. Dissertação de mestrado. Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza., Jean Moreira Alcântara (2009)ALCÂNTARA, Jean Moreira. (2009), Territórios invisíveis: territorialidades dos garotos de programa na área central de Manaus. Dissertação de mestrado. Universidade Federal do Amazonas, Manaus. e Vladir Inácio do Prado Júnior (2018)PRADO JÚNIOR, Valdir Inácio do. (2018), Os territórios de prostituição masculina em Goiânia. Dissertação de mestrado. Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Goiânia.. Em todos esses trabalhos, há uma enorme valorização do corpo,11 10 Sobre questões que envolvem sexualidade e geração no campo da prostituição, ainda que não se trate, especificamente, do contexto das ruas, mas das saunas, indicamos a leitura de Fernando Altair Pocahy (2017) e Daniel Kerry dos Santos (2016). que é construído para ser atraente aos olhos dos clientes. A construção do corpo, geralmente, passa por sessões longas de hipertrofia nas academias de musculação. É como se o corpo malhado, com os músculos destacados, constituísse a estética do michê, que passaria a ser reconhecido também como bem-dotado. O corpo casa com uma roupa justa, com algumas partes salientes, deixando algo à mostra. Portanto, há uma espécie de montagem do michê ideal para seduzir seu cliente. Isso passa pela manipulação cuidadosa do corpo, mas não para aí. Existe todo um repertório que se completa com a chamada pegada, isto é, a atitude masculina e viril durante o programa.

Em nosso levantamento sobre prostituição masculina de rua, há, como dissemos anteriormente, uma série de trabalhos sobre capitais litorâneas do Nordeste. Em alguns desses trabalhos, o destaque se dá ao aparecimento da questão da raça. Esse é o caso, por exemplo, do trabalho de Ferreira (2011)FERREIRA, Daniel Rogers de Souza. (2011), Prazer com segurança? As relações entre michês e polícia num ponto de prostituição do centro de Fortaleza. Dissertação de mestrado. Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza. sobre os denominados homens de aluguel do centro de Fortaleza, que eram, em geral, discretos e bem-vestidos. No entanto, o que mais os destacava era a branquidade, um atributo muito valorizado no mercado sexual local. Isso apareceu em nosso campo, conforme vai ser apresentado adiante. Há locais em que o inverso ocorre, onde a negritude é altamente valorizada, inclusive porque o sujeito racializado como descendente de africano é tido como hipersexualizado. Isadora Lins França (2012)FRANÇA, Isadora Lins. (2012), Consumindo lugares, consumindo nos lugares: homossexualidade, consumo e subjetividades na cidade de São Paulo. Rio de Janeiro, EdUERJ. ouviu em seu campo que esse sujeito é detentor de uma “genética africana abençoada” (p. 127).

As pesquisas sobre prostituição de rua nas regiões Norte e Centro-Oeste são mais tímidas e ainda há um vasto campo a ser explorado. Os trabalhos de Prado Júnior (2018)PRADO JÚNIOR, Valdir Inácio do. (2018), Os territórios de prostituição masculina em Goiânia. Dissertação de mestrado. Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Goiânia. e de Prado JúniorPRADO JÚNIOR, Valdir Inácio do; AMARAL, Fabrício Borges do e BARBOSA, Ycarim Melgaço. (2018), “Epistemologia do território: a prostituição masculina em Goiânia”. urbe: Revista Brasileira de Gestão Urbana, 10 (2): 335-345., Fabrício Borges do Amaral e Ycarim Melgaço Barbosa (2018) apresentam um olhar sobre a prostituição masculina de rua de Goiânia (GO). Os autores contam que se trata de uma prática muito comum na cidade, mas igualmente invisível. Está alocada no setor central, uma região bastante popular em termos de comércio formal durante o dia e onde, no período noturno, teria lugar o comércio sexual. Do ponto de vista das modalidades de programa, o mais comum é o sexo rápido dentro do carro. Os autores ainda destacam as tensões com o poder público e a polícia, que tentam acabar com os pontos de prostituição na área.

