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Adolescência e institucionalização numa perspectiva de vinculação

Adolescence and institutionalization in attachment perspective

Resumos

O presente artigo procura problematizar as implicações da institucionalização de jovens em Portugal, dando relevância à qualidade das relações e laços afectivos na reorganização interna da esfera emocional. A vinculação é entendida enquanto processo contínuo, em que as relações com figuras afectivamente significativas permitem reestruturar bases seguras nos jovens. A institucionalização em casas de abrigo ou orfanatos é geradora de sentimentos de perda e abandono, podendo a integração ser ainda mais dificultada pela desconfiança e pelo medo do desconhecido. Sublinha-se o carácter transformador das relações afectivamente estáveis dentro e fora das instituições que poderão promover a adaptação psicossocial e a construção de representações mais favoráveis acerca de si e do mundo ao longo do ciclo vital.

institucionalização; vinculação; afectos; reorganização interna


The present paper aims to discuss the implications of the adolescent's institutionalization in Portugal, giving relevance to the quality of affective relations and bonds for the internal reorganization of the emotional sphere. Attachment is understood as a continuous process, where the relationships with significant emotional figures allow reorganization of secure bases in adolescents and young adults. The institutionalization in shelter houses or orphanages generates feelings of loss and abandonment in the adolescents, and the process of integration is accompanied by mistrust and the fear of the unknown. An emphasis is put on the reconstructive character of stable affective relations developed with members of the institutions and outer contexts, promoting psychosocial adaptation and the construction of more favourable representations of self and the world along the life cycle.

institutionalization; attachment; affects; internal reorganization


Adolescência e institucionalização numa perspectiva de vinculação1 1 Trabalho realizado no âmbito do projecto da FCT- PTDC/PSI/65416/2006

Adolescence and institutionalization in attachment perspective

Catarina Pinheiro Mota; Paula Mena Matos

Universidade do Porto, Porto, Portugal

RESUMO

O presente artigo procura problematizar as implicações da institucionalização de jovens em Portugal, dando relevância à qualidade das relações e laços afectivos na reorganização interna da esfera emocional. A vinculação é entendida enquanto processo contínuo, em que as relações com figuras afectivamente significativas permitem reestruturar bases seguras nos jovens. A institucionalização em casas de abrigo ou orfanatos é geradora de sentimentos de perda e abandono, podendo a integração ser ainda mais dificultada pela desconfiança e pelo medo do desconhecido. Sublinha-se o carácter transformador das relações afectivamente estáveis dentro e fora das instituições que poderão promover a adaptação psicossocial e a construção de representações mais favoráveis acerca de si e do mundo ao longo do ciclo vital.

Palavras-chave: institucionalização; vinculação; afectos; reorganização interna.

ABSTRACT

The present paper aims to discuss the implications of the adolescent's institutionalization in Portugal, giving relevance to the quality of affective relations and bonds for the internal reorganization of the emotional sphere. Attachment is understood as a continuous process, where the relationships with significant emotional figures allow reorganization of secure bases in adolescents and young adults. The institutionalization in shelter houses or orphanages generates feelings of loss and abandonment in the adolescents, and the process of integration is accompanied by mistrust and the fear of the unknown. An emphasis is put on the reconstructive character of stable affective relations developed with members of the institutions and outer contexts, promoting psychosocial adaptation and the construction of more favourable representations of self and the world along the life cycle.

Key words: institutionalization; attachment; affects; internal reorganization.

Introdução

A institucionalização constitui um tema que tem vindo a ser de certa forma negligenciado em Portugal, especialmente quando nos referimos ao domínio afectivo e emocional das crianças e jovens. Referimo-nos particularmente à institucionalização em casas de abrigo ou orfanatos, por falta de condições ou negligência dos cuidados parentais, representando em grande parte das vezes uma transição difícil e nem sempre aceite pelos jovens. Não é estranho, por isso, que para estes a instituição seja símbolo de um último recurso, quase como que aprisionados num local onde não escolheram estar. A chegada à instituição pode ser vivida como uma perda ou rejeição do seio familiar, que, por muito disfuncional que possa apresentar-se, traduz no mundo interno dos jovens um sentido de pertença. A natureza dos laços afectivos estabelecidos na relação com as figuras primordiais de vinculação torna-se fundamental no processo de significação da relação com o mundo. Quando esta relação primordial é insegura, assistimos a uma maior dificuldade na relação com o exterior. Apesar de tudo, numa perspectiva de reorganização dos laços de vinculação e de adaptação resiliente, percebemos que em alguns casos os jovens são capazes de manter ligações afectivamente duradouras com figuras significativas alternativas, ultrapassando as barreiras do risco.

Neste artigo começaremos por analisar, à luz da perspectiva da vinculação, a natureza dos laços emocionais que se desenvolvem na relação com as figuras afectivamente significativas, sejam elas da família ou externas a ela. De seguida, procuraremos abordar as implicações psicossociais da institucionalização nos jovens, enquadrando a noção de perda e os entraves à adaptação ao novo contexto. Por último, abordaremos a importância da qualidade das relações com figuras significativas na instituição ou fora dela enquanto factor protector e potencializador da adaptação psicossocial.

