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Articulações entre gênero e raça/cor em situações de violência de gênero

Gender and race/color articulations in gender violence

Articulaciones entre género y raza/color en situaciones de violencia de género

Resumos

Este artigo discute teoricamente as articulações entre gênero e raça/cor na temática da violência de gênero nas relações de intimidade. A fundamentação teórica é composta pelos estudos de Michel Foucault sobre as relações de poder, pelos estudos contemporâneos de gênero (Joan Scott, Heleith Saffioti, Karin Smigay) e pelos estudos de raça/cor (Florestan Fernandes, Lilia Schwarcz). O trabalho de campo, envolvendo entrevistas e análise de andamento de processos judiciais, foi desenvolvido no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e na Delegacia da Mulher, em Porto Alegre, no período de maio de 2010 a outubro de 2011. Destaca-se como necessária a problematização sobre as formas como as questões de raça/cor se entrecruzam nos discursos sobre violência de gênero nas relações de intimidade, uma vez que a maneira como as vulnerabilidades são vividas pelas mulheres variam fortemente de acordo com suas experiências singulares de vida e com os marcadores sociais.

violência de gênero; raça/cor; Lei Maria da Penha; articulação; direitos humanos


This article discusses theoretically the gender/race articulation in gender violence in intimacy relationships. The theoretical-methodological approach is based in Michel Foucault's analysis of power relations and contemporary gender studies (Joan Scott, Heleith Saffioti, Karin Smigay) as well as race and color studies (Florestan Fernandes, Lilia Schwarcz). The field work, including interviews and processes' analysis using a convenience sample was conducted in the domestic and familiar violence judgeship and women's police station, in the city of Porto Alegre from May 2010 until October 2011. We reaffirm the necessary discussion about how race/color is intercrossed in the gender violence in intimacy situations, once vulnerabilities are lived in different ways depending on women singular life experiences and its social determinants.

gender violence; race/color; Maria da Penha's law; articulation; human rights


Este trabajo discute teóricamente las articulaciones entre género y raza/color en el tema de la violencia de género dentro de las relaciones íntimas. El marco teórico se compone de los estúdios de Michel Foucault sobre las relaciones de poder, por estúdios contemporáneos de género (Joan Scott, Heleith Saffioti, Karin Smigay) y por estúdios de raza/color (Florestan Fernandes, Lilia Schwarcz). El trabajo de campo, compuesto por entrevistas y análisis de procesos judiciales no concluídos, se desarrolló en el Juzgado de Violencia Doméstica y Familiar contra la Mujer y en la Comisaría de la Mujer, en Porto Alegre, en el período de Mayo 2010 a Octubre de 2011. El cuestionamento de las formas en que las cuestiones de raza / color se entrecruzan en los discursos sobre la violencia de género en las relaciones íntimas es necesario, ya que la forma como las vulnerabilidades son experimentadas por las mujeres varían mucho de acuerdo a sus experiencias de vida únicas y los marcadores sociales.

violencia de género; raza/color; Ley Maria da Penha; articulación; derechos humanos


ARTIGOS

Articulações entre gênero e raça/cor em situações de violência de gênero

Articulaciones entre género y raza/color en situaciones de violencia de género

Gender and race/color articulations in gender violence

Raquel da Silva SilveiraI; Henrique Caetano NardiI; Giselle SpindlerII

IUniversidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil

IICentro Universitário Ritter dos Reis, Porto Alegre/RS, Brasil

RESUMO

Este artigo discute teoricamente as articulações entre gênero e raça/cor na temática da violência de gênero nas relações de intimidade. A fundamentação teórica é composta pelos estudos de Michel Foucault sobre as relações de poder, pelos estudos contemporâneos de gênero (Joan Scott, Heleith Saffioti, Karin Smigay) e pelos estudos de raça/cor (Florestan Fernandes, Lilia Schwarcz). O trabalho de campo, envolvendo entrevistas e análise de andamento de processos judiciais, foi desenvolvido no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e na Delegacia da Mulher, em Porto Alegre, no período de maio de 2010 a outubro de 2011. Destaca-se como necessária a problematização sobre as formas como as questões de raça/cor se entrecruzam nos discursos sobre violência de gênero nas relações de intimidade, uma vez que a maneira como as vulnerabilidades são vividas pelas mulheres variam fortemente de acordo com suas experiências singulares de vida e com os marcadores sociais.

Palavras-chave: violência de gênero; raça/cor; Lei Maria da Penha; articulação; direitos humanos.

RESUMEN

Este trabajo discute teóricamente las articulaciones entre género y raza/color en el tema de la violencia de género dentro de las relaciones íntimas. El marco teórico se compone de los estúdios de Michel Foucault sobre las relaciones de poder, por estúdios contemporáneos de género (Joan Scott, Heleith Saffioti, Karin Smigay) y por estúdios de raza/color (Florestan Fernandes, Lilia Schwarcz). El trabajo de campo, compuesto por entrevistas y análisis de procesos judiciales no concluídos, se desarrolló en el Juzgado de Violencia Doméstica y Familiar contra la Mujer y en la Comisaría de la Mujer, en Porto Alegre, en el período de Mayo 2010 a Octubre de 2011. El cuestionamento de las formas en que las cuestiones de raza / color se entrecruzan en los discursos sobre la violencia de género en las relaciones íntimas es necesario, ya que la forma como las vulnerabilidades son experimentadas por las mujeres varían mucho de acuerdo a sus experiencias de vida únicas y los marcadores sociales.

Palabras clave: violencia de género; raza/color; Ley Maria da Penha; articulación; derechos humanos.

ABSTRACT

This article discusses theoretically the gender/race articulation in gender violence in intimacy relationships. The theoretical-methodological approach is based in Michel Foucault's analysis of power relations and contemporary gender studies (Joan Scott, Heleith Saffioti, Karin Smigay) as well as race and color studies (Florestan Fernandes, Lilia Schwarcz). The field work, including interviews and processes' analysis using a convenience sample was conducted in the domestic and familiar violence judgeship and women's police station, in the city of Porto Alegre from May 2010 until October 2011. We reaffirm the necessary discussion about how race/color is intercrossed in the gender violence in intimacy situations, once vulnerabilities are lived in different ways depending on women singular life experiences and its social determinants.

Keywords: gender violence; race/color; Maria da Penha's law; articulation; human rights.

A violência contra a mulher foi por séculos vivida de forma silenciosa e individualizada, garantida pelos princípios da inviolabilidade do mundo privado. Como forma de denúncia e de luta contra as formas institucionais e não institucionais de dominação masculina, o movimento feminista foi responsável por denunciar a violência de gênero como algo de dimensão pública e coletiva. Desde a década de 1960, as feministas têm lutado para incluí-la na agenda política das violações de Direitos Humanos e fomentado o debate coletivo de que "o privado é político" (Smigay, 1989, 2002). Todavia, somente em 1993 a questão da igualdade de gênero foi explicitada na Conferência dos Direitos Humanos de Viena. É evidente, portanto, que o discurso jurídico que reconhece a violência de gênero nas relações de intimidade como violação de Direitos Humanos é algo recente nos jogos de verdade que legitimam e hierarquizam as posições de homens e mulheres no mundo ocidental.

