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Violência política e eleitoral nas eleições municipais de 20201 1 Esse artigo contou com financiamento da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Political and electoral violence in the 2020 municipal elections

Resumo

O artigo analisa a violência política durante o ciclo das eleições municipais brasileiras de 2020, com dois objetivos: discutir teoricamente a violência eleitoral como um tipo específico de violência política; e medir a incidência de cinco modalidades de violência (homicídios, atentados, ameaças, agressões e sequestros) contra lideranças políticas locais, a partir do monitoramento diário da imprensa. No total, foram identificados 485 casos entre janeiro de 2019 e dezembro de 2020. As vítimas são majoritariamente do sexo masculino, brancos, com alta escolaridade, dos pequenos municípios e filiados a partidos da centro-direita. No entanto, o modelo log-linear estimado sob o paradigma bayesiano revela que a chance de um homicídio ocorrer é maior contra políticos não brancos e de baixa escolaridade.

Palavras-chave:
Eleições; Violência política; Violência eleitoral; Política local; Eleições municipais

Abstract

The article analyzes political violence during the 2020 municipal election cycle. The article pursues two objectives. The first theoretically discusses electoral violence as a specific kind of political violence, while the second aims to measure the incidence of five types of violence (homicides, attacks, threats, assaults and kidnappings) against local political leaders, based on daily press monitoring. In total, 485 cases were identified between January 2019 and December 2020. The victims are mostly male, white, highly educated, from small municipalities and affiliated to center-right parties. However, the log-linear model estimated under the Bayesian paradigm reveals that the chance of a homicide occurring is greater against non-white, low-educated politicians.

Keywords:
elections; political violence; electoral violence; local politics; municipal elections

Introdução

Nos últimos anos, o estudo da relação entre violência política e eleições ganhou notoriedade. No nível internacional, a relação entre violência e eleições tem chamado a atenção para realidades tão diversas como a asiática, a africana e a latino-americana (undp, 2011UNDP (2011), Understanding Electoral Violence in Asia. Nova York, Bureau for Development Policy.; Goldsmith, 2015GOLDSMITH, Arthur. (2015), “Electoral Violence in Africa Revisited”. Terrorism and Political Violence, 27, 5: 818-837.; Ballivián, 2017BALLIVIÁN, Salvador Romero. (2017), “Elecciones y violencia en América Latina: de los antiguos a los nuevos desafios”. In: BALLIVÁN, S. R. (org.), Democracia, elecciones y violencia en América Latina. Tegucigalpa, Instituto Universitario en Democracia, Paz y Seguridad.). No Brasil, embora a perseguição a adversários e a coação de eleitores sejam instrumentos de dominação bem documentados na literatura sobre a República Velha (Leal, 1975LEAL, Victor Nunes. (1975), Coronelismo, enxada e voto. São Paulo, Alfa Ômega.), a violência política e a sua versão eleitoral não chegaram a se configurar como agenda de pesquisa no recente período democrático brasileiro.

O tema, no entanto, ganhou enorme visibilidade recentemente. Durante as eleições municipais de 2020, diferentes veículos de imprensa, pesquisadores e organizações sociais divulgaram resultados de coleta de dados própria sobre a incidência de homicídios, atentados e outras formas de violência contra diferentes lideranças políticas brasileiras. Entre eles, se destacam os levantamentos feitos pelo jornal Estado de S. Paulo (Moura e Nossa, 2020MOURA, Rafael Moraes & NOSSA, Leonencio. “País registra 107 assassinatos políticos; TSE começa só agora a analisar violência”. (2020), O Estado de S. Paulo, 26/11.), pela ONG Terra de Direitos e Justiça Global (Lauris e Hashizume, 2020LAURIS, Élida & HASHIZUME, Maurício. (2020), Violência política e eleitoral no Brasil: panorama das violações de direitos humanos de 2016 a 2020. Curitiba, Terra de Direitos e Justiça Global.), pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Cândido Mendes (Nunes, 2020NUNES, Pablo. (2020), “Política resolvida na bala”. Piauí. Disponível em: https://piaui.folha.uol.com.br/politica-resolvida-na-bala/, consultado em 16/10/2021.
https://piaui.folha.uol.com.br/politica-...
) e pelo Núcleo de Estudos Guerreiro Ramos da Universidade Federal Fluminense (Paz, 2020PAZ, Huri. (2020), “A epidemia de assassinatos de políticos no Brasil”. Nexo Jornal, 11 nov.). Em comum, esses levantamentos revelam a escalada da violência política durante o ano eleitoral.

A violência durante o período eleitoral também chamou a atenção de instituições responsáveis por zelar pela segurança dos eleitores e a integridade do pleito. No Rio de Janeiro, a polícia civil e a polícia federal realizaram operações contra integrantes de milícias que atuam no estado e exercem forte controle político sobre amplas zonas territoriais. Apenas na capital, segundo o Mapa dos grupos armados do Rio, pesquisa conduzida em convênio por diferentes grupos de estudo, a milícia e o tráfico estão presentes em 96 do total de 137 bairros (57% da superfície territorial), onde vivem 3,76 milhões de pessoas.2 2 Disponível em https://nev.prp.usp.br/mapa-dos-grupos-armados-do-rio-de-janeiro/, consultado em 16/10/2021. A preocupação com a violência não se restringiu ao Rio de Janeiro. Segundo notícias veiculadas na imprensa, o Tribunal Superior Eleitoral recebeu de municípios de todas as partes do país pedidos de envio tropas federais para assegurar a paz e a integridade das eleições.

A relevância do tema é óbvia. A violência política durante o processo eleitoral gera enorme dano à sociedade, porque afeta o correto funcionamento da democracia. Em condições de elevado nível de violência, o resultado eleitoral deixa de ser considerado a expressão confiável da vontade dos eleitores e passa a ser visto como subproduto da manipulação eleitoral. Ao limitar as opções dos eleitores – que perdem o consagrado direito político de exercer a sua livre escolha e, coagidos, votam em determinados candidatos por medo de represálias –, rompe-se o vínculo programático que deveria orientar as eleições. São eleitores que perdem a fé no sistema e a confiança nas instituições. Ao mesmo tempo, a violência traz consequências para o tipo de representação e de atuação parlamentar. Ao impedir a livre concorrência pelo voto, inibe a atuação de representantes eleitos, que agem coagidos em suas rotinas e atribuições políticas.

Neste artigo, buscamos suprir parte desta lacuna apresentando dados inéditos sobre a incidência da violência contra lideranças políticas locais durante a eleição municipal de 2020. Nossos propósitos centrais são conceituar teoricamente a violência eleitoral como um tipo específico de violência política, e traçar o perfil da sua ocorrência. Este segundo objetivo é abordado em duas direções. A primeira refere-se ao caráter temporal dos pleitos eleitorais, que foram divididos segundo a ideia dos ciclos eleitorais, respeitando-se a literatura sobre violência política e as regras eleitorais vigentes no país, inclusive as mudanças por conta da pandemia do novo Coronavírus. A segunda direção está no estudo das covariáveis associadas à incidência da violência política e sua intensidade, abordadas a partir do referencial metodológico quantitativo dos modelos lineares generalizados. Não é nosso objetivo explicar as causas da violência política, mas sim apresentar um relato denso de como o fenômeno se manifestou nas eleições municipais de 2020.

O artigo divide-se em cinco seções. A primeira discute o conceito de violência eleitoral. Abordamos autores e relatórios técnicos de organismos internacionais que se propuseram a elaborar tipologias da violência eleitoral segundo o momento em que ocorrem, a intensidade e autores e vítimas. Na seção seguinte, “Ciclo político e violência eleitoral nas eleições municipais de 2020”, discutimos como as tipologias encontradas na literatura nacional servem para iluminar hipóteses a respeito do caso brasileiro. A quarta seção apresenta a metodologia e os principais resultados da análise. Por último, discutimos as implicações do nosso estudo. Esperamos contribuir com a literatura sobre eleições no Brasil, tendo por base a seguinte pergunta de pesquisa: como a violência política se manifestou na eleição municipal de 2020?

O conceito de violência eleitoral

O problema da violência é colocado desde o fim da ditadura militar como um dos principais entraves à consolidação da democracia brasileira. Um número considerável de pessoas tem seus direitos e liberdades básicas negados, seja pela ação de grupos criminosos, seja pelas forças de segurança pública, que agem de forma indiscriminada e violenta sobre grupos vulneráveis. Direitos fundamentais de sociedades democráticas liberais – o direito de ir e vir, à liberdade de expressão e à igualdade de oportunidades, entre outros – são negados a indivíduos que vivem em áreas de risco.

