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Exigências nos percursos profissionais de gerentes de banco

Demands regarding professional and personal trajectories of bank managers

Resumos

Este artigo aborda os percursos de trabalho e formação de gerentes de bancos públicos e privados da cidade de João Pessoa, desde sua inserção até a promoção à função gerencial. Busca-se compreendê-los à luz de autores que analisam o trabalho e suas transformações, segundo uma perspectiva clínica, a exemplo de Zarifian, Dejours e Schwartz, ao lado daqueles que tratam especificamente do trabalho bancário, como Jinkings, Merlo e Barbarini. Realizaram-se dezesseis entrevistas, com pessoas que exercem gerências gerais ou intermediárias. Evidenciou-se a intensa pressão a que estão submetidos os gerentes quanto à capacitação, alcance de resultados e disponibilidade para a empresa. Constatou-se, entretanto, que, mesmo atendendo aos requisitos exigidos, não há garantia de estabilidade na função. Empresas requisitam sempre mais, solicitando um patamar inalcançável, desgastante para a saúde. Esta pesquisa levanta questionamentos sobre as conquistas relativamente à autonomia e formação profissional, que os gerentes experimentam como efeito da reestruturação bancária.

trabalho; gerentes; percursos profissionais; formação


This paper deals with the trajectory of bank managers in Joao Pessoa with regard their job and education, spanning from their entry in the system up to the point when they hold a management position, searching to understand this through authors who analyze the work and its transformation from a clinical perspective, like Zarifian, Dejours and Schwartz, as well as those that deal with the bank work, as it is the case of Jinkings, Merlo and Barbarini. Sixteen interviews have taken place with general or intermediaries managers. The study showed that they are submitted to a great pressure with respect to their general ability, competence to obtain results and availability to the bank. It was noted, however, that even fulfilling these demands they do not have stability in the position. They argue that the company continually demands further effort, in an unreachable level, spoiling their health. This research addresses some questions and doubts about the benefits with respect to the autonomy and formation that managers are subject as a consequence of the banking system restructuring.

job; managers; professional trajectory; education


Exigências nos percursos profissionais de gerentes de banco

Demands regarding professional and personal trajectories of bank managers

Thaís Augusta Cunha de Oliveira Máximo; Anísio José da Silva Araújo; Paulo César Zambroni-de-Souza; Maria de Fátima Pereira Alberto

Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, Brasil

RESUMO

Este artigo aborda os percursos de trabalho e formação de gerentes de bancos públicos e privados da cidade de João Pessoa, desde sua inserção até a promoção à função gerencial. Busca-se compreendê-los à luz de autores que analisam o trabalho e suas transformações, segundo uma perspectiva clínica, a exemplo de Zarifian, Dejours e Schwartz, ao lado daqueles que tratam especificamente do trabalho bancário, como Jinkings, Merlo e Barbarini. Realizaram-se dezesseis entrevistas, com pessoas que exercem gerências gerais ou intermediárias. Evidenciou-se a intensa pressão a que estão submetidos os gerentes quanto à capacitação, alcance de resultados e disponibilidade para a empresa. Constatou-se, entretanto, que, mesmo atendendo aos requisitos exigidos, não há garantia de estabilidade na função. Empresas requisitam sempre mais, solicitando um patamar inalcançável, desgastante para a saúde. Esta pesquisa levanta questionamentos sobre as conquistas relativamente à autonomia e formação profissional, que os gerentes experimentam como efeito da reestruturação bancária.

Palavras-chave: trabalho; gerentes; percursos profissionais; formação.

ABSTRACT

This paper deals with the trajectory of bank managers in Joao Pessoa with regard their job and education, spanning from their entry in the system up to the point when they hold a management position, searching to understand this through authors who analyze the work and its transformation from a clinical perspective, like Zarifian, Dejours and Schwartz, as well as those that deal with the bank work, as it is the case of Jinkings, Merlo and Barbarini. Sixteen interviews have taken place with general or intermediaries managers. The study showed that they are submitted to a great pressure with respect to their general ability, competence to obtain results and availability to the bank. It was noted, however, that even fulfilling these demands they do not have stability in the position. They argue that the company continually demands further effort, in an unreachable level, spoiling their health. This research addresses some questions and doubts about the benefits with respect to the autonomy and formation that managers are subject as a consequence of the banking system restructuring.

Keywords: job; managers, professional trajectory; education.

Discutimos, neste artigo, os percursos de trabalho e formação de gerentes de bancos públicos e privados da cidade de João Pessoa. Pudemos apreender, por dentro e no seu movimento histórico, as transformações nos requisitos e exigências que recaem sobre esses profissionais em suas atividades. Embora reconhecendo a importância e a pertinência de análises macros, nosso encaminhamento nesta pesquisa foi no sentido de utilizar uma abordagem que foca a atividade de trabalho dos gerentes, enxergando, por este ângulo, as mudanças no trabalho bancário.

Neste sentido, Guèrin, Laville, Daniellou, Duraffourg e Kerguelen (2001) asseveram que o trabalho é sempre situado, ocorre necessariamente em um sítio, em uma polis (em um dado campo de forças), em um espaço-tempo específico. Desse modo, compreender e transformar o trabalho (Clot, 2006) e seus produtos em termos de qualidade, produtividade e competência (Zarifian, 2001) supõe conhecer, entre outras coisas, as características gerais e específicas em que o mesmo se realiza (Dejours, 2008).