Natureza dos laços emocionais na perspectiva da vinculação

A natureza dos laços emocionais construídos desde os primeiros tempos de vida assume especial relevância ao longo do desenvolvimento psicológico da criança e jovem. Numa perspectiva da teoria evolucionista da vinculação, a criança está dotada desde cedo de um sistema capaz de diversificar os seus comportamentos com o fim de manter a proximidade da figura de vinculação e garantir a sobrevivência (Bowlby, 1969). Através dos estudos realizados por Mary Ainsworth, a noção de figura de vinculação torna-se sem dúvida um marco para o desenvolvimento da criança, enquanto futuro adolescente e adulto. A proximidade e a capacidade de acolher, dar e cuidar evidencia-se na forma da criança tolerar os momentos mais difíceis, que podem ir desde a mera separação física pontual até situações de doenças ou perdas de figuras importantes. Bowlby (1988) sugere que no ser humano as sinalizações por choro ou sorrisos, assim como a aproximação mediante estímulos tácteis ou verbais são exemplos dos comportamentos organizados em sistemas corrigidos por objectivos (goal-corrected systems), que permitem a manutenção desta proximidade e procura de protecção física e psicológica da criança.

À medida que a criança cresce, esse sistema assume contornos mais complexos e diversificados, influenciado por representações internas de si, dos outros e do mundo que a rodeia contribuindo para uma importante fonte de previsão dos comportamentos sociais.

Esse conjunto de representações ou modelos internos dinâmicos começa a ser formado nos primeiros meses de vida através de acontecimentos de vinculação relevantes e reflectem a história das interacções com as figuras cuidadoras. Não sendo estruturas estáticas, podem alterar-se de acordo com importantes transições de vida e designadamente mudanças na sensibilidade e disponibilidade das figuras de vinculação (Marrone, 1998; Waters & Cummings, 2000). Para além disso, caracterizam-se pela capacidade de transformação e de adaptação às características dos novos períodos de desenvolvimento e contextos ao longo do ciclo de vida (Bretherton, 1999).

Estudos empíricos realizados por Ainsworth (1977; Ainsworth, Blehar, Waters, & Wall, 1978) nos anos 50, levados a cabo em Uganda e Baltimore, evidenciam que crianças com padrões de vinculação segura, apesar de reagirem emocionalmente face à separação, são capazes de comportamentos de exploração do mundo exterior, respondendo positivamente aos estímulos das figuras de vinculação aquando do seu aparecimento. Logo, a possibilidade de exploração articula-se com a percepção de segurança interna por parte da criança, sabendo que a ausência da mãe não implica uma rejeição ou abandono e que face a estímulos ameaçadores a figura cuidadora estará predisposta para a acarinhar e proteger (Bowlby, 1980). A presença de figuras capazes de satisfazer as necessidades básicas da criança, onde se inclui o afecto, carinho, protecção e segurança, proporcionam o desenvolvimento de mecanismos de regulação emocional e um sentimento de competência pessoal na criança, reforçando uma representação positiva de si própria e das figuras de vinculação.

Por sua vez, o desenvolvimento de modelos internos negativos é descrito como gerador de uma vinculação ansiosa, evidenciando na criança comportamentos evitantes ou resistentes face à preocupação com a inacessibilidade e a não responsividade das figuras de vinculação (Holmes, 1993). A presença de vinculação não representa necessariamente qualidade da vinculação. Ainsworth refere nos seus estudos crianças que aquando da ausência materna desencadeiam diferentes comportamentos vinculativos, cujos padrões de vinculação determinam, à excepção dos seguros, uma vinculação com limitações sob o ponto de vista da qualidade relacional (Ainsworth, Blehar, Waters & Wall, 1978).

Entre as dimensões que contribuem para o desenvolvimento de uma vinculação na criança e jovem, encontram-se as histórias de vinculação dos pais e o modo com integraram ao longo do seu desenvolvimento experiências mais desfavoráveis. Uma meta-análise realizada com a Adult Attachment Interview (AAI) (George, Kaplan, & Main, 1985), uma entrevista que procura avaliar memórias autobiográficas relacionadas com a vinculação, prestando atenção ao modo como o sujeito processa e integra a informação disponível, revela, em 18 amostras, percentagens de concordância elevadas entre as classificações dos pais na entrevista e a organização comportamental da vinculação das crianças. Dessa forma, a representação da vinculação parental dos próprios pais assume-se como preditora da qualidade da vinculação dos filhos permitindo ter algum conhecimento acerca da relação com as crianças (Veríssimo, Monteiro, Vaughn, Santos, & Waters, 2005; Wolff & Ijzendoorn, 1997). A literatura aponta para o facto de que figuras parentais cujo desenvolvimento afectivo lhes permitiu criar uma vinculação segura estão mais capazes de potenciar o desenvolvimento de ligações afectivas duradouras num ambiente de harmonia e segurança (Feeney & Noller, 1996). A criação de bases seguras pressupõe que as figuras parentais respeitem e incentivem a criança à exploração de si própria e do meio, por forma a permitir o desenvolvimento emocional e a integração psicossocial.

A qualidade das relações precoces parece manifestar-se nas relações para além das figuras primárias. A natureza dos laços afectivos permite-nos prever o nível de segurança dos jovens, que segundo os estudos empíricos retratam um maior nível de auto-confiança, auto-estima e autonomia (Allen et al., 2003; Helsen, Vollebergh, & Meeus, 2000; Huntsinger & Luecken, 2004). Outros estudos indicam que a qualidade da vinculação aos pais e inclusive aos pares aparece como forte indicador da auto-estima e satisfação de vida, havendo importantes indícios de que estas relações serviriam para prever níveis de depressão, ansiedade e alienação (Armsden & Greenberg, 1987; Engels, Dekovic, & Meeus, 2002; Rice, Cunningham, & Young, 1997).