No estado do Amazonas, Alcântara (2009)ALCÂNTARA, Jean Moreira. (2009), Territórios invisíveis: territorialidades dos garotos de programa na área central de Manaus. Dissertação de mestrado. Universidade Federal do Amazonas, Manaus. realizou uma pesquisa sobre prostituição masculina de rua na cidade de Manaus. O olhar do autor, como tem sido comum nos trabalhos mais recentes sobre prostituição masculina de rua, dá destaque para a questão que envolve a constituição de territórios do desejo. Apresenta as diferentes regiões da cidade em que a prostituição acontece e a particularidade de cada um desses pontos, desde as performances dos garotos de programa, até a especificidade dos clientes em cada um desses espaços. Alcântara acaba por traçar algo como uma cartografia da prostituição masculina de rua em Manaus. Praças, banheiros públicos, avenidas escuras, ruas do centro da cidade, durante a noite, constituem territórios desejantes, onde diferentes pontos da cidade abarcam variadas performances nesse complexo negócio.12 11 A exceção a essa compreensão está no trabalho de Reginaldo Guiraldelli e Marisa Fernandes de Souza (2013) sobre prostituição masculina de rua em Belo Horizonte (MG). Na capital mineira, pelo menos nessa pesquisa, os michês não eram apenas homens malhados.

Após esse sobrevoo por algumas pesquisas brasileiras sobre prostituição masculina de rua, é possível notar a atualidade do trabalho de Perlongher (1987)PERLONGHER, Néstor O. (1987), O negócio do michê: a prostituição viril. São Paulo, Brasiliense., que, direta ou indiretamente, é referenciada em todas as investigações. No entanto, além disso, é interessante perceber como alguns scripts, algumas estéticas e, ainda, alguns imaginários se repetem em diferentes contextos regionais. Em vista disso, de algumas rupturas e de tantas permanências no campo de investigações sobre o uso tarifado do corpo para fins sexuais entre homens nas ruas do Brasil, torna-se oportuno problematizar como tem ocorrido em Campo Grande, não mais no sentido da trajetória de um sujeito, como fizemos com Cristian, mas destacando alguns territórios do desejo.

A prostituição masculina de rua em Campo Grande

Conversas com interlocutores de outras pesquisas e investigações em salas de bate-papo na internet nos encaminharam para dois pontos de prostituição masculina em Campo Grande, cuja frequência costuma ser maior nos dias da semana e, esporadicamente, nas noites de sábado. O ponto em que conhecemos Cristian é a Região Central e está próximo a uma praça de grande movimento. Essa mancha13 12 É importante salientar, ainda, que existem trabalhos sobre prostituição pautados em iniciativas de movimentos sociais. Indicamos a leitura de Ana Isabel Fábregas-Martínez e Marcos Renato Benedetti (2000) e Fernando Altair Pocahy (2007). de prostituição está delimitada por ruas e avenidas do centro da cidade. A concentração efetiva de prostituição nessa mancha é muito destacada.

O segundo ponto de prostituição, a Região Universitária, tem como configuração uma espécie de triângulo imperfeito que compreende sete quarteirões do bairro. Essa região é marcada pela presença de empresas de transporte, segurança e algumas residências. O local apresenta a prostituição de forma menos visível e é mais conhecido como um lugar de pegação entre pessoas que estão, geralmente, de carro. Há alguns de motocicleta e outros a pé que são, na maioria, moradores da região. Como ali a prostituição é eventual, há poucos garotos que se concentram nas partes mais escuras perto de uma quadra de esportes. Essa concentração nas áreas mais escuras pode ser compreendida como repressão da sexualidade, em que existe um ciclo de interdição. Dito de outra forma, um ciclo de negatividade que constrói o entendimento do que venha a ser a sexualidade, como aponta Foucault, “o ciclo da interdição: não te aproximes, não toques, não consumas, não tenhas prazer, não fales, não apareças; em última instância não existirás, a não ser na sombra e no segredo” (1998, p. 81).

