Acessibilidade / Reportar erro

Morfoanatomia de folha e caule de Genipa americana L., Rubiaceae

Leaf and stem morpho-anatomy of Genipa americana L., Rubiaceae

Resumos

Genipa americana L., conhecida como jenipapo, é uma Rubiaceae nativa do Brasil e as suas folhas são utilizadas pela população como antidiarreico e febrífugo, e o caule como anti-hemorrágico, contra luxações e contusões. Com o objetivo de caracterizar macro e microscopicamente folhas adultas e caules jovens para o controle de qualidade farmacognóstico, essa planta medicinal foi analisada segundo a metodologia clássica de morfoanatomia vegetal. Genipa americana apresenta folhas simples, opostas, de formato obovado a oblanceolado e pecíolos curtos. A epiderme foliar é uniestratificada e revestida por cutícula delgada e levemente estriada. Os estômatos são paracíticos e restritos à superfície abaxial. Há tricomas tectores uni e pluricelulares predominantemente na superfície abaxial. O mesofilo é dorsiventral. Em secção transversal, a nervura central é plano-convexa e o pecíolo é circular, ambos apresentando um feixe vascular colateral em disposição cilíndrica e outros menores. O caule possui felogênio localizado nas camadas subepidérmicas, colênquima anelar e um cilindro floemático externo ao de xilema, sendo ambos percorridos por raios parenquimáticos estreitos. Ocorrem idioblastos contendo compostos fenólicos, areia cristalina e drusas de oxalato de cálcio na folha e no caule.

Genipa americana; Rubiaceae; farmacobotânica; jenipapo; planta medicinal


Genipa americana L., known as jenipapo, is a Rubiaceae species native to Brazil. Its leaves are used by the population as anti-diarrheic and febrifuge, and its stem as anti-hemorrhagic and for trauma injuries. Aiming to identify macro and microscopically mature leaves and young stems for the pharmacognostic quality control, this medicinal plant was investigated according to standard morpho-anatomical techniques. The leaves are simple, opposite, obovate-oblanceolate, presenting short petiole. The epidermis is uniseriate and coated with thin and slightly striate cuticle. The stomata are paracytic and restricted to the abaxial surface. It occurs non-glandular trichomes, uni and multicellular, predominantly on the abaxial surface. The mesophyll is dorsiventral. In cross-section, the midrib is plane-convex and the petiole is circular, both presenting one collateral vascular bundle in centric arrangement and minor ones. The stem shows phellogen installed superficially, annular collenchyma and a phloem cylinder outside the xylem one, both traversed by narrow parenchymatic rays. It is encountered idioblasts containing phenolic substances and calcium oxalate crystal-sand and druses.

Genipa americana; Rubiaceae; "jenipapo"; medicinal plant; morpho-anatomy


Morfoanatomia de folha e caule de Genipa americana L., Rubiaceae

Leaf and stem morpho-anatomy of Genipa americana L., Rubiaceae

Marianna Erbano; Márcia R. Duarte* * E-mail: marciard@ufpr.br, Tel. + 55 41 3360 4064.

Programa de Pós-graduação em Ciências Farmacêuticas, Laboratório de Farmacognosia, Departamento de Farmácia, Universidade Federal do Paraná, Av. Prof. Lothário Meissner, 632, 80210-170, Curitiba-PR, Brasil