Apesar do microssistema familiar ser um espaço privilegiado para o desenvolvimento de processos de vinculação, torna-se inevitável que desde cedo a criança tenha que interagir com outros contextos. Existem outros sistemas relacionais e subsequentemente outras potenciais figuras de vinculação, como as educadoras, amas ou avós, muito embora o seu lugar na hierarquia de preferências da criança possa ser diversa (Matos, 2002). O contacto com outros meios traz à criança uma nova possibilidade de actualização e organização interna, pese embora a influência das experiências anteriores na infância. Não se trata de perceber se existe uma diversidade de figuras ou saber qual a mais importante, mas antes de que modo as diferentes experiências se articulam e contribuem para criar uma vinculação segura na criança (Matos & Costa, 1996).

Numa fase posterior, a interacção com o exterior toma ainda contornos mais específicos, nomeadamente com a entrada na escola e com a fase da adolescência existem figuras que podem ser de extrema relevância para o desenvolvimento de uma base segura. Simultaneamente, o jovem é confrontado com novas exigências e tarefas desenvolvimentais, que desafiam as suas capacidades de adaptação. Adolescentes com uma base segura são descritos como mais capazes de desenvolver relações de qualidade com figuras significativas ao longo do seu contexto desenvolvimental (Engels, Dekovic, & Meeus, 2002). A qualidade destas relações, por sua vez, potencia o aumento de competências pessoais e sociais que traduz uma percepção positiva dos adolescentes. Sillick e Schutte (2006) descrevem estudos com jovens adultos, que sugerem uma percepção de uma boa rede de suporte afectivo proporcionado pelas figuras parentais enquanto crianças e adolescentes se traduz em níveis elevados de satisfação pessoal, auto-estima e felicidade.

Risco, Vulnerabilidade e Resiliência

No seguimento da importância da qualidade das ligações primordiais geradas pelo adolescente cabe-nos realizar uma abordagem em torno de factores paralelos que podem estar inerentes ao desenvolvimento afectivo e psicossocial dos jovens. Dessa forma, as noções de risco, vulnerabilidade e resiliência permitem-nos tornar mais clara a exposição que pretendemos realizar face à vivência dos jovens no processo de institucionalização. Muito embora a institucionalização não represente em muitos casos uma transição negativa, percebe-se que as vivências pessoais, emocionais e sociais a que os adolescentes foram sendo expostos podem gerar vulnerabilidades que se agravam face a factores de risco. A possibilidade de uma adaptação positiva e de um crescimento "por dentro e por fora" vem ao encontro da noção de qualidade relacional, que referimos anteriormente e iremos ressaltar mais adiante no contexto exterior aos jovens, dando sentido ao processo resiliente.

Portanto, numa perspectiva ecológica, assumimos que os jovens estão ligados desde cedo a uma panóplia de experiências que se alargam no contínuo vivencial. Ao longo desse percurso, e tal como temos vindo a referir, o desenvolvimento de laços afectivos seguros traduz-se num importante marco para a vida emocional da criança e do adolescente. Ressaltamos, porém, que uma base segura não é sinónimo de invulnerabilidade, já que os jovens não estão imunes face aos acontecimentos de vida stressores (Cowen & Work, 1988). Contudo, os adolescentes que não se limitam a evitar resultados negativos do risco, mas que também demonstram uma adaptação mais adequada face às adversidades, desenvolvem um processo resiliente (Masten, 2001).

Originalmente o conceito de risco encontra-se associado a diversos domínios como a Medicina, Sociologia, Psicologia ou Economia, entre muitos outros. Contudo, em comum a estes domínios, a magnitude do risco é descrita como a probabilidade de um acontecimento negativo específico acontecer pela presença ou ausência de um determinado factor ou conjunto de factores (Coie et al., 1993)

Tradicionalmente o risco é concebido como um marcador ou factor preditor de acontecimentos indesejáveis num dado contexto, afectando o desenvolvimento considerado normal da criança ou jovem (Cowan, P., Cowan, C., & Schulz, 1996). No entanto, mesmo em populações consideradas de risco, existem alguns indivíduos mais susceptíveis do que outros a serem afectados, nomeadamente pela emergência pluridimensional de factores biológicos, características de personalidade, condições sócio-culturais, ou o próprio ambiente familiar. A presença/ausência ou a qualidade de cada um desses factores pode fazer com que a situação de risco se torne eminente (Marques-Teixeira, 2000).

Nesse sentido, os conceitos de vulnerabilidade e resiliência têm sido usados para explicar a variabilidade nos diferentes grupos, entre eles os jovens institucionalizados. A vulnerabilidade aumenta a probabilidade de um acontecimento específico negativo ou indesejável acontecer quando em presença de risco (Masten & Powell, 2003). Manifesta-se com maior acentuação quando o risco está presente, sem ele a vulnerabilidade perde efeito (Zimmerman & Arunkumar, 1994). Os agentes stressores representam factores de risco que interagem com a vulnerabilidade dos jovens, que se evidencia face a condições de fragilidade interpessoal e intrapessoal como a baixa auto-estima, insegurança e sentimentos de carência de suporte afectivo. A "pobreza" dos relacionamentos nos sistemas relacionais anteriores pode significar uma "desnutrição" para o desenvolvimento humano.

Sandler et al. (2003) sublinham que ambientes onde predominam dificuldades sócio-económicas e baixos recursos culturais, acrescidos de índices de criminalidade e desviância, associam-se tendencialmente a factores de risco, havendo maior vulnerabilidade face a dificuldades no investimento afectivo e relacional. Esse facto assume especial importância se pensarmos que, ao aumentar o risco de problemáticas associadas ao ambiente social e económico, evidencia-se uma maior instabilidade que se repercute na diminuição da qualidade das relações para além do aumento de conflitos e diminuição da disponibilidade pessoal das figuras cuidadoras (Emery & Forehand, 1996; Hetherington & Elmore, 2003).