Não se estranha que o local tenha passado por um profundo processo de higienização e gentrificação14 13 Segundo José Guilherme Cantor Magnani, “manchas são áreas contíguas do espaço urbano dotadas de equipamentos que marcam seus limites e viabilizam – cada qual com sua especificidade, competindo ou complementando – uma atividade ou prática predominante” (1996, pp. 40-41). que envolveu construção de casas, iluminação, corte de árvores e colocação de cercas de arame farpado em alguns imóveis e terrenos usados para práticas sexuais, segundo interlocutores. Nesse sentido, há traços de tentativas de repressão sexual. No entanto, Foucault entende que o dispositivo de sexualidade, lido unicamente pela repressão, seria limitante, uma vez que “todos os modos de dominação, submissão, sujeição se reduziriam, finalmente, ao efeito de obediência” (1998, p. 83). Diante disso, podemos lançar o seguinte questionamento: até que ponto a prostituição masculina nas ruas sobrevive unicamente às margens, às sombras, no escuro?

Pensar as relações de poder, em especial aquelas que envolvem a prostituição masculina na rua, unicamente pela ideia de negatividade é anular a positividade do poder na constituição dos sujeitos. Nesse caso, anula-se a agência dos atores sociais envolvidos nas tramas da prostituição masculina de rua (clientes, garotos de programa, moradores, policiais, empresários locais e outros). Se, de um lado, moradores e empresários reforçam a iluminação, instalam câmeras de vigilância, colocam arames farpados, de outro, os clientes circulam de carro com películas escuras nos vidros, nublando as fronteiras do permitido e do proibido, tensionando com as iluminações públicas e privadas, desafiando os arames farpados. Criam, assim, outras dimensões possíveis para estabelecer o negócio do desejo. Agora, a escuridão não está nos equipamentos externos, mas se configura do interior dos carros.

Qual é o deslocamento produzido por tal higienização? Das sombras das árvores e dos becos para a sutil escuridão dos carros com películas escuras nos vidros com reduzidos níveis de transparência. Tal prática evita que quem está fora do carro possa ver o que ocorre em seu interior. No caso de nossa investigação, as práticas sexuais entre clientes e garotos de programa ocorrem na via pública. Se antes a escuridão das árvores e dos becos tornava invisível a prática sexual, agora, a escuridão do carro torna invisível e transmite a sensação de maior segurança para o cliente,15 14 De acordo com Rogério Proença Leite (2007), a tradução do neologismo gentrification é ainda controversa no Brasil. Em alguns textos, aparece como gentrificação, nossa opção neste texto. No entanto, segundo o autor, o termo que mais se aproximaria em português é enobrecimento. uma vez que aquele é seu território.

É importante mencionar que o ponto de prostituição da Região Central também está passando, desde 2018, por um programa de revitalização da prefeitura chamado Reviva Campo Grande16 15 Tal deslocamento pode permitir agressão física, furto e até sequestro, mas também pode assegurar anonimato e invisibilidade. . Tal programa tem por objetivo trazer vida ao centro da capital e, para isso, diversas ações de infraestrutura, cultura, arquitetura e urbanismo estão em andamento.17 16 Para mais informações, consultar o site do programa Reviva Campo Grande, disponível em http://www.campogrande.ms.gov.br/reviva/o-programa/, consultado em 5/12/2019. Como destacamos, nessa mancha estão presentes a prostituição de homens, mulheres cisgêneros e transgêneros e travestis. Além disso, é visível a presença de usuários de drogas, vendedores de drogas e pessoas em situação de rua18 17 Compreendemos que há um esforço no sentido da gentrificação, do enobrecimento, da “limpeza” desses espaços para que se tornem, outra vez, atrativos economicamente. que, na visão do Estado, de comerciantes e de boa parcela da população não deveriam morar ali ou existir ali, principalmente após os processos de revitalização em curso.19 18 Para mais informações, consultar Michelli Rossi (2011) e Mariana Lopes (2012).

Compreendemos, dessa forma, que o conceito foucaultiano de biopolítica nos ajuda a apreender melhor esse cenário e, especialmente, torna mais perceptível quem deve ocupar o centro da cidade e quem não deve. Para Foucault (2008)FOUCAULT, Michel. (2008), Nascimento da biopolítica. São Paulo, Martins Fontes., ao passo que o Estado realiza políticas públicas de valorização da vida, também faz, na mesma medida, um investimento pela morte. Não necessariamente uma morte física. Pode ser, como no caso do centro de Campo Grande, uma morte social, caracterizada pela expulsão de alguns sujeitos em benefício de outros. Cristian e outros garotos de programa já estão sofrendo os impactos do Reviva Campo Grande: os clientes diminuíram ou se afastaram em razão das obras que alteram o trânsito e da nova e potente iluminação do local.

