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Maternidades: os repertórios interpretativos utilizados para descrevê-las

Motherhoods: the interpretative repertories used to describe them

Resumos

O objetivo deste estudo foi identificar os repertórios interpretativos sobre a maternidade utilizados em entrevistas com mulheres que vivenciavam esta experiência. Foram entrevistadas doze mães, usuárias de uma unidade de saúde materno-infantil de Araguari, cujos filhos caçulas tinham idades compreendidas entre quatro meses e dois anos. O corpus foi analisado segundo as propostas de análise do discurso influenciadas pela perspectiva construcionista social. Como resultados, observamos que as participantes descreveram a maternidade a partir da utilização de quatro repertórios: (1) maternidade romântica, enfatizando-a como um fenômeno natural; (2) maternidade medicalizada, descrevendo-a por meio de um vocabulário médico e psicológico; (3) maternidade exigente, apontando as exigências do exercício de ser mãe; (4) aprendendo com a maternidade, em que esta é uma oportunidade de aprendizado e mudanças. Concluímos, então, que ao utilizarem tais repertórios, as participantes procuraram se colocar como boas mães, buscando um lugar confortável e um julgamento favorável na interação.

maternidade; análise do discurso; saúde da mulher; construcionismo social


The aim of this study was to describe the interpretative repertoires about the motherhood used in interviews by women who lives motherhood experience. We interviewed twelve mothers, users of a Maternal and Child Health-care Center, whose youngest child was between four months and two years old. Corpus analysis was performed according to Discourse Analysis. As results, we observed that the interviewers described the motherhood using four repertories: (1) romantic motherhood, emphasizing motherhood as a natural phenomenon, (2) medicate motherhood, that presents motherhood through a medical and psychological vocabulary; (3) exigent motherhood, in that the descriptions emphasize the demands of being mother; (4) learning with the motherhood, by which motherhood is described as an opportunity for learning and change. We concluded that, when such repertoires were used, the participants sought to position themselves as good mothers, seeking a comfortable place and positive assessment in the interaction.

motherhood; discourse analysis; women's health; social constructionism


Maternidades: os repertórios interpretativos utilizados para descrevê-las

Motherhoods: the interpretative repertories used to describe them

Renata Leite C. Aguiar Moreira; Emerson F. Rasera

Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, Brasil

RESUMO

O objetivo deste estudo foi identificar os repertórios interpretativos sobre a maternidade utilizados em entrevistas com mulheres que vivenciavam esta experiência. Foram entrevistadas doze mães, usuárias de uma unidade de saúde materno-infantil de Araguari, cujos filhos caçulas tinham idades compreendidas entre quatro meses e dois anos. O corpus foi analisado segundo as propostas de análise do discurso influenciadas pela perspectiva construcionista social. Como resultados, observamos que as participantes descreveram a maternidade a partir da utilização de quatro repertórios: (1) maternidade romântica, enfatizando-a como um fenômeno natural; (2) maternidade medicalizada, descrevendo-a por meio de um vocabulário médico e psicológico; (3) maternidade exigente, apontando as exigências do exercício de ser mãe; (4) aprendendo com a maternidade, em que esta é uma oportunidade de aprendizado e mudanças. Concluímos, então, que ao utilizarem tais repertórios, as participantes procuraram se colocar como boas mães, buscando um lugar confortável e um julgamento favorável na interação.

Palavras-chave: maternidade; análise do discurso; saúde da mulher; construcionismo social.

ABSTRACT

The aim of this study was to describe the interpretative repertoires about the motherhood used in interviews by women who lives motherhood experience. We interviewed twelve mothers, users of a Maternal and Child Health-care Center, whose youngest child was between four months and two years old. Corpus analysis was performed according to Discourse Analysis. As results, we observed that the interviewers described the motherhood using four repertories: (1) romantic motherhood, emphasizing motherhood as a natural phenomenon, (2) medicate motherhood, that presents motherhood through a medical and psychological vocabulary; (3) exigent motherhood, in that the descriptions emphasize the demands of being mother; (4) learning with the motherhood, by which motherhood is described as an opportunity for learning and change. We concluded that, when such repertoires were used, the participants sought to position themselves as good mothers, seeking a comfortable place and positive assessment in the interaction.

Keywords: motherhood; discourse analysis; women's health; social constructionism.

Introdução

A ênfase dada à maternidade tem sido uma preocupação cada vez mais constante das áreas que envolvem pesquisadores e profissionais da saúde, em especial da Saúde Pública (Oliveira & Pelloso, 2004). Entretanto, embora grande parte dos estudos coloque os primeiros anos da vivência da maternidade como um período crítico na vida da mulher (Felice, 2000; Schwengber & Piccinini, 2005; Stasevskas, 1999), pouca assistência ainda é dirigida a ela nessa fase, sendo o bebê ou as questões biológicas o foco da atenção das ações da saúde pública e de grande parte das produções acadêmicas (Stefanello, 2005).

