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O conceito de liberdade na dialética negativa de Theodor Adorno

The concept of freedom in Theodor Adorno's negative dialectic

Resumos

Este artigo, de natureza teórica, discute algumas ideias de Theodor Adorno, da Teoria Crítica da Sociedade, vinculada à Escola de Frankfurt, acerca do que é liberdade. Esta discussão pretende oferecer subsídios para a psicologia social, já que o tema tem sido pouco debatido. Como procedimento desta pesquisa teórica, selecionou-se a obra Dialética negativa, de Theodor Adorno, por ela apresentar mais profundamente a problematização dessa temática. Adorno indica o quanto pode ser maléfica a delimitação da liberdade a partir de critérios individuais, metafísicos, materiais, ontológicos ou empíricos. Para ele, a liberdade é vivida pelo indivíduo, mas possui uma conexão estreita com a humanidade, uma vez que passa pela ética, pelo particular e pelo universal. Afinal, a liberdade é o princípio que deveria nortear as ações morais.

liberdade; dialética negativa; teoria crítica da sociedade


This theoretical article discusses some ideas of Theodor Adorno about freedom, as part of the Critical Theory of Society, developed by the Frankfurt School. This discussion aims to provide some tools to social psychology, since this theme has not been frequently discussed. In order to carry out this theoretical research, Adorno's major work, Negative Dialectics, was selected inasmuch as it approaches this issue more profoundly. Adorno points out the maleficence of freedom restraint due to individual, metaphysical, material, ontological, or empirical criteria. For him, although freedom is experienced by the individual, it possesses a close connection with mankind, since it is related to ethical, private, and universal matters. After all, freedom is the principle that should guide moral actions.

freedom; negative dialectics; critical theory of society


O conceito de liberdade na dialética negativa de Theodor Adorno

The concept of freedom in Theodor Adorno's negative dialectic

Juliana de Castro Chaves

Universidade Federal de Goiás, Goiânia, Brasil

RESUMO

Este artigo, de natureza teórica, discute algumas ideias de Theodor Adorno, da Teoria Crítica da Sociedade, vinculada à Escola de Frankfurt, acerca do que é liberdade. Esta discussão pretende oferecer subsídios para a psicologia social, já que o tema tem sido pouco debatido. Como procedimento desta pesquisa teórica, selecionou-se a obra Dialética negativa, de Theodor Adorno, por ela apresentar mais profundamente a problematização dessa temática. Adorno indica o quanto pode ser maléfica a delimitação da liberdade a partir de critérios individuais, metafísicos, materiais, ontológicos ou empíricos. Para ele, a liberdade é vivida pelo indivíduo, mas possui uma conexão estreita com a humanidade, uma vez que passa pela ética, pelo particular e pelo universal. Afinal, a liberdade é o princípio que deveria nortear as ações morais.

Palavras-chave: liberdade; dialética negativa; teoria crítica da sociedade.

ABSTRACT

This theoretical article discusses some ideas of Theodor Adorno about freedom, as part of the Critical Theory of Society, developed by the Frankfurt School. This discussion aims to provide some tools to social psychology, since this theme has not been frequently discussed. In order to carry out this theoretical research, Adorno's major work, Negative Dialectics, was selected inasmuch as it approaches this issue more profoundly. Adorno points out the maleficence of freedom restraint due to individual, metaphysical, material, ontological, or empirical criteria. For him, although freedom is experienced by the individual, it possesses a close connection with mankind, since it is related to ethical, private, and universal matters. After all, freedom is the principle that should guide moral actions.

Keywords: freedom; negative dialectics; critical theory of society.

Estratégias que limitam a problematização da liberdade

A liberdade positiva é um conceito aporético

pensado para conservar a ansiedade do espiritual

frente ao nominalismo e ao cientificismo

(Theodor Adorno)

Segundo Adorno (1984), é importante realizar a problematização sobre a liberdade, mesmo que seja difícil conseguir desse questionamento, sem a cumplicidade acerca de seu significado, a almejada resposta clara. Pode-se afirmar que, por mais que a indagação sobre a existência da liberdade seja difícil de ser respondida, ela não deve deixar de ser feita e nem sua resposta deve se basear em critérios imediatistas ou desejos legítimos, pois a urgência de pensá-la não pode nos inclinar a uma resposta forjada ou forçada, quando não há nenhuma verdadeira a obter.

A reflexão sobre esse tema não passa pelo julgamento de algo que existe ou não, mas pela incorporação em sua própria definição tanto da impossibilidade de capturá-lo como da necessidade de pensá-lo. Não basta apenas falar da importância da liberdade, é fundamental questionar quais as condições oferecidas para a sua concretização. Não se trata de reduzir à subjetividade a esfera da sociedade, mas de articular o pensamento sobre a liberdade às condições concretas de existência, à dinâmica da socialização e à formação dos indivíduos.