A violência é um fenômeno presente em todas as sociedades e constitui um ponto de grande preocupação, pelos enormes custos que gera para governos e cidadãos, pelo sentimento de medo que impõe e pelo enfraquecimento dos laços comunitários. Zizek (2014)ZIZEK, Slavoj. (2014), Violência: seis reflexões laterais. Trad. Miguel Serras Pereira. São Paulo, Boitempo. aponta que o paradoxo da violência está no confronto entre seus sinais mais evidentes, como atos de crime e terror (violência subjetiva), e a violência que não é diretamente visível e exercida por agente não claramente identificável (violência objetiva). A violência política pode ser entendida como uma das diferentes formas de manifestação da violência subjetiva. Ela foi inicialmente definida como o conjunto de danos físicos, materiais ou psicológicos perpetrados pelo Estado contra grupos ou movimentos sociais insurgentes e de contestação (Porta, 2013PORTA, Donatella Della. (2013), Clandestine Political Violence. Cambridge University Press.). Mais tarde, essa visão inicial foi alargada, incorporando a ideia de que a violência política não seria de uso exclusivo do poder estatal, mas também uma forma de ação que busca remodelar as relações assimétricas entre governados e governantes. O uso da força teria como objetivo alterar as políticas, o sistema, o território ou o próprio governo, bem como a vida dos indivíduos dentro da sociedade (Balibar, 2015BALIBAR, Étienne. (2015), “Violencia, Política, Civilidad”. Universidad Nacional de Colombia. 10, 19:45-67.).

A violência eleitoral é discutida como uma subcategoria da violência política. O tema é de interesse recente e se origina a partir do esforço coletivo de acadêmicos e agências internacionais, como a Organização das Nações Unidas (onu), para entender como os países autoritários enfrentaram o desafio de fazer sua transição para sociedades democráticas (Mochtak, 2018MOCHTAK, Michal. (2018), “Fighting and voting: Mapping electoral violence in the region of post-communist Europe”. Terrorism and Political Violence, 30, 4: 589-616.). A violência eleitoral é estudada como consequência da trajetória de sociedades cuja transição para a democracia não foi plenamente consolidada (Höglund, 2009HÖGLUND, K. (2009). “Electoral Violence in Conflict-Ridden Societies: Concepts, Causes, and Consequences”. Terrorism and Political Violence, 21, 3: 412-427.). Mas também pode ser entendida como um tipo extremo de fraude eleitoral, observado até mesmo em democracias consolidadas (Lehoucq, 2003LEHOUCQ, Fabrice. (2003), “Electoral fraud: Causes, types, and consequences”. Annual Review of Political Science, 6, 1:233–256.), como vimos, em janeiro de 2021, com a invasão do Capitólio, por apoiadores de Donald Trump, para impedir a cerimônia de posse do democrata Joe Binden, vitorioso nas eleições presidenciais norte-americanas de 2020.

Na definição do debate acadêmico atual, violência eleitoral consiste em atos de violência que perturbam o ciclo eleitoral e seus resultados. O argumento central preconiza que a violência eleitoral pode ocorrer em praticamente qualquer ambiente político com pelo menos um nível mínimo de competição, e eleições organizadas regularmente. A violência eleitoral pode consistir em apenas um episódio insignificante, ou pode ser o gatilho para desencadear ondas de choque em larga escala, como no pleito de 2006 no Quênia (Dercon e Gutiérrez-Romero, 2012DERCON, Stefan & GUTIÉRREZ-ROMERO, Roxana. (2012), “Triggers and Characteristics of the 2007 Kenyan Electoral Violence”. World Development, 40, 4:731-744.). Portanto, assim como em outras formas de violência, a definição de violência eleitoral torna-se um problema de caracterização de motivação, timing, atores, ações e alvos (Höglund, 2009HÖGLUND, K. (2009). “Electoral Violence in Conflict-Ridden Societies: Concepts, Causes, and Consequences”. Terrorism and Political Violence, 21, 3: 412-427.).

Uma das primeiras tentativas de definir conceitualmente a violência eleitoral como tipo específico de violência política foi realizada pela International Foundation for Electoral System (ifes). O documento foi publicado como working paper, com base em pesquisa de Jeff Fischer sobre eleições em diferentes partes do mundo. Fischer definiu a violência eleitoral como

qualquer ato aleatório ou organizado que busque determinar, atrasar ou influenciar um processo eleitoral por ameaça, intimidação verbal, discurso de ódio, desinformação, agressão física, ‘proteção’ forçada, chantagem, destruição de propriedade ou assassinato. (Fischer, 2002FISCHER, Jeff. (2002), Electoral conflict and violence: a strategy for study and prevention. Arlington, IFES White Paper.:3)

A onu apresentou definição similar, ao caracterizar a violência relacionada às eleições como

atos ou ameaças de coerção, intimidação ou dano físico perpetrados para afetar um processo eleitoral ou que surjam no contexto da competição eleitoral. Quando cometidas para afetar um processo eleitoral, a violência pode ser empregada para influenciar o processo eleitoral - como esforços para atrasar, interromper ou atrapalhar uma votação - e para influenciar os resultados: a determinação de vencedores em disputas competitivas para cargos políticos ou para aprovação ou reprovação de perguntas em referendos. (undp, 2009,UNDP (2009), Elections and conflict prevention: a guide to analysis, planning and programming. Nova York, Bureau for Development Policy. p.4)

O debate acadêmico atual enfatiza que a violência eleitoral se manifesta nas diferentes fases que compõem o ciclo eleitoral. Fischer (2002)FISCHER, Jeff. (2002), Electoral conflict and violence: a strategy for study and prevention. Arlington, IFES White Paper. divide esse ciclo em cinco etapas. A primeira, que ele chama de “conflito de identidade”, refere-se ao momento pré-eleitoral, durante o processo de registro de eleitores, quando refugiados ou migrantes não podem estabelecer sua identidade. A segunda, “conflito de campanha”, ocorre durante o período eleitoral. A terceira, “conflito de votação”, é própria do dia da eleição. A quinta, “conflito de resultados”, é pós-eleitoral. Por fim, a quinta etapa, “conflito de representação”, também pós-eleitoral, ocorre quando as eleições são de “soma zero” e os perdedores ficam sem participação no governo.

O relatório da onu também distribui a violência eleitoral ao longo de cinco fases (undp, 2009UNDP (2009), Elections and conflict prevention: a guide to analysis, planning and programming. Nova York, Bureau for Development Policy.). A primeira, a fase pré-eleitoral, começa dezoito meses antes e termina três meses antes da eleição; nela, as vítimas preferenciais são os políticos com mandatos ou potenciais futuros candidatos. A segunda, a fase eleitoral, correspondente aos três meses anteriores ao dia da eleição; as vítimas incluem candidatos, eleitores e demais agentes envolvidos no processo eleitoral. Na terceira fase, o dia da eleição, o objetivo é intimidar eleitores, atacar seções eleitorais e destruir urnas e demais artefatos eleitorais. A quarta fase é o período entre o dia da eleição e a proclamação dos resultados. A quinta e última fase ocorre após a proclamação dos eleitos; nesse momento, a violência é estimulada sobretudo pela percepção de fraude e costuma opor eleitores ao Estado ou grupos vitoriosos aos perdedores.

A ideia de que a violência eleitoral é cíclica é importante porque há evidências de que ela não se distribui uniformemente por todas as etapas do calendário eleitoral. Taylor, Pevehouse e Strauss (2017)TAYLOR, Charlie; PEVEHOUSE, Jon & STRAUSS, Scott. (2017), “Perils of pluralism: Electoral violence and incumbency in sub-Saharan Africa”. Journal of Peace Research, 54, 3: 397-411., examinado um conjunto de eleições africanas realizadas entre 1990 e 2008, identificaram que a violência ocorre principalmente antes do dia das eleições. Porém, segundo os autores, quando acontece no período pós-eleitoral, tende a ser mais intensa. Analisando um conjunto de eleições nas antigas repúblicas soviéticas, localizadas no Leste europeu, Mochtak (2018)MOCHTAK, Michal. (2018), “Fighting and voting: Mapping electoral violence in the region of post-communist Europe”. Terrorism and Political Violence, 30, 4: 589-616. relata que o grosso da violência na região é de natureza pré-eleitoral. Estudos de caso, por sua vez, mostram que certos países possuem dinâmicas próprias. Na Indonésia, a violência assume a forma bimodal: é alta nos dias anteriores ou imediatamente posteriores ao dia da eleição (Harish e Toha, 2019HARISH, S. P. & TOHA, Risa. (2019), “A New Typology of Electoral Violence: Insights from Indonesia”. Terrorism and Political Violence, 31, 4: 687-711.). Já na eleição presidencial do Quênia de 2007, a violência manifestou-se principalmente depois das eleições, como fruto da insatisfação em relação à legitimidade do resultado (Dercon e Gutiérrez-Romero, 2012DERCON, Stefan & GUTIÉRREZ-ROMERO, Roxana. (2012), “Triggers and Characteristics of the 2007 Kenyan Electoral Violence”. World Development, 40, 4:731-744.). Em 2019, vimos a violência na Bolívia eclodir após a eleição, como consequência das denúncias de fraude feitas pela Organização dos Estados Americanos (oas, 2019OAS (2019), General Elections in the Plurinational State of Bolivia. Washington, Department of Electoral Cooperation and Observation.).