Acrescida à pequena parcela de atenção à mulher nessa fase, as limitações impostas pela maternidade e a cobrança da responsabilidade pelo filho por parte dos familiares e da sociedade são colocadas como fatores que possibilitam o surgimento de sentimentos contraditórios na vivência inicial da maternidade (Stasevskas, 1999).

Outras abordagens sobre o tema (Fidalgo, 2003; Martins, 2005; Scavone, 2004; Stefanello, 2005) sugerem que os significados atribuídos atualmente à maternidade, bem como os sentidos que cada mulher confere ao fenômeno são contingenciados pelos discursos sócio-históricos que constroem significados específicos sobre o que é ou deveria ser a maternidade, os quais estabelecem formas determinadas de exercê-la que influenciam no fazer cotidiano dessas mães.

Buscando resgatar esses discursos que historicamente constituíram os significados de maternidade, consultamos revisões históricas diversas (Ariès, 1981; Badinter, 1985; Chodorow 1979; Costa, 1989; Donzelot, 1986; Rich, 1981), que apontaram que as transformações econômicas e sociais, as alterações na imagem da criança, as modificações na organização das famílias e a difusão das normas higiênicas promoveram o surgimento de discursos consagrando as mulheres como eixo da família, responsáveis pelo cuidado e educação dos filhos.

Badinter (1985), ao enfatizar a construção histórica do amor materno, situa a emergência e consolidação de uma nova concepção de infância e a organização da família nuclear burguesa destacando a correlata definição social das mulheres como esposas e mães.

Também nesse movimento de questionar o modelo existente, Rich (1981), ao buscar abordar as implicações da maternidade como experiência e instituição, ressalta como a construção cultural discursiva em torno do corpo das mulheres legitimou a relação de dominação na sociedade, chamando a atenção para o silenciamento da perspectiva feminina em relação ao tema da maternidade, uma vez que, segundo essa autora, a grande maioria das imagens científicas, culturais e artísticas da maternidade chegou até nós perspectivada pela voz masculina, individual ou coletiva.

Chodorow (1979) também ressalta a questão da universalidade da maternidade ter sido raramente problematizada e defende que os padrões tradicionais da maternagem no mundo contemporâneo se reproduzem de forma cíclica, pois são naturalizados através de processos psicológicos complexos consequentes dos tradicionais arranjos familiares.

Em relação à questão familiar, Ariès (1981) e Costa (1989) apontam que a ideia que se tem da infância foi sendo historicamente construída e que a criança, por muito tempo, não foi vista como um ser em desenvolvimento, com características e necessidades próprias, e sim como um adulto em miniatura. Nesse sentido, a história da infância surge como possibilidade para reflexões sobre a forma como entendemos e nos relacionamos atualmente com a criança, bem como para as implicações do desenvolvimento desse conceito para o surgimento de um novo ideário de família e de maternidade.

A aliança da família com o poder médico é também, segundo esses autores, um aspecto de destaque na reorganização da família e da maternidade. A norma higiênica, ao definir regras para a moderna criação "científica" das crianças, promoverem iniciativas privadas e públicas para protegê-las, e assim as mulheres passaram a ser enaltecidas como principais colaboradoras na promoção de uma população saudável (Costa, 1989).

A compreensão dos significados da maternidade como um fenômeno articulado à multiplicidade de vozes e contextos históricos nos trouxe alguns questionamentos, como: Que descrições de maternidade são atualmente sustentadas? Quais as descrições de maternidades privilegiadas pelas mães?

Repensando a maternidade a partir da perspectiva construcionista

Na análise da literatura sobre maternidade avaliamos que muitos estudos já haviam sido realizados sob o enfoque qualitativo como tentativa de compreender a complexidade envolvida na temática (Fidalgo, 2003; Stasevskas, 1999; Stefanello, 2005). Contudo, apesar da quantidade de estudos, consideramos que há poucos a partir da perspectiva aqui adotada, uma vez que não identificamos referências à questão da multiplicidade de sentidos da maternidade, ou seja, grande parte desses trabalhos esteve focada na compreensão de uma maternidade única, e assim descreveram um único tipo de mãe e mulher.

Há diversas maneiras de produzir conhecimento, e, de acordo com a perspectiva construcionista social, essa produção é algo que as pessoas fazem juntas, por meio de suas práticas sociais. Nesse sentido, a pesquisa é compreendida como um empreendimento coletivo, cultural, por meio do qual as pessoas constroem os termos a partir dos quais compreendem e lidam com as situações e fenômenos a sua volta (Spink, Medrado, & Mello, 2002).

E é a partir dessa compreensão, do pressuposto de que também os sentidos de maternidade são conjuntamente construídos na interação e buscando criar espaço para a identificação dos múltiplos sentidos de maternidade construídos na relação entre pesquisador e participante, que o enfoque qualitativo, privilegiado neste estudo, esteve fundamentado epistemologicamente na perspectiva construcionista social (Gergen, 1996; Potter & Wetherell, 1987; Spink, Medrado, & Mello, 2002).