Na discussão sobre essa temática, Adorno (1984) dialoga com Kant, Hegel, Marx, Nietzsche e Freud, dentre outros, e nos alerta para a limitação da formulação da liberdade, tanto do conhecimento científico como da filosofia. Para ele, as ciências, por seguirem determinados métodos e regras que delimitam o que é digno de atenção, priorizam os meios sobre os fins, se concentram predominantemente em leis e em formas comprovadas de experiência e descartam, sob a justificativa de apresentar um caráter leigo ou pré-científico, qualquer dado que se distancie ou confronte os padrões pré-existentes. Ao primar pela regulamentação universal, o pensamento científico exterioriza a violência em forma de procedimento, priva o indivíduo da reflexão e, desse modo, termina sendo, até sem querer, aliado do determinismo e, por isso, parceiro da dominação. A Psicologia, por exemplo, ao se apropriar da Filosofia, transforma muitas afirmações filosóficas sobre o livre arbítrio em declamações e obrigações, fazendo com que a posição frente ao dilema liberdade-determinismo termine sendo realizada de maneira arbitrária e irracional, por oscilar entre observações isoladas mais ou menos empíricas e generalidades dogmáticas.

A Filosofia, por sua vez, também é incapaz de auxiliar a discussão sobre a liberdade, pois se coloca em abstrata oposição ao cientificismo. Adorno (1984) critica a grande filosofia do século XVII, que fundamenta a liberdade se dirigindo contra a antiga opressão, por ela trazer uma racionalidade que se distancia da empiria e apresentar uma falta de clareza e de precisão, ou seja, uma vagueza do tema liberdade, que fomenta uma nova dominação. Para a filosofia idealista, tudo o que é deve ser fundamentalmente pensamento, e pensamento do absoluto; portanto, tudo o que é deve ser livre.

Segundo Adorno (1984), essa ideia não propicia a liberdade, pois exerce coibição para o pensado e para o pensante. Ao ter a intenção de apaziguar a consciência sobre o fato de que os pensamentos não têm nada de livre e que geralmente se acomodam às constelações do poder, esse raciocínio não realiza a compreensão dos homens de carne e osso, o que termina perpetuando as condições perversas, pois não são analisadas as determinações objetivas que impedem a liberdade, atribuindo ao indivíduo isolado a total responsabilidade pela não-liberdade. Vista por esse prisma, a liberdade perde mais ainda a sua força e se distancia de sua compreensão genuína.

O imperativo de buscar o fortalecimento dentro de cada um delega exclusivamente ao indivíduo transcendental, que é desenhado por formas fixas atemporais, a capacidade de sobrepor-se a questões objetivas, ocultando a falta de liberdade e atribuindo ao indivíduo uma solidão absoluta (Adorno, 1984). Essa vertente garante a liberdade inerente aos indivíduos para pedir contas ao empírico particular, sendo os males atribuídos à sociedade: "a pura concepção de homem meramente buscada em sua própria racionalidade desnuda de todo conteúdo empírico obstrui o juízo racional sobre a causa de seu êxito ou fracasso" 1 1 Todas as citações literais do livro Dialética negativa (Adorno, 1984) foram traduzidas do original em espanhol pela própria autora, pois no processo de elaboração deste artigo o livro Dialética Negativa ainda não tinha sido traduzido no Brasil. No entanto, como no processo de publicação houve a tradução da editora Zahar, também foram incluídas as citações referentes à publicação de 2009 em respeito ao tradutor. ,2 2 "O puro ser-em-si do homem, privado de todo conteúdo empírico, um ser-em-si que não é procurado senão em sua própria racionalidade, não admite nenhum juízo racional sobre por que ele tem sucesso aqui e fracassa lá" (Adorno, 2009, p. 244). (Adorno, 1984, p. 292). Isso faz com que o indivíduo se distancie da sociedade e, consequentemente, seja menos capaz de entendê-la e transformá-la. A certeza de que a individualidade é prejudicada quando cada um se deixa afetar pela realidade que o cerca sugere que quanto mais são ampliadas as condições adversas à liberdade, mais cresce a tendência de o homem buscar consolo no interior de sua alma.

A personalização, que consiste na atribuição de importância desmedida a pessoas individuais e a relações privadas contra o efetivamente determinante (Adorno, 1993), gera a tendência da valorização do prefixo "auto" como saída para a crise pessoal e social. Esse modelo de liberdade imprime inicialmente a dominação pessoal e, depois de interiorizada, a dominação sobre todo o conteúdo concreto, mantendo o absolutismo da dominação. Além disso, ele faz apologia ao individualismo, reforçando o sofrimento, pois quem sofre, além de sofrer sozinho, sente-se mais culpado por não conseguir reagir.

Apesar da aparência de controle absoluto do sujeito, a busca da liberdade interior é sintoma da mais profunda fraqueza humana, da vontade covarde dos que têm medo de enfrentar o mundo real e de analisar a própria subjetividade. Essa liberdade formal3 3 De acordo com Adorno (1984), o limite da liberdade do eu isolado encontra-se representado na ontologia existencial e mesmo que essa vertente emancipe a pessoa, essa dignidade não existe. Isso acontece porque tanto o conceito de pessoa e de suas variantes como a relação eu-tu são cobrados como uma teologia em que já não se crê. Quando Heidegger, em seu manifesto do personalismo O ser e o tempo, interpreta a subjetividade como modelo do ser pré-ordenado, o personalismo já se converte em seu contrário, pois o indivíduo já é diminuído em expressões impessoais como Dasein e existência. Nessa obra, segundo Adorno, o contorno abstrato da pessoa, a consciência individual, se encontra atrelada a uma objetividade transubjetiva que, segundo a doutrina idealista e ontológica, se funda no puro sujeito que não existe nas condições concretas. Tentando ir contra o impessoal, o projeto da autenticidade se transfigura em metafísica da ideia de um Eu forte e fechado em si mesmo. No entanto, o conceito de homem pressupõe a objetivação do sujeito e também a sua decadência. Assim, a constituição do indivíduo não é antecipada. revelase frágil. Basta observar que as escolhas reais não são tomadas pelo puro e metafísico eu penso, mas pelo sujeito empírico. A neurose é exemplo de que a liberdade interior pode ser desbancada em seu próprio reino. A neurose obsessiva se impõe no campo da própria imanência do sujeito como uma atuação que se experimenta como estranha ao Eu, mostrando a destruição da cômoda imagem: livre por dentro, submetido por fora.