Demarcar as distintas formas como diferentes mulheres foram submetidas à dominação masculina também é algo recente (Brah, 1996/2006; Carneiro, 2003; Crenshaw, 2002). Somente em 1993 acontece o Seminário Nacional de "Políticas e Direitos Reprodutivos das Mulheres Negras", um importante evento brasileiro que abordou as especificidades da violência contra as mulheres negras. No campo teórico, os estudos de gênero têm sido profícuos, produzindo grandes embates políticos, mas apenas recentemente ampliou-se o debate em relação às diferentes formas de dominação e subordinação de mulheres de distintas origens, raças, etnias, idades e condições socioeconômicas, cujos direitos e conquistas, assim como retrocessos, dependem das relações de poder que configuram as hierarquias sexuais e de gênero nas diversas regiões do globo (Brah, 1996/2006; Crenshaw, 2002; Stolke, 2006).

Muitos estudos têm apontado a predominância de estruturas sociais em que a mulher ocupou e ocupa posições de submissão e subordinação ao homem (Bourdieu, 1998/2007; Engels, 1884/2003; Saffioti, 2005). Essas formas de organização nos foram por muito tempo apresentadas como naturais, ou seja, ligadas à inscrição de diferenças biológicas dos corpos, em que se destacam, por um lado, a maior força física do homem, sua capacidade de raciocínio lógico e, pelo outro, a responsabilidade pela gestação e amamentação dos filhos/as da mulher, assim como sua maior sensibilidade afetiva inata. Esses enunciados legitimaram como verdade a superioridade masculina como determinada pela natureza. De acordo com Pierre Bourdieu (1998/2007) e Heleieth Saffioti (2005), o sistema patriarcal de dominação masculina está enraizado arcaicamente nas relações humanas, estando inscrito nas práticas cotidianas de nossas vidas e, por essa razão, se torna tão difícil sua desconstrução. As relações de poder entre homens e mulheres são marcadas, ainda, por posições sociais pouco reversíveis, gerando desigualdades econômicas e sociais.

Como aponta Michel Foucault (1979/1996), o poder é uma ação que se exerce sobre a ação dos outros e, portanto, faz parte de todas as relações que vamos estabelecendo nos encontros da vida. Para esse autor, as relações de poder são constitutivas do humano e, desde que vividas entre sujeitos "livres", elas sempre vão ser tensionadas pelas capacidades estratégicas de reversão internas às distintas formas de dominação. Foucault (1984/2001) fala da intransigência da liberdade e de quanto o poder também é produtivo, pois, assim como produz assujeitamentos, também produz a necessidade de lutar, de criar estratégias para dinamizar o jogo de forças que as opressões impõem. Para esse autor, a ausência de dominação não é possível, em virtude do conjunto de regramentos sociais no qual o sujeito está imerso, mas a capacidade de resistir também está sempre presente quando existe liberdade. Dessa forma, o que podemos fazer é trazer a ética para o campo das relações cotidianas que marcam a microfísica do poder, exercitando-a como prática reflexiva da liberdade e, dessa forma, alterando os jogos de poder para que obedeçam a relações de forças mais equânimes. As situações em que a possibilidade de resistência é inexistente ou muito pequena, Foucault denominará de coação, e não de relação de poder.

Outro ponto importante da perspectiva de análise foucaultiana das formas de legitimação e das formas de dominação é que a verdade é construída como uma rede discursiva que emerge nas relações sócio-históricas e é por essas alçada ao estatuto de regime de verdade. Assim sendo, as relações de gênero não estão inscritas em uma matriz biológica que define a priori sua formatação. Elas são constituídas nos jogos de saber-poder em que estamos imersos, os quais produzem nossos corpos e as formas que assumem as relações. É nessa direção que podemos compreender as condições políticas da emergência dos regimes de verdade, o que os sustenta hoje e a maneira como reiteram sua naturalização (Foucault, 1984/1994).

Estes dois conceitos chaves da obra de Foucault, poder-resistência e regimes/jogos de verdade, são fundamentais para a análise dos modos de dominação que demarcam posições distintas para homens e mulheres em nossa sociedade.

Dentro do grande tema da violência de gênero, no qual a mulher figura como uma das maiores vítimas, a violência emerge como um problema social grave, frequente, persistente e de difícil combate. Por tratar-se de algo que acontece na intimidade das relações afetivas e familiares, a sua explicitação como violação de direitos e como testemunho explícito da permanência de relações patriarcais não é uma tarefa fácil. Segundo Karin Smigay (2002, p. 44), a sociedade se organiza num sistema de gênero e, por isso mesmo, não podemos esquecer que "o privado é político. É a política de gênero que informa tais relações, que as cristaliza e lhes fornece os contornos precisos: é ela que estrutura as relações. Mais: estrutura as relações pela violência". Nesse contexto, compreende-se por que a possibilidade de o Estado intervir na intimidade da instituição familiar, ou seja, tornar um problema público e coletivo uma vivência privada, a qual muitas vezes é experimentada de forma individual, sem dúvida é uma problemática complexa (Saffioti, 2005; Soares, 1999).

A Lei Maria da Penha e as novas políticas públicas no enfrentamento da violência contra as mulheres

A ideia da mulher como um sujeito de direitos plenos é uma questão nova no discurso jurídico dos Estados Modernos. Somente no século XX é que o movimento feminista conseguirá pautar agendas públicas de reconhecimento e regulação dos seus direitos. Nesse contexto, as relações desiguais entre homens e mulheres deixam de ser "naturais". Segundo Scott (1988/1995), o conceito de gênero foi fundamental para explicar como as diferenças foram transformadas em desigualdades através de um processo histórico, político e relacional de dominação masculina/submissão feminina. O salto de uma discussão centrada na natureza para uma reflexão crítica sobre a política das relações é que permitiu o processo de desconstrução dos estereótipos e de luta pela igualdade de direitos entre homens e mulheres.

No Brasil, a década de 1980 marca um dos primeiros avanços na conquista do reconhecimento da violência de gênero com a criação das "Delegacias da Mulher", as quais vão atuar no sentido de reconhecer a revitimização que as mulheres em situação de violência viviam nas instituições públicas (Moreira, 1989).

