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PARTICIPACIONISMO E DIFERENCIALISMO IDENTITÁRIO NAS RELAÇÕES ENTRE ESTADO E MOVIMENTOS SOCIAIS NO BRASIL (2003-2010)

PARTICIPACIONISMO Y DIFERENCIALISMO EN LA RELACIÓN ENTRE EL ESTADO Y LOS MOVIMIENTOS SOCIALES EN BRASIL (2003-2010)

Resumo

Este trabalho discute a relação entre Estado e movimentos sociais por meio da análise de discursos sobre a participação e a constituição de fronteiras identitárias em torno de temáticas que envolvem os movimentos de juventude e LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais). Pesquisa qualitativa com entrevistas semiestruturadas, análise de documentos e observação de campo. Realizamos 26 entrevistas semiestruturadas com ativistas que, no período entre 2003 e 2010, ocuparam cargos governamentais. Os resultados são organizados por meio de dois discursos: (a) O discurso do participacionismo, que aponta sentidos e ambiguidades sobre participação social; (b) O discurso do diferencialismo identitário, que identifica tratamentos às identidades e diferenças. Esses discursos oferecem uma base conceitual para a análise dos efeitos do participacionismo e da fragmentação identitária nos processos organizativos e estratégias dos movimentos sociais, bem como para a relação entre atores.

Palavras-chave:
Estado; Movimentos sociais; Políticas públicas; Análise do discurso

Resumen

Este trabajo discute la relación entre estado y movimientos sociales, a través del análisis de discursos sobre la participación y la constitución de fronteras identitarias en torno a temáticas que involucran los movimientos de juventud y LGBT (Lesbianas, Gays, Bisexuales, Travestis y Transexuales). Investigación cualitativa con entrevistas semiestructuradas, análisis de documentos y observación de campo. Realizamos 26 entrevistas semiestructuradas con activistas que, en el período entre 2003 y 2010, ocuparon cargos gubernamentales. Los resultados se organizan por medio de dos discurso: (a) El discurso del participacionismo, que apunta sentidos y ambigüedades sobre participación social; (b) El discurso del diferencialismo identitario, que mapea el campo de identificaciones y el posicionamiento de los actores en la arena política. Estos discursos ofrecen una base conceptual para el análisis de los efectos del participacionismo y de la fragmentación identitaria en los procesos organizativos y estrategias de los movimientos sociales, así como para la relación entre actores.

Palabras clave:
Estado; Movimientos sociales; Políticas públicas; Análisis del discurso

Abstract

This work discusses the relationship between State and social movements through the analysis of discourses on participation and the constitution of identity boundaries around themes that involve youth and LGBT movements (Lesbians, Gays, Bisexuals, Transvestites and Transsexuals). Qualitative research with semi-structured interviews, document analysis and field observation. Were conducted 26 semi-structured interviews with activists who, between 2003 and 2010, held government positions. The results are organized through two discourses: (a) The discourse of participationism, which points out meanings and ambiguities about social participation; (b) The discourse of identity differentialism, which identifies treatments to identities and differences. These discourses offer a conceptual basis for the analysis of the effects of participationism and identity fragmentation in organizational processes and strategies of social movements, as well as for the relationship between actors.