O construcionismo situa-se como uma perspectiva que privilegia os processos relacionais e a centralidade da linguagem, ressaltando o papel dos sistemas de significação definidos sócio-historicamente no processo de construção da realidade. O processo de produção de sentido é uma prática social, dialógica e implica uma compreensão da linguagem como ação. O estudo desse processo envolve uma investigação das práticas discursivas do cotidiano (Spink, Medrado, & Mello, 2002); investigação essa que, segundo Iñiguez (2004), pode ser realizada em diferentes níveis de acordo com as opções dessa por noções particulares dentro da ampla teoria de análise do discurso, que pode privilegiar os atos de fala, a pragmática, a retórica, os repertórios interpretativos. Optamos, neste estudo, por realizar uma análise do discurso privilegiando o conceito de Potter e Wetherell (1987) de repertórios interpretativos.

Repertório interpretativo é, segundo Potter e Wetherell (1987), o conjunto de termos, descrições, lugares comuns e figuras de linguagem, agrupadas em torno de metáforas ou imagens, usados na linguagem cotidiana. São as unidades que demarcam o rol de possibilidades das construções discursivas. Originam-se na comunidade linguística em que somos socializados e são transmitidos em nossas relações. Pode-se dizer, portanto, que são ferramentas discursivas gerais, que utilizamos conforme os recursos sociais e culturais disponíveis para justificar nossas versões particulares dos eventos.

De acordo com esses autores, no processo de análise com os repertórios não é suficiente que simplesmente identifiquemos as diferentes formas de linguagem envolvidas, precisamos também conhecer em que situações são utilizadas e que funções e efeitos exercem na fala e na relação (Potter & Wetherell, 1987; Spink, Medrado & Mello, 2002).

Perante essas considerações, entendemos que a possibilidade de identificar os repertórios interpretativos utilizados para descrever a maternidade nos permitirá compreender melhor tais processos de produção de sentidos, servindo como direção tanto para o atendimento das mães como de outras mulheres, uma vez que poderemos abranger de forma mais ampla quais imagens e sentidos demarcam as descrições de maternidade produzidas.

Desse modo, o objetivo deste estudo é identificar os repertórios interpretativos sobre maternidade utilizados em entrevistas com mulheres que vivenciam essa experiência.

Método

Participantes: Foram entrevistadas, neste estudo, 12 mulheres, mães, pertencentes às classes socioeconômicas média-baixa e populares, usuárias de uma unidade de saúde materno-infantil, com idade compreendida entre 18 e 36 anos, cujo filho caçula tinha idade compreendida entre quatro meses e dois anos. No que se refere ao nível de instrução das participantes, metade delas, seis mulheres possuem o ensino médio completo; 2 (duas) possuem o ensino fundamental completo e 1 (uma) o está cursando; 1 (uma) cursa o ensino superior e 2 (duas) delas declaram ter o ensino superior interrompido.

A escolha por mulheres que estivessem vivenciando os anos iniciais do pós-parto esteve sustentada pelas descrições desse período na literatura (Felice, 2000; Stasevskas, 1999) como sendo um momento crítico e cheio de tensões para a mulher, bem como pela escassa investigação acadêmica e ações no âmbito da saúde pública voltadas à mulher nessa fase. Conversar sobre os sentidos de maternidade nesse momento de mudanças parecia, assim, facilitar a emergência de múltiplos sentidos, bem como assumir uma relevância para o cotidiano dessas mulheres.

As participantes foram selecionadas através dos cadastros da unidade de saúde nos quais era consultado o número de telefone das usuárias que frequentaram o serviço nos últimos meses. O convite à participação na pesquisa se deu através de contatos telefônicos, ocasião essa em que a pesquisadora se apresentava, esclarecia sobre o que tratava a entrevista, seus objetivos e a forma como se realizaria.

Procedimentos para construção e análise do corpus: O corpus foi produzido por meio da realização, na residência das participantes, de entrevistas semiestruturadas, as quais foram feitas pela pesquisadora e gravadas em áudio com a utilização de um aparelho mp3.

A decisão de entrevistarmos todas as participantes em suas residências esteve pautada pela consideração de que esse seria um contexto mais cômodo às participantes - por não precisarem se deslocar com as crianças e por adequarem o horário da entrevista de acordo com a sua disponibilidade, além de acreditarmos que esse seria também um contexto mais familiar e mais aberto para as peculiaridades da vida de cada entrevistada.

As entrevistas tiveram uma duração média de uma hora e meia. Antes de serem iniciadas, as participantes leram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Informado, o qual continha informações sobre a pesquisa e seus objetivos. Ressaltamos que preservamos os nomes das participantes, de seus filhos e companheiros, sendo utilizados nomes fictícios para identificá-los. Consideramos importante destacar, ainda, que o projeto aqui apresentado foi submetido à avaliação e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Uberlândia, sob o parecer nº 256/07.