Apesar dessas conquistas, o tratamento jurídico dado aos casos de violência de gênero nas relações de intimidade no Brasil vinha sendo alvo de muitas críticas. O Poder Judiciário parecia caminhar na contramão dos compromissos assumidos pelo Estado brasileiro com os documentos internacionais de luta contra a erradicação desse tipo de violação de direitos. Em seus estudos sobre o papel do sistema judiciário nos casos de violência conjugal -mesmo nos casos mais graves como o homicídio –, Wânia Pasinato (2004) aponta que a violência contra a mulher não chegava a ser criminalizada, pois, na maioria das vezes, não havia um reconhecimento social de que esse fato fosse um crime: "Esse não-reconhecimento teria sua origem num determinado arranjo das relações de gênero que age no sentido de apresentar como 'naturalizadas' as relações violentas entre os sexos" (Pasinato, 2004, p.68). Em suas conclusões, a autora explica que a forma como a justiça era aplicada nesses casos embasava-se numa jurisprudência e numa política criminal que, "a despeito da comprovação do crime, justificam a absolvição do agressor em nome da preservação da família, que dessa forma é colocada acima de qualquer decisão judicial que ocorra como resultado da restrita aplicação das leis" (Pasinato, 2004, p. 268).

Em agosto de 2006 foi sancionada a Lei Maria da Penha (nº 11.340) com o propósito de coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Embasados/as na perspectiva foucaultiana, tomamos essa legislação como um acontecimento. Em seus estudos sobre as práticas judiciárias, Foucault afirma que esse campo discursivo é composto por modelos de verdade que afetam os comportamentos cotidianos e a ordem da ciência, as quais "não se impõem do exterior ao sujeito do conhecimento, mas que são, elas próprias, constitutivas do sujeito do conhecimento" (Foucault, 1973/2005, p. 27).

Dessa forma, entendemos que a Lei Maria da Penha é um acontecimento que pode demarcar uma nova forma de legitimação de saberes que rompe com formas cristalizadas de dominação masculina, pois afirma que qualquer ato violento contra a mulher é crime e violação dos Direitos Humanos.

Dentro dessa discussão, um ponto importante de preocupação sobre as lutas através da efetivação de legislações e de políticas públicas é a questão da universalidade e da representatividade do sujeito de direito. Na temática aqui trabalhada, a discussão se dá em torno de quem representa a categoria "mulher". Para Henrique Nardi (2008, p.13), essa problemática precisa ser tensionada, pois pode induzir a "imposição de um universalismo sustentado na figura abstrata do sujeito jurídico que, ao utilizar um modelo único, produz uma invisibilidade 'oficial' das diferenças". Assim sendo, entende-se como necessária a problematização sobre as formas como as questões de raça/cor se entrecruzam nos discursos sobre a violência de gênero, uma vez que a maneira como as vulnerabilidades são vividas pelas mulheres variam fortemente de acordo com suas experiências singulares de vida e seus marcadores sociais.

Todavia, sabe-se que as políticas públicas precisam eleger um sujeito de direitos a quem elas se dirigem, e, por isso, acabam universalizando suas ações. No tema aqui proposto, percebe-se que a Lei Maria da Penha chega a nominar a articulação gênero/raça em alguns de seus artigos1 1 Por exemplo: no Título I (artigo 2º), no Título III (artigo 8º, incisos II, VII, VIII e IX). , mas a pergunta que precisa estar presente é de que forma assegurar um olhar que, de fato, privilegie e aborde tal articulação.

Articulando os conceitos de gênero e raça/cor na problematização da violência contra a mulher

No campo dos estudos de gênero, Joan Scott (1988/1995) propõe um conceito em que esse seria um modo primeiro de significar as relações de poder. Ela sugere que o gênero tem que ser redefinido e reestruturado em conjunção com uma visão de igualdade política e social que inclui não só o sexo, mas também a classe e a raça. Quanto a esse ponto, Saffioti (2009) ressalta a importância de visibilizar as relações entre sexismo e racismo, afirmando que eles são irmãos gêmeos, constituindo um enovelado de complexidades.

Nessa direção, um grupo de feministas negras norte-americanas, seguindo a ideia de relações entre gênero e raça, propôs que se pensem as questões relativas às discriminações de gênero de mulheres negras numa perspectiva interseccional. A luta contra a violação de direitos deve, nessa perspectiva, levar em consideração a complexidade das vulnerabilidades a que as mulheres estão expostas, pois as desigualdades de gênero, raça e classe se entrecruzam e se potencializam (Crenshaw, 2002).

Nas discussões das mulheres negras brasileiras, destacamos alguns questionamentos de Sueli Carneiro (2003) sobre a necessidade da articulação gênero/raça/cor na luta do movimento feminista contra a violência de gênero:

Quando falamos do mito da fragilidade feminina, que justificou historicamente a proteção paternalista dos homens sobre as mulheres, de que mulheres estão falando? Nós, mulheres negras, fazemos parte de um contingente de mulheres, provavelmente majoritário, que nunca reconheceram em si mesmas esse mito, porque nunca fomos tratadas como frágeis. Fazemos parte de um contingente de mulheres que trabalharam durante séculos como escravas nas lavouras ou nas ruas, como vendedoras, quituteiras, prostitutas... Mulheres que não entenderam nada quando as feministas disseram que as mulheres deveriam ganhar as ruas e trabalhar! Fazemos parte de um contingente de mulheres com identidade de objeto. Ontem, a serviço de frágeis sinhazinhas e de senhores de engenho tarados. Hoje, empregadas domésticas de mulheres liberadas e dondocas, ou de mulatas tipo exportação. (Carneiro, 2003, p. 49)

É nesse contexto que os conceitos de interseccionalidade e articulação têm sido fortalecidos nos estudos que pretendem combater as diversas formas de desigualdade social. Adriana Piscitelli (2008) destaca que existem diferenças teóricas entre a noção de interseccionalidade e a categoria articulação, demonstrando como esses dois conceitos vão se distanciar com relação ao tratamento dado às noções de diferença e de poder. Ela classifica a abordagem que trabalha com o conceito de interseccionalidade como uma leitura sistêmica e a que adota o conceito de articulação como uma abordagem construcionista, destacando Kimberlé Crenshaw como representante da primeira e Anne Mcklintock e Avtar Brah como representantes da segunda. Piscitelli (2008) também aponta que essas duas abordagens apresentam diferenças quanto às "margens de agência (agency) concedidas aos sujeitos, isto é, as possibilidades no que se refere à capacidade de agir, mediada cultural e socialmente" (Piscitelli, 2008, p. 267).

Em Crenshaw (2002, p. 177), "a interseccionalidade é uma conceituação do problema que busca capturar as consequências estruturais e dinâmicas da interação entre dois ou mais eixos de subordinação". Essa autora propõe que existem eixos de poder estabelecidos pelo patriarcado, pelo racismo e pela luta de classes e constrói a imagem de um cruzamento de avenidas, em que o fluxo dos tráfegos vai definir a multiplicidade de opressões a que a pessoa estará submetida, definindo mais ou menos "poder" em suas relações.