O fato dos gerentes serem vistos como representantes das organizações, supostos guardiães de seus interesses, certamente bloqueou durante algum tempo a realização de estudos sobre essa categoria profissional (Willmott, 2005). As recentes reestruturações produtivas retiraram benefícios históricos dos gerentes (poupados em reestruturações anteriores), lançando-os, como a outros trabalhadores, na instabilidade. As empresas passaram a exercer sobre eles uma intensa pressão por resultados, com incidências em vários níveis de suas vidas, especialmente sobre a saúde e a subjetividade. São as mudanças no estatuto e no conteúdo do trabalho gerencial que deram origem à pesquisa da qual esse artigo é uma expressão.

A escolha, dentre as inúmeras possibilidades empíricas, dos gerentes de banco, se lastreia no fato de que o setor financeiro constitui uma das principais facetas do capitalismo globalizado, do que se pode deduzir que sobre eles (os gerentes), enquanto operadores do mercado financeiro, recaem grandes responsabilidades e uma intensa pressão.

Antes de discorrer sobre os caminhos percorridos pelos gerentes, desde a sua inserção no banco até o exercício de funções gerenciais, julgamos necessário fazer um breve desvio para situar as transformações recentes do sistema financeiro, que espelham, por sua vez, mudanças econômicas, políticas, sociais e culturais, em nível mundial (Lombardi, 1997).

1. Transformações recentes no trabalho bancário

Ao focalizarmos o tema do trabalho bancário, nos colocamos a condição de refletir, ainda que brevemente, sobre as profundas transformações que contribuíram para a atual conformação do sistema financeiro. Nesse sentido, cabe destacarmos, a princípio, que um dos grandes diferenciais do setor financeiro é o seu objeto, ou seja, a mercadoria dinheiro, que conferiu ao bancário, desde sua constituição, o status de depositário da riqueza alheia administrada pelo banco (Jinkings, 2002). Entretanto, as modificações no trabalho bancário, que decorreram da incorporação de inovações tecnológicas e organizacionais, fizeram com que, como assinala a autora, a tradicional matéria prima (papel moeda) fosse substituída por dados armazenados e manipulados em sistemas operacionais eletrônicos, resultando em profunda reestruturação da identidade e da atividade bancária.

Com início na década de 1980, essa revolução tecnológica/organizacional ainda se encontra em processo. Entre os seus elementos característicos estão a informatização dos serviços (que possibilitou agilidade e eficiência nas operações) e as mudanças nas formas de gestão e no perfil exigido dos trabalhadores (Grisci & Bessi, 2004). As novas formas de gestão passaram a focalizar uma outra maneira de atendimento aos clientes, como forma de redução de custos e de aumento de lucratividade. Ou seja, os próprios clientes passaram a executar grande parte das operações, até então realizadas pelos escriturários, ficando o espaço das agências destinado, sobretudo, mas não apenas, ao trabalho que depende da intervenção direta dos gerentes.

Assim, através da instalação de caixas eletrônicos de autoatendimento, externos às agências, de serviços por telefone e, mais tarde, pela internet, os bancos puderam oferecer serviços aos clientes aparentemente sem o concurso do trabalho do bancário, fazendo com que os próprios clientes passassem a executar grande parte das operações, via autoatendimento. Paralelamente, porém, o aumento do número de produtos e serviços oferecidos pelos bancos, e a necessidade de comercializá-los e maximizar os lucros, resultaram em alterações significativas na arquitetura das agências, que passaram a destinar mais espaço ao atendimento personalizado (Souza, 2007).

Tal reestruturação representou redução de custos operacionais por meio do fechamento de agências, demissões progressivas de funcionários e terceirização de diversas atividades (Jinkings, 2002; Merlo & Barbarini, 2002). O período que vai do final dos anos 1980 até meados da década de 1990 foram de importante redução do número de empregados nos bancos. Dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos – DIEESE (1997) apontam que, naquele período, os bancos demitiram cerca de 40% dos seus funcionários, passando de 812 mil (em janeiro de 1989) para 497 mil bancários (em dezembro de 1996).

Os anos 2000 trouxeram consigo a progressiva substituição do dinheiro papel pelo dinheiro eletrônico (cartão magnético), e da agência física pela agência eletrônica. Podemos observar, ainda, a transformação das agências bancárias em lojas informatizadas de produtos e serviços (Jinkings, 2002). Consolida-se, desse modo, a focalização no atendimento, em função da crescente oferta de produtos e serviços financeiros, definindo os trabalhadores de banco, em especial os gerentes, como vendedores, sujeitos a metas constantes impostas pelas diretorias dos bancos e a um sistema de remuneração variável (com o intuito de aumentar a produtividade e intensificar o trabalho). Mascia (2007) afirma que os gestores passaram a assumir a tarefa de relação com os clientes e de apresentar as ofertas de produtos e serviços.