No entanto, estudos empíricos revelam que adolescentes, quando inseridos em contextos de risco com elevados índices de desviância, conflitos parentais, assim como ausência de figuras cuidadoras primárias, podem desenvolver diferentes trajectórias de vida (Zimmerman & Arunkumar, 1994). Apesar da exposição a factores de risco, a relação de qualidade com figuras externas ao seio familiar parece ser relevante para alguns jovens que se tornam menos vulneráveis e conseguem traçar um percurso desenvolvimental adaptativo (Luthar & Goldstein, 2004). As relações extra-familiares, como a relação com professores ou com o grupo de pares, embora possam exercer uma menor influência face às relações com as figuras cuidadoras primárias, assumem um importante indicador de adaptação social e bem-estar dos jovens (Larose, Tarabulsy, & Cyrenne, 2005).

Note-se que não existe um conflito no que respeita à relação das figuras parentais e outras figuras significativas. Pelo contrário, parece haver uma complementaridade, já que as relações seguras com os pares proporcionam um desenvolvimento da qualidade das relações sociais e afectivas, existindo um permanente ensaio e aperfeiçoamento das relações e papéis futuros (Meeus, Oosterwegel, & Vollerbergh, 2002).

Por outra parte, Fergusson e Lynskey (1996), pretendendo avaliar a resiliência de adolescentes face a factores adversos do contexto familiar, verificaram que variáveis individuais (inteligência, auto-estima, auto-eficácia etc.) em associação com o estabelecimento de ligações de segurança parecem distinguir-se como factores protectores face ao risco. Nessa medida, torna-se impossível dissociar factores contextuais de factores individuais e relacionais.

Segundo a perspectiva de Luthar e Zigler (1991), os jovens podem ser resilientes face a um domínio, mas mostrar grandes dificuldades em outros domínios. Nesse sentido, a resiliência não deve ser entendida como uma característica pessoal exclusiva de alguns indivíduos (como factores de personalidade ou a inteligência), mas sim enquanto construto longitudinal que se traduz num processo que não deve ser separado do percurso desenvolvimental dos adolescentes (Luthar, Cicchetti, & Becker, 2000). Será assim mais correcto falar em processos resilientes que resultam da adaptação dos jovens a acontecimentos adversos tendo em conta factores individuais, relacionais e contextuais (Cyrulnik, 2001).

Só dessa forma podemos descrever jovens que atravessam situações de risco e possuem apesar de tudo estabilidade e recursos psicológicos, assim como capacidades interpessoais que os tornam capazes de responder de forma adaptativa às adversidades (Cowan, P., Cowan, C., & Schulz, 1996). A forma como o jovem lida com as dificuldades reporta-se ao âmbito experiencial e ao significado que retira dessas experiências. A significação desenvolve-se mediante a percepção das vivências, quer sejam positivas ou negativas, assim como da resposta que está capaz de dar. O jovem cria, dessa forma, configurações experienciais compostas de percepções relativas a si, às relações de si com o outro, com o meio e com a vida em geral, criando significados face às diversas apreensões realizadas durante as vivências (Rogers & Kinget, 1975).

Por outro lado, apesar dos factores de risco e de protecção desempenharem um papel relevante para a compreensão do desenvolvimento da vinculação, sabemos que trajectórias semelhantes podem originar diversos desfechos de vida (princípio da equifinalidade), assim como os mesmos desfechos podem provir de diferentes trajectórias (princípio da multifinalidade), pelo que não podemos à partida prever o desenvolvimento futuro dos jovens face aos acontecimentos de vida adversos atravessados.

De seguida tentaremos contextualizar o processo de institucionalização em casas de acolhimento em Portugal de forma a clarificar a sua dinâmica de funcionamento actual. Posteriormente serão abordadas, por um lado, a importância da transição do seio familiar para uma nova realidade que é a institucionalização, dando relevância à construção de relações e laços emocionais, assim como a sua influência no processo vinculativo futuro e, por outro lado, a natureza das relações criadas, a necessidade de terem um contexto igualmente acolhedor e apoiante, assim como a importância das figuras afectivamente significativas para os jovens que vivem desde sempre na instituição.

Uma revisão histórica em torno da Institucionalização em Portugal

Numa breve resenha histórica iremos contextualizar a questão da institucionalização em Portugal, tentando compreender a dinâmica de integração pessoal e social dos adolescentes nesse novo ambiente.

Nessa medida, os períodos específicos atribuídos ao desenvolvimento humano nem sempre foram bem delimitados, nomeadamente a infância. A antiga sociedade tradicional tinha dificuldade em conceber esta noção, pelo que a infância se reduzia a um período de maior fragilidade. Contudo, a partir do momento em que a criança se desenvolvia fisicamente garantindo a sua sobrevivência, ela era imiscuída no mundo dos adultos, quer no trabalho, quer no lazer, sendo a sua socialização controlada, não apenas pelo círculo privado da família, mas também, e especialmente, por sociabilidades alargadas, como a rua, sendo espaço privilegiado para transmitir valores e saberes à criança.