O nominalismo também é uma estratégia que sustenta a concepção de liberdade abstrata. Ao eliminar as contradições, o nominalismo desenvolve um conceito de liberdade que duplica a segunda natureza que a sociedade produziu e, por isso, é determinista. Para Adorno (1984, p. 212), "modelar os conceitos guiando-se pelo modelo de uma filosofia subjetiva da imanência supõe tacitamente que vontade e liberdade estão estruturadas monadologicamente"4 4 "junto à formação conceitual orientada pelo modelo de uma filosofia subjetiva da imanência, a estrutura monadológica da vontade e da liberdade é tacitamente pressuposta" (Adorno, 2009, p.180). . Ao invés de falar do fetichismo conceitual da vontade ou da liberdade, o nominalismo descreve e classifica os comportamentos dos homens em diversas situações. No entanto, é certo que a contradição entre o homem concreto e a liberdade ideal continua existindo e não é eliminada pelo conceito.

Segundo Adorno (1984, p. 234), "a abstração da liberdade faz desaparecer no sujeito o que se opõe a ela, ou seja, faz dissipar tudo aquilo que o sujeito possa apontar como objetividade"5 5 "tudo aquilo que se tem de alguma forma em vista como objetividade, tudo aquilo que se opõe à subjetividade, desaparece abstratamente no sujeito" (Adorno, 2009, p.198). . No momento em que se realiza a separação rigorosa do que é e do que deve ser, e em que se fala dos seres com consciência acorrentada, atribui-se à própria pessoa o engano sobre a liberdade, terminando por perpetuar o determinismo psicológico que dispensa o juízo. Ao usar conceitos arbitrários, valores supostamente concretos carregados de normas eternas que imprimem uma aparência de concretização, reduz-se a liberdade à completa metafísica, perdendo-se a relação entre a objetividade e a subjetividade.

Por outro lado, a resposta acerca do que é liberdade também não pode assumir como referência apenas o sujeito empírico6 6 Adorno (1984) afirma que o behaviorismo representa essa tendência, pois, ao traduzir todas as determinações do Eu a reações particulares, termina solidificando-as. O método que prima pela observação realiza a descrição e a dependência passiva à situação dada. Assim, a interação entre sujeito e objeto é escamoteada a priori, ficando excluídas do processo de análise as condições históricas e sociais que determinam os comportamentos do sujeito. Isso indica, pelo método, a presença da ideologia da adaptação, significando que a objetivação dos homens, que não é refletida, realiza a propagação da dominação. Esse método, além de comportar-se serviçalmente com a marcha do mundo, retira os homens, agora teoricamente, do costume da reflexão sobre suas determinações. , pois este carece da dimensão ontológica, sendo a liberdade reduzida ao existente. Essa situação é análoga: "ao comportamento do prisioneiro que ama a sua cela porque não lhe é permitido amar outra coisa" (Adorno, 1993, p. 174). Nesse caso, a integração social também chega aos indivíduos como se fosse irresistível. Investigar a liberdade por meio da empiria, do possível nas condições adversas ou a partir da realização dos interesses dos sujeitos no cotidiano provoca a indiferença ante a liberdade como conceito e, inclusive, como coisa, fazendo com que a invocação dessa dimensão soe como retórica. A liberdade individual ou coletiva deve ser o fundamento da vida, a base da conduta humana moral ou ética. Nesse caso, viver lutando pela autoconservação não traduz a liberdade.

Estabelecer o que é liberdade a partir das ações existentes no cotidiano é limitado, pois essas escolhas geralmente não podem esperar e, por isso, retiram o homem da possibilidade de analisar o que de conceito está presente nas ações. A diferença entre teoria e prática implica, teoricamente, que a prática nem pode ser reduzida à teoria nem é seu instrumento. Ambos os aspectos não se deixam reduzir a uma síntese. Se existe unidade, ela só ocorre nos extremos, isto é, no impulso espontâneo que não está disposto a tolerar que o horror perdure ou em uma consciência teórica impávida ante as ordens que calam a razão.

As ponderações realizadas nesse tópico nos instigam a concluir que o embate entre a distinção do útil e necessário à provisão cotidiana da vida e a teoria pura ou a concepção personalista sobre a liberdade dá início à discussão sobre a liberdade. A apreensão da liberdade não pode prescindir da indagação conceitual, ela jamais pode ser captada de modo direto e imediato apenas com os dados dos sentidos. Ao mesmo tempo, o sujeito é também mediado pela realidade, de sorte que nenhuma formação conceitual deixa de ser referida e condicionada pela existência real. Desse modo, é fundamental avaliar as mediações recíprocas no plano do universal e do singular. A existência ou não da liberdade depende de sua contradição, depende do objeto que outorga ou nega autonomia ao sujeito, por isso a sociedade tem que ser repensada. Separada dela, a liberdade é fictícia, pois o sujeito está mediado em si por aquilo que se separa: a conexão de todos os sujeitos.