RESUMO

Genipa americana L., conhecida como jenipapo, é uma Rubiaceae nativa do Brasil e as suas folhas são utilizadas pela população como antidiarreico e febrífugo, e o caule como anti-hemorrágico, contra luxações e contusões. Com o objetivo de caracterizar macro e microscopicamente folhas adultas e caules jovens para o controle de qualidade farmacognóstico, essa planta medicinal foi analisada segundo a metodologia clássica de morfoanatomia vegetal. Genipa americana apresenta folhas simples, opostas, de formato obovado a oblanceolado e pecíolos curtos. A epiderme foliar é uniestratificada e revestida por cutícula delgada e levemente estriada. Os estômatos são paracíticos e restritos à superfície abaxial. Há tricomas tectores uni e pluricelulares predominantemente na superfície abaxial. O mesofilo é dorsiventral. Em secção transversal, a nervura central é plano-convexa e o pecíolo é circular, ambos apresentando um feixe vascular colateral em disposição cilíndrica e outros menores. O caule possui felogênio localizado nas camadas subepidérmicas, colênquima anelar e um cilindro floemático externo ao de xilema, sendo ambos percorridos por raios parenquimáticos estreitos. Ocorrem idioblastos contendo compostos fenólicos, areia cristalina e drusas de oxalato de cálcio na folha e no caule.

Unitermos: Genipa americana, Rubiaceae, farmacobotânica, jenipapo, planta medicinal.

ABSTRACT

Genipa americana L., known as jenipapo, is a Rubiaceae species native to Brazil. Its leaves are used by the population as anti-diarrheic and febrifuge, and its stem as anti-hemorrhagic and for trauma injuries. Aiming to identify macro and microscopically mature leaves and young stems for the pharmacognostic quality control, this medicinal plant was investigated according to standard morpho-anatomical techniques. The leaves are simple, opposite, obovate-oblanceolate, presenting short petiole. The epidermis is uniseriate and coated with thin and slightly striate cuticle. The stomata are paracytic and restricted to the abaxial surface. It occurs non-glandular trichomes, uni and multicellular, predominantly on the abaxial surface. The mesophyll is dorsiventral. In cross-section, the midrib is plane-convex and the petiole is circular, both presenting one collateral vascular bundle in centric arrangement and minor ones. The stem shows phellogen installed superficially, annular collenchyma and a phloem cylinder outside the xylem one, both traversed by narrow parenchymatic rays. It is encountered idioblasts containing phenolic substances and calcium oxalate crystal-sand and druses.

Keywords: Genipa americana, Rubiaceae, "jenipapo", medicinal plant, morpho-anatomy.

INTRODUÇÃO

A família Rubiaceae possui 550 gêneros com aproximadamente 9000 espécies (Judd et al., 2008). É uma das maiores famílias de Angiospermas, e uma das principais da flora brasileira (Souza & Lorenzi, 2005), de grande importância social e econômica, pois o café, uma das bebidas mais consumidas mundialmente, encontra-se nela. Espécies dessa família são empregadas como ornamentais, complemento alimentar, na medicina popular e como medicamento fitoterápico (Judd et al., 2008).

Para Delprete et al. (2004), o gênero Genipa encontra-se na subfamília Ixoroideae e na tribo Gardenieae, sendo reconhecido, como um táxon que apresenta duas espécies apenas: G. americana L. e G. infundibuliformis Zappi & Semir. A primeira é nativa e cultivada em todo o neotrópico, desde o México até a Patagônia, e a segunda está somente referida para o Brasil centro-meridional (Delprete et al., 2005).

Genipa americana é popularmente conhecida no Brasil como jenipapeiro ou jenipapo (Delprete et al., 2005). Possui hábito arbóreo, que pode chegar a 25 m de altura, e encontra-se distribuída desde o Amapá até São Paulo e Mato Grosso, sendo cultivada nos pomares de todo o país, inclusive nos estados do Sul (Corrêa, 1984). Essa espécie possui em sua composição manitol, taninos, metil-éteres, hidantoína, ácidos tânicos (Revilla, 2001) e principalmente iridoides, característicos da família Rubiaceae. Dentre os iridoides glicosídicos isolados têm-se genipina (Djerassi et al., 1960), ácido geniposídico (Guarnaccia et al., 1972) e geniposídeo (Jensen, 1983).