2. As novas demandas sobre os gerentes de banco

Netz e Mendes (2006) ressaltam que a categoria bancária parece ser a que melhor reflete a condição moderna do desgaste humano no processo de trabalho, principalmente devido à introdução das novas tecnologias no setor, que ocasionaram uma profunda reestruturação organizacional, tendo como efeitos: desemprego, terceirização, precarização e intensificação do trabalho, além da necessidade de constante atualização profissional.

Nesse sentido, registram-se tentativas de elevação da qualificação do bancário, por meio de políticas de formação, treinamento e da oferta de vários cursos técnicos na própria organização bancária (Larangeira, 1997). Os cursos, no entanto, aumentaram a carga de trabalho, e os bancários passaram a ser reféns dessas requalificações, visto que constituem um pré-requisito para as promoções e até mesmo para a manutenção do emprego (Souza, 2007). Passou-se a exigir do bancário amplo conhecimento do mercado financeiro, domínio da tecnologia das operações financeiras, habilidade no relacionamento com os clientes e com a equipe de vendas e capacidade de decisão frente a imprevistos.

As características pretendidas são: aceitação do risco e da complexidade típicas de um contexto de instabilidade e imprevisibilidade; flexibilidade; capacidade de ação rápida diante de imprevistos e de prazos cada vez mais curtos; resistência ao aumento do ritmo e da carga de trabalho e da cobrança excessiva por bons resultados (Serva & Ferreira, 2006).

Os gerentes que desejam trilhar um caminho bem sucedido na hierarquia da empresa devem estar dispostos a realizar o maior número possível de cursos de capacitação, de especialização, cursos em universidades corporativas e MBA (Master in Business Administration ou Mestre em Administração de Negócios), com o intuito de sempre estarem aptos às novas demandas tecnológicas e dos processos financeiros, ainda que a excessiva capacitação não se constitua como garantia absoluta para assegurar a posição na empresa. Os gerentes se sentem pressionados, pois ao mesmo tempo em que almejam ascensão funcional, temem pela demissão (Almeida, 2006). Como afirma Sennett (1999), é a incerteza como regra que constrange os gerentes a um movimento sem tréguas.

Tremblay (2005) ressalta que as dificuldades para conciliar o trabalho e a vida pessoal têm crescido na atualidade, e isso se deve ao aumento das exigências de flexibilidade e competitividade nas organizações, visto que "fica difícil programar uma vida quando os horários se definem segundo as agendas patronais e os dias de descanso são definidos em função das necessidades da empresa" (Linhart, 2006, p. 4).

A suposição de liberdade na gestão do tempo é outro aspecto ressaltado como prerrogativa do trabalho gerencial, um suposto privilégio não concedido aos demais trabalhadores. No entanto, a experiência gerencial contraria essa representação, pois é sob essa base que se exerce uma exploração sem precedentes, sem retribuição ou pagamento de horas extras (Bouffartigue, 2002), e que torna sem sentido a clássica separação entre vida profissional e vida privada, na medida em que é preciso assistir aulas à noite e/ou nos fins de semana e ainda levar celulares e relatórios para casa.

A pressão psíquica para a obtenção de resultados é intensa e o fracasso no alcance das metas, ainda que outros critérios para a promoção tenham sido atendidos, pode ter como efeito uma demissão imediata, visto que é o desempenho que constitui a dimensão mais valorizada na análise do trabalho.

Tendo esse quadro por referência, o objetivo geral desta pesquisa foi analisar os percursos de trabalho e formação dos gerentes de bancos públicos e privados da cidade de João Pessoa. Como objetivos específicos, estabelecemos os seguintes: identificar as mudanças nos requisitos de inserção e formação na carreira gerencial; e verificar a importância dos coletivos na formação profissional dos gerentes.

No sentido de contemplar nossos objetivos, dirigimos, de início, nossa atenção aos critérios estabelecidos pelos bancos para a conquista e manutenção na função gerencial, com destaque para o tipo de formação profissional exigida dos gerentes. Posteriormente, exploramos algumas possibilidades teóricas existentes para a construção de um processo de formação contextualizado e que, acima de tudo, valorize o saber dos trabalhadores.

3. Método

3.1. Participantes

Participaram deste estudo 16 gerentes de cinco bancos privados (PRIV) e dois bancos públicos (PUB). Desse total, sete ocupavam a função de Gerente Geral (GG), três eram Gerentes de Relacionamento de Pessoa Física (GPF), três eram Gerentes de Atendimento (GAT), dois eram Gerentes de Relacionamento de Pessoa Jurídica (GPJ) e um era Gerente Administrativo (GA).

Dentre os participantes, 15 são do sexo masculino e apenas um é do sexo feminino. As idades variaram entre 28 e 47 anos, com média de 38 anos. Quanto ao estado civil, 13 gerentes são casados, dois são divorciados e um é solteiro. No tocante a quantidade de filhos, a maioria dos entrevistados possui dois filhos.

3.2. Instrumento

Utilizamos o enfoque qualitativo, haja vista o interesse em nos aproximar das experiências subjetivas dos gerentes (Minayo, 2008) a partir de sua atividade de trabalho, entendendo que o diálogo torna-se meio deles próprios construírem conhecimento sobre suas vivências em relação ao trabalho e à formação profissional.