A análise do corpus foi realizada segundo as propostas de análise do discurso influenciadas pela perspectiva construcionista social (Gill, 2003; Potter, 1996; Potter & Wetherell, 1987; Rasera & Japur, 2007; Spink, 2004; Wetherell, 1998). Assim, os passos da análise consistiram de: (a) transcrição de todas as entrevistas realizadas; (b) leitura curiosa e reflexiva, a qual permitiu que surgissem as primeiras impressões a respeito das transcrições; (c) codificação, momento em que identificamos os repertórios por meio do reconhecimento e agrupamento das imagens, adjetivos, expressões e figuras de linguagem produzidas pelas participantes para descreverem a maternidade; (d) análise dos repertórios interpretativos, na qual procuramos compreender os posicionamentos assumidos e as funções do uso de cada repertório em contextos conversacionais específicos.

Resultados e discussão

Para melhor compreendermos os repertórios identificados, enfatizamos em nossa análise os lugares construídos para a mãe, a mulher e a criança em cada descrição. Tendo esse foco, a análise proporcionou a identificação de 4 repertórios interpretativos dominantes em relação à maternidade, os quais apresentaremos a seguir:

1) Maternidade romântica

Nesse repertório, a maternidade é descrita em termos de amor, sentimento, instinto, beleza, essência e transcendência. Assim, características deste repertório são as descrições que enfatizam a maternidade como vivência incomunicável, como ocorrência mágica, como condição natural e instintiva, divina, plena, idealizada e como sonho a ser realizado. Esse repertório também é marcado pela associação com a amamentação e tipicamente é utilizado em momentos da entrevista em que as participantes tentam definir o ser mãe e descrever a história da maternidade na família.

Expressões como "tudo lindo", "não tem como explicar", "só quando é mãe pra saber o que é ser mãe", "melhor coisa que existe", "não acaba nunca", "é viver", "é amor", "é Deus" são utilizadas pelas participantes com o objetivo de descrever a maternidade como um fenômeno majestoso, pleno, divino.

Trecho 1:

R: Andréia, nós vamos conversar um pouquinho, então, sobre ser mãe. Que coisas que você gostaria de me falar sobre esse assunto?

A: Você pensa em carinho, é pouco. Parece que a palavra não consegue abranger tudo, sabe? ... Eu acho que toda mãe deve sentir isso "eu queria criar uma palavra nova pra definir completamente, ilimitadamente tudo o que eu sinto pela minha filha, o que eu sinto pelo meu filho". Então eles falam muito isso "ah, você não conseguiu entender porque você não é mãe". ... Então é por isso que eu escutei demais isso e hoje eu sei que realmente é assim. (Andréia)

Com a utilização desse repertório, as participantes se colocam na interação como boas mães, pessoas completas, realizadas e agradecidas pelos privilégios a elas concedidos pela maternidade.

A descrição da experiência de ser mãe por meio desse repertório, além de destacá-la como algo incomunicável, traz a ideia de que a maternidade tem um sentido único, como se, ao ter um filho, todas as mulheres compreendessem e partilhassem os mesmos significados e sentidos em relação ao ser mãe, como se contassem com uma linguagem única para descrever a maternidade.

Desse modo, a constituição da mãe nesse repertório é pautada por um sentido de universalidade sustentado pela ideia que há uma mãe por natureza, uma mãe por essência. Ser mãe é desempenhar uma condição natural; para além das ações da mãe e do bebê, a mãe existe pela sua condição essencial, pela sua composição interior que a faz mulher e mãe. A criança nesse repertório possui um papel indeterminado.

Contudo, essas descrições marcadas pela ênfase na mãe como modelo de generosidade e afetividade servem como incentivo à construção de uma imagem hegemônica da maternidade, visto que nossa sociedade fundamentada em uma distribuição hierárquica e desigual parece privilegiar alguns sentidos. E, embora haja outras formas de maternidade socialmente disponíveis, a força retórica dessa descrição promove a cristalização de sentidos, dificultando o questionamento dessa imagem dominante e, assim, a compreensão e legitimação de formas distintas de ser mãe ou de ser mulher.

A maternidade descrita como algo inimaginável, só passível de compreensão pela vivência, faz com que a gravidez seja constituída, nesse repertório, como uma dádiva, como um sonho a ser alcançado, algo que distingue quem tem e quem não tem, quem é e quem não é mãe. Assim, esse repertório associa-se à noção de que só não se é mãe se houver impossibilidade e, desse modo, além de produzir uma estigmatização da mulher infértil, não legitima a opção feminina por não ser mãe.

A questão da amamentação como possibilidade da mãe em estabelecer uma relação de afeto com o filho também é enfatizada nesse repertório, que ilustramos com a fala de Cecília, que diz que amamentar: "é um afeto, é bonito demais. ... Só meu peito acalma ele. ... É sei lá, um sentimento de carinho, de... como é que fala? De conexão entre nós dois daquelas que... Ah, ... eu não sei explicá".

E, assim como não ser mãe é ser descrita, nesse repertório, como sendo menos mulher, não amamentar, resultado de uma impossibilidade, constitui a mãe como inferior àquelas que o fazem, como incapaz.