Diversas partes da planta são utilizadas como medicinal pela população. A equipe de Agra et al. (2008) relatou que a infusão das folhas é usada contra doenças do fígado e o fruto é considerado tônico contra anemias. A folha, quando cozida, serve como antidiarreica ou antissifilítica (Corrêa, 1984) e, quando macerada, é empregada por algumas tribos nativas como antifebril (Delprete et al., 2005). O caule, embora apresente taninos, tem efeito predominantemente purgativo e, em decocto, é indicado para o tratamento de ferida escorbútica, úlcera venérea, faringite granulosa e anemia (Corrêa, 1984), além de ser usado em contusões e luxações (Matos, 1999).

Por causa do reconhecido uso popular da espécie e de alguns estudos químicos e farmacológicos demonstrando potencialidades terapêuticas, este trabalho objetivou analisar as características macroscópicas e microscópicas dos órgãos vegetativos aéreos para complemento e definição das estruturas de G. americana, para o controle de qualidade farmacognóstico.

MATERIAL E MÉTODOS

O material botânico foi coletado por Irineu Olinisky, no Centro Nacional de Pesquisas de Florestas (CNPF), da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que se localiza no município de Colombo-PR, nas coordenadas de 25º17'S e 40º13'W, a uma altitude de 950 m. Uma exsicata foi identificada por Wilson Marchio do Herbário Fernando Cardoso e registrada como HFC 3272.

Folhas adultas e fragmentos de caules jovens, coletados entre 5-25 cm do ápice caulinar, foram fixados em FAA 70 (Johansen, 1940) e preservados em álcool etílico a 70% (Berlyn & Miksche, 1976). Para o preparo de lâminas semipermanentes foram realizadas secções transversais e longitudinais, à mão livre. Empregaram-se os corantes azul de astra e fucsina básica (Roeser, 1972), além do azul de toluidina (O'Brien et al., 1964). As lâminas permanentes foram confeccionadas a partir do material fixado em FAA 70 e a desidratação foi realizada em série etanólica crescente (80 e 95% v/v). O material foi infiltrado em glicol-metacrilato a vácuo por quatro dias e emblocado (Kraus & Arduin, 1997). Deste material, obtiveram-se cortes finos provenientes do micrótomo de rotação Olympus CUT 4055 e corados com azul de toluidina.

Os reativos utilizados para os testes microquímicos foram: Sudan III para verificar cutina, óleo e gordura (Sass, 1951), lugol para amido (Berlyn & Miksche, 1976), cloreto férrico para compostos fenólicos (Johansen, 1940), floroglucina clorídrica para verificação de lignina (Foster, 1949) e ácido sulfúrico para cristais de cálcio (Oliveira & Akisue, 1987). Os resultados foram registrados por meio de fotomicrografias no microscópio óptico Olympus BX-40, acoplado à unidade de controle PM-20.

A análise ultraestrutural de superfície (microscopia eletrônica de varredura-MEV) foi realizada segundo Souza (2007). Amostras sofreram desidratação etanólica crescente (80, 90 e 100% v/v), sendo transferidas a cada 10 min. Essas amostras desidratadas foram colocadas no aparelho de ponto crítico de CO2 Bal-Tec CPD-030, metalizadas com ouro no aparelho Balzers SCD-030, observadas e fotografadas no microscópio eletrônico de varredura JEOL JSM-6360LV.

RESULTADOS

Folha

As folhas são simples, opostas, com pecíolos curtos de aproximadamente 0,3 cm de comprimento e estípulas interpeciolares. Geralmente, a lâmina é simétrica com formatos obovado, elíptico-obovado ou oblanceolado (Figuras 1a, 1b). O ápice é acuminado, a base aguda-cuneada e a margem lisa (Figura 1b). A textura é semicoriácea e a coloração verde escura, sendo a face adaxial brilhante e a abaxial aveludada (Figuras 1a, 1b). O tamanho médio das folhas é de 23 (18-28) cm x 8 (5-11) cm.


 






A nervação é pinada (Figura 1b) e subclassificada em camptódroma-broquidódroma, ou seja, com nervuras que se interconectam na margem em uma série de arcos proeminentes.