Bases para o entendimento do conceito de liberdade

Para Adorno (1984), a elaboração da resposta sobre o que é liberdade passa pela articulação com a noção de justiça, ou seja, com o que a tradição filosófica chamou de moral ou ética. De acordo com Schweppenhäuser (2003), Adorno prefere o termo moral mesmo que ele tenha implicações restritivas ao termo ética, que, embora seja benquisto, carrega uma tendência ontologizante, presente principalmente nos anos 50, por fazer referência a uma índole a ser encontrada, uma qualidade do ser humano sem conexão com as condições objetivas. Com o intuito de evitar reproduzir limitações no discurso sobre a moral (ênfase no teor repressivo ou nas denúncias à racionalidade moral burguesa), Adorno relaciona a ordem moral à razão e decifra as suas ambivalências: "como índice da heteronomia social ainda não superada" (pp. 403-404).

Segundo Adorno (1984), a liberdade está relacionada ao exercício de uma razão não-instrumental. A liberdade só pode ser identificada e buscada por um indivíduo que exerça uma razão não-subjetiva e nãopragmática. De acordo com Matos (1998), o próprio Kant já denuncia a restrição da razão quando afirma que a vida limitada à sobrevivência desfaz as máximas7 7 Segundo Abbagnano (2003), máxima é um princípio subjetivo da vontade, da lei, que é o princípio objetivo universal de conduta. morais e que a redução da vida a quanto custa empobrece o espírito e o exercício da razão.

Embasado em Kant, Adorno realiza a discussão sobre a razão necessária para a busca da liberdade. Para ele, a razão deve ser definidora dos princípios que alguém formula para si mesmo, leis não relativas que conduzam à ação de cada homem como ser universal. É exatamente por isso que cada um deve seguir as máximas originadas da razão, pois elas indicam o procedimento a ser executado pelo homem em conformidade com a lei universal. A liberdade, como uma dessas máximas, deve ter como ideia reguladora a humanidade, que não é a soma de todos os homens, mas o princípio que os converte em tais, e o indivíduo não é somente uma função do processo, alguém que se sacrifica para garantir a liberdade social, mas é representante da espécie homem.

Apesar das diversas críticas à primazia da razão em Kant, Adorno (1984) ressalta que a reflexão desse filósofo já nos mostra a capacidade da razão ir além da autoconservação. Kant nos alerta para uma complexidade que sobrepõe o imediatismo do habitual quando reclama que a razão tem a necessidade de responder a questões distantes do mundo empírico, tais como a existência de Deus, a imortalidade da alma e a liberdade. Essa perspectiva auxiliaAdorno a criticar a razão moderna baseada na validade das formas lógicas que obedece à consciência coisificada e à aceitação social. Para essa razão moderna, tanto o bem quanto o mal passam da universalidade moral ao determinismo social. É como se a lei que favorece a liberdade dos demais não fosse fundamento de determinação da vontade pura, não surgisse do suposto de que é um objeto para o arbítrio de cada um, mas uma mera forma legal pela qual o Eu limita a sua própria liberdade para proporcionar a universalidade de uma lei e fazê-la adequada à pura razão prática.

Desse modo, a reflexão sobre o bem ou o mal de uma ação não é realizada. A razão faz com que o juízo seja entregue às coações da sociedade empírica e transforme categorias, como nobre e certo, em mera ideologia burguesa. Com esse movimento, a liberdade é usurpada pela tarefa formal da integração, a priori nada formal, mas concreta, pois se revela no domínio sedimentado da natureza interior, que é reificada.

De acordo com Adorno (1984), mesmo que Kant tenha colocado o indivíduo no centro de sua ética, concebendo-o como autônomo, ao mesmo tempo em que o hipostasiou8 8 Na linguagem moderna, hipostasia indica a transformação falaz e subreptícia de uma palavra ou um conceito em substância, ou seja, em uma coisa ou em um ente que cristaliza a realidade, favorecendo a eliminação das contradições e dificultando a capacidade de reflexão (Abbagnano, 2003). A hipostasia acontece quando o sujeito abandona a cisão evidenciada empiricamente na realidade, quando os conceitos retiram do fenômeno as condições objetivas, tentando juntar coisas distintas por meio do conhecimento e transformando o objeto em um simples para si, pensado e conceituado pelo sujeito como algo meramente designativo. , porque não levou em conta a sua mediação heterônoma real, em sua definição da liberdade ele oferece bases para se pensar em liberdade como ação baseada na razão, e não como reação. Nesse caso, a liberdade está orientada por leis, as ações livres procedem por normas. Isso sugere tanto que a liberdade não é uma ação desregrada e sem vínculo com a moral, como traz a possibilidade da defesa da hipótese de que não se conhece liberdade sem lei e que somente se admite sua existência no conhecimento desta.