Para Piscitelli (2008, p. 267), essa perspectiva teórica apresenta uma fragilidade importante, pois "funde a ideia de diferença com a de desigualdade". Essa autora destaca que as análises críticas sobre o conceito de interseccionalidade têm apontado o caráter sistêmico dessa abordagem, em que se sobressai uma análise dos efeitos do sistema ou da estrutura na produção das identidades. Dessa forma, haveria uma primazia dos sistemas de opressão, de marginalização e de dominação, tanto de classe quanto de gênero e de raça, que determinariam as identidades, as quais estariam "exclusivamente vinculadas aos efeitos da subordinação social e o desempoderamento" (Prins citada por Piscitelli, 2008, p. 267). Aliado a isso, Piscitelli (2008), apoiada nos estudos de Baukje Prins, salienta que, apesar da linha sistêmica afirmar trabalhar com os preceitos teóricos de Foucault, a noção de poder é utilizada de forma seletiva, ganhando destaque o caráter macroestrutural, com pouca visibilidade à produtividade do poder e sua intrínseca relação com as formas de resistência.

Com relação ao conceito de articulação, ele está vinculado à abordagem construcionista em virtude de uma compreensão da identidade social que privilegia aspectos relacionais e dinâmicos na produção da mesma. A articulação é "entendida como prática que estabelece uma relação entre elementos, de maneira que sua identidade se modifica como resultado da prática articulatória" (Piscitelli, 2008, p. 267). Dessa forma, gênero, raça e classe não são tomados apenas como formas exclusivamente limitantes dos marcadores de identidade, mas podem ser analisados como recursos que oferecem oportunidades de ação. A abordagem construcionista traça "distinções entre categorias de diferenciação e sistemas de discriminação, entre diferença e desigualdade" (Piscitelli, 2008, p. 268).

Brah (1996/2006) propõe que se trabalhe com a noção de articulação ao invés de interseccionalidade na temática das múltiplas formas de dominação que constituem as relações sociais. Essa autora acrescenta as questões de territorialidade e etnicidade, ou seja, alarga ainda mais as especificidades que compõem as diferentes experiências de subjetivação. A partir de um olhar dos povos colonizados, os estudos pós-coloniais têm colocado luz na complexa trama que legitima determinadas formas de dominação em prol de outras, bem como nas dificuldades enfrentadas pela invisibilidade e silêncio que permanecem atuando nos regimes de verdade legitimados pelos povos ocidentais brancos. Para essa autora, segundo Piscitelli (2008, p. 269), "a diferença nem sempre é um marcador de hierarquia nem de opressão", e, portanto, deveríamos nos questionar sobre "se a diferença remete à desigualdade, opressão, exploração. Ou ao contrário, se a diferença remete a igualitarismo, diversidade, ou a formas democráticas de agência política".

Pode-se afirmar que outro ponto significativo na diferenciação entre interseccionalidade e articulação é que a articulação propõe um lugar de destaque à experiência. Todavia, Piscitelli (2008) alerta que mais importante do que os embates acerca desses dois conceitos é a potência que ambos carregam ao problematizar temáticas como poder, diferença e agência.

Donna Haraway (1991/2004), em seu apanhado histórico sobre o conceito de gênero e as tensões teóricas nesse campo, destaca a importância dos estudos das mulheres negras sobre o caráter etnocêntrico e imperialista dos feminismos europeus e euro-americanos. Nessa direção crítica dos estudos feministas, Judith Butler (1990/2003) denuncia a manutenção do binarismo naturalizante de alguns desses discursos, propondo que se conceba o gênero como norma, em que entram em jogo múltiplas relações entre corpo-gênero-sexualidade. Para essa autora, o corpo não é da ordem da natureza, mas da ordem de uma inscrição sócio-histórica que acaba por ser incorporada naquilo que identificamos como masculino e feminino.

A representação da categoria mulher no movimento feminista sofreu e ainda sofre as dificuldades apontadas acima, sendo a questão da raça/cor um aspecto relevante que vem ganhando visibilidade, mas que merece ser aprofundado em virtude de seus impactos na vida das mulheres brasileiras. Em nosso país, enfrentamos um problema específico de negação das questões raciais, pois por muito tempo convivemos com o mito da democracia racial. Em 1933, Gilberto Freyre publica Casa Grande & Senzala, clássico brasileiro que abordou as especificidades da miscigenação brasileira como um caso exemplar da possibilidade de uma democracia racial. Em relação a essa crença, encontramos em Sobrados e Mucambos uma afirmação que a corrobora, mas, ao mesmo tempo, aponta para as dificuldades de superação da dominação masculina: "Mais depressa nos libertamos, os brasileiros, dos preconceitos de raça do que dos de sexo" (Freyre, 1933/2000, p. 159).

Talvez numa das primeiras leituras brasileiras sobre as articulações entre gênero e raça/cor, Guerreiro Ramos afirmou, em relação à mulher negra, como ela era focalizada pelo branco apenas com um olhar dionisíaco, produzindo estereótipos que se atualizavam em ditos populares da época, tais como: "Branca para casar, negra para cozinhar e mulata para fornicar!" (Ramos, 1957/1995, p. 245).

De acordo com Florestan Fernandes (1964/1978), apesar de nossa legislação não discriminar brancos e negros, como em outras sociedades, tal como nos EUA, a configuração social brasileira foi bastante perversa, pois produziu uma transição do modelo escravocrata para o modelo republicano sem alterar faticamente a situação da antiga relação de castas entre "senhores", "libertos" e "escravos". Além disso, tentou sustentar por muito tempo a imagem de uma verdadeira democracia racial.

Em sua pesquisa sobre o racismo brasileiro, Lilia Schwarcz (2001) é uma das autoras que endossa as críticas a esse mito. Além dos dados censitários que ajudam a desmascarar as desigualdades raciais persistentes na sociedade brasileira, a autora realizou uma pesquisa sobre a percepção que os/as brasileiros/as tinham com relação à experiência do racismo, concluindo que "todo brasileiro parece se sentir uma 'ilha de democracia racial', cercado de racistas por todos os lados" (Schwarcz, 2001, p. 76). Ao analisar a mestiçagem de nosso povo e as políticas de branqueamento posteriores à abolição da escravatura realizadas no Brasil no início do século XX, a autora afirma que produzimos um racismo à brasileira, em que, mais do que com diferenças raciais, lidamos com diferenças na coloração da pele, as quais acabam por demarcar desigualdades sociais reconhecidas na intimidade. Dessa forma, Lilia Schwarcz corrobora a ideia de que ainda que o conceito raça já tenha sido desconstruído do ponto de vista biológico, ele continua ainda a ser um potente conceito descritivo e analítico das relações sociais.