Em vista frontal, as células epidérmicas possuem contorno poligonal reto a levemente curvo, em ambas as faces (Figuras 1c, 1d, 1e) e são revestidas por uma cutícula pouco estriada em toda a sua extensão (Figuras 1c, 1f). Os estômatos, presentes na superfície abaxial, caracterizam a folha como hipoestomática (Figuras 1e, 1f). Estes apresentam crista cuticular externa nítida (Figura 1f) e duas células subsidiárias paralelas às células-guarda, sendo classificados como paracíticos ou rubiáceos (Figura 1e). Observam-se, na superfície abaxial, tricomas tectores eretos, unicelulares e pluricelulares, unisseriados, de ápice agudo e paredes espessadas (Figuras 2a, 2b).


 




Em secção transversal, a epiderme é uniestratificada, constituída de células ligeiramente menores na face abaxial (Figuras 2c, 2d) e, recobrindo o sistema de revestimento, encontra-se uma cutícula delgada. Os estômatos se inserem no mesmo nível das demais células epidérmicas (Figura 2c).

O mesofilo possui organização dorsiventral (Figuras 2c, 2d) e apresenta parênquima paliçádico, constituído de cerca de duas camadas, voltado para a face adaxial. Na superfície oposta, tem-se parênquima esponjoso multiestratificado, representando cerca de 70% da altura dos parênquimas fotossintetizantes. Distribuídos pelo mesofilo encontram-se feixes vasculares de pequeno porte, do tipo colateral, envoltos por uma bainha do feixe parenquimática.

A nervura central é plano-convexa, sendo proeminente na superfície abaxial (Figura 2e). Subjacente à epiderme unisseriada, encontram-se vários estratos de células colenquimáticas do tipo angular. Há um feixe vascular colateral, de grande porte e disposição cilíndrica, além de feixes menores na região central (Figuras 2e, 3a). Ocorrem algumas fibras externamente ao floema, sendo que neste reconhecem-se elementos crivados e células parenquimáticas. No xilema, os elementos traqueais estão alinhados e separados por células parenquimáticas lignificadas (Figuras 3a, 3b).


 




O pecíolo (Figura 3c) tem contorno circular, com duas pequenas alas laterais. Possui um feixe vascular colateral, de grande porte e em arranjo cilíndrico, alguns feixes menores na região central, bem como feixes acessórios na direção das projeções aliformes. Tanto no limbo como no pecíolo, principalmente no parênquima fundamental, há drusas de oxalato de cálcio e amiloplastos (Figura 3d). No floema do pecíolo, encontra-se areia cristalina.

Caule

Em secção transversal, o formato do caule é circular. Nos estágios iniciais de desenvolvimento secundário, a epiderme apresenta uma única camada de células em fase de destacamento e é recoberta por cutícula relativamente delgada (Figuras 4a, 4b). Nas camadas subepidérmicas, o felogênio se instala formando súber, com células comparativamente altas e paredes espessadas em direção à parte externa do caule, e feloderme para o lado oposto (Figura 4b).


 




No córtex, há alguns estratos de células colenquimáticas do tipo anelar e parênquima cortical multiestratificado com meatos (Figura 4a). Ao redor do sistema vascular, ocorrem fibras, que tendem a formar uma bainha esclerenquimática. A zona cambial é evidente. O cilindro floemático, externo ao de xilema, é constituído por células parenquimáticas e elementos crivados. O xilema é formado de elementos traqueais, fibras e células parenquimáticas lignificadas (Figuras 4c, 4d). Ambos os sistemas são percorridos por raios parenquimáticos estreitos, que são lignificados no xilema (Figura 4d). A medula é formada de células parenquimáticas relativamente grandes, com paredes levemente espessadas (Figura 4a).

No córtex, no sistema vascular e na região medular encontram-se numerosos amiloplastos e drusas de oxalato de cálcio. Tanto no floema como no xilema, há a presença de idioblastos contendo areia cristalina.