Todavia, face ao aparecimento de correntes religiosas, como o Cristianismo, uma mudança substancial foi levada a cabo. Muito embora a Igreja exercesse grande influência, os testemunhos de fenómenos de abandono de crianças recém-nascidas persistia devido a razões fundamentais de miséria em que vivia a maior parte da população, assim como pela instabilidade política (Fernández, 1996). Porém, nos finais da idade média, e sobretudo durante os séculos XVII e XVIII, devido a uma nova concepção social, filosófica e jurídica, surgem instituições religiosas com fim de recolha de crianças, tornando mais "legal" o abandono. Em Portugal, no ano de 1783, surge a primeira instituição que salvaguarda o anonimato e evita, à partida, a praga do infanticídio, através da "roda dos expostos"2 2 "A roda dos expostos" era uma espécie de cilindro de madeira semelhante a um armário giratório com uma grande cavidade que seria colocado junto à portaria dos conventos e onde eram depositadas as crianças; os religiosos encarregavam-se de encontrar amas que alimentassem e tomassem conta das crianças, mas o tempo que levavam a encontrar cuidadora e a falta de meios levavam a uma grande percentagem de mortalidade (Fernández, 1996). , oficializada por Pina Manique, fundador da Casa Pia de Lisboa (Amado, Ribeiro, Limão, & Pacheco, 2003). Assim, mães, pais, parentes ou tutores abandonavam crianças por diversas razões. A morte da mãe era um forte motivo, sobretudo porque muitas mulheres, naquela época, morriam no momento do parto. A doença da mãe ou da criança, falta de leite materno, subnutrição ou miséria absoluta dos pais. Algumas pesquisas ditam que o número de expostos ilegítimos era grande, isto porque crianças que nasciam de relações amorosas não abençoadas pela Igreja, para além de ilegítimas, eram considerados sacrilégios.

Em Portugal, originalmente o Estado começa a preocupar-se com as questões de menores desprotegidos e abandonados em 1911 formalizando a Lei da Infância e Juventude. Mediante uma evolução da perspectiva de protecção às crianças, em 1989 as Nações Unidas aprovam em Assembleia Geral a "Convenção dos Direitos da Criança". Esta convenção foi ratificada em Portugal em 1990. Em 1995 é iniciada a Reforma dos Direitos de Menores, tendo por base o disposto na Constituição da República Portuguesa, nas Convenções e Recomendações Internacionais, centrando a atenção na promoção da família, a responsabilização do Estado e da sociedade na protecção e promoção de direitos. Esse percurso culmina em 1999 na "Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo", tendo como objectivo "a promoção dos direitos e a protecção das crianças e dos jovens em perigo, por forma a garantir o seu bem estar e desenvolvimento integral" (Art. 1 da lei 147/99 de 1 de Setembro) (Alberto, 2004). Esta promoção dos direitos e a protecção justifica a intervenção quando se verifica que a criança ou jovem: está abandonada ou vive entregue a si própria; sofre maus tratos físicos ou psíquicos ou é vítima de abusos sexuais; não recebe os cuidados ou a afeição adequados à idade; é obrigada a actividades e trabalhos excessivos inadequados à sua idade, dignidade e situação pessoal ou prejudiciais à sua formação ou desenvolvimento; está sujeita de forma directa ou indirecta a comportamentos que afectem gravemente a segurança ou o seu equilíbrio emocional; ou assume comportamentos ou se entrega a actividades ou consumos que afectam gravemente a sanidade, sem que os pais possam ter qualquer controlo ou forma de os retirar dessa situação (Alberto, 2004). Nesses casos a lei dispõe de intervenções através das seguintes vias (Magalhães, 2004): (a) Entidades com Competência em Matéria de Infância e Juventude (ECMIJ), onde se incluem Instituições Particulares de Solidariedade Social, lares, Centros de Acolhimento, entre outros; (b) Comissões de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo (CPCJP) e (c) Tribunais.

Em regra, os jovens que são negligenciados acabam por ser encaminhados para esse tipo específico de instituições: casas de acolhimento temporário, lares de acolhimento de crianças e jovens ou entregues a famílias de acolhimento. A sua tutoria permanece ao cuidado da instituição ou do tribunal, podendo haver contactos mais ou menos frequentes com as figuras parentais e inclusive voltar para o seio familiar se forem tomadas medidas preventivas de apoio e supervisão familiar. A vivência em institucionalização, por sua vez, prevê a recriação de um ambiente familiar, com menos elementos, promovendo o apoio pessoal e a participação comunitária. Como iremos descrever mais adiante, alguns factores poderão no entanto interferir com os objectivos gerais, traduzindo certa fragilidade das instituições. A questão dos cuidadores e da forma como esses adolescentes são encarados dentro e fora da instituição aponta-se como uma razão forte que mais adiante irá ser discutida.

Perda e processo de adaptação na institucionalização

À luz de uma perspectiva de vinculação, o processo de institucionalização é acompanhado de sentimentos de perda, abandono e solidão, na medida em que implica o confronto com a realidade de negligência e insensibilidade parental. A perda traduz-se na noção de quebra nos laços afectivos que se avista temerosa por parte dos jovens (Strecht, 1998). No entanto, mesmo quando presenciamos cenários de maus tratos, ou negligência parental, seja ela de qualquer ordem, sentimos que, para os jovens, o estar inserido num seio familiar é de alguma forma um factor de organização interna e de protecção (Magalhães, 2004). Consideramos que conceber o modo como esses jovens encaram a "nova casa" é fundamental no seu percurso desenvolvimental psíquico e emocional.