Como instrumento, optamos pela entrevista semiestruturada. Sua flexibilidade favoreceu um contato mais íntimo entre os atores da pesquisa (entrevistador e entrevistado) e, consequentemente, uma exploração profunda dos saberes e crenças do entrevistado e uma melhor compreensão da realidade social (Laville & Dionne, 1999).

Guèrin et al. (2001) admitem que cada resposta a uma pergunta pode ser uma chance para aprofundar um tema através da realização de outra pergunta que não esteja no roteiro, o que pode tornar a descrição mais precisa e rica, além de ajudar o trabalhador a recordar novos fatos relacionados ao tema. O roteiro das entrevistas possuía vinte questões iniciais, que versaram sobre os seguintes temas: trajetória profissional, ascensão dentro da empresa, participação em treinamentos e avaliação dos cursos oferecidos pela organização.

Assim, a ferramenta básica nesta pesquisa foi o contato face a face entre pesquisador e participantes, utilizando a palavra enquanto via privilegiada de acesso à realidade do trabalho. Estamos de acordo com Dejours (1993), quando afirma que é a partir da palavra que pesquisador e participante podem ter acesso à inteligibilidade do que ainda não estava acessível. Concordamos igualmente com Schwartz e Durrive (2007), ao afirmarem que quando as pessoas falam sobre suas experiências de trabalho descobrem relações que não imaginavam antes. Por isso, falar sobre o trabalho é muito mais do que simplesmente descrever a rotina, os modos de se comportar, "é descobrir, é descobri-la por si mesmo, redescobri-la" (p. 179). É por isso que as pessoas, ao refletirem o próprio trabalho, voltam ao seu posto de trabalho com um olhar diferente sobre sua atividade.

3.3. Procedimento

A estratégia de definição dos entrevistados foi do tipo "bola de neve", ou seja, o processo de pesquisa iniciou-se com alguns gerentes indicados pelo Sindicato dos Bancários, na cidade de João Pessoa – PB, que, por sua vez, se desdobraram em outras indicações. As entrevistas, realizadas no período de maio a dezembro de 2007, foram encerradas tendo como critério a saturação, que, segundo Minayo (2008), pode ser operacionalmente definida como a suspensão de inclusão de novos participantes, quando os dados obtidos passam a apresentar, na avaliação do pesquisador, certa redundância ou repetição.

De posse desses nomes, agendamos as entrevistas individualmente. Algumas foram agendadas por telefone, outras pessoalmente. Das 16 entrevistas realizadas, apenas três foram agendadas dentro do horário em que o banco estava aberto ao público, a pedido dos próprios participantes. As demais aconteceram antes da abertura das agências ou após o fechamento das mesmas. Quanto ao local de realização da entrevista, apenas uma deu-se fora do ambiente de trabalho, em uma sala na Universidade Federal da Paraíba. Todas as outras tiveram como lócus o banco, na própria mesa dos gerentes ou em salas mais reservadas, a critério do entrevistado. A duração média das entrevistas foi de 45 minutos.

Antes do início das entrevistas, reservamos um momento para a explicação dos objetivos do estudo e assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, conforme exigências éticas.

Importante assinalar que, mesmo que as entrevistas tenham ocorrido em momentos nos quais o banco estivesse fechado, o nível de interrupção foi bastante alto, envolvendo o toque constante de celular ou telefone do banco, solicitações de assinaturas para realização de procedimentos ou pendências para resolver antes e após o expediente oficial.

3.4. Análise dos dados

Como dissemos, buscamos nessa pesquisa analisar os percursos de trabalho e formação desses gerentes em face das transformações ocorridas nos últimos anos no trabalho bancário. Desse modo, nosso foco foi a atividade e a formação para o trabalho. A fim de melhor evidenciar esse percurso de trabalho e formação, nos valemos da análise de conteúdo temática, que nos possibilitou uma interpretação sistemática das falas dos participantes do estudo, permitindo-nos organizar e dar visibilidade aos elementos construídos nas entrevistas. Pudemos, dessa maneira, "desmontar a estrutura e os elementos do conteúdo para esclarecer suas diferentes características e extrair sua significação" (Laville & Dionne, 1999, p. 214).

O primeiro momento da Análise de Conteúdo foi, portanto, destinado à organização dos dados construídos, por meio da transcrição das entrevistas, a fim de manejar com maior clareza o material, ao longo do processo de análise. Posteriormente, fizemos um estudo minucioso de todo o conteúdo, a fim de nos familiarizarmos com os dados construídos a partir das entrevistas.

Optamos pelo recorte de conteúdo a partir de temas, ou seja, foram selecionados fragmentos dos depoimentos de acordo com suas similaridades ou particularidades, que compuseram os núcleos de sentido, de acordo com a frequência de ocorrência e, principalmente, com a importância de cada um dos elementos na totalidade da pesquisa.

4. Resultados e Discussão

Apresentamos, neste tópico, os dados produzidos na pesquisa no que diz respeito à trajetória profissional (focalizando as formas de inserção dos gerentes nos bancos e os modos de construção da carreira), à formação escolar e profissional e ao lugar do coletivo na construção de suas competências. Utilizaremos legendas entre parênteses no final de cada depoimento, que correspondem ao número atribuído ao participante em função da ordem em que fora entrevistado, à função desempenhada e ao tipo de banco em que trabalha; que seguem o mesmo padrão da legenda proposta na seção Método.