DISCUSSÃO

A morfologia foliar externa de Genipa americana L., Rubiaceae, descrita neste trabalho é concordante com o relato de Delprete et al. (2005) para a mesma espécie. Adicionalmente, mostra-se semelhante à de outros representantes da família, tais como G. infundibuliformis (Delprete et al., 2005) e Palicourea longepedunculata Gardner (Pereira et al., 2003). A nervação pinada verificada na espécie em estudo segue o padrão das Rubiaceae (Metcalfe & Chalk, 1950; Burger & Taylor, 1993; Judd et al., 2008) e a subclassificação do tipo broquidódromo também foi apontada para P. longepedunculata (Pereira et al., 2003).

Com relação aos aspectos anatômicos, G. americana apresenta caracteres de ocorrência comum para a família, tais como folha hipoestomática, estômatos paracíticos, tricomas tectores uni e pluricelulares, células epidérmicas com paredes anticlinais retas e mesofilo dorsiventral (Metcalfe & Chalk, 1950). Esses caracteres revelam-se de pouco valor taxonômico para a distinção de espécies, uma vez que estão presentes também em outros representantes da família, a saber, em Tocoyena bullata (Vell.) Mart. (Vieira, 1986-88), T. formosa (Cham. & Schltdl.) K. Schum. (Coelho et al., 2006) e Psychotria viridis Ruiz & Pav. (Quinteiro et al., 2006). Em discordância parcial, embora o contorno das células epidérmicas esteja sujeito a influências ambientais, paredes anticlinais sinuosas foram mencionadas em Psychotria carthagenensis Jacq. (Vitarelli, 2008) e na face abaxial de P. longepedunculata. Esta última espécie também apresentou epiderme papilosa e aerênquima na nervura central e no pecíolo (Pereira et al., 2003), aspectos não verificados em G. americana.

Outro caráter que responde diferentemente, dentro de certos limites, a variações ambientais diz respeito ao tipo de mesofilo e ao número de camadas dos parênquimas fotossintetizantes. Sant'Anna-Santos et al. (2006), avaliando a influência da chuva ácida sobre folhas de G. americana, relataram a presença de mesofilo dorsiventral, consistindo de um ou dois estratos de parênquima paliçádico, da mesma forma como foi descrito neste estudo.

A organização estrutural do pecíolo de G. americana é semelhante à de Gardenia spathulifolia Stapf & Hutch., particularmente quanto à ocorrência de feixes vasculares acessórios nas proximidades das alas e de um feixe maior em arranjo cilíndrico, contendo pequenos feixes "medulares", segundo descrição de Metcalfe e Chalk (1950). No entanto, difere de T. bullata (Vieira, 1986-88), P. viridis (Quinteiro et al., 2006), P. carthagenensis (Vitarelli, 2008), P. longepedunculata (Pereira et al., 2002) e dos vários representantes de Rondeletia analisados por Kocsis et al. (2004), uma vez que possuem feixe vascular em arco fechado no pecíolo. Em T. formosa (Coelho et al., 2006), espécie que apresenta pecíolo mais longo comparativamente a G. americana, somente o terço distal tem organização similar à observada na presente investigação.

A associação de fibras ao sistema vascular é um caráter mencionado para família (Metcalfe & Chalk, 1950), corroborando com o verificado neste estudo, assim como em T. bullata (Vieira, 1986-88) e P. carthagenensis (Vitarelli, 2008). Adicionalmente, essas duas espécies também apresentam feixe vascular em arranjo cilíndrico na nervura central.