Keywords:
State; Social movements; Public policies; Discourse analysis

Introdução

Este trabalho discute a relação entre o Estado e os movimentos sociais no Brasil, no período compreendido entre 2003 e 2010, analisando discursos sobre a participação e a constituição de fronteiras identitárias em torno de temáticas que envolvem os movimentos de juventude e LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais). Diversos autores apontam que no Brasil, sobretudo após a Constituição de 1988, os movimentos sociais e o Estado deixaram de assumir relações prioritariamente de confrontação para desenvolver parcerias e diálogos que culminaram em uma aproximação crescente e contínua entre essas duas esferas da política (Abers, Serafim, & Tatagiba, 2014Abers, R., Serafim, L., & Tatagiba, L. (2014). Repertórios de interação estado-sociedade em um estado heterogêneo: a experiência na Era Lula. Dados, 57(2), 325-357.; Cardoso, 1999Cardoso, R. (1999). A trajetória dos movimentos sociais. In E. Dagnino (Org.), Anos 90 - política e sociedade no Brasil (pp. 81-90). São Paulo: Brasiliense.; Silva, 2010Silva, V. (2010). As Conferências Públicas Nacionais como forma de inclusão política: alguns determinantes da capacidade inclusiva desses espaços de participação e deliberação. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-graduação em Ciência Política, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG.; Silva, 2015Silva, Marcelo K. (2015). Atores, Espaços e Repertórios: a atuação dos movimentos sociais através das fronteiras da sociedade civil e do Estado. In: Ilse Scherer-Warren; Lígia H. H. Lüchmann (Orgs.), Movimentos Sociais e Engajamento Político: trajetórias e tendências analíticas (pp. 133-160). Florianópolis: Editora UFSC.). Lavalle, Carlos, Dowbor e Szwako (2019Lavalle, A. G., Carlos, E., Dowbor, M., & Szwako, J. (2019). Movimentos Sociais, Institucionalização e Domínios de Agência. In Movimentos Sociais e Institucionalização: Políticas Sociais, Raça e Gênero no Brasil pós-transição (1ª ed., pp. 21-88). Rio de Janeiro: EDUERJ.) argumentam que a institucionalização de formas de controle e instâncias de participação é um dos fenômenos mais notáveis deste período.

A partir de 2003, essa aproximação e a institucionalização de mecanismos de participação se ampliam. Silva (2010Silva, V. (2010). As Conferências Públicas Nacionais como forma de inclusão política: alguns determinantes da capacidade inclusiva desses espaços de participação e deliberação. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-graduação em Ciência Política, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG.) argumenta que o Governo Lula “inaugurou um novo período na história da participação social no país. Esse governo buscou construir um novo pacto com a sociedade civil por meio da criação e institucionalização de novos espaços participativos” (p. 35Silva, V. (2010). As Conferências Públicas Nacionais como forma de inclusão política: alguns determinantes da capacidade inclusiva desses espaços de participação e deliberação. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-graduação em Ciência Política, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG.). Entre 2003 e 2010, foram realizadas 74 conferências nacionais sobre 40 temas diferentes que “mobilizaram diretamente mais de cinco milhões de pessoas, em cerca de cinco mil municípios brasileiros” (Secretária Geral Presidência da República, 2011, p. 38Secretaria-Geral da Presidência da República. (2011). Democracia Participativa: Nova relação do estado com a sociedade (2003-2010). Brasília, DF: Autor. Recuperado de https://issuu.com/secretariageralpr/docs/democraciaparticipativa_web
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). Além disso, no âmbito federal, durante o governo Lula, foram criados 18 novos conselhos nacionais de políticas públicas e 15 foram reformulados (Secretária Geral Presidência da República, 2010Secretaria-Geral da Presidência da República. (2010). Conselhos Nacionais: Dados Básicos, Organização, Gestão Atual, Finalidade, Composição, Competências. Brasília, DF: Autor. Recuperado de https://www.ipea.gov.br/participacao/images/pdfs/relatoriofinal_perfil_conselhosnacionais.pdf
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).