Kant identificou a conexão entre lei e liberdade em seu tempo histórico e a expressou em sua ética quando alertou que o homem não estava só atado por dever a leis, mas estava também sujeito a sua própria legislação, que funcionava em conformidade com a própria vontade legisladora, em conexão com o universal. Nesse caso, a relação da moral com a liberdade possui elementos emancipatórios e repressivos. Se não existisse o princípio da liberdade, não teríamos os preceitos morais e, nesse caso, a vida humanamente digna seria impensável: "Isso significa que a reflexão moral tanto fundamenta quanto reduz a liberdade de ação do indivíduo" (Schweppenhäuser, 2003, p. 399). Essa é uma aporética9 9 Dificuldade de ordem racional que põe em evidência os aspectos do fenômeno que não são compreendidos e que, por isso, constituem aporias naturais. Aporia é uma dificuldade inerente a um raciocínio, uma dúvida objetiva de um raciocínio ou da conclusão a que leva um raciocínio. situação de contradição da moral:

por um lado, ela conduz os homens para a responsabilidade, atribui-lhes a liberdade de ação que eles não teriam de outro modo, por outro lado, a moral, na condição de crítica do agir existente do homem é, ao mesmo tempo, representante de uma liberdade que ainda está por vir (pp. 399-400).

As teses contrárias de que a vontade é livre e nãolivre expressas em Kant indicam uma antinomia10 10 Segundo Abbagnano (2003), a palavra antinomia significa propriamente conflito de leis, mas foi estendida por Kant para indicar o conflito em que a razão se encontra consigo mesma em virtude dos seus próprios procedimentos. que não carece de verdade, e nos faz refletir sobre a relação estreita entre leis e liberdade (Adorno, 1984). É certo que a vontade não segue a causalidade natural, mas as leis da razão. Avontade é a substância da liberdade, é a unidade característica de todos os atos que se têm como livres. Nesse sentido, como princípio moral, ela não pode ser meio para a aquisição de algo ou para se chegar a um fim. Avontade é realmente autônoma, pois enquanto princípio sintético do Eu assume posturas frente aos fenômenos, porém ela é subordinada à razão, porque a objetivação dos impulsos singulares em forma de vontade para algo é uma sublimação, isto é, desvio do objeto primário, por isso também está atrelada a algo. Em termos psicanalíticos, a vontade é derivada da difusa energia da libido. É daí que vem a afirmação de que a vontade não é livre, desvinculada das experiências reais (Adorno, 1984).

Embutida nessa discussão, surge também outro princípio fundamental para o entendimento do que seja liberdade: a liberdade passa necessariamente pelo universal e pelo particular, ou seja, abrange os: "interesses particulares e a pretensão de felicidade, em concordância com os interesses objetivos, originando certas normas para o gênero humano" (Schweppenhäuser, 2003, p. 396). Essa relação está exposta no imperativo categórico kantiano, segundo o qual o indivíduo tem que agir de tal modo que exerça a humanidade sempre como um fim, e nunca como um meio.

Refletir sobre a relação entre indivíduo e sociedade é vital para a tematização da liberdade, pois a confusão entre o particular e o universal traz como consequência a não realização da mesma. Para Adorno (1984), o perigo de se ignorar as diferenças entre essas duas dimensões é que, na realidade social, elas terminam se embaralhando, assumindo uma a característica da outra e, nessa confusão, acabam sendo pautadas pelo mercado. Como na realidade social os interesses particulares não se colocam como interesse universal, geralmente a resolução da ambivalência da moral acontece por meio do relativismo individual.

Segundo Adorno (1984), a perspectiva de universalidade tem que ser mais bem debatida, para que ela não se torne privilegiada como objetividade lógica da razão e, com isso, viabilize o desaparecimento de todos os sujeitos particulares e, consequentemente, da subjetividade. Seguindo esse caminho, a sociedade repressiva reproduz na consciência o contrário da liberdade. Não adianta invocar a universalidade11 11 Para Adorno (1984), a imposição do coletivismo como submissão do indivíduo à sociedade é perigoso, pois os países que hoje recebem o nome de socialistas também revelam a mentira na pretensão da liberdade e consolidam o antagonismo. As supostas democracias populares não fazem mais que prolongar a frieza com seu governo autoritário e indiferente às necessidades do sujeito. Nesse caso, coletivismo e o individualismo se complementam mutuamente. ou a particularidade enquanto a outra dimensão é alienada, ou seja, fazendo sempre injustiça a seu oposto.

Para Adorno (1984), uma vontade arrancada da razão e declarada fim em si mesma está disposta ao crime. Quanto mais a razão se afasta da análise da trama da sociedade, tanto menor a garantia de que haverá qualquer decisão particular de ser justa moralmente ou livre, pois o indivíduo faz parte da sociedade. Sem sociedade, não há consciência do Eu e, da mesma forma, não existe sociedade fora dos indivíduos.

Outro ponto interessante para se refletir acerca do que é liberdade se refere à conexão que ela estabelece com a existência da vontade autônoma que segue a causalidade dos seres racionais. Para que os atos volitivos sejam autônomos e não careçam da análise de suas consequências, é necessário que eles sigam o nexo causal. Essa causalidade não brota unicamente dos objetos, porque "uma causalidade que se fecha rigorosamente no interior dos objetos, fica reduzida à sua própria casca"12 12 "A causalidade que se fecha rigorosamente contra o interior dos objetos não é outra coisa senão seu invólucro" (Adorno, 2009, p.208). (Adorno, 1984, p. 247), mas da necessidade do pensamento. O sujeito tem que pensar de forma causal e analisar os constituintes e o constituído. Nesse raciocínio, a liberdade seria a propriedade pela qual a causalidade pode ser eficiente independentemente das causas estranhas que a determinem. Nesse caso, a liberdade se converte em uma propriedade da causalidade dos sujeitos, já que se sobrepõe às causas materiais, ao empírico e ao imediato.