Com referência ao caule, há poucos estudos na literatura relatando os caracteres anatômicos de espécies de Rubiaceae. Epiderme uniestratificada, instalação superficial do felogênio, fibras isoladas no periciclo e xilema contínuo apresentando elementos condutores na sua maioria solitários são mencionados para a família e para Genipa (Metcalfe & Chalk, 1950) e observados em G. americana. Todavia, a ocorrência de raios, com quatro ou mais células de largura percorrendo o xilema, também considerado um caráter comum no gênero, não foi verificada no nível caulinar analisado. De um modo geral, a organização do caule da espécie estudada tem correspondência com o diagrama ilustrativo de Rondeletia cordata Benth., elaborado por Metcalfe & Chalk (1950).

Em Genipa americana, verificou-se a presença de idioblastos contendo compostos fenólicos, que possivelmente são equivalentes às células taníferas relacionadas dentre as variadas estruturas secretoras presentes na família (Metcalfe & Chalk, 1950). Esse mesmo grupo de metabólitos secundários foi verificado em Rondeletia (Kocsis et al., 2004) e T. bullata (Vieira, 1986-88).

Na opinião de Metcalfe & Chalk (1950), o tipo de cristal possui importância diagnóstica para gêneros e espécies de Rubiaceae. Todas as espécies de Rondeletia estudadas por Kocsis et al. (2004) apresentaram exclusivamente areia cristalina, para T. formosa relataram-se apenas drusas (Coelho et al., 2006), enquanto que ráfides de oxalato de cálcio foram verificadas em P. longepedunculata (Pereira et al., 2003). Apesar de ráfides serem comuns para a família, segundo Lersten (1974), essas formações não foram confirmadas na espécie em análise. Houve o registro de areia cristalina simultaneamente a drusas de oxalato de cálcio para o gênero Genipa (Metcalfe & Chalk, 1950), em concordância com a constatação feita nesta investigação.

Com base nas informações deste estudo, G. americana apresentou caracteres morfoanatômicos compatíveis com Rubiaceae, tais como folhas simples, opostas e hipoestomáticas, estômatos paracíticos, tricomas tectores uni e pluricelulares, unisseriados, feixe vascular colateral em arranjo cilíndrico e feixes menores na nervura central e no pecíolo, além da presença de areia cristalina e drusas de oxalato de cálcio. Esses resultados são aplicáveis para o controle de qualidade farmacognóstico, entretanto, devem ser considerados em conjunto, porque se mostram de pouco valor diagnóstico específico, uma vez que ocorrem em diferentes representantes da família.

Laboratório de Farmacognosia, Departamento de Farmácia, Universidade Federal do Paraná, Av. Prof. Lothário Meissner, 632, 80210-170 Curitiba-PR, Brasil.