2) Maternidade medicalizada

O repertório "maternidade medicalizada" é tipicamente utilizado pelas entrevistadas quando conversamos sobre a gravidez, o parto, o pós-parto e os primeiros anos da criança. Nesse repertório, a maternidade é constituída como fenômeno do campo da saúde, organizado e regulado pelo conhecimento médico, psicológico, pedagógico, entre outros saberes, bem como pela tecnologia.

Essa descrição da maternidade surge associada aos sentidos de risco, cuidado, saúde, doença e normalidade e assim promove, nesse repertório, a valorização de ações e práticas voltadas para o cuidado com a criança, descrições do parto normal como o tipo mais saudável e menos arriscado, preocupação com a formação do ser humano "saudável", do adulto "equilibrado", bem como gera uma descrição do peso corporal saudável para a mãe.

O uso de expressões como "dor", "parto", "trauma", "perfeito", "hospital", "médico", "depressão", "hemorragia", "cesariana", "fiquei muito obesa" parece, nesse repertório, estar relacionado à tentativa das participantes em legitimar o sofrimento "da mãe", bem como legitimar suas versões sobre os riscos envolvidos.

Trecho 1:

R: Aham. Eu gostaria agora, Karla, que você me contasse um momento marcante seu com ele, com seu filho.

K: Acho que foi no nascimento, que eu acho que, nossa! ... porque depois eu vi o choro dele eu pensei assim "nossa, meu filho nasceu saudável, perfeito", né? Porque até então cê tem, até então quando cê tá grávida você tem aquele medo, aquela preocupação "nossa, será que meu filho vai nascer com alguma deficiência ou...", né? Então na hora que eu vi ele, que ele tava perfeito com todos os membros dele, foi, nossa senhora, pra mim foi tudo. ... Como se diz, ele veio perfeito, né, saudável, não precisou, assim, não precisou ficar no, em incubadora, precisar de fazer algum tratamento, assim, nada, nasceu perfeitinho. (Karla)

Trecho 2:

R: Como que foi os primeiros dias como mãe?

C: Olha, traumatizada com a cesariana. Parto normal mil vezes eu daria, até menino de dez quilos. Que nossa! Cesariana eu sofri demais porque eu engordei trinta e cinco quilos, fiquei muito obesa, né? E tô ainda, né? Que eu só perdi 17 quilos até agora, tem mais 20 quilos mais ou menos pra perder, pra voltá ao que eu era. E eu com infecção demais, me dando febre e chorando, né? ... Chorando e não sabia o que que eu tinha ... Aí minha irmã, minha vizinha vinha e eu não tava com rejeição dele não. É que eu tava, eu realmente estava passando mal e não sabia que que eu tinha. (Cecília)

Nessas imagens do repertório "maternidade medicalizada", o nascimento do bebê constitui-se como uma oportunidade para certificar-se de que o bebê é saudável, perfeito e, mais do que isso, como oportunidade também de comprovação da competência da mãe em produzir um filho "normal"; o que pode ser ilustrado na fala de Raquel: "Ai, assim, a capacidade que a gente tem, sabe? Principalmente fazê".

A expectativa em relação à condição física do bebê, assumida com preocupação, medo e angústia, nos ajuda também a compreender os lugares que são criados para a mãe e para a criança. Nesse repertório, a mãe constitui-se como figura ativa, como quem cuida e é responsável por reduzir todos os riscos a que o bebê está exposto. A criança, por outro lado, é posicionada de forma passiva, descrita como personagem frágil, que tem sua sobrevivência, desenvolvimento e normalidade dependentes da mãe.

Assim, o uso do repertório "maternidade medicalizada" tem a função de colocá-la como alguém que não se arrisca no cuidado com o filho e como alguém que acompanha as evoluções da ciência, como uma tentativa de se colocar como uma mulher moderna, que não se prende às tradições e superstições. Porém, ao mesmo tempo em que a utilização desse repertório demonstra uma valorização do saber médico-científico, há também uma deslegitimação e desvalorização do saber comum, considerado como "coisa de gente antiga", bem como uma desvalorização do próprio saber, descrito como desprovido de importância científica e, assim, legitimado como um saber de quem não entende e para o qual só resta ficar "quieta chorando".

Portanto, colocar-se, a partir desse repertório, como uma mulher moderna não impossibilita que se descreva como uma mulher dependente do saber médico; ao contrário, ser moderna comporta a descrição de ser dependente desse conhecimento socialmente valorizado, o que nos traz a compreensão de como esse repertório coloca a mãe numa posição de passividade na relação com o profissional.

O parto normal, constituído nesse repertório como o tipo de parto ideal, parece assumir para as participantes um caráter normatizador, justificado pela ideia que esse tipo de parto constitui um procedimento sem intervenção cirúrgica e, por isso, de recuperação mais rápida que o parto cesáreo; bem como pela concepção de que o parto normal constitui-se como um tipo de procedimento mais adequado à saúde da mulher; sentidos apresentados por expressões como "cesariana é mais perigoso", "normal é melhor", "parto normal mil vezes eu daria, até menino de dez quilos". Esse caráter prescritivo do parto normal é promovido por esse vocabulário profissional - médico, psicológico, biológico - e proporciona uma descrição em que as participantes quase que se culpabilizam quando não o realizam.