Sai o feio, o pobre, o sujo e o transgressor. Deseja-se quem têm condições sociais e financeiras de se manter no centro da cidade e consiga, do ponto de vista econômico e moral, consumir adequadamente. Esse Homo oeconomicus – quem deve morar no centro de Campo Grande – é o sujeito ideal para que o Estado possa exercer sua função de governamentalidade, pois é disciplinado e dócil e gera riquezas, o que não ocorre com a prostituição nem com o universo das drogas. Na biopolítica de gestão da cidade, seria preciso, primeiro, conceber as manchas da prostituição como regiões morais20 19 Para uma visão mais aprofundada sobre determinados usos da cidade por grupos colocados à margem, especialmente usuários de crack, ver Taniele Rui (2014) e Erick Luiz Araújo de Assumpção (2019). e delas se afastar para, logo em seguida, submeter os locais da cidade a processos de enobrecimento baseados em iniciativas do poder público, como ocorre no centro de Campo Grande, ou do setor privado, conforme se observou na Região Universitária.

Os dois pontos de prostituição masculina de Campo Grande estão distantes, mais ou menos, 4 quilômetros. São ligados por uma via de fácil acesso que conecta centro a bairro, possibilitando, por meio do uso de automóvel, transitar entre um e outro. Frequentadores da Região Universitária e garotos de programa que se prostituem ali comentam que boa parte das pessoas que consome o local (França, 2012FRANÇA, Isadora Lins. (2012), Consumindo lugares, consumindo nos lugares: homossexualidade, consumo e subjetividades na cidade de São Paulo. Rio de Janeiro, EdUERJ.) “é povo da universidade”.

Há semelhanças e diferenças entre os dois pontos. Talvez a semelhança mais marcada seja a forma de contato entre clientes e garotos de programa. O carro é um mecanismo fundamental que possibilita esse tipo de negócio. As pessoas que estão procurando sexo com garotos de programa na Região Central e aquelas que estão na Região Universitária usam o carro e, mais especificamente, permanecem dentro do carro. É o garoto de programa que entra no carro. Os clientes pouco saem do veículo. Muitas vezes, o programa é realizado no carro mesmo, como nos contou Cristian.21 20 Segundo Robert E. Park (1967), a região moral é um espaço segregado por interesses, gostos e temperamentos. Em Chicago (Estados Unidos), eram as zonas de vício encontradas na cidade. Difere por seus interesses mais imediatos e fundamentais. Outra recorrência entre os dois pontos de prostituição é que o cliente é quase sempre um homem mais velho e dono do carro. O garoto de programa, por sua vez, é mais jovem e está, geralmente, a pé ou de bicicleta. Pode ocorrer de o cliente, algumas vezes, ter proximidade etária com o garoto de programa, mas essa não é a regra. Temos aqui, uma flagrante interação sexual intergeracional comum a outros contextos de prostituição e presente em outras pesquisas brasileiras sobre envelhecimento e sexualidade/homossexualidade, como Júlio Assis Simões (2004)SIMÕES, Julio Assis. (2004), “Homossexualidade masculina e curso da vida: pensando idades e identidades sexuais”, in A. Piscitelli, M. F. Gregori e S. Carrara (orgs.), Sexualidade e saberes: convenções e fronteiras, Rio de Janeiro, Garamond, pp. 415-447., Carlos Eduardo Henning (2014)HENNING, Carlos Eduardo. (2014), Paizões, tiozões, tias e cacuras: envelhecimento, meia-idade, velhice e homoerotismo masculino na cidade de São Paulo. Tese de doutorado. Universidade Estadual de Campinas, Campinas., Gustavo Santa Roza Saggese (2015)SAGGESE, Gustavo Santa Roza. (2015), Entre perdas e ganhos: homossexualidade masculina, geração e transformação social na cidade de São Paulo. Tese de doutorado. Universidade de São Paulo, São Paulo. e Guilherme Rodrigues Passamani (2018)PASSAMANI, Guilherme Rodrigues. (2018), Batalha de confete: envelhecimento, condutas homossexuais e regimes de visibilidade no Pantanal-MS. Rio de Janeiro, Papéis Selvagens..