Além dos arranjos de participação social, a relação entre movimentos sociais e Estado se intensifica com a indicação de ativistas para cargos de confiança, com a eleição desses para o Executivo e o Legislativo, bem como com a atuação na construção ou mesmo na execução de políticas públicas (Abers & Bülow, 2011Abers, R. & Bülow, M. (2011). Movimentos sociais na teoria e na prática: como estudar o ativismo através da fronteira entre Estado e sociedade? Sociologias, 13(28), 52-84.; Silva, 2015Silva, Marcelo K. (2015). Atores, Espaços e Repertórios: a atuação dos movimentos sociais através das fronteiras da sociedade civil e do Estado. In: Ilse Scherer-Warren; Lígia H. H. Lüchmann (Orgs.), Movimentos Sociais e Engajamento Político: trajetórias e tendências analíticas (pp. 133-160). Florianópolis: Editora UFSC.). Abers et al. (2014Abers, R., Serafim, L., & Tatagiba, L. (2014). Repertórios de interação estado-sociedade em um estado heterogêneo: a experiência na Era Lula. Dados, 57(2), 325-357.) destacam que a participação no Governo Lula “abriu espaço para a combinação mais criativa de diferentes práticas e rotinas, ampliando as chances de acesso e influência dos movimentos sobre o Estado” (p. 326Abers, R., Serafim, L., & Tatagiba, L. (2014). Repertórios de interação estado-sociedade em um estado heterogêneo: a experiência na Era Lula. Dados, 57(2), 325-357.). A diversificação e a articulação entre repertórios e espaços formais e informais ganha destaque nesse período. Segundo Silva (2015Silva, Marcelo K. (2015). Atores, Espaços e Repertórios: a atuação dos movimentos sociais através das fronteiras da sociedade civil e do Estado. In: Ilse Scherer-Warren; Lígia H. H. Lüchmann (Orgs.), Movimentos Sociais e Engajamento Político: trajetórias e tendências analíticas (pp. 133-160). Florianópolis: Editora UFSC.), estes repertórios questionam dois pressupostos de algumas teorias sobre movimentos sociais:

o pressuposto da externalidade, segundo o qual existe (ou deveria existir) uma separação clara entre movimentos sociais e Estado ou, em outras palavras, entre política contestatória e política institucional; e o pressuposto da confrontação, segundo o qual a atuação confrontacional é (ou deveria ser) a forma de ação por excelência dos movimentos sociais. (Silva, 2015, p 134Silva, Marcelo K. (2015). Atores, Espaços e Repertórios: a atuação dos movimentos sociais através das fronteiras da sociedade civil e do Estado. In: Ilse Scherer-Warren; Lígia H. H. Lüchmann (Orgs.), Movimentos Sociais e Engajamento Político: trajetórias e tendências analíticas (pp. 133-160). Florianópolis: Editora UFSC.)

Por outro lado, a percepção de que estas fronteiras tornaram-se indefinidas ou opacas (Prado, Machado, & Carmona, 2009Prado, M., Machado, F., & Carmona, A. (2009). Reflexões sobre a luta pela formalização e tradução da igualdade nas fronteiras indefinidas do Estado contemporâneo: radicalização e/ou neutralização do conflito democrático? Interface: a journal for and about social movements, 1(2), 134-165.) não alcança a complexidade das interações que se desenvolvem nesses espaços. Uma noção neutra de Estado dificulta a análise do sistema de relações que condicionam as interações políticas e impactam a identidade dos atores individuais e coletivos.

Embora ocorram trânsitos de atores entre espaços estatais e não estatais, é importante identificar como se dá a constituição de fronteiras políticas para não perdermos de vista os momentos em que, distantes dos diálogos, as fronteiras entre os movimentos sociais e o Estado tornam-se intransponíveis, não apenas limitando o poder de impacto do ativismo e verticalizando as deliberações políticas a partir da burocracia Estatal, mas também dificultando que as políticas públicas alcancem setores populacionais avessos à lógica institucional hegemônica, ou mesmo criminalizando atores e ações coletivas.

Esse cenário ressalta a importância de reflexões sobre as relações estabelecidas entre os atores políticos nas fronteiras entre o Estado e a sociedade civil organizada. A maior parte da literatura sobre esse tema se abriga nas ciências políticas e na sociologia, com poucas contribuições da psicologia social (Paiva, Stralen, & Costa, 2014Paiva, F. S., Stralen, C., & Costa, P. H. A. (2014). Participação social e saúde no Brasil: revisão sistemática sobre o tema. Ciência e Saúde Coletiva, 19(2), 487-498.). Desse modo, nosso estudo busca contribuir para a compreensão das interações entre atores por meio da análise dos processos identitários e da construção discursiva sobre essas interações.