Outra imagem relacionada ao repertório "maternidade medicalizada" é a do peso corporal saudável, frequentemente relacionada às descrições sobre o corpo da mãe. A preocupação com o peso parece relacionada a uma descrição sobre as perdas e prejuízos decorrentes da gravidez e é apresentada nesse repertório, especialmente, quando as participantes tentam descrever os cuidados que têm com elas mesmas como mães, o que colocam por meio de expressões como: "depois que eu fui mãe, é assim, eu tenho, eu tenho agora preocupação com o corpo, sabe?"; "quando você é mãe, nó! Seu corpo fica..."; "eu engordei demais quando eu engravidei".

Considerando a utilização do repertório "maternidade medicalizada" no contexto das entrevistas, compreendemos que o seu uso tem a função de auxiliar as participantes a se colocarem como pessoas esclarecidas, conscientes e conhecedoras tanto dos riscos como das possibilidades em relação à gestação e à maternidade, além de se apresentarem como pessoas cooperativas, dispostas a fazer tudo o que estivesse ao alcance para redução dos riscos que se apresentavam.

Além dessas questões, utilizar o repertório da "maternidade medicalizada" parece afastá-las da imagem de pessoas teimosas, inflexíveis ou ignorantes e as aproxima da imagem de pessoas realistas e modernas.

3) Maternidade exigente

Nomeamos esse repertório como "maternidade exigente" porque entendemos que é utilizado para descrever a maternidade em termos das prescrições, regras e exigências que cabem à mãe. É nessa descrição que as prescrições são discursivamente justificadas como obrigações da mãe. Desse modo, o repertório "maternidade exigente" é caracterizado por um vocabulário que descreve os deveres, as tarefas, as ações e modos de ser impostos à mãe. Também identificamos uma associação entre maternidade e renúncia, maternidade e cuidado, além de uma distinção entre a boa e a má mãe.

Falar de maternidade a partir desse repertório tem a função de descrever a responsabilidade socialmente atribuída à figura da mãe. Geralmente, é utilizado nos momentos da entrevista em que as participantes tentam descrever o valor e a dificuldade do exercício da maternidade. Expressões como "tem que largar tudo", "tem que ficar junto", "é difícil", "tem que estar bem preparada", "tem que ter paciência", "tem que ficar vinte e quatro horas olhando", "é saber brigar na hora certa", "é educar" são utilizadas pelas participantes para realçar essa ideia. Esse repertório é também tipicamente marcado pela estrutura: "ser mãe é..., mas tem que...", a qual parece relacionada a uma ideia de contraposição.

Trecho 1:

R: Bem, você me falou que depois que ela nasceu que você viu o que é ser mãe. O que é ser mãe?

J: Ser mãe é bom, mas tem que ter muito cuidado, né? Cê tem que proteger... Cê tem que cuidar... Cê tem que amar. Cê tem que acordar várias vezes de noite num pode estressar. Que ela, ela [a filha] precisa assim... Ela chora tem que dá mamá... tem que acordar. Tem vez que você acorda quer sair correndo, num quer levantar, mas você tem... Tem que proteger. (Janaina)

Trecho 2:

R: A história da sua mãe, das suas tias, da sua avó... Como que é? Todas são mães? Como que é a história?

A: Na minha família, da minha, do lado da minha mãe, todas são. Mas assim, a que é mais, que eu falo, mãezona, é a minha mesmo. ...

R: E se fosse pra você me contar assim quais são as características de uma mãezona, o que você me falaria? O que que é uma mãezona?

A: Uma mãezona? Uma mãezona é... é saber brigar na hora certa, é saber tá do lado sempre, cuidar, e isso, sabe? Dar apoio quando a gente precisa, mas também saber puxar a orelha na hora que precisa. (Adriana)

No repertório "maternidade exigente" parece ser preciso primeiramente dizer que a maternidade é algo bom para depois criar espaço para descrições opostas. Assim, nessa forma de descrever a mãe, o termo "mas", como conjunção adversativa, contrapõe duas ideias, apresentando uma relação de conflito entre prazer e desprazer, entre os encantos e as dificuldades da maternidade.

Falar da maternidade nesses termos - "ser mãe é bom, mas tem que..." - tem a função de protegê-la da acusação de ser uma mãe ruim ou que desgoste da condição de mãe e permite que ela expresse as dificuldades, a responsabilidade e o compromisso envolvido no exercício da maternidade. O uso dessa expressão nesse repertório, portanto, tem a função de convidar o interlocutor a uma postura compreensiva em relação ao que está sendo dito, bem como a um lugar confortável na interação para a participante.

As demandas desse repertório parecem ser expressas pelas descrições das exigências impostas à mãe, nas quais ela "tem que largar tudo", "tem que proteger", "tem que amar". Observamos que a expressão "tem que" tem uma função prescritiva e normatizadora sobre os requisitos que a mãe, especialmente a boa mãe, deve desempenhar em seu exercício. Nesse sentido, "ter que largar tudo", "largar de trabalhar", "ficar junto o tempo todo" são exigências que demandam renúncia, especialmente do papel profissional da mulher, como ilustra a fala de Márcia: "eu larguei de trabalhar pra cuidá dele".