As diferenças estão, principalmente, nos sujeitos que se prostituem e na aparente distância social entre os contratantes do serviço. No centro da cidade, é possível encontrar garotos de programa jovens, brancos e bem-vestidos, que têm cuidados estéticos destacados, como Cristian. Também existem garotos de programa não brancos, pardos no máximo. Não percebemos, nas observações, garotos de programa negros na Região Central. Inclusive, aqueles com quem conversamos não se classificaram como negros. Isso não quer dizer que o espaço de prostituição masculina de rua não seja racializado, pelo contrário, ele é altamente racializado. Isso se dá, especialmente, se levamos em consideração a intersecção com a categoria classe. Há diferenças flagrantes de classe entre os garotos de programa, podemos dizer, que podem ser observadas na estética, nas roupas e nos demais adereços.

Desde Perlongher (1987)PERLONGHER, Néstor O. (1987), O negócio do michê: a prostituição viril. São Paulo, Brasiliense., a categoria raça está presente como tensor libidinal na prostituição masculina. Em determinados contextos, a branquidade, como diz Ferreira (2011)FERREIRA, Daniel Rogers de Souza. (2011), Prazer com segurança? As relações entre michês e polícia num ponto de prostituição do centro de Fortaleza. Dissertação de mestrado. Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza., é um forte estimulante do prazer e um qualificador do negócio. Tal questão também esteve presente na etnografia de Victor Hugo de Souza Barreto (2012)BARRETO, Victor Hugo de Souza. (2012), “Vamos fazer uma sacanagem gostosa?”: uma etnografia do desejo e das práticas da prostituição masculina carioca. Dissertação de mestrado. Universidade Federal Fluminense, Niterói., quando pesquisou saunas de boys no Rio de Janeiro. Naquele contexto, conta o autor, como no mercado sexual local, os boys loiros ou russos eram altamente valorizados em relação a homens negros, por exemplo.

A situação em relação ao marcador cor/raça muda na prostituição masculina de rua de Campo Grande, principalmente quando se trata do ponto da Região Universitária. Lá não observamos nem contatamos garotos de programa brancos. Eram, em sua totalidade, pretos e pardos, ou seja, negros.22 21 Entre as principais práticas sexuais realizadas, estão sexo oral no garoto de programa e no cliente; masturbação no garoto de programa e no cliente; introjeção do dedo (algumas vezes mais de um) no ânus do cliente; penetração no cliente; anilíngua no cliente (popularmente conhecido como cunete). Alguns, inclusive, aparentavam ser moradores de rua, pois suas roupas eram muito velhas e sujas.23 22 O trabalho de Élcio Nogueira Santos e Pedro Paulo Gomes Pereira (2016) em saunas da cidade de São Paulo aborda o corpo negro como depositário de um capital erótico e sexual destacado. Os clientes negros eram rejeitados, em contrapartida, os michês negros eram hipersexualizados. Apenas uma vez, durante o trabalho de campo, encontramos um garoto de programa branco que lembrava aqueles que se prostituíam no centro da cidade. Os garotos de programa que são vistos com mais recorrência são os mais pobres. Os demais são muito flutuantes. Geralmente, estão com uma mochila. Quem se veste melhor e tem o corpo, aparentemente, mais bem cuidado é flutuante. Estes se revelam estudantes do ensino médio ou universitários e estão ali para fazer um extra e se divertir um pouco.

Na Região Universitária, os garotos de programa que lembram moradores de rua parecem se conhecer e habitar um galpão abandonado, uma espécie de oficina. É nesse local que há maior concentração de michês durante as noites e madrugadas da semana. Então, é possível que façam parte de um mesmo “pedaço” (Magnani, 2002MAGNANI, José Guilherme Cantor. (2002), “De perto e de dentro: notas para uma etnografia urbana”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 17 (49): 11-29., p. 19). Isso difere bastante daqueles que se prostituem na Região Central. Segundo Cristian, eram de bairros distantes e transitavam pelo centro para se prostituir e/ou trabalhavam no centro e se prostituíam depois do trabalho formal.