4.1. Trajetória Profissional

Estruturamos a discussão sobre a trajetória profissional, contemplando tanto as formas pelas quais se deu a inserção na carreira bancária quanto os caminhos percorridos desde a inserção até a ocupação de uma função gerencial, enfocando os critérios utilizados, ao longo do tempo, para a progressão profissional, nas diferentes organizações bancárias.

A carreira bancária teve início muito cedo para a maioria dos entrevistados, geralmente entre os 16 e 18 anos, sendo o banco o primeiro emprego, nas funções de estagiário ou contínuo (office boy). Nesse contexto, a inserção no banco funcionava como uma possibilidade de conciliação do trabalho com os estudos, visto que o expediente bancário era apenas de seis horas, de segunda a sexta-feira, como afirma um GPF: "devido à faculdade, aí eu optei pela carreira bancária, por trabalhar só até a sexta, de segunda a sexta, e ter um horário mais reduzido" (02, GPF, PUB).

A carreira bancária também se apresentou, para muitos dos entrevistados de origem em classes sociais baixas e/ou do interior do estado, como um meio de projeção social e econômica, pois viam no emprego bancário uma oportunidade de estabilidade e crescimento profissional, como afirmam os participantes: "trabalhar em banco sempre foi um sonho" (03, GPF, PUB) e "é um projeto de criança trabalhar em banco. Eu sou do interior ... e meu sonho era entrar pra ser menor aprendiz e posteriormente fazer um concurso pro banco e seguir carreira" (11, GPJ, PRIV).

Como bem ressalta Jinkings (2002), a representação que se construiu em torno do bancário sempre esteve relacionada à imagem de homem de bem, exemplo de honestidade, de ética e de bons costumes. Apesar de Grisci e Bessi (2004) afirmarem que, a partir da década de 60, o status social da profissão e a perspectiva de carreira terem entrado em declínio, esses elementos ainda se apresentaram como os principais motivos de procura dessa profissão.

No que se refere à trajetória profissional, é preciso destacar que, tanto em bancos públicos quanto privados, duas situações típicas se apresentaram: a daqueles que entraram nos anos 80 e que demoraram, em média, 10 a 20 anos para serem promovidos a gerentes; e a dos que tiveram sua inserção nos anos 1990 e 2000 e que ascenderam em menos de cinco anos à função gerencial.

Analisando a conjuntura histórica e econômica do trabalho bancário, constatamos que a profunda reestruturação pela qual o setor passou, desencadeou uma postura de enxugamento e de achatamento dos organogramas das instituições financeiras (Merlo & Barbarini, 2002), o que repercutiu na diminuição dos degraus que o funcionário deveria galgar para ascender profissionalmente. Se antes, o indivíduo entrava como contínuo e seguia uma longa e demorada carreira até assumir o posto maior na agência, atualmente, embora ele ainda exerça várias funções ao longo da carreira, sua trajetória de ascensão ao posto gerencial é mais rápida.

Como exemplo dos bancários que entraram na década de 1980 e passaram por um longo período de espera até chegarem à função gerencial está um GG, de um banco privado, que afirma: "Comecei como contínuo em 1987, e como o banco tem um sistema de carreira fechada, eu fui galgando cargos. Fui supervisor, escriturário, caixa, e hoje eu estou como gerente geral há dois anos na função" (08, GG, PRIV). Ou seja, ele entrou no banco como contínuo em 1987 e só assumiu a função de gerente geral em 2005, demorando cerca de 18 anos para alcançar o cargo maior dentro de uma agência.

Paralelamente, um dos GPF, de um banco público, admite: "entrei em 2000 e, enfim, de 2000 pra cá, minha trajetória foi bem rápida assim, de ascensão. Eu fiquei somente dois anos sem ser como gerente. Eu já sou gerente há cinco anos" (03, GPF, PUB).

Independente do período de espera para a promoção, os dados indicam que todos os funcionários necessitam percorrer vários postos anteriores ao gerencial, diferindo apenas quanto ao período de tempo que passaram em cada uma dessas funções.

Os próprios gerentes parecem sinalizar para essa diferença histórica quanto à promoção de função. Um deles assim afirmou em seu depoimento:

quando eu entrei, a gente demorava muito pra galgar um cargo. E hoje, uma das coisas que mudou, é que antes considerava tempo de serviço, hoje não, hoje se você tiver um desempenho bom, com certeza você já galga o cargo mais rápido. Hoje nós já temos na empresa gerentes com três anos de banco, quatro anos de banco, já exercendo cargo de gerente, que já é um alto cargo na empresa (10, GG, PUB).

Refletindo sobre os requisitos do banco para a promoção de funcionários ao nível gerencial, podemos ver que o desempenho é atualmente determinante, ao contrário de anos atrás, em que prevalecia o tempo de serviço. Segundo Zarifian (2001), na lógica do trabalho atual, a experiência não está mais associada à antiguidade nos postos de trabalho. O autor sinaliza que a antiguidade em um posto de trabalho não se constitui mais como um critério discriminante para avaliar a qualificação de um trabalhador, mas sim, a flexibilidade, o alcance de resultados e a variedade de situações enfrentadas pelo mesmo. Tal diversidade está diretamente relacionada ao grau de disponibilidade para mudar de agência, de cidade e de estratégias.