Aspectos metodológicos

A pesquisa foi orientada por uma abordagem qualitativa e os dados empíricos foram construídos com o uso de análise de documentos, observação de campo e entrevistas semiestruturadas. Os documentos analisados foram materiais publicados pelos governos sobre participação social, tais como divulgação dos conselhos e conferências, cartilhas, relatórios, editais, discursos públicos etc. As observações de campo, com registro em diário, foram feitas em eventos que contaram com a participação de ativistas e gestores públicos e em interações informais nos espaços que acessamos durante a pesquisa. Buscamos registrar os conflitos que estabeleceram fronteiras políticas e as enunciações identitárias que situavam as interações estatais e movimentalistas.

Realizamos 26 entrevistas semiestruturadas com ativistas que, no período entre 2003 e 2010, ocuparam cargos: no governo federal, em Brasília, nos governos estaduais e municipais nas cidades de Belo Horizonte/MG e Rio de Janeiro/RJ. Optamos por essas duas cidades como contraponto à influência do pertencimento partidário. No Estado de Minas Gerais a base partidária governista era opositora ao governo federal, ao contrário do Rio de Janeiro. Onze entrevistados eram filiados a partidos políticos, três deles em partidos opositores ao governo federal, seis especificamente ao Partido dos Trabalhadores (PT). Dois haviam se desfiliado e um nunca foi filiado a nenhum partido, mas estava em processo de filiação ao Partido Comunista do Brasil (PC do B). Com relação ao gênero, foram treze homens, sendo um deles transexual, e treze entrevistadas mulheres, sendo três delas travestis ou transexuais. Com relação à orientação sexual, doze entrevistados se declararam homossexuais, sendo três lésbicas. Três deles nunca militaram no movimento LGBT, mas sim no movimento de Juventudes. Com relação à vinculação aos movimentos sociais, onze declararam ativismo apenas junto do movimento LGBT, sete apenas do movimento de juventudes e os demais declararam pertencer a dois ou mais movimentos. Com relação à idade, entrevistamos seis militantes com menos de trinta anos de idade (ou seja, eram oficialmente “jovens” no momento da entrevista), dez entre trinta e quarenta e dez com mais de quarenta anos no momento da entrevista.

Os órgãos nos quais acessamos esses entrevistados estão ligados a políticas de educação, saúde e questões sociais variadas, tais como direitos humanos, direitos de cidadania, desenvolvimento social e assistência social. Buscamos acessar sujeitos que ocupam desde cargos de mais destaque, como subsecretários, chefes de gabinetes e coordenadores, até assessores e técnicos administrativos, mas todos com uma trajetória significativa como militantes de movimentos sociais. As entrevistas foram majoritariamente realizadas nos locais de trabalho, mas também em eventos e agendamentos específicos para a entrevista, em locais públicos. A escolha dos entrevistados se deu, inicialmente, por indicações pessoais e busca em sites dos movimentos sociais, mas em seguida aplicamos a técnica “bola de neve” para uma maior diversidade de posições discursivas.

Não utilizamos um roteiro de entrevista rígido nas entrevistas semiestruturadas (Klandermans, Staggenborg, & Tarrow, 2003Klandermans, B., Staggenborg, S., & Tarrow, S. (2003). (Orgs.), Methods of Social Movement Research. Minneapolis: University of Minnessota Press.), e as perguntas foram feitas no contexto do diálogo estabelecido entre o pesquisador e os entrevistados (Mendes, 2003Mendes, J. (2003). Perguntar e observar não basta, é preciso analisar: algumas reflexões metodológicas. Recuperado de http://www.ces.uc.pt/publicacoes/oficina/194/194.pdf
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). As entrevistas abordaram: (a) percurso de militância e a transição para o cargo governamental; (b) relações entre os diversos movimentos sociais e destes com o Estado; (c) noções de mudança social, formas de interação, conflitos políticos e papel dos movimentos sociais.