A ideia de seguir a causalidade dos acontecimentos é interessante, por oferecer espaço para o indivíduo analisar as causas determinantes de um fenômeno. Porém, no momento em que Kant atribui à razão pura a total responsabilidade pela leitura da causalidade, ele reduz a relação entre sujeito e objeto. Quando a causalidade, ao buscar a determinação das coisas, não renuncia à pretensão de totalidade e se alia ao princípio da subjetividade, termina realizando a unidade indistinta da pura subjetividade.

Nesse sentido, a causa cognocente é projetada sobre os objetos como causa eficiente, isto é, a razão projeta seu próprio princípio de unidade aos objetos e logo os faz passar pelo conhecimento que tem deles. Com esse movimento, o sujeito é afirmado sem se confundir com o objeto, e as categorias do conhecimento se convertem em um para si do sujeito. Pode-se dizer que: "uma objetividade considerada como o resíduo que fica atrás do sujeito é um remendo, um esquema, inconsciente de si mesmo. É como se a causalidade mimetizasse o pensamento"13 13 "A objetividade definida como resíduo após a retirada do sujeito não é senão uma macaquice. Ela é o esquema inconsciente de si mesmo, ao qual o sujeito subsume o seu outro" (Aforno, 2009, p.226). (Adorno, 1984, p. 268). Nesse caso, a liberdade só é reconhecida quando segue a causalidade determinada pela razão pura, e ela é a identidade que ignora o diferente.

Dessa forma, a equivalência entre liberdade e razão pura produtora de seus objetos para si mesma não se ocupa dos objetos para conhecê-los, mas de sua própria faculdade para torná-los reais. O princípio da identidade do sujeito é assustador por ser interiorização do princípio social. Esse é o motivo pelo qual o determinismo segue prevalecendo sobre a liberdade nos sujeitos reais. Não se pode esquecer que a instância em que está ancorado o caráter inteligível, a razão pura, considerada irredutível, em vez de ser condicionante absoluto, faz-se também condicionada. Por isso, situada fora do tempo como um absoluto, é muito mais irracional do que a doutrina da criação, já que alia a ideia de liberdade à dominação.

A causalidade também não pode ser considerada uma cadeia de decisões que se desenrola com regularidade, algo que é verdadeiro se não houver motivações do sujeito, pois há imprevistos que fazem com que a consciência tenha estranheza de si mesma. Portanto, não há como conceber a intervenção do espírito puro. A própria infinidade de entrelaçamentos torna impossível, já em princípio, a formulação de claras cadeias causais. Ao tratar a relação causal como um princípio, ignora-se o emaranhamento, a contradição. Tal descuido é condicionado pelo deslocamento da causalidade para o sujeito transcendental e, como pura forma da legalidade, a causalidade se reduz a uma dimensão. Se a causalidade é a verdadeira unidade na pluralidade, ela termina perdendo-se. Para Adorno (1984), a categoria interação surge como esforço adicional na tentativa de remediar a falta, a impossibilidade, que já está inserida na crise da causalidade.

Pode-se dizer que o capitalismo representa esse sistema, e sua medida é a integração, a interdependência universal de todos os fatores que deixa a causalidade para trás. Nessa sociedade monolítica, torna-se inútil buscar o que pode ser a causa, pois ela é retraída à totalidade como se fosse inapreensível. Tudo parece ter a mesma distância do centro, o que gera o hábito de reduzir uma situação particular a outra (Adorno, 1984).

Ao mesmo tempo em que temos que tomar cuidado com o imperativo da causalidade localizada no sujeito, o desaparecimento dela também não é a solução. Menosprezar a causalidade não anuncia, tampouco, o reino da liberdade, pois a dependência reproduz-se na total interdependência. Nesse processo, acontece a conversão da causalidade à mera relação sucessiva de fatos e à perda da capacidade da reflexão.

Se a causalidade é um contra-senso como princípio mental subjetivo, ao mesmo tempo é impossível conhecer sem ela. Desse modo, devem-se buscar componentes que não sejam, em si, mentais. A reflexão sobre a causalidade insinua a ideia de liberdade como possibilidade de diferença. Quando a causalidade é objetiva e subjetivamente o feitiço da natureza dominada, que tem como fundamento a identidade que, como princípio espiritual, é o reflexo da dominação real sobre a natureza, a reflexão sobre ela pode trazer à tona sua própria naturalidade bárbara como causa do feitiço.

Para Adorno (1984), considerar a liberdade algo positivo, estabelecido como dado ou como inevitável significa convertê-la no contrário de si mesma. Ao dizer que livre é aquilo que se submete ao Eu, Kant ignora que esse Eu já é submetido à causalidade, determinado pelo externo e constituído em relação com o social. Ao mesmo tempo, no momento em que ele realiza a separação rigorosa do que é e do que deve ser e que fala dos seres que tem uma consciência acorrentada, Kant atribui esse fato ao próprio indivíduo, ao amor próprio que engana terminando por perpetuar o determinismo psicológico que dispensa o juízo.