Outro tema levantado nas falas dos participantes diz respeito às formas de seleção para se tornar gerente. Em um dos bancos públicos, a seleção ocorre por meio de um processo seletivo interno. Em contrapartida, um gerente do outro banco público afirmou que os critérios para promoção ainda estão sendo aprimorados, de modo que melhor avaliem as competências de cada um para exercer o cargo. Ele afirma que o banco em que trabalha não faz um concurso interno, com realização de provas, mas uma espécie de seleção, e denuncia sua frustração em saber que nem sempre os critérios utilizados são justos:

eu sou um exemplo porque participei de todas as etapas do processo seletivo, mas eu sei que existe muita indicação, e já fui frustrado por uma indicação, uma não, por várias, umas três indicações, que a pessoa não estava nem na lista e foi chamado (15, GAT, PUB).

Em relação aos bancos privados, o critério mais utilizado para a promoção ainda é a indicação por parte dos superiores hierárquicos, tomando por base o desempenho do funcionário. Um dos gerentes gerais entrevistados ressalta que "a promoção é sempre por indicação interna ... não tem uma prova como alguns bancos estatais, que tem que fazer prova, é indicação, é pelo seu desempenho, é pela sua motivação, pelo seu interesse em aprender" (08, GG, PRIV). Mais uma vez, o desempenho emerge como exigência para o sucesso, como diferencial para alcançar e permanecer na função gerencial.

Novamente concordamos com Dejours (2008), quando faz uma crítica a essa visão contemporânea de avaliação do trabalho, calcada exclusivamente no desempenho. Ele ressalta que muitas tarefas ou funções de um trabalhador demandam uma mobilização subjetiva que não é visível por meio de resultados financeiros. Por isso, trabalhadores que conseguem faturamentos elevados não são necessariamente os que trabalham mais ou melhor.

4.2. Formação Profissional

Dentre as inúmeras transformações pelas quais o sistema financeiro vem passando, uma das mais significativas é, sem dúvida, o novo conceito de gestão adotado. Em meio às inúmeras exigências feitas aos trabalhadores, a formação profissional constitui condição indispensável para progressão funcional e, até mesmo, para manutenção do emprego, muito embora não seja garantia de estabilidade. Segundo Jinkings (2002), é comum a exclusão dos trabalhadores considerados menos qualificados ou não adaptados aos princípios de excelência e qualidade. Druck et al. (2002, p. 218) afirmam que "a volatilidade, a flexibilidade e a descartabilidade vão impregnando as relações sociais" no trabalho, e, nesse sentido, não é apenas o dinheiro que se torna descartável e volátil, mas também os homens e as mulheres que vivem do trabalho.

Constatamos, inicialmente, que nenhum dos entrevistados cogita a possibilidade de não ter o ensino superior concluído. Do total de participantes, nove possuem superior completo; quatro possuem superior em curso e três declararam ter cursado MBA ou outra pós-graduação. Dos que possuem superior completo, alguns concluíram mais de um curso. Entre as principais áreas de formação estão Ciências Contábeis, Administração e Economia, áreas mais relacionadas ao sistema financeiro.

Analisando as questões relativas à formação para o exercício da função gerencial, podemos apontar, mais uma vez, a distinção entre a formação oferecida pelos bancos há algumas décadas atrás e a formação atual, realizada por meio das Universidades Corporativas e dos Cursos on line. Os gerentes que adentraram os bancos na década de 1980 relatam que não havia cursos específicos para o exercício da função gerencial. Quando, porventura, algum curso era oferecido, o era em resposta às demandas das situações de trabalho. Além disso, os bancos não incentivavam a formação superior, como confirmou um gerente geral de um banco privado:

Eu, quando entrei no banco, há 20 anos, o gerente dizia para mim: ou você estuda ou você trabalha. Era assim. Você não tinha opção. Só que de uns 10 anos, 15 anos pra cá, o que é que o banco permitiu? Que você estude. Você tem que estudar! Porque o banco começou a exigir, até para promover tem que ter curso superior. Agora querem que faça uma pós. Porque o curso superior daqui a dois, três anos não vai valer mais de nada. Só uma pós-graduação, um mestrado, doutorado, e aí vai, eu não quero parar. (08, GG, PRIV)

Com esse depoimento, constatamos que, até a década de 1980, a formação acadêmica não era valorizada pelas empresas como o é hoje. Contudo, atualmente, a formação tornou-se objeto de negociação no mercado do emprego, e a filosofia que rege os executivos é a de que quanto mais instrução, maiores serão os rendimentos e as oportunidades profissionais (Alauf, 2007). A formação torna-se, cada vez mais, uma moeda de troca, um meio de sobrevivência no que Gaulejac (2007) chama de guerra dos negócios. A formação contínua é a palavra de ordem para os que querem continuar no mercado, mesmo que isto não seja garantia de permanência nele, já que em pouco tempo esse patrimônio pode não valer mais nada, como aponta o entrevistado. Este quadro é coerente com as transformações ocorridas a partir da década de 1970, quando, em função da crise do capitalismo mundial, "surge a demanda de um 'superprofissional', altamente qualificado para atender às novas exigências do capital" (Borges, 2004, p. 46).