Nesse sentido, Elisa Nascimento (2003) sustenta a utilização do termo raça, pois analisa criticamente os construtos acadêmicos que colam a questão da raça ao biológico. Para essa autora, o conceito de etnia é apenas acadêmico e de certa forma invisibiliza a força política que o termo raça carrega. Ela denomina de sortilégios da cor "esse processo de desracialização ideológica, que comparece travestida de análise científica para esvaziar de conteúdo racial hierarquias baseadas no supremacismo branco" (Nascimento, 2003, p. 32). Outra questão significativa levantada por Nascimento (2003) é a constatação de que no Brasil temos dois tabus relativos à raça que precisam ser superados. O primeiro é de que quando se fala de racismo no Brasil estamos produzindo um racismo às avessas. Para Nascimento (2003), esse tabu produz o recalque e o silenciamento sobre o nosso racismo. O segundo tabu seria a "resistência à idéia do racismo comum às populações de origem africana subjugadas em diferentes partes do mundo" (Nascimento, 2003, p. 57), pois o negro no Brasil viveria uma situação singular em virtude de nossa miscigenação.

Complementando essa ideia, Laura López (2009, p. 177) focaliza os efeitos do racismo no corpo das mulheres negras brasileiras, pois a mestiçagem de nossa nação se construiu com a "violência sexual do homem branco colonizador sobre as mulheres africanas e indígenas"; em que "o corpo da mulher negra se torna visível como objeto de múltiplas opressões e o centro das disputas políticas".

Em seu estudo sobre as interfaces entre violência racial e violência de gênero, Maria Moura (2009) aponta a maior vulnerabilidade da mulher negra em situações de violência doméstica, pois essas têm menos acesso aos equipamentos sociais e de saúde, bem como carregam a forte marca do racismo nos assujeitamentos que constituem seus processos de subjetivação. Ao analisar os sentidos produzidos por profissionais que atendem mulheres em situação de violência de gênero, essa autora identificou que, apesar de a maioria dos órgãos de assistência identificar em seus prontuários o quesito cor/raça, essa informação não tem sido tomada como uma questão. Com relação aos profissionais da psicologia que atuam nessa área, as singularidades da questão racial ficam invisibilizadas, demonstrando falta de informação e de comprometimento dos/as técnicos/as com os efeitos do racismo.

Violência de gênero: dos conceitos à prática

Para fazermos o caminho dos conceitos à prática, passamos agora a apresentar uma parte de nosso trabalho de campo. Desde 2005, atuamos em equipe interdisciplinar (Direito, Psicologia e Ciências Sociais) desenvolvendo ações de extensão e de pesquisa junto ao Poder Judiciário gaúcho no foco da violência de gênero nas relações de intimidade. Nesse cenário, poucas têm sido as reflexões sobre as articulações entre gênero e raça/cor, apesar de aparecer explicitamente em vários artigos da Lei Maria da Penha (n. 11.340/2006)2 2 Idem. . Enquanto proposta de políticas públicas, a temática da raça nas situações de violência doméstica está pautada no Plano Plurianual 2008-2011 do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão3 3 Regulamentado pela Lei n. 11.653, de 7 de Abril de 2008. , documento que denota a dificuldade da articulação gênero e raça/cor no Programa de Combate à Violência contra as Mulheres.

Em nosso percurso acadêmico, bem como nas práticas extensionistas e de pesquisa junto ao Poder Judiciário, encontramos a invisibilização da questão racial, assim como a pouca apropriação teórico-conceitual referente à violência de gênero por grande parte dos/as operadores/as do direito e dos/as colegas docentes.

A partir dessa constatação surgiu a necessidade de desenvolvermos uma pesquisa que investiga como se dão as articulações entre gênero e raça/cor no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e na Delegacia da Mulher, ambos em Porto Alegre. Trazemos alguns dados de nossa pesquisa de campo, a qual começou em maio de 2010 e tem previsão de término da pesquisa de campo para julho de 20124 4 Neste artigo estamos trabalhando com uma primeira etapa de coletas de informações, em virtude de este trabalho estar vinculado à pesquisa de doutorado acima referida, a qual foi concluída em maio de 2013. . Serão apresentados dados sobre o andamento judicial dos processos no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, bem como levantamento de informações com mulheres que procuraram a Delegacia da Mulher.

Na Delegacia da Mulher, desenvolvemos uma ação de extensão cujo objetivo é o atendimento prévio a mulheres que pretendem registrar um boletim de ocorrência (BO) de uma situação de violência nas relações de intimidade. É uma proposta de trabalho interdisciplinar de assessoria jurídica, em que as mulheres foram atendidas por duplas compostas por estudantes de direto, de psicologia e/ou de ciências sociais. A nossa equipe atuou em três turnos por semana na Delegacia, no ano de 2010, e em cinco turnos por semana no ano de 2011. Foram realizadas duas entrevistas estruturadas: uma que busca identificar o nível de risco da situação de violência5 5 Questionário elaborado por Bárbara Musumeci Soares a partir de situações descritas por mulheres que já estão em situação de violência. e outra que busca informações relativas à trajetória de vida e à situação conjugal. A entrevista dirigida que busca avaliar o risco da situação de violência era encaminhada junto ao BO para o Juizado, a fim de ser mais um subsídio na análise dos pedidos de medidas protetivas. Durante a entrevista, eram oferecidos esclarecimentos e informações sobre as situações de violência de gênero nas relações de intimidade e os possíveis encaminhamentos jurídicos e sociais.

No período de maio de 2010 a agosto de 2011, tivemos um total de 100 mulheres entrevistadas na Delegacia da Mulher. No agrupamento dos níveis de escolarização, encontramos os seguintes percentuais totais: 33% responderam ser analfabetas ou com nível fundamental incompleto, 25% com ensino fundamental completo/médio incompleto, 24% com médio completo e 17% com ensino superior completo ou incompleto.

Quando feito o recorte relacional entre escolaridade e raça/cor, encontramos a seguinte comparação intrarracial:

-Nível de analfabetismo e/ou nível fundamental incompleto:

• 27, 3% das 55 mulheres autodeclaradas brancas;

• 37, 8% das 37 mulheres que se autodeclararam como negras e mulatas e informaram o seu nível de escolaridade;

-Nível fundamental completo e/ou médio incompleto:

• 25,5% das 55 mulheres autodeclaradas brancas;

• 24,3% das 37 mulheres que se autodeclararam como negras e mulatas;

-Nível médio completo:

• 21,8% das 55 mulheres autodeclaradas brancas;

• 29,7% das 37 mulheres que se autodeclararam como negras e mulatas;

-Nível superior completo e/ou incompleto:

• 25,5 % das 55 mulheres autodeclaradas brancas;

• 8,1% das 37 mulheres que se autodeclararam como negras e mulatas.