A violência eleitoral se manifesta de formas distintas e envolve diferentes atores e alvos. Os principais são os agentes repressivos do Estado, como militares ou policiais; partidos políticos e candidatos; grupos rebeldes e paramilitares; organizações criminosas e grupos militantes extremistas. As ações incluem assédio, agressão física, intimidação, tumulto, destruição de propriedade e assassinato. Os alvos variam de pessoas a instituições e instalações físicas. Höglund (2009)HÖGLUND, K. (2009). “Electoral Violence in Conflict-Ridden Societies: Concepts, Causes, and Consequences”. Terrorism and Political Violence, 21, 3: 412-427. diferencia os alvos em quatro categorias: as “partes interessadas”, que seriam os eleitores, candidatos, funcionários da justiça eleitoral, mídia e monitores internacionais; as “informações eleitorais”, como dados cadastrais, urnas, resultados de votação, cédulas e material de campanha; as “instalações eleitorais”, como seções de votação e centrais de apuração dos votos; e, finalmente, os “eventos eleitorais”: comícios de campanha, carreatas, panfletagem e outros atos de campanha.

A noção de que a violência se manifesta de forma diferente conforme o estágio do ciclo eleitoral em que acontece levou alguns autores a propor tipologias que consideram modalidade, momento, intensidade e atores envolvidos. Fischer (2002)FISCHER, Jeff. (2002), Electoral conflict and violence: a strategy for study and prevention. Arlington, IFES White Paper. enumera categorias descritivas de conflito eleitoral e sugere uma diversidade de motivos, vítimas e perpetradores. A violência pode ser realizada por eleitores contra o Estado (sob alegação de injustiça no processo eleitoral); do Estado contra os eleitores (em repressão a manifestações de contestação dos resultados eleitorais); e entre grupos rivais que disputam ganhos políticos. Strauss e Taylor (2009)STRAUSS, Scott & TAYLOR, Charlie. (2009), Democratization and Electoral Violence in Sub-Saharan Africa, 1990-2007. American Political Science Association Annual Meeting. desenvolvem a sua tipologia da violência eleitoral a partir do momento (antes e depois da eleição), dos atores (incumbente e oposição), e da intensidade (baixa e alta). Para esses autores, incumbentes são mais inclinados a usar a violência no período pré-eleitoral, com o objetivo de modular a decisão de voto dos eleitores. Já a violência pós-eleitoral costuma ter como ator principal os grupos de oposição, e acontecer em resposta a resultados eleitorais considerados desfavoráveis.

A intensidade se manifestaria em três diferentes níveis. O primeiro é o assédio violento, exemplificado pela polícia que rompe comícios, partidários lutando, brigas de rua, jornais da oposição sendo confiscados e prisões de oponentes políticos limitadas a curto prazo. Um segundo nível é a repressão violenta: prisões a longo prazo de líderes de partidos oposicionistas, o uso consistente de intimidações, o uso limitado de assassinatos e tortura. O último nível seria o de uma campanha altamente violenta, com ataques físicos coordenados e repetidos levando a vinte mortes ou mais.3 3 Kammerund (2012) argumenta que a intensidade da violência acompanha a dinâmica de evolução do ciclo eleitoral, na qual o país experimenta períodos cíclicos de violência latente, escalada da tensão, surtos de violência e redução da escalada da violência.

A tipologia de Staniland (2014)STANILAND, Paul. (2014), “Review Article: Violence and Democracy”. Comparative Politics, 47, 1:99-118. distingue sete tipos de violência, a partir de seus atores e objetivos. Os atores são agentes do Estado, agentes não-estatais ligados ao regime, grupos de oposição e atores políticos não alinhados. Conforme seus objetivos, são definidos como intrassistêmicos e antissistêmicos. Atores intrassistêmicos são aqueles que buscam vencer mantendo o regime; os antissistêmicos, aqueles que pretendem subverter o sistema. Segundo Staniland, a natureza do ator molda o tipo de violência que usará. Os agentes do Estado, por exemplo, por serem incumbentes, usarão forças de segurança formais para manter o status quo com ameaças a adversários, enquanto grupos de oposição podem se insurgir contra o regime em uma rebelião.

Harish e Toha (2019)HARISH, S. P. & TOHA, Risa. (2019), “A New Typology of Electoral Violence: Insights from Indonesia”. Terrorism and Political Violence, 31, 4: 687-711. ignoram a intensidade e, usando dados de eleições na Indonésia entre 2005 e 2012, propõem uma tipologia de violência eleitoral baseada em alvos – eleitores, candidatos e agências governamentais – e no momento em que ocorrem, antes ou depois das eleições. Apontam que: a) de todos os casos de violência eleitoral observados, a maioria era direcionada a candidatos e órgãos governamentais; b) os candidatos geralmente são alvejados antes das eleições; os incidentes direcionados aos eleitores acontecem tanto antes quanto depois; e a violência contra o governo tende a ocorrer depois das eleições; c) a violência pré-eleitoral concentra-se em regiões originalmente separatistas, mas a violência pós-eleitoral é mais comum em distritos com violência etnocomunitária anterior.

Finalmente, Mochtak (2018)MOCHTAK, Michal. (2018), “Fighting and voting: Mapping electoral violence in the region of post-communist Europe”. Terrorism and Political Violence, 30, 4: 589-616. identifica seis tipos de violência eleitoral na região do Leste europeu pós-comunista, conforme intensidade, atores, momentos e resultados. A maioria dos incidentes se enquadra apenas nas categorias “Baixas eleitorais fatais” (Deadly electoral casualties), “Tumultos ou protestos eleitorais” (Electoral riots or protest) e “Assédio eleitoral por parte do governo” (Electoral harassment by government). As três categorias restantes são tipos híbridos, que combinam elementos das três principais, configurando tipos mais complexos e também menos frequentes de violência: “Violência eleitoral autoritária” (Authoritarian electoral violence), “Violência eleitoral tipo revolucionária” (Revolutionary-like electoral violence) e “Guerra eleitoral” (Electoral war).

Ciclo político e violência eleitoral nas eleições de 2020

As tipologias discutidas há pouco ajudam a orientar a coleta e a interpretação dos episódios de violência nas eleições brasileiras. Três questões norteiam esse artigo: saber quando a violência ocorre, onde ocorre e quem são as suas vítimas preferenciais. Em relação à primeira pergunta, como estamos examinando a violência praticada exclusivamente contra lideranças políticas locais nas eleições de 2020 – e, portanto, desconsiderando outros atores igualmente relevantes, como eleitores, jornalistas e ativistas sociais –, é razoável supor que a violência se intensifica com a proximidade do pleito, com o objetivo de dissuadir adversários políticos de competir, consistindo em agressões, ameaças, atentados, sequestros ou, no limite, a eliminação sumária, com o assassinato político. Neste caso, podemos dizer que a violência se configura como recurso extremo, usado prioritariamente na fase eleitoral, e que sua incidência diminui após a proclamação dos resultados, quando os eleitos já foram definidos.