A sensação de pertença atenua a desorientação que a falta de confiança cria. A experiência clínica mostra-nos que adolescentes com uma base insegura têm maior tendência à procura de apoio e protecção, mesmo que essa procura seja feita de forma paradoxal como é o cometimento de delitos ou o mau comportamento na tentativa de apelar à atenção. Nestes casos, facilmente percebemos que os jovens sentem a solidão psicológica que o abandono parental lhes confere, revertendo o seu sofrimento no comportamento. Dell'Aglio, Santos e Borges (2004) suportam esta ideia num estudo realizado com 50 adolescentes do género feminino, autoras de actos infraccionais, observando a ocorrência de repetidas rupturas nas relações com os cuidadores, para além de violência intra e extrafamiliar. A falta de estabilidade e a fragilidade dos vínculos estabelecidos durante o desenvolvimento estariam, de acordo com esses autores, associados à manifestação de comportamentos desadaptativos, não exercendo a sua função protectiva, mas pelo contrário podendo ser entendidos como facilitadores da entrada na vida infraccional. Da mesma forma, Hukkanen, Sourander, Bergroth e Piha (1999) apresentam um estudo com jovens institucionalizados em que fazem referência aos factores de risco inerentes ao desenvolvimento psicossocial dos jovens, pelo que as dificuldades encontradas nas experiências anteriores no seio familiar, nomeadamente um acumular de experiências de separação e eventos traumatizantes como os maus tratos ou negligência, estariam significativamente associados com os distúrbios emocionais e comportamentais, tratando-se de jovens mais vulneráveis.

Jovens com uma vinculação insegura procuram, em grande parte das vezes, conforto na sensação de realização própria, autoridade sobre si e liberdade para decidir. A procura de independência e autonomia radical revela na verdade seres inseguros e frágeis, incapazes de superar as barreiras de forma adaptativa. Estudos empíricos realizados com jovens cuja vinculação foi classificada como desorganizada na Situação Estranha indicam mais tarde um risco acrescido de desenvolver dificuldades a nível comportamental, incluindo internalização e externalização de comportamentos com figuras externas ao seio familiar (Carlson, 1998).

Uma vinculação insegura obriga os jovens a procurarem alternativas de sobrevivência; a criação de "barreiras" afectivas em seu redor é uma estratégia frequente. Falamos de "barreiras" como mecanismos de defesa para evitar o sofrimento. Sentimos que se torna mais simples para o jovem refugiar-se no silêncio, indiferença e afastamento, em contrapartida da abertura e entrega de si mesmo enquanto ser emocionalmente vivo, pese às consequências que os sentimentos de rejeição e insegurança lhe podem conferir, caso não se sinta incondicionalmente aceite. Dell'Aglio e Hutz (2004) apresentam um estudo com 215 jovens institucionalizados sublinhando as diferenças nas variáveis de depressão e desempenho escolar comparativamente com jovens não institucionalizados. Os resultados apontaram para uma maior incidência de indicadores depressivos em jovens do género feminino em institucionalização; por outra parte, os jovens institucionalizados em geral apresentavam uma média mais baixa no desempenho escolar. Esses resultados indicaram a necessidade de estratégias e atendimento específico para as necessidades dos jovens institucionalizados no intuito de melhorar o desempenho escolar e prevenir a depressão entre as raparigas.

Nesta medida, os jovens institucionalizados experienciam reacções que podem ser interpretadas como sinais de stress, junto com mecanismos de defesa, estando susceptíveis a sofrer perturbações desenvolvimentais se a institucionalização se prolongar. O isolamento tendencialmente gera ansiedade e outros sentimentos de dor, incluindo raiva e depressão. A privação completa de cuidados primários e apoio afectivo pode ter um efeito permanente no desenvolvimento da personalidade e na capacidade de formar, suster e desfrutar das relações (Marrone, 1998).

Posto isso, a sensação de que não existem regras torna-se abismal em alguns casos, se pensarmos que a percepção de inexistência de limites pode criar um forte sentimento de desorientação e medo do desconhecido (Branco, 2000). Nestes casos, como não existe a vantagem de sentir o apoio das figuras primárias de afecto, os jovens acabam por desenvolver estratégias de sobrevivência que nada têm a ver com a adaptação. A adaptação é descrita como o esforço para atingir um novo equilíbrio interno e bem-estar psicológico face à situação de crise (MacCubbin, H., MacCubbin, M., Thompson, A., & Thompson, E., 1998).

Assim, apesar da fantasia de omnipotência e autonomia, existe necessidade de conceber os pais como figuras presentes e cuidadoras, por isso permanece o desejo de ser querido e acolhido pelas figuras parentais. Não é estranho pois constatar que muitos jovens fogem das instituições e voltam para casa, mesmo sabendo que todo o ciclo de maus tratos e negligência pode restabelecer-se (Magalhães, 2004).

Torna-se assim premente a necessidade dos jovens estabelecerem e sentirem laços afectivos com figuras significativas, por forma a diminuir a vulnerabilidade face ao risco das situações que atravessam. É de extrema relevância que os adultos que recebem esses jovens estejam capazes de acolher toda a revolta e raiva que é exteriorizada, devolvendo-lhes um meio estável de confiança, privilegiando o estabelecimento de ligações afectivas seguras. A segurança interna que estas figuras securizantes traduzem funciona em certa medida como factor protector, o que permite que esses jovens sejam mais capazes de enfrentar as adversidades de forma adaptativa, potencializando por isso o processo resiliente (Matos, 2003).

Mas estarão os adultos das instituições de acolhimento capazes de lidar com a carga emocional provinda da resistência dos jovens e das dificuldades que atravessam? A resposta parece determinar uma importante função na trajectória desenvolvimental desses jovens. Certamente que para lidar com tantas exigências emocionais, e segundo a perspectiva da vinculação, o adulto necessita de modelos internos de si próprio e dos outros estáveis e seguros. Por outro lado, importa criar estruturas de acompanhamento neste processo de institucionalização. Perguntamo-nos se por ventura alguém explica às crianças ou jovens para onde vão e por que vão para a instituição? Será que existe uma comissão de apoio para essas crianças e jovens se sentirem acolhidos e integrados?

O processo de luto poderia, assim, ser elaborado de forma mais adaptativa em instituições adequadas para conferir um acompanhamento a nível afectivo e interpessoal, criando elos vinculativos que proporcionem uma base segura ao jovem.

