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A PSICOLOGIA SOCIAL, AS QUESTÕES AMBIENTAIS E A CRÍTICA

LA PSICOLOGÍA SOCIAL, LAS CUESTIONES AMBIENTALES Y LA CRÍTICA

SOCIAL PSYCHOLOGY, ENVIRONMENTAL ISSUES AND CRITICISM

Uma das características da psicologia social no Brasil, especialmente aquela que se vincula à ABRAPSO, é sua capacidade de abordar problemáticas da sociedade brasileira de forma crítica e com forte sensibilidade às mudanças que vão ocorrendo ao longo do tempo. Tal posição faz com que, de tempos em tempos, "novos" temas emerjam como questões para a psicologia social brasileira contribuindo, eventualmente, para a delimitação de novos campos do conhecimento. Tal movimento não é algo exclusivo da psicologia social, mas fazemos esse destaque para enfatizar o peculiar vínculo da psicologia social a problemas concretos da sociedade brasileira, produzindo, a partir deles, modos de pensar e intervir pelo viés psicossocial. Esse tipo de afirmação merece cuidados já que alguns poderão interpretá-la como a defesa de uma posição que qualifica a psicologia social como uma perspectiva privilegiada de análise da realidade. Ao contrário: o que queremos afirmar aqui é a constituição de um campo do conhecimento que evita pensar a realidade de "lugar nenhum" ou de uma espécie de "tribunal das razões", mas que faz sua crítica em estreito diálogo e interação com a sociedade e que necessita, por essa razão, de um constante movimento de reflexividade e autocrítica.

Esse é um movimento muito diverso. Como campo de conhecimentos e práticas, a psicologia social brasileira enfrenta problemas por vezes experimentados como "novos", mas não necessariamente recentes nos contextos vividos. Aproxima-se, desse modo, de questões e contextos que se destacam na cena contemporânea, sem abandonar o redimensionamento de problemas que se apresentam como desafios antigos. Acompanhamos, nos movimentos do campo, a reinvenção de ferramentas analíticas já consolidadas e a abertura à invenção de outros olhares, diálogos, abordagens, perspectivas e conceitos.

Os leitores da Revista Psicologia & Sociedade e aqueles que se preocupam com questões históricas e epistemológicas de um campo científico devem estar acompanhando a emergência de alguns "novos" problemas e temas no periódico da ABRAPSO nos últimos anos. Poderíamos citar alguns deles, mas damos especial destaque para as questões voltadas para o que chamaremos aqui, de problemas relacionados a conflitos ambientais. É inegável que o problema do direito à terra, dos sujeitos e das lutas que envolvem essa questão não são novos para a teoria social brasileira o que inclui a psicologia social. Questões relacionadas ao campo e à luta pela reforma agrária estiveram presentes nas produções da psicologia social, através, principalmente, de reflexões relacionadas aos sujeitos políticos em luta pelo direito à terra, ao êxodo rural e a constituição das grandes cidades e dos problemas decorrentes de um desenvolvimentismo economicista - problemas que marcam a história da sociedade brasileira e em relação aos quais a psicologia social não esteve alheia.

O que chama nossa atenção são algumas reconfigurações que essas questões têm ganhado no contemporâneo, fruto de fortes mudanças sofridas pela sociedade brasileira nos últimos anos. De um lado, interesses por terras e territórios a partir de um projeto específico de desenvolvimento: agronegócio, mineradoras, hidroelétricas, grandes obras urbanas. De outro, a violação de direitos humanos de populações indígenas, quilombolas, ribeirinhas, agricultores familiares, famílias pobres urbanas. Mas há ainda uma terceira dimensão que é da resistência a essas violações que demonstra a emergência, no debate público, de vozes e posições de atores coletivos e políticos que, de forma legítima, demandam o cumprimento da Constituição, mas, sobretudo, o direito a participar das decisões e da construção da sociedade à qual pertencem.

Mais uma vez, a psicologia social busca se aproximar dessa realidade com intuito de contribuir com a compreensão dos processos psicossociais envolvidos nesses contextos, refletindo sobre os dilemas metodológicos, mas sobretudo os dilemas éticos e políticos que marcam essas grandes questões. Mais uma vez, está em pauta a pergunta sobre a liberdade na pesquisa, já que os grandes interesses das empresas, mineradoras, latifundiários e da especulação imobiliária têm se incomodado com as reflexões produzidas por pesquisadores das mais distintas áreas sobre os conflitos ambientais. Mais uma vez os pesquisadores são convocados a explicitar sua posição e tal movimento não se dá sem conflitos.

Neste número da Revista Psicologia & Sociedade o tema ambiental e acerca dos territórios volta a aparecer. Assim como nos números anteriores as questões indígenas e quilombolas marcaram presença, neste número os leitores vão se deparar com produções que tratam, em uma perspectiva psicossocial e interdisciplinar, de problemas que envolvem o movimento dos sem terra, mineração e garimpo, comunidades ribeirinhas amazônicas, trabalho escravo, materiais recicláveis - violências, mas também resistências. Problemas complexos que exigem leituras teóricas e posições metodológicas densas. Problemas complexos que convidam a psicologia social a se reposicionar, necessidade constante do pensar crítico.

Neste número, ao lado das questões ambientais e territoriais, outros temas também são abordados com qualidade analítica e competência teórico-metodológica. Escolhemos dar destaque ao dos conflitos ambientais em nosso editorial por este ser um tema quase que constitutivo da sociedade brasileira, que ganha novos contornos e complexidades no contexto contemporâneo e que interpela a psicologia social mais uma vez.

Desejamos a todos uma excelente leitura e que novas posições possam ser produzidas, afirmadas e confrontadas a partir do diálogo com os textos aqui publicados!

Claudia Mayorga
Emerson Rasera
Luciana Kind
Marco Antônio Torres

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2015
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