Em relação ao perfil das vítimas e ao local onde a violência política acontece, é mais difícil especular por conta da escassez de trabalhos que examinam o mesmo problema. No Brasil, há vasta literatura indicando que a elite política brasileira é composta majoritariamente por pessoas do sexo masculino, da cor/raça branca, de alta escolaridade e nas faixas de idade entre 40 e 60 anos (Perissinotto e Miríade, 2009PERISSINOTTO, Renato & MIRÍADE, Angel. (2009), “Caminhos para o parlamento: candidatos e eleitos nas eleições para deputado federal em 2006”. Dados, 52, 2:301-333.; Perissinotto e Bolognesi, 2010PERISSINOTTO, Renato & BOLOGNESI, Bruno. (2010), “Electoral Success and Political Institutionalization in the Federal Deputy Elections in Brazil (1998, 2002 and 2006)”. Brazilian Political Science Review, 4, 1:10-32.; Araújo e Borges, 2013ARAÚJO, Clara & BORGES, Doriam. (2013), “Trajetórias políticas e chances eleitorais: analisando o ‘gênero’ das candidaturas em 2010”. Revista de Sociologia e Política, 21, 46: 69-91.). Ao mesmo tempo, sabemos que a violência social é maior nos estratos mais baixos da sociedade, ou seja, contra pessoas pobres, pretas e/ou pardas, de baixa escolaridade e jovens (Cerqueira et al., 2020CERQUEIRA, Daniel et al. (2020), Atlas da violência 2020. Rio de Janeiro, IPEA.). Essas duas realidades nos conduzem a pensar que a violência política tende a refletir o universo político e, também, a violência cotidiana da sociedade: ela é mais frequente entre aqueles que se enquadram no perfil dominante do quadro político brasileiro, mas atinge com mais intensidade os candidatos de classe baixa. Por consequência, é de se esperar que o tipo de violência mais extrema – o homicídio – atinja prioritariamente lideranças políticas oriundas das classes menos privilegiadas.

Finalmente, a violência é um fenômeno nacional e está dispersa por todas as regiões, estados e cidades. Entretanto, a literatura brasileira sobre política local tem enfatizado que a violência sempre foi um importante instrumento de dominação política e eleitoral nos pequenos municípios do país (Leal, 1975LEAL, Victor Nunes. (1975), Coronelismo, enxada e voto. São Paulo, Alfa Ômega.). A face mais visível desse fenômeno foi a política coronelista e seu mandonismo local, que não desapareceu com a Revolução de 30 ou no período democrático que sucedeu a ditadura varguista (Soares, 2001SOARES, Gláucio Ary Dillon. (2001), Democracia interrompida. Rio de Janeiro, FGV.). E mesmo hoje, quando se aponta o eventual declínio do poder dos coronéis (Kerbauy, 2016KERBAUY, Maria Teresa Miceli. (2016), A morte dos coronéis: política e poder local. Curitiba, Appris.), a violência continua partindo das elites locais, cujos mecanismos de manutenção do poder sempre se basearam nela. Por conta disso, seria de se supor que a violência varie de acordo com o tamanho do município e a região, incidindo principalmente nas cidades pequenas e médias, devido à proximidade entre eleitos e eleitores e aos conflitos entre grupos adversários, ou “clivagens familiares” (Soares, 1988SOARES, Gláucio Ary Dillon. (1988), “A política brasileira: Novos partidos e velhos conflitos”. In: FLEISCHER, David, Da distensão à abertura: as eleições de 1982. Brasília, UNB.).

Uma vez que a ideia de ciclo é central nas análises da violência eleitoral, é preciso esclarecer como o calendário eleitoral evolui. No Brasil, as eleições municipais acontecem a cada quatro anos, sempre em anos pares, em alternância com as eleições estaduais e nacionais. O ciclo eleitoral municipal, portanto, pode ser pensado de duas maneiras distintas: considerando o período de quatro anos completos, ou de forma mais restrita. Na versão completa, o ciclo eleitoral compreende os quatro anos entre uma eleição e outra. Na versão restrita, exclui o período destinado às eleições estaduais e nacionais, entendendo que as articulações e a organização das eleições municipais se iniciam com o fim daquelas. Na versão restrita, adotada neste artigo, o ciclo das eleições municipais de 2020 se inicia após o fim das eleições de 2018, em janeiro de 2019.

As eleições no Brasil são, ao mesmo tempo, marcadas por forte regulamentação. A Lei Eleitoral 9.504, de 1997, divide o ciclo eleitoral em múltiplas etapas, das quais oito datas são fundamentais para compreender a maneira como as eleições são organizadas e pautam o comportamento dos partidos e candidatos (Quadro 1). A primeira determina que o calendário oficial das eleições inicia um ano antes da realização do primeiro turno, que, de acordo com a legislação, é a data limite para aprovação das regras que regulamentarão o processo eleitoral. A segunda, seis meses antes da eleição, é a data limite para todos os partidos que pretendam participar das eleições obterem o registro de seu estatuto no TSE. Os candidatos aos cargos eletivos devem ter domicílio eleitoral na circunscrição em que pretendem concorrer, e devem estar com filiação deferida pelo partido.

Quadro 1
Principais datas do calendário eleitoral

A terceira data relevante é o período das convenções, quando os partidos deliberam sobre coligações e definem candidatos a prefeitos, vice-prefeitos e vereadores. A partir daí inicia-se a fase de campanha: os candidatos têm seu registro oficializado no TSE e podem iniciar o pedido expresso de votos. A fase da campanha se encerra no dia do segundo turno, que dá início ao período pós-eleitoral. Esta última etapa é marcada pelo processo de apuração e contagem dos votos, e pela declaração, a diplomação e a posse dos eleitos.

Em julho de 2020, no entanto, o calendário eleitoral foi modificado pela Emenda Constitucional nº 107 que, em função da pandemia da Covid-19, ajustou as datas e prazos previstos, adiando o primeiro e o segundo turnos das eleições para os dias 15 e 29 de novembro. Assim, o período anterior à campanha foi estendido em quarenta dias, e o período destinado ao segundo turno, reduzido a duas semanas. O Quadro 1 resume as principais datas dos dois calendários relativos às eleições de 2020.

Seguindo as principais fases do calendário eleitoral, analisaremos a violência ao longo de um ciclo eleitoral composto por seis etapas. A primeira (fase pré-eleitoral) é a que vigora após o fim das eleições nacionais e estaduais, em janeiro de 2019, e se encerra um ano antes do início oficial das eleições. A segunda (fase eleitoral I) corresponde aos primeiros seis meses do calendário eleitoral, entre os dias 4 de outubro de 2019 e 4 de abril de 2020, quando os políticos e futuros candidatos definiram sua filiação partidária e seu domicílio eleitoral e se a desincompatibilizam de cargos públicos para poder concorrer. A terceira (fase eleitoral II) inicia na sequência e se estende até o fim das convenções partidárias (16/09/2020). A quarta (fase eleitoral III) começa com a definição das candidaturas e termina no dia do primeiro turno (15/11/2020). A quinta (fase eleitoral IV) engloba o segundo turno e termina no dia 29 de novembro. A divisão da fase eleitoral em quatro etapas é importante, porque o segundo turno é restrito ao cargo de prefeito das cidades com mais de 200 mil eleitores.

A sexta e última etapa (fase pós-eleitoral) começa no dia seguinte à realização do segundo turno das eleições e vai até a posse dos eleitos.4 4 Seria possível encerrar a fase pós-eleitoral no dia 18 de dezembro, com a diplomação dos eleitos e, assim, criar uma nova etapa do ciclo entre esta data e a posse. Essa distinção é importante, uma vez que a solenidade de diplomação dos eleitos é a última fase oficial do calendário eleitoral. Existe interpretação na Justiça Eleitoral de que, em caso de morte de um eleito antes da diplomação, uma nova eleição poderia ser convocada para escolher seu substituto; caso a diplomação já tivesse ocorrido, o vice assumiria. No entanto, por se tratar de um período muito curto, de apenas doze dias, optamos por juntar as duas etapas em uma só. Segundo o que delineamos na seção anterior, nossa expectativa é observar o aumento da violência sobretudo na fase eleitoral III, relativa à realização do primeiro turno das eleições.

O Gráfico 1, abaixo, ilustra a evolução diária dos 485 registros de violência contra lideranças políticas e familiares entre os dias 1º de janeiro de 2019 e 31 de dezembro de 2020. As linhas verticais pontilhadas demarcam os momentos que separam as diferentes etapas do calendário eleitoral. Nessa primeira abordagem analítica, observa-se que a violência evolui segundo a ideia teórica do ciclo eleitoral: aumenta com o avanço das fases eleitorais, alcança o ápice durante a realização do primeiro turno (etapa 3), com média de três episódios por dia, e desacelera acentuadamente no segundo turno (etapa 4) e no momento pós-eleitoral.5 5 Os números de violência política chamam a atenção até mesmo em relação ao contexto latino-americano. A ONG moe, que monitora episódios de violência política com metodologia semelhante, encontrou 89 casos de violência contra lideranças políticas na Colômbia, nos seis meses que antecederam a eleição presidencial que conduziu Iván Duque ao poder, em 2020 (MOE, 2020). Na seção seguinte, descreveremos com maiores detalhes os dados sobre a ocorrência da violência contra lideranças políticas nas eleições municipais de 2020.