O isolamento da constituição do Eu e sua posterior valoração natural positiva ou negativa é discutido por Adorno quando ele afirma que qualquer patologia individual deve ser entendida no elo que estabelece com a sociedade: "a consequência socialmente irracional se torna também individualmente irracional. Nesse sentido, as neuroses seriam de fato dedutíveis, quanto à sua forma, da estrutura de uma sociedade a qual não podem ser suprimidas"14 14 Todas as citações literais do texto "Acerca de la relación entre Sociologia y Psicologia" (Adorno, 1986) foram traduzidas do original em espanhol pela própria autora deste artigo. (Adorno, 1986, pp. 49-50). Portanto, qualquer personalidade perversa não deve ser apreendida equivocadamente como natureza e como dado imutável, mas como resultado de uma formação. Sem acreditar nisso, diante de indivíduos que cometem atrocidades, muitos defendem a pena de morte como modo de justiça, afirmando que a absolvição seria a plena injustiça. Com essa postura, essas pessoas não refletem que o duplo castigo é contagiado pelo princípio da violência permanente e que apenas a resistência contra a violência é que faz humanidade.

Qualquer reflexão séria sobre a liberdade deve assimilar o empírico. Quanto mais objetiva a causalidade, tanto maior é a possibilidade de liberdade. No momento em que a razão é objetivada como faculdade hipotética, em meio ao mundo empírico dos dados, não pode ser separada da sociedade, o que significa que a constituição dos objetos faz parte dos juízos práticos e, portanto, a razão deve referir-se ao exterior.

Ao mesmo tempo, Adorno (1984) alerta que as condições experimentais de pensamento não podem servir apenas para confirmar a ordem dos conceitos nos indivíduos. O papel dos experimentos mentais deve estimular o juízo, instigar a tensão necessária ao entendimento e não se ater a circunstâncias particulares. Se, em vez de incitar desconfiança, eles acabam eliminando o conteúdo crítico, sendo empregados como fórmulas e ganhando o teor de concludentes, os experimentos não permitem a legitimação da ideia de liberdade, mas o costume de o juízo usá-los como muleta, como algo imprescindível, o que termina por transformar a ação em puro espírito, servindo-se dele como substituto da ação. O experimento mental jamais será igual a uma situação extrema de perigo, pois não se pode prever nem profetizar como reagirá o mais íntegro dos homens em situação de tortura (Adorno, 1984). Assim, o contra-senso dos experimentos morais parece ser se comprometer em calcular o que rompe o âmbito do calculável.

Não dá para garantir a liberdade aos homens empíricos como se ela estivesse demonstrada na natureza. Mesmo que a ideologia emancipe a pessoa, essa dignidade não existe. A elaboração filosófica kantiana não indaga se a liberdade, tida como ideia eterna, é histórica. É inconcebível predicar algo à liberdade se ela é idealizada como radicalmente atemporal, pois, em princípio, ela é um atributo da ação temporal e somente temporalmente pode ser atualizada (Adorno, 1984). Tornar a liberdade uma conquista ontológica e eterna é perigoso, e Adorno nos mostra isso quando afirma que atribuir liberdade, no sentido pleno da palavra, a crianças, é equivocado. É anacrônico falar de liberdade real ou exigida antes de o indivíduo formar-se, pois ele não é somente biológico, mas constituído como único pela reflexão sobre si mesmo; é um disparate atestar em bebês, cuja razão ainda está em formação, a autonomia que corresponde à razão madura.

O indivíduo autônomo só se faz em oposição à sociedade. A individuação acontece quando a liberdade é primariamente a de um indivíduo com fins próprios, não necessariamente idênticos aos da sociedade. Esse tipo de liberdade faz-se liberada da sociedade instintiva para alcançar realidade própria em uma sociedade cada vez mais racional. Os indivíduos são livres somente em uma sociedade livre. Com a eliminação da repressão exterior, também desapareceria a interior. Entretanto, a liberdade encontra-se tão afastada de seu contrário que ele a inibe e termina constituindo a condição de seu conceito. Desse modo, o conceito não deve ser isolado e convertido em absoluto. Aquilo que ocorre com o conceito de liberdade também acontece com o conceito de causalidade e se encontra em consonância com a tendência universal que deseja superar falsamente os antagonismos, fazendo com que o universal, por meios da identificação, liquide o particular.

Adorno (1984) nos oferece elementos para o entendimento de que a liberdade não é concebida apenas com base em critérios individuais, metafísicos, materiais, ontológicos ou empíricos, pois assim ela se reverteria em dominação, reprodução da lógica hegemônica ou ilusão que se reserva à heteronomia. Da mesma forma, o sacrifício do indivíduo em prol da liberdade da sociedade, ou o inverso, não indica a liberdade. Essa dimensão humana é vivida pelo indivíduo, mas possui uma conexão estreita com a humanidade, posto que passa pela ética ou pela moral, pelo particular e pelo universal. Ela não é consequência, mas princípio, finalidade da vida que deveria nortear as ações morais.