Assim, a mãe, especialmente a boa mãe, é constituída nesse repertório como alguém que se esforça para responder e executar o que é esperado dela e, desse modo, é posicionada como figura ativa nesse processo de orientar, educar e desenvolver seus filhos. Por outro lado, a criança é posicionada como passiva e dependente, como aquela a quem se deve dispensar o máximo de atenção e cuidado.

Esse repertório promove o ser mãe como o compromisso primordial a que deve se dedicar a mulher. Trabalhar fora, estudar ou qualquer outra atividade que desvie a mãe de sua função principal tende a ser colocada nesse repertório como uma ameaça, como algo que, comprometendo o filho, questiona a própria capacidade de ser mãe. Portanto, ao colocar como função principal da mãe o cuidado com o filho e a ressaltá-la como a única capaz de atender completamente as necessidades da criança, esse repertório promove uma imagem de mãe marcada por sentimentos de culpa, ansiedade, angústia e preocupação constante.

Entretanto, embora essa descrição da maternidade esteja relacionada ao sentimento de ansiedade e ao desafio de experimentar constantemente a dúvida em todas as questões relacionadas à maternidade, descrever a mãe a partir do repertório da "maternidade exigente" tem a função de colocar a participante como uma mãe presente, atenta, preocupada, que faz tudo ao seu alcance - e até o que está fora dele - para proporcionar o que há de melhor ao filho.

Assim, ser mãe, de acordo com o repertório "maternidade exigente", vai além do fato de gerar e conceber um filho. Para ser reconhecida e legitimada como mãe, esta tem que desempenhar em seu exercício as prescrições estabelecidas, o que a possibilita ser descrita nesse repertório como "mãe de verdade".

4) Aprendendo com a maternidade

Esse repertório compreende o conjunto de expressões e lugares comuns utilizado pelas participantes para descrever a maternidade como oportunidade para o aprendizado do ser mãe, para reflexão sobre o antes e o depois dessa condição, para modificar os relacionamentos estabelecidos e de si, como pessoa, filha e esposa.

Esse repertório, tipicamente, é utilizado no contexto das entrevistas pelas participantes que estão vivenciando a maternidade pela primeira vez, ou seja, pelas mães de um único filho, e tem a função de apresentá-las ora como mães ainda inexperientes, ora como mães em processo de construção, assim como as situam como pessoas em constante modificação - comumente avaliadas como positivas - a partir da maternidade.

Expressões como "é a primeira vez que sou mãe", "muita coisa que a gente não sabe assim", "eu vou aprendendo ainda", "vai aprendendo com a vida", "a pessoa que é mãe vai e aprende as coisas", "cada dia é uma coisa diferente", "imaginava diferente", "pensava que não seria capaz", "algo que muda muito a pessoa" são utilizadas pelas participantes para realçar essa ideia.

Trecho 1:

R: Você tava me contando assim que você descobriu que amadureceu muito. Que outras coisas que você descobriu além de você ter amadurecido e ter crescido?

A: É, eu descobri que eu sô... Que tô sendo uma boa mãe, descobrindo coisas da vida que eu não descobria... E tô vivendo, tô crescendo. Eu fico me perguntando como que vai ser daqui pra frente, quando a Edna [filha] crescê? Como é que eu vô sê? Brava com ela? Se eu vô deixá fazê as coisa, pôr de castigo? Começá a mexê nas minhas coisas... Como é que eu vô sê? Fico me perguntando pra mim ... Como vô sê mãe, assim. E vô aprendendo ainda, né? ... Vai crescendo e vai, né? Vai... Cada mês, cada ano, sei lá. É uma fase, né? (Amanda)

Trecho 2:

A: ... a gente aprende mais com os filhos do que com a mãe da gente.

R: O que você acha que você tem aprendido com o seu filho?

A: Eu aprendi a conviver melhor com as pessoas. Que nesses dez meses eu aprendi a ter mais educação, eu aprendi a ter mais respeito com as pessoas, sabe? Eu aprendi a me controlar mais. Então eu acho que o mais assim, o que eu aprendi mais foi isso. (Ana Luiza)

Se, por um lado, esse repertório constitui a mãe como aquela que aprende, a criança, por outro, é apresentada como aquela que ensina, que ajuda e que transforma a mãe. Nesse sentido, a criança é posicionada como alguém que exerce um papel ativo na relação. É especialmente ela quem ensina a mãe a ser mãe, quem modifica a mãe como pessoa, quem a aprimora. É também a partir da maternidade que a mãe aprende a conviver com os outros e a "ser menos egoísta", a se (re)posicionar como filha e como esposa, conforme relatam as participantes.

Descrever, a partir desse repertório, a mãe como alguém em processo de aprendizado parece protegê-la de descrições idealizadas e opressivas e, assim, resguardá-la de acusações de que seja uma má mãe.