Gráfico 1
Evolução da violência política e eleitoral nas eleições municipais de 2020 Fonte: Elaboração própria dos autores

Dados e resultados

A noção de que a violência se desenvolve e se modifica conforme a etapa do ciclo eleitoral, como argumentamos acima, orientará a análise e a apresentação dos dados, que faremos a partir de duas abordagens empíricas diferentes. Na primeira, descrevemos como a violência política e eleitoral evoluiu ao longo das eleições municipais de 2020, em que locais ela ocorreu com mais frequência, qual foi o perfil político e social das vítimas e quais foram as modalidades de violência mais comuns. Na segunda, apresentamos um modelo para dados categóricos dicotômicos (modelo binomial), com função de ligação na escala logarítmica, a fim de medir a associação entre a ocorrência de homicídios (variável dependente) e o perfil social e político das vítimas, o local da violência e o momento em que ela ocorre (variáveis independentes).

Os casos de violência contra lideranças políticas foram levantados a partir do acompanhamento de veículos de comunicação nacionais – noticiários de rádio e televisão, jornais e revistas impressos, blogues jornalísticos e demais canais digitais – pela equipe de pesquisadores do Grupo de Investigação Eleitoral da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Giel/Unirio), que coleta dados desta natureza desde 2018 (Borba e Nogueira, 2018BORBA, Felipe & NOGUEIRA, Ary Jorge Aguiar. (2018), “Violência eleitoral no Brasil: o perfil político e social de candidatos assassinados entre 1998 e 2016”. 42º Encontro Nacional da Anpocs, Caxambu, 22 a 26/10. Disponível em http://www.anpocs.com/index.php/encontros/papers/42-encontro-anual-da-anpocs/gt-31/gt35-10>, consultado em 16/10/2021.
http://www.anpocs.com/index.php/encontro...
). Esse monitoramento foi feito a partir do Alerta do Google, que gerou relatórios semanais a partir de um conjunto específico de palavras-chave. As informações obtidas através desses veículos foram validadas pela equipe de investigadores, depois de cruzadas com outras fontes para descartar mortes naturais, acidentais ou sem razão conhecida. Essa metodologia é a mesma utilizada em pesquisas como Misíon de Observación Electoral (2020), da organização não-governamental colombiana moe, e em outros estudos acadêmicos sobre violência política e eleitoral (Hyde e Marinov, 2012HYDE, Susan & MARINOV, Nicolay. (2012), “Which Elections Can Be Lost?” Political Analysis, 20, 2:191-210.; Harish e Toha, 2019HARISH, S. P. & TOHA, Risa. (2019), “A New Typology of Electoral Violence: Insights from Indonesia”. Terrorism and Political Violence, 31, 4: 687-711.).

A construção de bancos de dados a partir de notícias veiculadas na mídia tem gerado muita discussão, sobretudo por causa dos vieses de seleção utilizados pelos meios de comunicação. Diversos trabalhos clássicos documentaram a natureza ideológica da seleção de notícias pelas mídias impressas (Snyder e Kelly, 1977SNYDER, David & KELLY, William. (1977), “Conflict Intensity, Media Sensitivity and the Validity of Newspaper Data”. American Sociological Review, 42, 1:105-123.; Franzosi, 1987FRANZOSI, Roberto. (1987), “The Press as a Source of Socio-Historical Data: Issues in the Methodology of Data Collection from Newspapers”. Historical Methods, 20, 1:5-16.; Oliver e Myers, 1999OLIVER, Pamela & MYERS, Daniel. (1999), “How Events Enter the Public Sphere: Conflict, Location, and Sponsorship in Local Newspaper Coverage of Public Events”. American Journal of Sociology, 105, 1:38-87.). Também no Brasil os vieses da cobertura da mídia sobre violência e crime são debatidos em diversos trabalhos (Ramos e Paiva, 2007RAMOS, Silvia & PAIVA, Anabela. (2007), Mídia e violência: Novas tendências na cobertura de criminalidade e segurança no Brasil. Rio de Janeiro, IUPERJ.; Ramos, 2014RAMOS, Silvia. (2014), “Violência, crime e mídia”. In: RATTON, José Luiz Ratton; LIMA, Renato Sérgio & AZEVEDO, Rodrigo Ghiringhelli (orgs.), Crime, polícia e justiça. São Paulo, Contexto.; Nunes, 2017NUNES, Pablo. (2017), “Favela, mídia e remoções: discurso jornalístico, imagens sociais e políticas públicas de habitação em favelas cariocas”. Transversos: Revista de História, 9.). A vantagem de usar a ferramenta Alerta do Google é poder abarcar uma grande quantidade e diversidade de meios de comunicação, tipos de mídias e posicionamentos ideológicos, espalhadas por várias regiões do país. Além disso, as formas de violência que têm a política como motivação saem do lugar comum do noticiário sobre crime e violência. Esse caráter de excepcionalidade gera interesse dos meios de comunicação, reduzindo o viés de cobertura.

Em relação aos dados, é importante mencionar que apresentamos apenas a violência cometida contra lideranças políticas municipais – prefeitos, vice-prefeitos e vereadores, e candidatos e pré-candidatos a estes mesmos cargos – e/ou seus familiares.6 6 Candidatos são os políticos que sofrem violência durante a campanha eleitoral. São considerados políticos em campanha apenas quando há registro oficial da candidatura no Tribunal Superior Eleitoral. Pré-candidatos são aqueles que anunciaram a intenção de se candidatar, mas ainda não haviam registrado oficialmente a candidatura no momento da violência. Em relação aos tipos de violência relatados a seguir, distinguimos cinco modalidades que atingiram políticos e/ou o familiares: agressões, ameaças, atentados, homicídios e sequestros. O Quadro 2, abaixo, sistematiza a definição das cinco modalidades de violência pesquisadas.

Quadro 2
As cinco modalidades de violência política e eleitoral

A série de gráficos abaixo descreve a evolução da violência política nas etapas do ciclo eleitoral, confrontando-a com as variáveis políticas e sociais das lideranças e as modalidades de violência (Imagem 1).7 7 Os casos de violência contra políticos e familiares foram agrupados para simplificar a informação. Geograficamente, percebe-se um número grande de ocorrências nas regiões Nordeste e Sudeste, com maior incidência nos municípios com até 20 mil habitantes. Embora São Paulo seja a unidade da federação com o maior número de ocorrências (60), o equivalente a 12% do total, a Paraíba se destaca por apresentar a maior taxa de violência por 100 mil habitantes (1,04). O Amapá é o único estado do país sem registro de violência contra lideranças locais. O Anexo I desse artigo apresenta dois mapas com a distribuição da violência pelos estados, com o número total de casos e com as taxas por 100 mil habitantes.

Imagem 1
Evolução da violência política no ciclo eleitoral de 2020 Fonte: Elaboração própria dos autores.

Houve relativo equilíbrio entre os tipos de violência. As ameaças e os atentados somaram 27% dos casos cada uma, seguidos pelas agressões (22%) e os homicídios (21%). Os sequestros completam os 3% restantes. As modalidades de violência evoluíram de maneira autônoma ao longo das etapas do ciclo eleitoral. Os atentados representaram 44% dos episódios de violência na fase correspondente ao primeiro turno, porém declinaram para 6% no segundo turno. As ameaças, por sua vez, foram 19% no primeiro turno, mas subiram para 43% na fase eleitoral IV (segundo turno). Os homicídios foram a categoria mais comum de violência na fase pré-eleitoral, declinaram nas fases seguintes e voltaram a aumentar no período do segundo turno, quando eram 37% de todos os registros de violência.

As lideranças podem ser agrupadas em dois grupos centrais: políticos no exercício dos mandatos e candidatos. O primeiro grupo corresponde aos prefeitos, vice-prefeitos e vereadores eleitos em 2016. O segundo são os políticos que concorreram a estes cargos em 2020.8 8 Cerca de 30% das lideranças ocupavam um cargo eletivo e eram, simultaneamente, pré-candidatas ou candidatas no momento da violência. Em situações desse tipo, optou-se por manter o cargo eletivo como referência (não candidato), quando a violência tivesse ocorrido antes do registro oficial da candidatura no TSE. Se isso aconteceu depois do registro da candidatura, o político foi classificado como candidato. Os vereadores, prefeitos e vice-prefeitos somaram 39% dos casos, mas no período eleitoral a proporção cai para 7% e desaparece no período eleitoral IV.