Dessa forma, as informações apontam que um percentual maior das mulheres negras encontra-se nos níveis mais baixos de escolarização do que as mulheres brancas. Na passagem do nível médio para o nível superior, as mulheres negras parecem enfrentar maiores dificuldades, com um percentual muito inferior ao das mulheres brancas no nível mais alto de escolarização. Este levantamento pode indicar que as mulheres negras têm mais dificuldades de avançar em seus estudos, o que tem sido identificado em pesquisas que correlacionam escolaridade e raça/cor no Brasil. Estes dados estão em concordância com os estudos que mostram a persistência da desigualdade racial na distribuição do ensino. No tocante à expansão do ensino superior em nosso país, o qual se deu prioritariamente na rede privada, produziu um aumento no nível de escolaridade da população em geral, contudo, não contemplou brancos/as e negros/as da mesma forma (Hasenbalg & Silva, 1999; Jaccoud & Beghin, 2002; Silva & Rosemberg, 2008). Esses estudos têm sustentado a necessidade de políticas de cotas raciais nas universidades públicas.

Apesar da limitação numérica da parcela da amostra analisada até o momento, essas informações confirmam o que tem sido discutido na literatura sobre a violência de gênero nas relações de intimidade, ou seja, de que esse é um fenômeno presente em todas as camadas sociais. Entretanto, as articulações entre os diversos marcadores sociais que constituem as experiências das mulheres em situação de violência, no caso da análise proposta neste artigo, gênero e raça/cor, somente podem ganhar visibilidade a partir de análises qualitativas que coloquem perguntas específicas para essas informações. Segundo Crenshaw (2002, p. 182), para conquistarmos o propósito de visibilizar a "subordinação interseccional, será necessário desenvolver novas metodologias que desvendem as formas como várias estruturas de subordinação convergem, pois é muito pouco provável que tais problemas se apresentem claramente como produto de vulnerabilidades múltiplas".

Salientamos que as informações obtidas até aqui não nos permitem uma análise efetiva da articulação entre gênero e raça/cor, uma vez que não foram elaboradas entrevistas em profundidade com as mulheres atendidas que objetivassem esse foco. Todavia, utilizamos as informações recolhidas nas situações cotidianas de atendimento a mulheres que buscam a Delegacia e o Juizado referidos, bem como o andamento judicial dos processos no intuito de apreender alguns pontos significativos da situação atual da violência de gênero nas relações de intimidade na cidade de Porto Alegre.

Construindo uma descrição inicial do quesito raça/cor, destacamos que a cidade de Porto Alegre apresenta 20,2% de população negra (Prefeitura Municipal de Porto Alegre, 2010). Após o agrupamento dos dados referentes à autodeclaração de raça/cor das 100 respondentes, apenas 95 responderam a essa pergunta, sendo 55 brancas e 38 negras (considerando a raça/cor negra como o total de mulheres autodeclaradas negras e pardas). As autodeclarações de duas mulheres foram agrupadas na categoria outras (no caso, autodeclaradas amarelas). Como o percentual da população negra em Porto Alegre é de apenas 20, 2%, essas 38 mulheres representam 40% da nossa amostra, ou seja, haveria neste recorte uma maior prevalência da violência de gênero em relações de intimidade nas mulheres dessa raça/cor. Essa é uma informação importante, pois, ainda que seja apenas descritiva e quantitativa neste momento, visibiliza uma grande disparidade na distribuição racial desse tipo de violência de gênero, pelo menos das mulheres que buscam os órgãos públicos para denunciá-la na cidade de Porto Alegre. Em seu estudo sobre a violência de gênero na cidade de Recife, Moura (2009) também afirma que as mulheres negras estariam mais vulneráveis a esse tipo de violência em suas relações de intimidade do que as mulheres brancas.

Nessa mesma linha de compreensão sobre a vulnerabilidade maior das mulheres negras à violência de gênero, trazemos aqui um relato importante que possibilita a construção de uma análise sobre as implicações raciais na busca de direitos das mulheres em espaços públicos, bem como apresenta as peculiaridades que o local de moradia produz na subjetividade. De acordo com o depoimento de uma das lideranças da ONG Maria Mulher6 6 Organização feminista que atua na promoção dos direitos das mulheres negras na cidade de Porto Alegre, desde 1987. , o qual foi colhido nos percursos da pesquisa de campo, é importante que o judiciário reconheça a maior vulnerabilidade a que estão expostas grande parte das mulheres negras, pois existem fatores específicos comunitários que escapam a uma análise pura das informações dos autos processuais. Segundo ela, a vivência nos atendimentos a mulheres vítimas de violência de gênero nas relações de intimidade permite inferir que muitas mulheres não possam denunciar seus parceiros em virtude do controle que o tráfico de drogas produz sobre suas vidas. Com a legislação Maria da Penha, a atuação policial ganha novos contornos, sendo mais incisiva e presente nas situações de violência contra a mulher, possibilitando a prisão efetiva de homens agressores que descumpram medidas protetivas ou que sejam presos em flagrante. Isso implica a entrada de policiais em qualquer ponto de nossas comunidades pobres, as quais muitas vezes são reféns de códigos de circulação dos traficantes. Nessas situações, as mulheres vítimas de violência "sabem" que não devem denunciar, pois a polícia não é bem vinda naquela localidade. Certamente esse tipo de informação escapa totalmente a um levantamento isolado de informações nos processos judiciais. A constatação dessa análise dos efeitos da vulnerabilidade que alguns espaços da cidade (i. e.,uma geografia da cor nas cidades, ou seja, negras/os moram em regiões mais pobres e mais vulneráveis ao tráfico, por exemplo) produzem na intimidade da vida das pessoas também apareceu em um depoimento espontâneo de um taxista que levava uma estudante que estava iniciando suas atividades de extensão em Maria Mulher. Esse homem comentou que, infelizmente, apesar do reconhecimento que esta ONG tem na comunidade, de sua luta contra a violência doméstica que afeta a vida de muitas mulheres, "as mulheres que mais precisam nem chegam aqui [em Maria Mulher], a gente vê coisas horríveis nessa comunidade!"

Essas duas falas registradas no percurso desta pesquisa nos parecem importantes, tanto por produzirem momentos de reflexão sobre o quanto a categoria mulher precisa ser pensada de uma forma não homogeneizante como por alertarem para a necessidade da construção de políticas públicas que levem em consideração a articulação de outros marcadores sociais no enfrentamento da violência de gênero.