Notas

Recebido em: 18/04/2009

Revisão em: 19/11/2009

Aceite final em: 02/12/2009

Juliana de Castro Chaves é Psicóloga, possui Mestrado em Psicologia Social pela UFMG e Doutorado em Psicologia Social pela PUC-SP. É Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás (UFG), Coordenadora do Núcleo da ABRAPSO de Goiás. Endereço: Rua 235, s/n, Setor Universitário. Goiânia/GO, Brasil. CEP 7460550. Email: julich@terra.com.br

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  • 1
    Todas as citações literais do livro
    Dialética negativa (Adorno, 1984) foram traduzidas do original em espanhol pela própria autora, pois no processo de elaboração deste artigo o livro
    Dialética Negativa ainda não tinha sido traduzido no Brasil. No entanto, como no processo de publicação houve a tradução da editora Zahar, também foram incluídas as citações referentes à publicação de 2009 em respeito ao tradutor.
  • 2
    "O puro ser-em-si do homem, privado de todo conteúdo empírico, um ser-em-si que não é procurado senão em sua própria racionalidade, não admite nenhum juízo racional sobre por que ele tem sucesso aqui e fracassa lá" (Adorno, 2009, p. 244).
  • 3
    De acordo com Adorno (1984), o limite da liberdade do eu isolado encontra-se representado na ontologia existencial e mesmo que essa vertente emancipe a pessoa, essa dignidade não existe. Isso acontece porque tanto o conceito de pessoa e de suas variantes como a relação eu-tu são cobrados como uma teologia em que já não se crê. Quando Heidegger, em seu manifesto do personalismo
    O ser e o tempo, interpreta a subjetividade como modelo do ser pré-ordenado, o personalismo já se converte em seu contrário, pois o indivíduo já é diminuído em expressões impessoais como
    Dasein e existência. Nessa obra, segundo Adorno, o contorno abstrato da pessoa, a consciência individual, se encontra atrelada a uma objetividade transubjetiva que, segundo a doutrina idealista e ontológica, se funda no puro sujeito que não existe nas condições concretas. Tentando ir contra o impessoal, o projeto da autenticidade se transfigura em metafísica da ideia de um Eu forte e fechado em si mesmo. No entanto, o conceito de homem pressupõe a objetivação do sujeito e também a sua decadência. Assim, a constituição do indivíduo não é antecipada.
  • 4
    "junto à formação conceitual orientada pelo modelo de uma filosofia subjetiva da imanência, a estrutura monadológica da vontade e da liberdade é tacitamente pressuposta" (Adorno, 2009, p.180).
  • 5
    "tudo aquilo que se tem de alguma forma em vista como objetividade, tudo aquilo que se opõe à subjetividade, desaparece abstratamente no sujeito" (Adorno, 2009, p.198).
  • 6
    Adorno (1984) afirma que o behaviorismo representa essa tendência, pois, ao traduzir todas as determinações do Eu a reações particulares, termina solidificando-as. O método que prima pela observação realiza a descrição e a dependência passiva à situação dada. Assim, a interação entre sujeito e objeto é escamoteada
    a priori, ficando excluídas do processo de análise as condições históricas e sociais que determinam os comportamentos do sujeito. Isso indica, pelo método, a presença da ideologia da adaptação, significando que a objetivação dos homens, que não é refletida, realiza a propagação da dominação. Esse método, além de comportar-se serviçalmente com a marcha do mundo, retira os homens, agora teoricamente, do costume da reflexão sobre suas determinações.
  • 7
    Segundo Abbagnano (2003), máxima é um princípio subjetivo da vontade, da lei, que é o princípio objetivo universal de conduta.
  • 8
    Na linguagem moderna, hipostasia indica a transformação falaz e subreptícia de uma palavra ou um conceito em substância, ou seja, em uma coisa ou em um ente que cristaliza a realidade, favorecendo a eliminação das contradições e dificultando a capacidade de reflexão (Abbagnano, 2003). A hipostasia acontece quando o sujeito abandona a cisão evidenciada empiricamente na realidade, quando os conceitos retiram do fenômeno as condições objetivas, tentando juntar coisas distintas por meio do conhecimento e transformando o objeto em um simples para si, pensado e conceituado pelo sujeito como algo meramente designativo.
  • 9
    Dificuldade de ordem racional que põe em evidência os aspectos do fenômeno que não são compreendidos e que, por isso, constituem aporias naturais. Aporia é uma dificuldade inerente a um raciocínio, uma dúvida objetiva de um raciocínio ou da conclusão a que leva um raciocínio.
  • 10
    Segundo Abbagnano (2003), a palavra antinomia significa propriamente conflito de leis, mas foi estendida por Kant para indicar o conflito em que a razão se encontra consigo mesma em virtude dos seus próprios procedimentos.
  • 11
    Para Adorno (1984), a imposição do coletivismo como submissão do indivíduo à sociedade é perigoso, pois os países que hoje recebem o nome de socialistas também revelam a mentira na pretensão da liberdade e consolidam o antagonismo. As supostas democracias populares não fazem mais que prolongar a frieza com seu governo autoritário e indiferente às necessidades do sujeito. Nesse caso, coletivismo e o individualismo se complementam mutuamente.
  • 12
    "A causalidade que se fecha rigorosamente contra o interior dos objetos não é outra coisa senão seu invólucro" (Adorno, 2009, p.208).
  • 13
    "A objetividade definida como resíduo após a retirada do sujeito não é senão uma macaquice. Ela é o esquema inconsciente de si mesmo, ao qual o sujeito subsume o seu outro" (Aforno, 2009, p.226).
  • 14
    Todas as citações literais do texto "Acerca de la relación entre Sociologia y Psicologia" (Adorno, 1986) foram traduzidas do original em espanhol pela própria autora deste artigo.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Fev 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 2010

    Histórico

    • Recebido
      18 Abr 2009
    • Aceito
      02 Dez 2009
    • Revisado
      19 Nov 2009
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