Essas lideranças estavam filiadas a 28 partidos políticos diferentes, sinalizando que a violência no país é plural e multipartidária (Gráfico 2). No entanto, quando agrupados por afinidade ideológica, os políticos de direita foram as vítimas mais envolvidas com a violência.9 9 Usamos a proposta de Bolognesi, Ribeiro e Codato (2020) para classificar os partidos ideologicamente. Os partidos de centro-esquerda e de centro-direita foram agrupados como centro. Feita em julho de 2018, a pesquisa destes autores se baseou em survey com 519 cientistas políticos brasileiros. No período eleitoral III, referente à campanha do primeiro turno, eles representaram 68% do total de casos. MDB, PSDB, PDS, PT e DEM são os cinco partidos mais atingidos, com 55, 43, 36, 32 e 31 casos, respectivamente. A presença desses partidos na lista dos mais atingidos era, de certa forma, esperada, já que eles são, também, os partidos com maior presença no cenário político brasileiro, em número de eleitos e de candidatos. O MDB, por exemplo, é o partido que mais elegeu prefeitos e vereadores em 2016, e que tinha o maior número de candidatos em 2020.

Gráfico 2
Filiação partidária das lideranças políticas vítimas de violência Fonte: Elaboração própria dos autores.

Em relação ao perfil social, a maioria dos casos de violência ocorre contra os grupos com maior representação na amostra, como mencionamos anteriormente. Os homens foram as principais vítimas da violência ao longo do ciclo, representando 88% dos casos. Por outro lado, nota-se o aumento na proporção da violência de gênero contra as mulheres, principalmente no período eleitoral IV e no período pós-eleitoral: em ambas as etapas, elas eram mais de 30% das vítimas. Isso sinaliza uma barreira a mais no acesso das mulheres aos cargos eletivos municipais.

A média de idade de todas as vítimas de violência eleitoral é 45 anos; a mais nova tinha 22 anos, e a mais velha, 77 anos. No que se refere à escolaridade, a ampla maioria tinha ensino superior completo ou incompleto, ainda que se observe o crescimento de políticos que têm apenas Ensino Fundamental ao longo do ciclo. Esses dados, mais uma vez, espelham a composição social dos quadros políticos brasileiros, notadamente de alta escolaridade. Finalmente, tem-se que a raça/cor predominante das vítimas é a branca, com metade dos casos.

Feita a descrição inicial dos dados, apresentamos a seguir um modelo para dados categóricos dicotômicos (modelo binomial), com função de ligação na escala logarítmica (Dobson e Barnett 2008DOBSON, Annette J. & BARNETT, Adrian G. (2008), An Introduction to Generalized Linear Models. Bocca Raton, CRC.; McCullagh e Nelder, 1999MCCULLAGH P. & NELDER, J. A. (1999), Generalized Linear Models. Londres, Chapman & Hall/crc.). O objetivo é estudar a associação entre o tipo de violência (homicídio versus não homicídio) com as variáveis relacionadas à localização da violência (porte do município e região), o perfil social (sexo, idade, cor/raça e escolaridade) e político das vítimas (cargo e ideologia partidária) e o momento da violência (etapas do ciclo eleitoral). Todo o procedimento de estimação e tomada de decisão científica segue o paradigma bayesiano, que toma todos os parâmetros como variáveis aleatórias e os atualiza à luz dos dados, a partir da Fórmula de Bayes (Gamerman e Lopes, 2006GAMERMAN, Dani & LOPES, Hedibert F. (2006), Markov Chain Monte Carlo: Stochastic Simulation for Bayesian Inference. Boca Raton, Chapman & Hall/CRC.; Migon, Gamerman e Louzada, 2015MIGON, Helio S., GAMERMAN, Dani & LOUZADA, Francisco. (2015), Statistical Inference: an integrated approach. Londres, Chapman & Hall/crc.). Para isso, utilizamos o pacote arm do programa R (comando bayesglm), assumindo distribuições a priori não informativas para todos os parâmetros. A principal vantagem desse procedimento é contornar o viés gerado na ciência, particularmente nos trabalhos da ciência política, pela tomada de decisão baseada no valor p (Gelman, 2016GELMAN, Andrew. (2016), “The problems with p-values are not just with p-values. Supplemental material to the ASA statement on p-values and statistical significance”. The American Statistician, 70, 2:129-133.).

As covariáveis do modelo são:

  1. 1

    Pessoais: sexo, cor (branca, não branca), escolaridade (Fundamental, Médio, superior) e faixa etária (18 a 29 anos, 30 a 39, 40 a 49, 50 a 59 e acima de 60).10 10 Os dados sobre perfil e filiação partidária foram obtidos na plataforma Divulga Cand, do TSE (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/).

  2. 2

    Políticas: situação (candidato, não candidato), ideologia (esquerda, centro, direita) e ciclo.

  3. 3

    Geográficas: porte do município (pequeno, médio, grande)11 11 Pequeno: até 20 mil eleitores; médio: entre 20 mil e 100 mil; e grande, acima de 100 mil. e região do país.

A análise de significância do parâmetro como variável explicativa é feita comparando a média e o desvio padrão (da distribuição a posteriori do parâmetro), e observando o quanto ele se afasta do zero. O modelo indica o grau de violência entre os grupos, ou seja: pode-se pensar o homicídio como violência extrema e observar variáveis específicas que podem estar associadas a ele.

O Gráfico 3 apresenta as estimativas a posteriori para o modelo completo (com todas as covariáveis) na escala do logaritmo da chance de ocorrer homicídio versus não ocorrer. Os segmentos de reta apresentam os intervalos de credibilidade de 95%, e os pontos, a mediana a posteriori dos parâmetros. Todo segmento de reta que não incluir o zero (reta vertical pontilhada) significa que o parâmetro é estatisticamente significativo no modelo. Se o segmento de reta estiver à direita do zero, indica que o parâmetro influencia positivamente a chance de ocorrer homicídio (frente à categoria de referência); se estiver à esquerda da reta vertical, significa associação negativa.

Gráfico 3
Estimativas do modelo completo Fonte: Elaboração própria dos autores

O resultado do modelo mostra que seis covariáveis aparecem associadas ao homicídio de lideranças políticas: a variável cor/raça, com razão de chances exponencial(1,01) = 2,75 de um branco sofrer homicídio frente a um não Branco, ou quase três vezes maior; a variável escolaridade, com redução de exponencial(-1,76) = 0,17 de um indivíduo com ensino superior sofrer homicídio frente a alguém com Ensino Fundamental (menos que 17%);12 12 A variável escolaridade pode ser considerada uma proxy de classe social, uma vez que os mais escolarizados estão nos estratos mais altos do mercado de trabalho, contando com as maiores rendas e riquezas (Ribeiro, 2019). As análises mostram aumento da violência (número de ocorrências) e aumento da intensidade (com maior chance de ocorrência de homicídios) ao se aproximar do pleito eleitoral. a variável região, com aumento de exponencial(1,14) = 3,12 de um homicídio na região Sudeste frente à região Centro-Oeste; a variável porte do município, com exponencial(-1,37) = 0,25 a razão de chances de homicídio nos municípios grandes frente aos pequenos; e a variável ciclo, com exponencial(-1,67) = 0,19 da razão de chances de homicídio na fase eleitoral II frente à fase pré-eleitoral, e exponencial(1,54) = 4,66 a razão de chances de homicídio na fase eleitoral IV frente à fase pré-eleitoral. A variável faixa etária mostra-se significativa pelos intervalos de credibilidade para as faixas 2 (30 a 39 anos) e 4 (50 a 59 anos), se comparadas à referência, faixa 1 (18 a 29 anos).