Outro ponto que destacamos do levantamento das informações sistematizadas até o momento diz respeito ao andamento dos processos no Poder Judiciário de Porto Alegre. Constata-se que o aspecto punitivo da Lei Maria da Penha nesta capital é um aspecto que vem tomando força a partir do final de 2010. A partir do ano de 2007 os dados passaram a ser sistematizados7 7 Dados obtidos a partir de documento fornecido pelo cartório do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do Foro Central de Porto Alegre, intitulado Mapa de mês/ano, elaborado pelo Sistema Themis – 1º Grau/Poder Judiciário/RS. , sendo que nesse primeiro ano de sistematização não houve nenhuma sentença e foram arquivados 2.128 processos. Em 2008, foram prolatadas duas sentenças condenatórias e 6.365 arquivamentos. Em 2009, houve três sentenças condenatórias e 5.353 processos arquivados. Em 2010, houve 40 sentenças condenatórias, 11 sentenças absolutórias e 9.334 processos foram arquivados. Até 26 de outubro de 2011, houve 19 sentenças condenatórias, 41 sentenças absolutórias e o arquivamento de 5.959 processos.

Constatou-se que a maioria esmagadora dos processos é arquivada, com duas classificações específicas: extinção de punibilidade (em que os processos não podem ser reabertos) e demais decisões terminativas (em que houve arquivamento sem julgamento do mérito, mas que podem ser reabertos). Em conversa com um dos juízes titulares do referido Juizado sobre o baixíssimo número de condenações diante do volume de processos, tivemos a informação de que o arquivamento massivo dos processos aconteceu sem que o Ministério Público tenha feito a denúncia do crime. De acordo com esse juiz, essa realidade impossibilita qualquer tipo de sentença, pois arquivar não é julgar e esclarece, em certa medida, o pequeníssimo número de condenações.

Além disso, também se verificou, a partir de conversas com outros/as operadores/as do direito do Juizado, bem como de observações das audiências, que um dos argumentos mais presentes na justificativa para o elevado número de arquivamento dos processos, sem que nem mesmo a denúncia8 8 A denúncia de um processo criminal é feita pelo Ministério Público, e não pela vítima. O autor do processo é o Estado, e não a pessoa que sofreu a violência. tenha sido feita pelo Ministério Público, é o desejo das vítimas de se retratarem quanto à representação penal, ou seja, a vontade de não darem prosseguimento ao processo criminal.

Assim sendo, destaca-se o quanto o caráter penal e punitivo dessa legislação não tem se efetivado, pois em cinco anos de implantação da Lei Maria da Penha houve 29.149 processos arquivados e apenas 116 julgamentos (64 sentenças condenatórias e 52 sentenças absolutórias). O aumento no número de condenações a partir do ano de 2010 é decorrente da postura de um dos juízes envolvidos, que, além de formação em direito, também possui pós-graduação em antropologia, com uma leitura das situações de violência contra mulher fundamentada nas discussões teóricas sobre as desigualdades de gênero construídas sócio-historicamente. Recentemente também aconteceu o ingresso de um novo representante do Ministério Público no Juizado pesquisado, o qual tem demonstrado uma postura mais favorável à propositura de denúncias e possibilitado a ampliação de sentenças.

De qualquer forma, o quadro geral dos processos constatado na cidade de Porto Alegre até o momento é de que existe uma postura muito pouco punitiva nos casos de violência de gênero nas relações de intimidade. Essa situação parece ser um caso singular nas práticas do judiciário no campo do Direito Penal Brasileiro. Em recente pesquisa sobre os critérios de aplicação da pena no Brasil, Salo de Carvalho (2010) afirma que os/as magistrados/as brasileiros/as são conservadores/as e claramente punitivistas. Apesar de a Constituição Federal ser um importante instrumento com tendência a inibir o punitivismo presente nas decisões judiciais, bem como de uma pequena parcela da teoria jurídica atual apontar a afronta aos Direitos Humanos que o Direito Penal tem efetivado, esse autor fortalece seu argumento trazendo a fala do Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, que em 2006 (p. 21) afirmou: "Os magistrados querem o endurecimento da lei penal". Claro que não podemos ocultar a informação de que a maioria dos crimes que são maciçamente punidos tem caráter patrimonial (furtos, roubos) e de violência que envolve o tráfico de drogas e a violação do direito à vida (homicídios, latrocínios etc.). Nesses casos, frequentemente, o autor do crime é uma pessoa estranha à vítima, o que possibilitaria o réu poder atingir indiscriminadamente qualquer cidadão/ã. Assim sendo, parece ser um consenso entre os/as magistrados/as o caráter público de violação de direitos e seu consequente reconhecimento como um problema coletivo que precisa ser tutelado pelo Estado.

No caso da violência de gênero nas relações de intimidade, o autor do fato normalmente não é visto como "criminoso", em virtude de ser pai de família, marido ou companheiro da vítima. Seu crime continua sendo encarado como do âmbito privado. Assim, podemos levantar como hipótese de análise para o arquivamento em massa dos processos judiciais o quanto o discurso conservador de dominação masculina, de preservação da família e da privacidade desse tipo de violência ainda é importante na produção de subjetividade dos/as operadores/as do direito brasileiro. Em oposição ao demonstrado por Carvalho (2010), nas questões de violência de gênero parece que o argumento do Direito Penal Mínimo, ou seja, aquele que defende uma postura menos punitivista, ganha maior guarida, sendo o discurso dos Direitos Humanos atualizado em prol do "réu/homem/marido". Nesse tipo de crime, emerge a compreensão jurídica de que o Direito Penal não seria o instrumento ideal para esse tipo de conflito doméstico, bem como a percepção do esgotamento do aparato estatal jurídico de "punir" de forma efetiva este tipo de "agressor" (Azevedo, 2008).

A respeito das relações de saber-poder em que estão imersas as mulheres vítimas de violência doméstica, a vivência da pesquisa na Delegacia da Mulher tem nos possibilitado algumas reflexões. Quando elas são questionadas sobre o que esperam da Delegacia e do Poder Judiciário, das 100 mulheres entrevistadas, categorizamos, inicialmente, três grandes tipos de expectativas: prisão, punição e proteção/ajuda.

Na categoria prisão, agrupamos nove mulheres: cinco que falaram explicitamente desejar o encarceramento de seu "agressor"; uma que mencionou esperar um "progresso" com a prisão dos agressores; duas que afirmaram desejar a prisão e/ou o tratamento do mesmo, demonstrando uma oscilação de sentimentos e de compreensão sobre a violência vivida, e uma mulher que solicitava a suspensão da condicional de seu "agressor", ou seja, que expressava o desejo de que ele voltasse a sua condição de privação de liberdade.

Na categoria punição, agrupamos oito mulheres, mas encontramos dois sentidos para essa categoria. Um primeiro relativo a uma expectativa de repreensão moral por parte das autoridades (juízes/as e delegadas), mais do que efetivamente uma punição penal. Ilustramos esse ponto com os seguintes registros das respostas dadas: "queria que ele tivesse um castigo, já que não posso bater nele de volta. E para que ele também não venha a repetir essa situação com outra mulher"; "não desejo mal para ele, mas quero mostrar que ele não pode ficar impune, porque deve respeitar os outros. Quero evitar um acontecimento pior".