No centro da cidade, também foi onde encontramos garotos de programa que se diziam migrantes do interior de Mato Grosso do Sul ou de outros estados, como Mato Grosso, São Paulo e Goiás. Uma recorrência no centro da cidade, que encontramos em outras pesquisas (Santos, 2016SANTOS, Daniel Kerry dos. (2016), Homens no mercado do sexo: fluxos, territórios e subjetivações. Tese de doutorado. Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.), é que os garotos de programa não compreendem a prostituição ou os contatos sexuais que estabelecem com outros homens como uma profissão. Entendem o que fazem como um bico, um extra, ou seja, um complemento de renda ao trabalho formal, mesmo que este seja – como houve um caso – o tráfico de drogas.

Considerações finais

Nos últimos anos, pensamos a prostituição masculina em Campo Grande e suas possíveis particularidades em um contexto urbano não caracterizado como um grande centro nessa região do Brasil. Em Mato Grosso do Sul, os debates em torno das questões macro relacionadas aos estudos de gênero e sexualidade ainda não estão consolidados, o que deixa espaço para muitas pesquisas. Há muito o que se descortinar. Em vista disso, parece-nos profícuo o investimento de estudos sobre a prostituição masculina.

Nosso trabalho tem se dedicado a pensar algumas rupturas e permanências nesse campo nas últimas décadas, apresentando reflexões sobre a prostituição masculina em outros contextos sociais e geográficos. Neste artigo, apresentamos algumas particularidades da prostituição de rua em Campo Grande em duas áreas de prostituição que, embora distantes 4 quilômetros e marcadas por algumas diferenças, mostram inúmeras possibilidades de diálogo e comunicação. Podemos observar que a rua está vivendo um momento de refluxo em termos de ser o lugar por excelência para o exercício da prostituição. Há uma configuração de novos cenários em que segurança, limpeza e cuidado parecem elaborar melhor uma nova faceta do erotismo.

Campo Grande é uma cidade com quase 900 mil habitantes. Não é uma metrópole nacional, mas não deve ser vista como uma cidade pequena. Existe, inclusive, em vista de ser uma cidade muito mais horizontal que vertical, a possibilidade de ser anônimo nela. Talvez por isso, quando contatamos alguns garotos de programa, notamos neles, e especialmente em nosso interlocutor Cristian, certa tranquilidade ao habitar lugares sociais e geográficos que não são seus. Deslocar-se de bairros periféricos, muito distantes do centro da cidade, para se prostituir é fazer um movimento rumo a outro mundo dentro da mesma cidade. Significa deslocar-se para os bicos na prostituição, mas pode ser também um mergulho em outro mundo que não toca, mancha ou macula aquela persona reconhecida entre os que compõem seu pedaço.

Há deslocamentos sutis na prostituição masculina de rua, e não são apenas espaciais. Do ponto de vista foucaultiano, esses deslocamentos podem estar, por exemplo, no processo de gentrificação por que passam os pontos de prostituição da Região Central, com o enobrecimento por meio do programa Reviva Campo Grande, e da Região Universitária, com câmeras de segurança, arames farpados, corte de árvores, construção de casas e iluminação, o que visa dificultar o negócio subversivo da prostituição masculina.

No entanto, como o poder não é total e onde há poder, há resistência, como diria o psicólogo francês, os sujeitos criam outras estratégias possíveis para suas explosões desejantes e tarifadas. O carro já era, antes da gentrificação dos pontos, um importante meio de efetivação dos programas. O deslocamento percebido está, agora, na utilização de películas escuros nos vidros que impedem completamente a identificação de quem está no carro e do que está ocorrendo dentro dele. Nesse sentido, os programas, que já tinham lugar nos carros, agora passaram a ser realizados quase sempre dentro deles, garantindo mais segurança e controle por parte dos clientes.