As perspectivas futuras, muitas vezes, estreitam-se dado que as oportunidades de adaptação são escassas. Referimo-nos, tal como aponta Juliano (2005), não só à dificuldade da parte do jovem em criar laços de vinculação seguros e contínuos, mas também à falta de expectativas e oportunidades criadas pelo contexto institucional, escolar e mesmo social; pela fragilidade dos recursos humanos, tanto na quantidade como na qualificação e ainda na ausência de objectivos comuns e dificuldades de interacção e comunicação entre as entidades que trabalham com adolescentes em risco pessoal e social. Por isso é fundamental não encarar esses jovens como delinquentes em menor escala cujo futuro estará à partida condicionado, mas sim como crianças ou jovens que foram arrastados no seio de meios adversos, mas que a todo momento podem desenvolver uma trajectória semelhante a qualquer jovem que viva numa família estruturada, sempre que seja ajudado a integrar as experiências desfavoráveis vividas no seio familiar. Certamente que se torna complexo para o jovem atingir um estado de segurança quando as suas raízes vinculativas assim não o permitiram. Contudo, na medida em que o processo vinculativo é contínuo e mutável, o jovem pode sofrer uma reorganização do seu mundo interno (Goldberg, Muir, & Herr, 2000).

O sentimento do investimento de figuras afectivamente presentes cria uma segurança emocional que potencia a capacidade adaptativa do jovem, mais confiante e capaz de desenvolver estratégias de coping. Só assim podemos enquadrar o processo de resiliência face ao risco.

Aparentemente, a situação de institucionalização, pela conotação de ruptura e perda, poderia ser concebida como uma situação de risco que muito provavelmente faria com que o jovem cedesse perante a sua vulnerabilidade interna. No entanto, a possibilidade do jovem vir a estabelecer ligações afectivamente seguras dentro ou fora da instituição permite que, por um lado, a organização emocional e afectiva se complexifique, evitando a permanência de estados de vulnerabilidade e, por outro lado, que o estado de maior consistência interna e segurança nas relações represente um factor protector face ao risco. Autores como Yunes, Miranda e Cuello (2004) sublinham esta ideia apontando os benefícios dos "factores de protecção" da institucionalização, dado que as influências das relações podem melhorar ou alterar as respostas pessoais a determinados riscos de desadaptação, provocando modificações catalíticas que alteram o curso de vida dos jovens. Em alguns casos, a instituição representa para as crianças e jovens o ambiente imediato de maior impacto nas suas vidas, um microssistema carregado de um elevado número de actividades, papéis e interacções simbólicas.

Nesta sequência levantamos algumas questões: Será que estes jovens esperam algum dia vir a ser aceites? Estarão disponíveis para que alguém estabeleça uma ligação afectiva consigo? Estarão indefinidamente condenados a ser rejeitados? Existe alguém capaz de facilitar a reorganização da vinculação nestes jovens?

Figuras significativas e trajectórias desenvolvimentais

Este ponto vem culminar todas as questões que foram levantadas ao longo desta análise em torno da institucionalização em Portugal. Temos vindo a apontar como fonte de segurança e crescimento pessoal a qualidade das relações que as crianças e os jovens desenvolvem no seu seio familiar. Contudo, constatamos que essa realidade nem sempre se constata nos adolescentes portugueses, que vivem uma vinculação insegura pela falta de cuidados ou ausência de cuidadores efectivos. Nessa medida, e assumindo a continuidade de uma perspectiva ecológica, sentimos que o desenvolvimento desses jovens pode ser pautado pela vivência com outras figuras significativas que podem dar respostas pessoais, afectivas e sociais potenciando o seu desenvolvimento adaptativo. De entre estas figuras, apontamos a relação com os professores, os funcionários da escola, os pares e em especial os funcionários da instituição onde vivem (onde se incluem auxiliares, cuidadores, monitores e técnicos).

Nessa medida, a literatura evidencia que o relacionamento professor-aluno é muitas vezes visto como um prolongamento das relações parentais (Davis, 2003). No caso dos jovens institucionalizados, essa realidade pode tomar uma importância crescente, dado que o professor se torna uma figura mais activa e fundamental no processo de regulação emocional e de integração psicossocial, promovendo as competências dos jovens e permitindo, ao mesmo tempo, a expressão das emoções experienciadas. Do mesmo modo, estudos empíricos têm vindo a revelar que a percepção dos jovens de que os professores estão dispostos a cuidar de si é extremamente positiva no alcance das metas traçadas, sejam elas a nível académico, social ou emocional (Wentzel, 2002).

Dessa forma, sabemos que a relação com as figuras que rodeiam os jovens institucionalizados é indispensável, a relação com o professor é um exemplo disso, já que os jovens permanecem na escola grande parte do seu tempo. A desmistificação de preconceitos criados em torno desses jovens passa muitas vezes pelo trabalho do professor. Quando existe disponibilidade e capacidade de escuta por parte do professor, os jovens sentem-se mais seguros, ficando receptivos a uma possível ligação futura. Trata-se de apelar aos sentimentos do jovem numa atitude empática e incondicionalmente aceitante, realizando "um trabalho de ensino por dentro e por fora" (Amado, Ribeiro, Limão, & Pacheco, 2003). A identificação afectiva com essas figuras é relevante para a contribuição da escolha das trajectórias de vida.

Essa questão pode igualmente transpor-se para qualquer que seja a figura significativa. O grupo de pares representa para o jovem uma importante fonte de apoio e compreensão, no entanto estas relações mostram-se demasiado lábeis, apesar de relevantes para o desenvolvimento psicoafectivo e social, geralmente são de pouca durabilidade e consistência, próprias de uma fase de experimentação e estruturação interna. Por isso, tal como o par amoroso, nesta fase não consideramos que se tratem de ligações que possam satisfazer os níveis de segurança necessários a vinculações seguras, embora sejam considerados marcos relevantes na construção emocional do jovem.