Isso se reflete nos depoimentos dos gerentes que assumiram a função recentemente, os quais admitem que o banco hoje oferece uma gama de cursos e possibilidades de formação profissional oferecida como gratuita. Apontamos aqui, no entanto, os possíveis custos na vida pessoal destes trabalhadores, que passam a dedicar noites e finais de semana a estes cursos. Quando questionados sobre o que os gerentes faziam em seu tempo extra trabalho, muitos deles destacaram a realização de faculdade e cursos de atualização, ou seja, para atender à intensa necessidade de atualização e formação os gerentes precisam dispor de seu tempo 'livre'. Os gerentes destacam:

Eu procuro ler, ler revista, televisão, adoro televisão. Cheguei em casa eu já ligo a televisão. Ver reportagens, eu procuro sempre me atualizar. Todo dia de manhã eu leio o jornal todo ... Ou então via Internet, fazer uns cursos, o banco dá uns cursos pela Internet pra gente fazer (08, GG, PRIV).

O pós-atendimento é esse de você checar tudo, de você olhar e-mail, de você fazer algum curso, algum treinamento, ler os normativos, ficar atualizado. Então foge do horário de atendimento e das atividades de rotina. Você tem que ficar atualizado e não dá pra você fazer isso no horário normal. (02, GPF, PUB)

O aperfeiçoamento envolve desde cursos de formação para a função gerencial, programas de trainee, até cursos periódicos específicos para cada área de trabalho. Nessas situações, as disciplinas ministradas situam-se em torno de conhecimentos técnicos e bancários e gestão de pessoas. A fala de um dos GG confirma tal realidade. Segundo ele, "o banco, nessa área de treinamento, o banco investe muito nos funcionários. ... E depois que você assume a função de gerente, aí existe uma onda de cursos, que quando você passa a ser gerente geral fica muito mais (08, GG, PRIV).

Ou seja, atualmente, os treinamentos estão presentes em quase todas as organizações bancárias, mas tanto a literatura (Durrive, 2002; Maggi, 2006; Schwartz & Durrive, 2007; Vasconcelos & Lacomblez, 2004) quanto os entrevistados concordam que estes são insuficientes para a apreensão do trabalho a ser realizado. Algumas declarações dos gerentes entrevistados refletem tal dificuldade, como esta de um GPJ: "Existem os treinamentos, só que não são suficientes pra você se tornar de imediato um bom gerente, um bom, um bom gerente de contas" (11, GPJ, PRIV).

Segundo Vasconcelos e Lacomblez (2004), para que a formação seja realmente eficaz é necessário que uma nova postura seja adotada, que considere o fato de que os diferentes tipos de saberes que as pessoas mobilizam em seu trabalho não são independentes entre si, nem podem ser dissociados da própria pessoa, das circunstâncias da sua aquisição e do contexto de sua utilização, tornando urgente a necessidade de articulação entre os saberes acadêmicos e os saberes práticos dos trabalhadores.

Schwartz e Durrive (2007) refletem sobre o slogan 'formar-se no decorrer de toda a sua vida' que, atualmente, é moda dentro das corporações e que, segundo nossa avaliação, é fonte de grande pressão, por vezes patogênica, sobre os trabalhadores. Aqueles autores afirmam que a aprendizagem é permanente e ocorre sob duas vias: a dos conceitos, ou o aprendizado formal técnico-científico; e a via da experiência dos outros (dos coletivos de trabalho) e de si próprio na atividade. Os conceitos são necessários, é verdade. Contudo, devemos considerar que a atividade solicita às pessoas saberes que ainda não foram produzidos, inéditos até então.

Dessa forma, não podemos conceber formação sem que haja uma articulação entre essas duas vias, pois "conhecer o trabalho e preparar-se para ele significa, de algum modo, preparar-se para essa dupla antecipação permanente, porque, se nos limitarmos ao modo pelo qual os conceitos e os saberes antecipam as atividades, veremos somente um lado das coisas" (Schwartz & Durrive, 2007, p. 149). Maggi (2006) também critica a formação vista como a realização de cursos estanques, pois, segundo ele, a atividade implica um processo constante de aprendizado. Para esse autor, a formação deve ser dinâmica e contribuir para a integração entre conhecimentos teóricos e a experiência prática.

4.3. O lugar do coletivo

Perante a insuficiência dos cursos formais, os colegas de trabalho surgem como instrumento valioso de aprendizado e tutoria, transmitindo seus saberes práticos aos novos gerentes, elemento que se apresenta também em outras categorias profissionais (Athayde, 1996; Figueiredo, Alvarez, Athayde, Suarez, & Pereira, 2007). É o coletivo de trabalho que retém a história do trabalho coletivo, que fornece as regras ou jurisprudências para a atividade (prescrições informais da atividade). O coletivo de trabalho corresponde ao gênero profissional, que se constitui das maneiras de fazer situadas em um determinado contexto histórico cultural para um certo ofício. Clot (2006) conceitua gênero profissional como sendo um intercalar social situado entre os sujeitos, por um lado, e entre eles e o objeto de trabalho, por outro, funcionando como fator de união entre os trabalhadores que compartilham daquela atividade, e, portanto, conhecem, compreendem e avaliam uma situação da mesma maneira.