Em vista disso, nossas pesquisas começam a indicar que é preciso questionar o lugar comum da prostituição masculina como um destino associado à falta de oportunidades. Em Campo Grande, temos observado que pode estar associada também à dimensão da escolha, de um manejamento entre um rol, ainda que restrito, de possibilidades de ganho material e financeiro. Nesse sentido, seria importante olhar para os mercados do sexo de um modo que iria além da compreensão como um bloco monolítico. Há complexidades e diferenças muitas vezes sutis, como algumas mostradas neste texto, que constituem esse universo. Complexidades essas que vão desde a apropriação do território nas ruas da cidade, demarcando espaços possíveis para oferecimento dos serviços, até intrincadas relações com clientes, outros michês e demais sujeitos envolvidos, de uma forma ou de outra, na economia do desejo. Estamos, assim, diante de variadas possibilidades de análise de um campo em transformação, e as pesquisas futuras podem contribuir para alargar a compreensão de como os tensionamentos do gênero e da sexualidade podem ser relevantes para a composição dos roteiros de desejo de diferentes sujeitos.

  • 1
    Para Adriana Gracia Piscitelli (2008), categorias de diferenciação ampliam o escopo de análise de diferenças e compreensão das desigualdades resultantes de processos de hierarquização binária pelos quais os sujeitos desviantes das normas passam.
  • 2
    Aqui, a estética da prostituição masculina é entendida como um modo específico de apropriação da realidade com intersecções com outros modos de ser e estar no mundo baseados em elementos sociais, econômicos, culturais etc.
  • 3
    Nome escolhido pelo interlocutor para ser identificado na pesquisa.
  • 4
    Conta que se prostitui exclusivamente nas ruas; não trabalha em saunas nem utiliza sites e aplicativos.
  • 5
    Todas as falas de Cristian apresentadas no texto foram autorizadas por ele.
  • 6
    Sobre essa hierarquia de modelos de classificação das sexualidades brasileiras, já é clássico o trabalho de Peter Fry (1982)FRY, Peter. (1982), Para inglês ver: identidade e política na cultura brasileira. Rio de Janeiro, Zahar Editores..
  • 7
    Disse que parece não haver uma concorrência entre os garotos de programa nas ruas do centro da cidade. Ele os consideraria como amigos e companheiros de trabalho na noite: “Não tem disputa ou briga. Professor, tem espaço pra todo mundo. É paz”.
  • 8
    Essa é uma recorrência na produção nacional sobre o tema. A maior parte dos garotos de programa diz fazer apenas sexo com preservativo. Afirmam que os “outros” fazem sexo desprotegido.
  • 9
    Prostituição masculina de rua e turismo também se aproximam nas pesquisas de Miguel Angelo Ribeiro (1997)RIBEIRO, Miguel Angelo. (1997), “Prostituição de rua e turismo em Copacabana: a Avenida Atlântica e a procura do prazer”. Revista Território, ano 2 (3): 87-99. realizadas no Rio de Janeiro (RJ). O autor destaca o encontro de michês e gringos em Copacabana.
  • 10
    Sobre questões que envolvem sexualidade e geração no campo da prostituição, ainda que não se trate, especificamente, do contexto das ruas, mas das saunas, indicamos a leitura de Fernando Altair Pocahy (2017)POCAHY, Fernando Altair. (2017), Entre vapores e dublagens: dissidências homo/eróticas nas tramas do envelhecimento. Salvador, Devires. e Daniel Kerry dos Santos (2016)SANTOS, Daniel Kerry dos. (2016), Homens no mercado do sexo: fluxos, territórios e subjetivações. Tese de doutorado. Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis..
  • 11
    A exceção a essa compreensão está no trabalho de Reginaldo Guiraldelli e Marisa Fernandes de Souza (2013) sobre prostituição masculina de rua em Belo Horizonte (MG). Na capital mineira, pelo menos nessa pesquisa, os michês não eram apenas homens malhados.
  • 12
    É importante salientar, ainda, que existem trabalhos sobre prostituição pautados em iniciativas de movimentos sociais. Indicamos a leitura de Ana Isabel Fábregas-Martínez e Marcos Renato Benedetti (2000) e Fernando Altair Pocahy (2007)POCAHY, Fernando Altair. (2007), Rompendo o silêncio: homofobia e heterossexismo na sociedade contemporânea – políticas, teoria e atuação. Porto Alegre, Nuances..