A descrição da maternidade como processo de aprendizado supõe também uma instabilidade na imagem da mãe, o que favorece a constituição de diferentes descrições de si mesma como mãe, como também possibilidades variadas de maternidade. Essa descrição que valoriza o contexto parece também legitimar outras formas de ser mãe.

Além da possibilidade de diferentes maternidades, a descrição da mãe nesse repertório possibilita o reconhecimento de diferentes lugares para a mulher, como o de filha, o de esposa, o de profissional. E, embora o ser mãe seja um lugar valorizado nessa descrição, ele não exclui outras descrições de si como mulher. Assim, essa descrição amplia as suas possibilidades. Ser mãe a transforma como filha, como esposa, amiga e profissional.

Essa descrição da mãe que está aprendendo relacionada ao sentido de capacitação e desenvolvimento pessoal fortalece versões de si como alguém responsável, capaz. Porém, embora essa descrição questione a noção de que a mulher nasça sabendo ser mãe, ela oferece a possibilidade de julgar como menos capacitada não só para o exercício da maternidade como também para a vida de um modo geral a mulher que não passou pela experiência de ser mãe e que, por isso, não teve condição de desfrutar as aprendizagens significativas que a maternidade oferece.

Considerações finais

Por meio deste estudo, identificamos quatro repertórios interpretativos dominantes utilizados pelas participantes na entrevista com o objetivo de validarem a imagem de pessoas amorosas, moralmente positivas, responsáveis e esclarecidas. De forma semelhante, tentaram garantir o afastamento de imagens de si como pessoas irresponsáveis, descompromissadas, incapazes, malvadas.

Ao descrevermos diferentes tipos de mães e mulheres associadas a cada contexto, acreditamos ter alertado para os diversos tipos de maternidade, bem como para o problema de se pensar a maternidade e a mulher como únicos. Entendemos que regular a sociedade a partir de uma única descrição de maternidade cria a expectativa de um modelo a ser seguido firmemente demarcado, restringindo as possibilidades de ser mãe, de ser mulher, de ser como pessoa.

Desse modo, acreditamos que analisar a maternidade a partir dos repertórios interpretativos destaca a importância de os profissionais - médicos, enfermeiros, psicólogos, educadores, pesquisadores - bem como de a sociedade, de forma geral, serem sensíveis aos repertórios interpretativos disponíveis socialmente, os quais ampliam ou limitam as possibilidades de sentido sobre a maternidade, assim como muitas vezes servem para sustentar discursos e práticas opressivas para as pessoas, homens e mulheres, mães e não mães.

Em relação à participação das mulheres neste estudo, avaliamos uma questão que muito se fala na literatura (Felice, 2000; Schwengber & Piccinini, 2005; Stasevskas, 1999; Stefanello, 2005) sobre a vulnerabilidade emocional e orgânica da mãe nos primeiros anos do pós-parto e da incidência de depressão relacionada a esse período. Compreendemos, entretanto, que muitos outros fatores parecem associados à maneira como são manejadas as demandas desse momento, como, por exemplo, o apoio familiar, a participação do marido no cuidado com a criança, os sentidos que cada mulher confere às situações vivenciadas e como lida com elas.

Esperamos que este trabalho possa contribuir como incentivo às reflexões sobre a formação profissional do psicólogo, na qual possam ser considerados os repertórios que têm sido promovidos pela Psicologia e as funções que eles assumem, como contribua para práticas profissionais mais sensíveis aos sentidos disponíveis, nas quais possa se abrir espaço para refletir sobre que repertórios de maternidade têm sido sustentados, permitidos ou impedidos nesses contextos.

Finalmente, almejamos que as discussões aqui realizadas possam constituir-se como um convite para se questionar: como a maternidade tem sido socialmente apresentada? Como que se regula a sociedade a partir dessas descrições? Que imagens de homem e mulher estão presentes nessas descrições? Que repertórios a mídia tem utilizado para descrever a maternidade? Com que funções eles são utilizados? Que descrições esses repertórios sustentam, permitem ou impedem em suas utilizações? Questões que podem levar a novas questões...

Recebido em: 14/04/2009

Revisão em: 26/02/2010

Aceite em: 23/09/2010

Renata Leite C. Aguiar Moreira é Psicóloga graduada pela Universidade Federal de Uberlândia e Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de Uberlândia. Endereço: Rua Professora Lourdes Naves, 400. Araguari/MG, Brasil. CEP 38.444-000. Email: renatalcamoreira@gmail.com

Emerson F. Rasera é Doutor em Psicologia pela Universidade de São Paulo e Professor da Universidade Federal de Uberlândia. Endereço: Rua Goiás, 467/804. Uberlândia/MG, Brasil. CEP 38400-064. Email: emersonrasera@uol.com.br

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Fev 2011
  • Data do Fascículo
    Dez 2010

Histórico

  • Aceito
    23 Set 2010
  • Revisado
    26 Fev 2010
  • Recebido
    14 Abr 2009
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