Para tratamento dos dados utilizamos a Análise Sociológica do Sistema de Discursos, que integra diferentes níveis analíticos. Os discursos são compreendidos como construções teóricas que ajudam a “reconfigurar o fenômeno que se está investigando e a localizá-lo em um novo marco compreensivo” (Álamo, 2010, p. 50Álamo, F. (2010). Análisis Sociológico del Sistema de Discursos. Madrid: CIS.). As categorias que emergiram da leitura exaustiva dos dados foram organizadas em dois discursos complementares entre si: (a) O discurso do participacionismo, que aponta sentidos e ambiguidades atravessadas nos discursos governamentais sobre a participação social; (b) O discurso do diferencialismo identitário, que mapeia o campo de identificações e o posicionamento dos atores na arena política, identificando negociações, articulações e estratégias discursivas sobre os processos de (in)diferenciação (Prado & Souza, 2002Prado, M. & Souza, T. (2002). Problematizando discursos contemporâneos sobre as formações identitárias. Revista IDEA, 16(36), 12-22.).

A articulação desses discursos é um instrumento para a análise das interações sociais nos espaços institucionais de participação e das formas que o político vem imprimindo no fazer coletivo dos atores. Busca-se uma ferramenta teórico-metodológica para o estudo de processos psicopolíticos que se dão na interface entre atores e espaços estatais e não estatais.

O discurso do participacionismo

O participacionismo no Brasil faz parte da cultura política institucionalizada com a constituição de 1988 e, como argumenta D’Incao (2001D’Incao, M. (Org.). (2001). O Brasil não é mais aquele… Mudanças sociais após a redemocratização. São Paulo: Editora Cortez.), o PT foi o partido que mais apostou na institucionalização dos mecanismos de participação, antes nas gestões municipais e estaduais e depois no governo federal. A atuação do partido historicamente valorizou a participação da sociedade civil, sem comprometer a estabilidade política e a governabilidade. No governo federal, o discurso governamental de ruptura histórica (“nunca antes na história desse país”) contrasta com a conciliação de antagonismos e de interesses contraditórios para a produção de consensos (Ricci, 2010Ricci, R. (2010). Lulismo: da Era dos Movimentos Sociais à Ascensão da Nova Classe Média Brasileira. Rio de Janeiro: Editora Contraponto/Fundação Astrojildo Pereira.). Como ironizou um de nossos entrevistados “Capilaridade e consenso. Pro PT tudo é consenso” (Entrevista 04). O discurso sobre a participação social tenta superar este contraste ao associar a participação social preconizada pela Constituição de 1988 a algo inédito: “a partir de 2003, o país adotou uma nova forma de governar”, “experiência inovadora que estabeleceu uma nova relação entre o Estado e a sociedade”; “o Governo Lula mostrou que é possível uma nova forma de fazer política” (Secretaria-Geral da Presidência da República, 2011, pp. 6-7Secretaria-Geral da Presidência da República. (2011). Democracia Participativa: Nova relação do estado com a sociedade (2003-2010). Brasília, DF: Autor. Recuperado de https://issuu.com/secretariageralpr/docs/democraciaparticipativa_web
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).