A seguir, adotamos o Akaike Information Criterion (aic) como critério de seleção para estimar o melhor modelo para o teste que realizamos. O aic é baseado no princípio da parcimônia, no qual o melhor modelo é aquele que apresenta o melhor ajuste, obtido pelo logaritmo da função de verossimilhança, penalizado pelo número de parâmetros. Neste procedimento, o modelo de melhor ajuste é o que apresenta o menor aic (Raftery, 1995RAFTERY Adrian. (1995), “Bayesian model selection in social research”. Sociological Methodology, 25: 111–165.; Gill, 2015GILL, Jeff. (2015), Bayesian Methods: A Social and Behavioral Sciences Approach. Boca Raton, CRC.). O critério de seleção de modelos indica que considerar as idades prejudica a qualidade do ajuste. O modelo completo, que inclui todas as variáveis, visualizado no Gráfico 3, obteve aic de 286, enquanto o modelo ajustado, sem as faixas de idade, registrou aic de 276 (Gráfico 4).13 13 Para estimar o modelo de melhor ajuste segundo o critério AIC, usamos o comando step() do R.

Gráfico 4
Estimativas do modelo de melhor ajuste Fonte: Elaboração própria dos autores.

As variáveis que seguiram associadas com a ocorrência de homicídios são cor/raça, escolaridade, região, porte do município e ciclo. As lideranças políticas não brancas e/ou com ensino Fundamental apenas continuam sendo mais vulneráveis ao assassinato do que as lideranças políticas brancas e/ou com ensino superior. Do mesmo modo, as lideranças residentes nas cidades de pequeno porte (até 20 mil habitantes) e/ou localizadas no Sudeste têm mais chance de sofrer homicídio do que as lideranças políticas de municípios de grande porte (acima de 100 mil habitantes) e/ou da região Centro-Oeste. Finalmente, na etapa do ciclo eleitoral II (fase de escolha dos candidatos e coligações), cai a chance de ocorrer homicídio, em relação ao período pré-eleitoral, enquanto que a fase eleitoral IV (segundo turno) esta chance aumenta em relação ao período pré-eleitoral (a Tabela 1 completa com as estimativas dos dois modelos pode ser vista no Anexo II).

Em resumo, os dados descritivos indicam que a fase eleitoral III, ou primeiro turno da eleição de 2020, foi a mais violenta. É nela que a violência política se manifestou com maior intensidade, apresentando uma média de três episódios por dia. A violência incide principalmente sobre homens brancos, de alta escolaridade, com 30 a 59 anos, moradores de municípios de pequeno porte das regiões Sudeste e Nordeste e filiados a partidos identificados como de direita. Contudo, o modelo que testou a relação entre o perfil da liderança e a sua chance de ser assassinado mostrou que as vítimas preferenciais são os políticos não brancos e de baixa escolaridade, sinalizando que estas lideranças enfrentam uma barreira a mais para ascender a um cargo eletivo, além da sua condição de classe. Esses resultados confirmam, portanto, a expectativa teórica de que a violência predomina nos grupos majoritários do universo político, mas são mais incisivas nos grupos socialmente mais vulneráveis.

Finalmente, é importante observar que, embora a ocorrência de violência contra as mulheres e os candidatos ter aumentado ao longo do ciclo eleitoral, principalmente na fase oficial da campanha, estas variáveis não aparecem em nenhum dos dois modelos como significativas do ponto de vista estatístico para o homicídio; ou seja, o aumento da violência vivenciado por estes dois grupos não foi ocasionado por aumento dos homicídios, mas pelo aumento conjunto de todos os tipos de violência.

Discussão e conclusão

Neste artigo, buscamos retratar a violência contra lideranças políticas durante as diferentes etapas do ciclo das eleições municipais de 2020. Reconhecemos que uma compreensão completa do fenômeno precisaria incluir a violência praticada também contra eleitores, ativistas políticos, líderes sociais, oficiais dos órgãos de gestão eleitoral, jornalistas e quaisquer outros atores interessados no processo eleitoral. Dentro do nosso objetivo restrito de mostrar apenas uma das faces da violência, podemos dizer que os números apresentados revelam uma situação no mínimo preocupante para o funcionamento da democracia brasileira.

O monitoramento do noticiário nos dois anos que compuseram o ciclo das eleições municipais encontrou o total de 485 episódios de violência contra lideranças políticas locais. O caráter eleitoral da violência ficou evidente com a alta da sua incidência durante a etapa do ciclo que coincidiu com o período oficial da campanha no primeiro turno, quando o país chegou a ter uma média de três casos de violência por dia. A descrição revelou perfil bem definido: as vítimas eram majoritariamente do sexo masculino, da cor/raça branca, de alta escolaridade e filiados a partidos tradicionais considerados de centro-direita. Geograficamente, as vítimas eram lideranças de municípios com até 20 mil habitantes, localizados nas regiões Nordeste e Sudeste.

No entanto, embora as lideranças brancas e com ensino superior sejam os alvos prioritários da violência, os dois modelos estatísticos que estimaram as chances de ocorrer um homicídio mostraram que elas são maiores para não brancos (pretos e pardos) e políticos com escolaridade menor (até o Ensino Fundamental). Este resultado é interessante por dois motivos. Primeiro, ele aproxima a violência política do padrão de violência social observado no cotidiano das cidades brasileiras, onde as pessoas não brancas (pretas ou pardas) e com baixo nível de escolaridade são o perfil dominante das vítimas de homicídios (Cerqueira et al., 2020CERQUEIRA, Daniel et al. (2020), Atlas da violência 2020. Rio de Janeiro, IPEA.). Em segundo lugar, os dados demonstram que estas lideranças enfrentam uma barreira a mais para alcançar um cargo eletivo, além da sua condição de classe.

Este artigo não teve como objetivo investigar as causas da violência eleitoral. Contudo, aproveitamos essas considerações finais para especular sobre o que poderia estar por trás dos números alarmantes retratados aqui. A literatura internacional sugere que a violência política em eleições é ocasionada por um conjunto de três macro fatores: o tipo de regime político, o arranjo institucional e as condições sociais do país. Segundo essa literatura, a violência eleitoral seria maior em países de regimes híbridos, sem instituições eleitorais sólidas ou apropriadas para incorporar os conflitos dentro dos canais oficiais, e em sociedades vulneráveis a condições sociais adversas – como alta desigualdade, subdesenvolvimento e pobreza extrema (Norris, Frank & Martínez i Coma, 2015NORRIS, Pippa; FRANK, Richard & MARTINEZ I COMA, Ferran. (2015), Contentious Elections: From Ballots to violence. Nova York, Routledge.).

Desde meados da década de 2010, a qualidade da democracia brasileira está em questionamento. Não cabe aqui revisar o estado da arte deste debate. Basta mencionar que os três principais organismos internacionais que medem a qualidade da democracia no mundo concordam que a democracia brasileira está em declínio. O relatório do v-dem Institute (2020) emite o julgamento mais duro de todos, ao afirmar que o Brasil vive um processo de “autocratização” de seu regime político. O relatório Estado global da democracia, da International idea (2019)IDEA – INTERNATIONAL INSTITUTE FOR DEMOCRACY AND ELECTORAL ASSISTANCE. (2019), The Global State of Democracy: Addressing the Ills, Reviving the Promise. Suécia, IDEA., não usa esses termos, mas inclui o Brasil entre as oito democracias que mais regrediram nos últimos cinco anos. O relatório da Freedom House (2020)FREEDOM HOUSE. (2020), Freedom in the World 2020. Washington. chama a atenção para a corrupção, os riscos de violência contra jornalistas independentes e ativistas da sociedade civil, as altas taxas de crimes violentos e violência desproporcional contra a exclusão econômica de minorias como problemas atuais da democracia brasileira.

Ao mesmo tempo, são conhecidos os desafios que a desigualdade, a violência e a criminalidade vêm impondo à democracia brasileira (Câmara, 2008CÂMARA, Paulo Sette. (2008), “Violência e criminalidade como desafios para a democracia no Brasil”. Revista Brasileira de Segurança Pública, 2, 3:162-169.; Cerqueira, 2014CERQUEIRA, Daniel. (2014), Causas e consequências do crime no Brasil. Rio de Janeiro, BNDES.; Soares, 2020aSOARES, Luiz Eduardo. (2020a), “Milícias: um desafio para a democracia brasileira”. Insight Inteligência, 91:50-75.). A presença cada vez maior do crime organizado na política partidária aproxima a realidade brasileira do contexto atual da violência política latino-americana. Aqui, assim como em outros países da região, como Colômbia e México, as eleições têm sido usadas como forma de promover a ascensão de criminosos ao poder político, sendo o uso da violência contra adversários uma das estratégias fundamentais (Trelles e Carreras, 2012TRELLES, Alejandro & CARRERAS, Miguel. (2012), “Bullets and Votes: Violence and Electoral Participation in Mexico”. Journal of Politics in Latin America, 4, 2:89-123.; Acemoglu, Robinson e Santos, 2013ACEMOGLU, Daron; ROBINSON, J, James & SANTOS, Rafael. (2013), “The Monopoly of Violence: Evidence from Colombia”. Journal of the European Economic Association, 11, 5: 5-44.; Ballivián, 2017BALLIVIÁN, Salvador Romero. (2017), “Elecciones y violencia en América Latina: de los antiguos a los nuevos desafios”. In: BALLIVÁN, S. R. (org.), Democracia, elecciones y violencia en América Latina. Tegucigalpa, Instituto Universitario en Democracia, Paz y Seguridad.). A presença destes grupos nos espaços de decisão política local – prefeituras e câmaras de vereadores – permite o acesso a recursos públicos e o controle da agenda governamental; assim, é possível evitar a aprovação de leis e normas que dificultem a ação desses grupos e/ou aumentem os custos de suas atividades ilegais. Segundo levantamento feito do jornal O Globo, pelo menos 31 candidatos a prefeituras e câmaras de vereadores em todas as regiões do país sofriam inquéritos, eram réus na Justiça ou haviam sido condenados por envolvimento com facções do tráfico, milícias ou grupos de extermínio (Soares, 2020bSOARES, Rafael. “Milícia, tráfico e grupos de extermínio são vinculados a 31 candidatos pelo país”. (2020b), O Globo, 13/11.).