De ressaltar que as ligações de proximidade e afecto podem inclusive ser proporcionada pelos funcionários da instituição onde o jovem vive. As relações estabelecidas nesse contexto podem alcançar a satisfação em muitas das dimensões vinculativas necessárias, conferindo ao jovem uma maior sensação de confiança. Tal como a relação com o professor, a relação com os adultos dentro da própria instituição pode fomentar o ser aceite, neste caso de "estar em casa", reforçando o sentimento de pertença e desenvolvendo o processo resiliente do jovem.

Particularmente, a relação criada com os funcionários das instituições desempenha um papel central na vida destas crianças e adolescentes, já que esses adultos assumem verdadeiros papéis no sentido de os orientar, proteger e acarinhar, constituindo inclusive os seus modelos identificatórios. Mais recentemente e contrariando as falsas crenças em torno da institucionalização, percebe-se assim que a qualidade das instituições tem vindo a replicar, embora não substitua, os sistemas familiares, potenciando uma intervenção mais personalizada, na tentativa de se assemelhar ao sistema familiar. Zegers, Schuengel, Ijzendoorn e Janssens (2006) expõem um estudo que descreve os efeitos das representações de vinculação dos adolescentes e dos seus cuidadores na instituição. Em 81 adolescentes e 31 cuidadores, constatou-se que as representações de vinculação estavam fortemente correlacionadas com o aumento da confiança com os mentores e uma diminuição do evitamento com os funcionários da instituição (staff). Ao mesmo tempo, os autores constataram que as representações de vinculação dos mentores eram preditoras das mudanças na percepção dos adolescentes.

Mais recentemente Hawkins-Rodgers (2007) apresenta um programa de reorganização do comportamento vinculativo e da construção do processo resiliente em adolescentes institucionalizados tendo como base a intervenção realizada pelos mentores e funcionários das instituições (staff). A construção da resiliência e o desenvolvimento de competências sociais proporcionavam aos adolescentes a possibilidade de conduzir relações de longo termo, denotando e experienciando respostas empáticas face às situações traumáticas, para além de aprender estratégias de coping. Os cuidadores representavam figuras que trabalham na reorganização interna das vias de vinculação dos jovens, moderando os comportamentos e proporcionando o que a autora designa de "intervenções de ensino terapêutico". Este tipo de intervenções centravam-se na transmissão de níveis consistentes de segurança para explorar novos comportamentos de vinculação no sentido de promover maior resiliência. A relação com o Staff representaria portanto um esforço contínuo no sentido de uma positiva e substantiva mudança na vida dos adolescentes com vista a um maior ajustamento.

Ainda nesta perspectiva, Simsek, Erol, Öztop e Munir (2007), num estudo conduzido com 461 adolescentes, sugerem que o contacto regular e o envolvimento afectivo com as figuras parentais, os professores e os funcionários da instituição determinavam uma percepção de maior suporte social, potenciando o desenvolvimento de factores de protecção face aos problemas emocionais e comportamentais. Arpini (2003) destaca, por fim, estudos com adolescentes institucionalizados cujos relatos de vivência institucional descrevem o melhor período das suas vidas, sendo um meio privilegiado para o estabelecimento de laços afectivos que se mantiveram ao deixar a instituição.

O desenvolvimento desses trabalhos vem ao encontro do objectivo geral desta análise, permitindo perceber as implicações das relações na instituição e a possibilidade de aperfeiçoar as condições de intervenção nos jovens que experienciam situações de privação contínua. A identificação dos factores de risco e factores protectores possibilita o trabalho dos adultos implicados na educação desses jovens promovendo o seu desenvolvimento emocional e comportamental, eliminando o estigma e a discriminação que frequentemente circunda esse contexto.

Notas

Recebido: 23/10/2007

Revisão: 14/03/2008

Aceite final: 05/09/2008

Catarina Pinheiro Mota é Licenciada em Psicologia Clínica, doutora em Psicologia e Investigadora na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto. Endereço para correspondência: Rua de Santo António 215. 2º Esq. 5400-069. Chaves, Portugal. Telf. 00351 276324496 / Telm. 00351 919130950 Email: catarinap.mota@gmail.com

Paula Mena Matos é Professora Auxiliar da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto. Endereço para correspondência: Rua do Dr. Manuel Pereira da Silva, 4200-392. Porto, Portugal. Email: pmmatos@fpce.up.pt

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  • 1
    Trabalho realizado no âmbito do projecto da FCT- PTDC/PSI/65416/2006
  • 2
    "A roda dos expostos" era uma espécie de cilindro de madeira semelhante a um armário giratório com uma grande cavidade que seria colocado junto à portaria dos conventos e onde eram depositadas as crianças; os religiosos encarregavam-se de encontrar amas que alimentassem e tomassem conta das crianças, mas o tempo que levavam a encontrar cuidadora e a falta de meios levavam a uma grande percentagem de mortalidade (Fernández, 1996).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Fev 2009
    • Data do Fascículo
      Dez 2008

    Histórico

    • Aceito
      05 Set 2008
    • Revisado
      14 Mar 2008
    • Recebido
      23 Out 2007
    Associação Brasileira de Psicologia Social Programa de Pós-graduação em Psicologia, Universidade Federal de Pernambuco, Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH), Av. da Arquitetura S/N - 7º Andar - Cidade Universitária, Recife - PE - CEP: 50740-550 - Belo Horizonte - MG - Brazil
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