  • Agra MF, Silva KN, Basílio IJLD, Freitas PF, Barbosa-Filho JM 2008. Survey of medicinal plants used in the region Northeast of Brazil. Rev Bras Farmacogn 18: 472-508.
  • Berlyn GP, Miksche JP 1976. Botanical microtechnique and cytochemistry Ames: Iowa State University.
  • Burger W, Taylor CM 1993. Rubiaceae. Fieldiana Bot 33: 1-333.
  • Coelho VPM, Agra MF, Barbosa MRV 2006. Estudo farmacobotânico das folhas de Tocoyena formosa (Cham. & Schltdl.) K. Schum. (Rubiaceae). Rev Bras Farmacogn 16: 170-177.
  • Corrêa PM 1984. Dicionário das plantas úteis do Brasil e das exóticas cultivadas. Rio de Janeiro: IBDF.
  • Delprete PG, Smith LB, Klein RM 2004. Flora Ilustrada Catarinense: Rubiáceas. Itajaí: Herbário Barbosa Rodrigues.
  • Delprete PG, Smith LB, Klein RM 2005. Flora Ilustrada Catarinense: Rubiáceas. Itajaí: Herbário Barbosa Rodrigues.
  • Djerassi C, Gray JD, Kincl FA 1960. Naturally occurring oxygen heterocyclies: isolation and characterization of genipin. J Org Chem 25: 2174-2177.
  • Foster AS 1949. Practical plant anatomy. Princeton: D. Van Nostrand.
  • Guarnaccia R, Madyastha KM, Tegtmeyer E, Coscia CJ 1972. Geniposidic acid, an iridoid glucoside from Genipa americana. Tetrahedron Lett 50: 5125-5127.
  • Jensen SR 1983. Iridoids in Rothmannia globosa. Phytochemistry 22: 1761-1765.
  • Johansen DA 1940. Plant microtechnique. New York: McGraw-Hill.
  • Judd WS, Campbell CS, Kellogg EA, Stevens PF, Donoghue MJ 2008. Plant systematics. Sunderland: Sinauer.
  • Kocsis M, Darók J, Borhidi A 2004. Comparative leaf anatomy and morphology of some neotropical Rondeletia (Rubiaceae) species. Plant Syst Evol 248: 205-218.
  • Kraus JE, Arduin M 1997. Manual básico de métodos em morfologia vegetal. Rio de Janeiro: Edur.
  • Lersten NR 1974. Morphology and distribution of colleters and crystals in relation to the taxonomy and bacterial leaf nodule symbiosis of Psychotria (Rubiaceae). Amer J Bot 61: 973-981.
  • Matos FJA 1999. Plantas da medicina popular do nordeste. Fortaleza: UFC.
  • Metcalfe CR, Chalk L 1950. Anatomy of the dicotyledons: leaves, stem, and wood in relation to taxonomy with notes on economic uses. Oxford: Clarendon.
  • O'Brien TP, Feder N, McCully ME 1964. Polychromatic staining of plant cell walls by toluidine blue O. Protoplasma 59: 368-373.
  • Oliveira F, Akisue G 1987. Farmacobotânica. São Paulo: Atheneu.
  • Pereira ZV, Meira RMSA, Azevedo AA 2003. Morfoanatomia foliar de Palicourea longepedunculata Gardiner (Rubiaceae). Árvore 27: 759-767.
  • Quinteiro MMC, Teixeira DC, Moraes MG, Silva JG 2006. Anatomia foliar de Psychotria viridis Ruiz & Pav. (Rubiaceae). Rev Univ Rur 26: 30-41.
  • Revilla J 2001. Plantas da Amazônia. Manaus: Programa de desenvolvimento empresarial e tecnologia.
  • Roeser KR 1972. Die nadel der schwarzkiefer-massenprodukt und kunstwerk der natur. Mikrokosmos 61: 33-36.
  • Sant'Anna-Santos BF, Silva LC, Azevedo AA, Aguiar R 2006. Effects of simulated acid rain of leaf anatomy and micromorphology of Genipa americana L., Rubiaceae. Braz Arch Biol Techn 49: 313-321.
  • Sass JE 1951. Botanical microtechnique. Ames: Iowa State College.
  • Souza VC, Lorenzi H 2005. Botânica sistemática Nova Odessa: Instituto Plantarum.
  • Souza W 2007. Técnicas de microscopia eletrônica aplicadas às Ciências Biológicas. Rio de Janeiro: Sociedade brasileira de microscopia.
  • Vieira RC 1986-88. Tocoyena bullata (Vell.) Mart. (Rubiaceae). Anatomia foliar. Rodriguésia 40: 33-39.
  • Vitarelli NG 2008. Morfoanatomia foliar da reófita facultativa Psychotria carthagenensis Jacq. (Rubiaceae). Florianópolis, 76 p. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-graduação em Biologia Vegetal, Universidade Federal de Santa Catarina.
  • *
    E-mail:
    marciard@ufpr.br, Tel. + 55 41 3360 4064.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Out 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 2010
    Sociedade Brasileira de Farmacognosia Universidade Federal do Paraná, Laboratório de Farmacognosia, Rua Pref. Lothario Meissner, 632 - Jd. Botânico, 80210-170, Curitiba, PR, Brasil, Tel/FAX (41) 3360-4062 - Curitiba - PR - Brazil
    E-mail: revista@sbfgnosia.org.br