A crise recente da democracia e a escalada do crime organizado na vida partidária nos parecem ser as duas questões-chaves, ou explicações principais, para a ocorrência da violência no processo eleitoral de 2020. Por outro lado, é preciso enfatizar que não é nossa ambição generalizar os resultados, estendendo-os a outras eleições; observamos somente um pleito eleitoral. Além disso, o ciclo das eleições municipais de 2020 possui características próprias – como o impacto da pandemia da Covid-19 e o adiamento do calendário eleitoral – que dificilmente podem ser observadas em outros contextos eleitorais. Pretendemos, mesmo assim, replicar o trabalho em eleições futuras, para observar padrões de continuidade e de mudança.

Finalmente, é fundamental que a violência eleitoral seja encarada de frente pelos administradores públicos, na busca de soluções para este grave problema, que corrói a democracia brasileira. Longe de esgotar o tema, este trabalho pretende servir de apoio a pesquisas futuras, bem como alimentar o debate sobre este singular viés da violência política com repercussão eleitoral.

Anexo I. Mapas da violência política e eleitoral por estado


Fonte: Elaboração própria dos autores

Anexo II. Estimativa dos parâmetros para o modelo completo e para o modelo com melhor ajuste, segundo aic. As linhas marcadas referem-se aos parâmetros significativos em ambos os modelos.

Modelo completo Melhor ajuste
Parâmetro Média Desvio Padrão Média Desvio Padrão
(Intercept) -0,97 1,20 -1,19 0,67
Sexo masculino -0,49 0,52
Cor não branca 1,01 0,40 1,07 0,39
Escolaridade Médio -0,46 0,37 -0,52 0,36
Escolaridade Superior -1,76 0,53 -1,66 0,50
Faixa etária 2 0,93 0,65
Faixa etária 3 0,10 0,66
Faixa etária 4 0,71 0,65
Faixa etária 5 0,31 0,82
Situação não candidato 0,09 0,51
Ideologia centro -0,42 0,59
Ideologia direita -0,33 0,51
Porte do município médio -0,80 0,43 -0,83 0,42
Porte do município grande -1,37 0,47 -1,36 0,46
Região Nordeste 0,01 0,59 -0,10 0,59
Região Norte -0,26 0,71 -0,23 0,70
Região Sudeste 1,14 0,61 1,18 0,60
Região Sul 0,45 0,69 0,43 0,69
Fase eleitoral I -0,85 0,54 -0,72 0,52
Fase eleitoral II -1,67 0,60 -1,55 0,57
Fase eleitoral III -0,85 0,60 -0,83 0,42
Fase eleitoral IV 1,54 0,86 1,59 0,74
Fase pós-eleitoral -0,81 0,83 -0,67 0,77
AIC = 286,09 AIC = 276,62
n = 439 q = 23 n = 439 q = 15
  • Fonte: Elaboração própria dos autores
    • 1
      Esse artigo contou com financiamento da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
    • 2
    • 3
      Kammerund (2012)KAMMERUND, Lisa. (2012), An Integrated Approach to Elections and Conflict. Arlington, IFES White Paper. argumenta que a intensidade da violência acompanha a dinâmica de evolução do ciclo eleitoral, na qual o país experimenta períodos cíclicos de violência latente, escalada da tensão, surtos de violência e redução da escalada da violência.
    • 4
      Seria possível encerrar a fase pós-eleitoral no dia 18 de dezembro, com a diplomação dos eleitos e, assim, criar uma nova etapa do ciclo entre esta data e a posse. Essa distinção é importante, uma vez que a solenidade de diplomação dos eleitos é a última fase oficial do calendário eleitoral. Existe interpretação na Justiça Eleitoral de que, em caso de morte de um eleito antes da diplomação, uma nova eleição poderia ser convocada para escolher seu substituto; caso a diplomação já tivesse ocorrido, o vice assumiria. No entanto, por se tratar de um período muito curto, de apenas doze dias, optamos por juntar as duas etapas em uma só.
    • 5
      Os números de violência política chamam a atenção até mesmo em relação ao contexto latino-americano. A ONG moe, que monitora episódios de violência política com metodologia semelhante, encontrou 89 casos de violência contra lideranças políticas na Colômbia, nos seis meses que antecederam a eleição presidencial que conduziu Iván Duque ao poder, em 2020 (MOE, 2020MOE. (2020), Informe de Violencia Contra Líderes Políticos, Sociales e Comunales. Bogotá, Observatorio Político-Electoral de la Democracia.).
    • 6
      Candidatos são os políticos que sofrem violência durante a campanha eleitoral. São considerados políticos em campanha apenas quando há registro oficial da candidatura no Tribunal Superior Eleitoral. Pré-candidatos são aqueles que anunciaram a intenção de se candidatar, mas ainda não haviam registrado oficialmente a candidatura no momento da violência.
    • 7
      Os casos de violência contra políticos e familiares foram agrupados para simplificar a informação.
    • 8
      Cerca de 30% das lideranças ocupavam um cargo eletivo e eram, simultaneamente, pré-candidatas ou candidatas no momento da violência. Em situações desse tipo, optou-se por manter o cargo eletivo como referência (não candidato), quando a violência tivesse ocorrido antes do registro oficial da candidatura no TSE. Se isso aconteceu depois do registro da candidatura, o político foi classificado como candidato.
    • 9
      Usamos a proposta de Bolognesi, Ribeiro e Codato (2020)BOLOGNESI, Bruno; RIBEIRO, Ednaldo & CODATO, Adriano. (2020), “Esquerda, centro ou direita? Como classificar os partidos no Brasil”. Observatório das Eleições. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/colunas/observatorio-das-eleicoes/2020/11/24/esquerda-centro-ou-direita-como-classificar-os-partidos-no-brasil.htm, consultado em 16/10/2021.
      https://noticias.uol.com.br/colunas/obse...
      para classificar os partidos ideologicamente. Os partidos de centro-esquerda e de centro-direita foram agrupados como centro. Feita em julho de 2018, a pesquisa destes autores se baseou em survey com 519 cientistas políticos brasileiros.
    • 10
      Os dados sobre perfil e filiação partidária foram obtidos na plataforma Divulga Cand, do TSE (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/).
    • 11
      Pequeno: até 20 mil eleitores; médio: entre 20 mil e 100 mil; e grande, acima de 100 mil.
    • 12
      A variável escolaridade pode ser considerada uma proxy de classe social, uma vez que os mais escolarizados estão nos estratos mais altos do mercado de trabalho, contando com as maiores rendas e riquezas (Ribeiro, 2019RIBEIRO, Carlos Antônio Costa. (2019), A dimensão social das desigualdades. Curitiba, Appris.). As análises mostram aumento da violência (número de ocorrências) e aumento da intensidade (com maior chance de ocorrência de homicídios) ao se aproximar do pleito eleitoral.
    • 13
      Para estimar o modelo de melhor ajuste segundo o critério AIC, usamos o comando step() do R.
    • DOI: 10.1590/3710803/2022
      Para replicação dos dados, ver: DOI: 10.48331/scielodata.RY6YB8

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    Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Mar 2022
    • Data do Fascículo
      2022

    Histórico

    • Recebido
      31 Mar 2021
    • Aceito
      28 Jun 2021
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