  • 13
    Segundo José Guilherme Cantor Magnani, “manchas são áreas contíguas do espaço urbano dotadas de equipamentos que marcam seus limites e viabilizam – cada qual com sua especificidade, competindo ou complementando – uma atividade ou prática predominante” (1996, pp. 40-41).
  • 14
    De acordo com Rogério Proença Leite (2007)LEITE, Rogerio Proença. (2007), Contra-usos da cidade: lugares e espaço público na experiência urbana contemporânea. Campinas, Editora da Unicamp., a tradução do neologismo gentrification é ainda controversa no Brasil. Em alguns textos, aparece como gentrificação, nossa opção neste texto. No entanto, segundo o autor, o termo que mais se aproximaria em português é enobrecimento.
  • 15
    Tal deslocamento pode permitir agressão física, furto e até sequestro, mas também pode assegurar anonimato e invisibilidade.
  • 16
    Para mais informações, consultar o site do programa Reviva Campo Grande, disponível em http://www.campogrande.ms.gov.br/reviva/o-programa/, consultado em 5/12/2019.
  • 17
    Compreendemos que há um esforço no sentido da gentrificação, do enobrecimento, da “limpeza” desses espaços para que se tornem, outra vez, atrativos economicamente.
  • 18
    Para mais informações, consultar Michelli Rossi (2011)ROSSI, Michelli. (2011), “Área central da capital vira comércio de sexo e drogas”. Correio do Estado, 11 fev., disponível em https://www.correiodoestado.com.br/noticias/area-central-da-capital-vira-comercio-de-sexo-e-drogas/99348/, consultado em 5/12/2019.
    https://www.correiodoestado.com.br/notic...
    e Mariana Lopes (2012)LOPES. Mariana. (2012), “No centro da capital, um território demarcado como cracolândia”. Campo Grande News, 11 nov., disponível em https://www.campograndenews.com.br/cidades/capital/no-centro-da-capital-um-territorio-demarcado-como-cracolandia, consultado em 5/12/2019.
    https://www.campograndenews.com.br/cidad...
    .
  • 19
    Para uma visão mais aprofundada sobre determinados usos da cidade por grupos colocados à margem, especialmente usuários de crack, ver Taniele Rui (2014)RUI, Taniele. (2014), Nas tramas do crack: etnografia da abjeção. São Paulo, Terceiro Nome. e Erick Luiz Araújo de Assumpção (2019)ASSUMPÇÃO, Erick Luiz Araújo de. (2019), “Funcionamentos de instituições em cenas de uso de crack: um estudo etnográfico”. Trabalho, Educação e Saúde, 17 (2)..
  • 20
    Segundo Robert E. Park (1967)PARK, Robert E. (1967), “A cidade: sugestões para a investigação do comportamento humano no meio do urbano”, in O. G. Velho (org.), O fenômeno urbano, Rio de Janeiro, Zahar, pp. 29-72., a região moral é um espaço segregado por interesses, gostos e temperamentos. Em Chicago (Estados Unidos), eram as zonas de vício encontradas na cidade. Difere por seus interesses mais imediatos e fundamentais.
  • 21
    Entre as principais práticas sexuais realizadas, estão sexo oral no garoto de programa e no cliente; masturbação no garoto de programa e no cliente; introjeção do dedo (algumas vezes mais de um) no ânus do cliente; penetração no cliente; anilíngua no cliente (popularmente conhecido como cunete).
  • 22
    O trabalho de Élcio Nogueira Santos e Pedro Paulo Gomes Pereira (2016) em saunas da cidade de São Paulo aborda o corpo negro como depositário de um capital erótico e sexual destacado. Os clientes negros eram rejeitados, em contrapartida, os michês negros eram hipersexualizados.
  • 23
    Segundo Daniel Miller, “as roupas não são superficiais, elas são o que faz de nós o que pensamos ser” (2013, pp. 22-23). As vestimentas são códigos que usamos para dar informações sobre nós mesmos; por meio desses códigos, somos lidos pelas outras pessoas.
  • *
    O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.
  • DOI: 10.1590/3510303/2020

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Abr 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    11 Jul 2019
  • Aceito
    01 Out 2019
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