Em contrapartida a essas expectativas punitivas, a maioria das respostas remete a um pedido de ajuda, à necessidade da interferência de um terceiro que tenha poder para tirá-las das situações de violência, como expresso a seguir: "quero ajuda para tirar o meu marido da minha vida"; "ajuda para poder afastá-lo da minha vida para poder me reorganizar"; "proteção para sair de casa com segurança". Esses relatos, de um modo geral, corroboram os estudos (Sagot, 2007; Soares, 1999) sobre o comportamento das mulheres que vivem situações domésticas de violência, em que há uma marca forte de subordinação e poucas redes de apoio que lhes permitam romper com o ciclo de violência.

Também destacamos uma fala de uma assistente social que foi à delegacia fazer a sua ocorrência. Ela pôde expressar a vergonha que estava sentindo por estar ali, logo ela, que tinha formação universitária para auxiliar as pessoas a resolverem seus conflitos, que muitas vezes se relacionavam à violência doméstica. Cabe aqui ressaltar que a única recusa de participação na pesquisa veio de uma profissional de nível superior e com a maior renda entre as pesquisadas. A recusa se deu em razão do medo de ser identificada e da vergonha associada ao fato. Esse medo anuncia que não é somente a pobreza que age como fator de vulnerabilidade, pois a posição social e a proteção do âmbito privado nas classes médias altas cria um tipo de vulnerabilidade à violência distinta daquela decorrente de condições de vida precárias. Entendemos que a tristeza e o constrangimento dessas duas mulheres possam ser potencializados quando, na prática dos órgãos públicos relacionada à violência de gênero no âmbito das relações de intimidade, essa problemática continuar sendo, majoritariamente, tratada como uma questão individual e privada, negando seu caráter socialmente produzido.

Reflexões finais

Discutir as articulações entre gênero e raça/cor nos casos de violência de gênero nas relações de intimidade é um desafio que precisa ser assumido como um trabalho de muitos/as. Ainda que alguns estudos já tenham apontado sua relevância, a revisão feita demonstra que essa trajetória analítica precisa ser ampliada.

Diversos são os mitos que têm composto o imaginário social de que o Brasil é um país exemplar de democracia racial. Desde Casa Grande & Senzala temos cultivado a ideia de uma tranquilidade e cordialidade de nossas relações de miscigenação, invisibilizando as situações de violência e de silêncio que compuseram as formas de dominação instituídas. Em sua análise para complexificar a desconstrução do mito da democracia racial brasileira, Antônio Guimarães (2006) aponta que, mais do que uma ideologia ou um ideal, a noção de democracia racial teve contornos de política pública em diferentes momentos da história brasileira. Esse autor aponta um novo quadro nas questões de enfrentamento das nossas desigualdades raciais a partir dos anos 1990. Todavia, ele nos alerta que a superação das desigualdades raciais não acontece como decorrência imediata das políticas públicas que tomam a raça como questão social. Certamente essas políticas são importantes para regulamentarem novas bases para o conflito distributivo, porém, de acordo com Guimarães (2006), elas parecem não pôr em risco a reprodução do sistema com um todo.

Com esse alerta em mente, afirmamos que tornar possível a visibilidade das diferentes formas de subordinação, às quais estão expostas parcelas significativas de nossa população, pode funcionar como um agenciador de políticas públicas mais específicas e efetivas no enfrentamento do cotidiano de violação de direitos das mulheres. Infelizmente, os números de processos que tramitam atualmente no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher em Porto Alegre, num montante de 22.7109 9 Este número refere-se à quantidade de processos que estão em tramitação, excluindo-se os processos que já foram julgados ou arquivados. até meados do mês de outubro/2011, demonstram que a luta contra as diversas formas de violência de gênero nas relações de intimidade tem um longo caminho pela frente. Esperamos que as pistas aqui exploradas possam auxiliar para que a articulação gênero-raça-cor emerja como categoria para pensar a vulnerabilidade à violência e refletir sobre as condições de seu enfrentamento, sobretudo na sua articulação com a pobreza e com a fragilidade das redes de apoio a ela associadas.

Notas

Agradecimento

Pelo fomento à pesquisa, ao CNPq – Edital MCT/CNPq/SPM-PR/MDA nº 20/2010 – Relações de Gênero, Mulheres e Feminismo – Número do Processo: 402543/2010-6.

Submissão em: 25/01/2011

Revisão em: 01/12/2011

Aceite em: 12/03/2012

Raquel da Silva Silveira é Psicóloga, doutora em Psicologia Social e Institucional/UFRGS. Endereço: Rua Nunes, nº 557, ap. 101. Bairro Medianeira. Porto Alegre/RS, Brasil. CEP 90.870-390. E-mail: raquelsilveira43@gmail.com

Henrique Caetano Nardi é Médico, doutor em sociologia, professor do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social e Institucional/UFRGS. E-mail: hcnardi@gmail.com

Giselle Spindler é Matemática, Mestre em Matemática Pura pela UFRGS, Professora do Curso de Administração do Centro Universitário Ritter dos Reis/ UNIRITTER. E-mail: giselspin@gmail.com

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  • 1
    Por exemplo: no Título I (artigo 2º), no Título III (artigo 8º, incisos II, VII, VIII e IX).
  • 2
    Idem.
  • 3
    Regulamentado pela Lei n. 11.653, de 7 de Abril de 2008.
  • 4
    Neste artigo estamos trabalhando com uma primeira etapa de coletas de informações, em virtude de este trabalho estar vinculado à pesquisa de doutorado acima referida, a qual foi concluída em maio de 2013.
  • 5
    Questionário elaborado por Bárbara Musumeci Soares a partir de situações descritas por mulheres que já estão em situação de violência.
  • 6
    Organização feminista que atua na promoção dos direitos das mulheres negras na cidade de Porto Alegre, desde 1987.
  • 7
    Dados obtidos a partir de documento fornecido pelo cartório do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do Foro Central de Porto Alegre, intitulado Mapa de mês/ano, elaborado pelo Sistema Themis – 1º Grau/Poder Judiciário/RS.
  • 8
    A denúncia de um processo criminal é feita pelo Ministério Público, e não pela vítima. O autor do processo é o Estado, e não a pessoa que sofreu a violência.
  • 9
    Este número refere-se à quantidade de processos que estão em tramitação, excluindo-se os processos que já foram julgados ou arquivados.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Ago 2014
    • Data do Fascículo
      Ago 2014

    Histórico

    • Aceito
      12 Mar 2012
    • Revisado
      01 Dez 2011
    • Recebido
      25 Jan 2011
    Associação Brasileira de Psicologia Social Programa de Pós-graduação em Psicologia, Universidade Federal de Pernambuco, Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH), Av. da Arquitetura S/N - 7º Andar - Cidade Universitária, Recife - PE - CEP: 50740-550 - Belo Horizonte - MG - Brazil
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