Os gerentes referiram-se recorrentemente à importância que seus pares tiveram e ainda têm para o exercício de sua atividade. Um deles relata:

se eu disser a você que eu fui preparado para isso, eu estou mentido, eu acho que ninguém foi preparado, você é colocado. ... eu já tinha uma noção do que era banco, e com a ajuda dos colegas você consegue desenvolver um bom trabalho. (11, GPJ, PRIV)

Eles também relataram a dificuldade em se inserir na função quando confrontados com a ausência desse coletivo, como ilustra esta fala de um GG:

quando eu era trainee de gerente, que eu estava em formação, todos os gerentes da minha agência foram demitidos, ficou só eu ... e eu precisava de alguém pra estar do meu lado, porque nem tudo você aprende num curso muito rápido, eu ficava meio doidinho com isso. (01, GG, PRIV)

Com relação a esse aspecto, Clot (2007) ressalta que para a eficácia da atividade é necessário que o sujeito acesse seus recursos pessoais (oriundos de sua experiência de vida, qualificação, características pessoais, entre outros) e os recursos de seu grupo profissional, principalmente porque a relação com os outros no trabalho "não é apenas um contexto. É constitutiva da própria atividade" (p. 270). Ou seja, a atividade nunca é um mero atributo pessoal, mas se forma e se transforma por meio da relação com os outros.

5. Considerações finais

Entendemos que uma das faces mais marcantes da lógica atual do sistema financeiro é a da pressão: pressão por resultados, por aperfeiçoamentos teóricos, por constante atualização, pela manutenção do emprego e do status social e por dedicação integral à empresa. Por mais que os gerentes se esforcem em alcançar esse patamar de perfeição, sacrificando, inclusive, sua vida pessoal, permanece a sensação de que este sempre se afasta, através da constituição de novas demandas, novas metas e requisitos mais difíceis de serem cumpridos.

Mas, realmente, o excesso de treinamentos, especializações e universidades corporativas são suficientes para atender as variabilidades impostas pela atividade gerencial? O esforço em atender a esses requisitos é garantia de um futuro profissional seguro? Os gerentes realmente se sentem preparados para a função após participarem desses inúmeros cursos? Os gerentes que entrevistamos, em sua maioria, relataram que a atividade em si supera os limites dos conteúdos formais ministrados, e que o aprendizado efetivo se dá por meio da vivência prática e da relação com os colegas, mesmo que permaneça, a cada dia, a sensação de um dever apenas parcialmente cumprido, já que as pressões estão sempre crescendo e se transformando. Assim, ainda que todos esses critérios sejam cumpridos, isso não se constitui certeza de um período de estabilidade no emprego, pois, algum tempo depois, uma meta descumprida pode ser motivo para a perda da função.

É preciso questionarmos as metas sempre maiores, os cursos infindáveis, a exploração intensa do trabalhador, o perfil inatingível a que os gerentes são submetidos, ainda que, muitas vezes, estes se mostrem conformados, a ponto de assumir todas as responsabilidades e demandas sem questionar, e até se culpando por possíveis consequências de um trabalho deletério para sua saúde. Este artigo foca, portanto, a dinâmica das exigências na trajetória de gerentes de banco, e as possíveis consequências em seu trabalho e suas vidas. Pretendemos, deste modo, estimular o debate sobre as implicações dessa lógica sobre o trinômio qualidade, produtividade e saúde.

Nota

* Este artigo é fruto de pesquisa de dissertação da autora principal, com apoio da CAPES.

Recebido em: 02/05/2009

Revisão em: 06/04/2010

Aceite final em: 27/07/2010

Thaís Augusta Cunha de Oliveira Máximo é Doutoranda em Psicologia Social da Universidade Federal da Paraíba. Endereço: Universidade Federal da Paraíba. Cidade Universitária. João Pessoa/PB, Brasil. CEP 58059-200. Email: thaisaugusta@hotmail.com

Anísio José da Silva Araújo é Docente do Departamento de Psicologia e do Mestrado em Psicologia Social da Universidade Federal da Paraíba. Membro do Grupo de Pesquisa Subjetividade e Trabalho.

Paulo César Zambroni-de-Souza é Docente do Departamento de Psicologia e do Mestrado em Psicologia Social da Universidade Federal da Paraíba. Membro dos grupos de pesquisa "Subjetividade e Trabalho" e "Atividade – Ergologia, trabalho e dialogia".

Maria de Fátima Pereira Alberto é Docente dos Programas de Mestrado e Doutorado em Psicologia Social da Universidade Federal da Paraíba. Coordenadora do Núcleo de Pesquisas e Estudos sobre o Desenvolvimento da Infância e da Adolescência (NUPEDIA).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Jun 2011
  • Data do Fascículo
    Abr 2011

Histórico

  • Recebido
    02 Maio 2009
  • Revisado
    06 Abr 2010
  • Aceito
    27 Jul 2010
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