O objetivo deste artigo não é criticar ou avaliar, mas analisar o lugar da participação na constituição de um discurso sobre a democracia no qual a participação social se torna, ao mesmo tempo, uma técnica de governo e uma utopia política. O discurso governamental pôde ser apreendido quando o governo expressou sua concepção sobre a participação e nos exemplos e depoimentos escolhidos para ilustrar os benefícios da participação nos materiais de divulgação do governo. Aqui trabalhamos especificamente com a análise dos documentos citados como Secretaria-Geral da Presidência da República (2010Secretaria-Geral da Presidência da República. (2010). Conselhos Nacionais: Dados Básicos, Organização, Gestão Atual, Finalidade, Composição, Competências. Brasília, DF: Autor. Recuperado de https://www.ipea.gov.br/participacao/images/pdfs/relatoriofinal_perfil_conselhosnacionais.pdf
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, 2011Secretaria-Geral da Presidência da República. (2011). Democracia Participativa: Nova relação do estado com a sociedade (2003-2010). Brasília, DF: Autor. Recuperado de https://issuu.com/secretariageralpr/docs/democraciaparticipativa_web
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). Sintetizamos essa perspectiva de participação em cinco elementos que compõem o discurso do participacionismo:

1. Participação qualificada: relativiza o papel tradicional do especialista: “Antes as decisões eram tomadas exclusivamente por técnicos e dirigentes dos ministérios. Agora, são construídas em parceria com a sociedade civil” (Secretaria-Geral da Presidência da República, 2011, p. 9Secretaria-Geral da Presidência da República. (2011). Democracia Participativa: Nova relação do estado com a sociedade (2003-2010). Brasília, DF: Autor. Recuperado de https://issuu.com/secretariageralpr/docs/democraciaparticipativa_web
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); Porém, esta nova forma de governar deve ser “baseada no diálogo permanente e qualificado” (p. 6Secretaria-Geral da Presidência da República. (2011). Democracia Participativa: Nova relação do estado com a sociedade (2003-2010). Brasília, DF: Autor. Recuperado de https://issuu.com/secretariageralpr/docs/democraciaparticipativa_web
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), ou seja, os atores coletivos que participam precisam se “qualificar” para estabelecer um “diálogo” com o Estado. A ideia de qualificação pode ser entendida tanto no sentido de que os movimentos sociais precisam compreender como funciona o Estado (o que contribui para adaptar as estratégias políticas às conformações institucionais) como no sentido de que o governo precisa se qualificar para dialogar com os movimentos sociais (o que contribuiu para que o discurso governamental se adeque aos anseios de cada movimento social com suas temáticas e demandas específicas, podendo evitar, inclusive, os pontos mais polêmicos, utilizar seus jargões e emular culturas políticas particulares em espaços delimitados).

2. Amadurecimento gradativo: naturaliza a existência de conflitos [Um dos principais papéis dos conselhos é dar visibilidade aos conflitos (Secretaria-Geral da Presidência da República, 2011, p. 32Secretaria-Geral da Presidência da República. (2011). Democracia Participativa: Nova relação do estado com a sociedade (2003-2010). Brasília, DF: Autor. Recuperado de https://issuu.com/secretariageralpr/docs/democraciaparticipativa_web
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)], mas os direciona à busca de um consenso, que se resolverá com a participação qualificada dos interessados, ou seja, se algo ainda não está suficientemente democratizado, deve-se à pouca mobilização ou à falta de acúmulo e de produção de consensos em um determinado campo de participação. Evitar as polêmicas e optar pelos temas incontroversos pode ser percebido nas entrevistas, sobretudo entre os filiados aos partidos da base governista, sob a justificativa de que essas pautas ainda “não estavam amadurecidas”, “não tinham o acúmulo necessário”, “eram recentes”, “não se mobilizaram o suficiente” (frases como essas foram recorrentes nos dados de campo). Esse raciocínio reflete que “o que ainda falta não é por ausência de diálogo” (Secretaria-Geral da Presidência da República, 2010, p. 41Secretaria-Geral da Presidência da República. (2010). Conselhos Nacionais: Dados Básicos, Organização, Gestão Atual, Finalidade, Composição, Competências. Brasília, DF: Autor. Recuperado de https://www.ipea.gov.br/participacao/images/pdfs/relatoriofinal_perfil_conselhosnacionais.pdf
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).

3. Participação como um fim em si mesmo: se refere aos momentos nos quais, esvaziado de sentido prático, o participacionismo se direciona para a dimensão simbólica e emocional da participação, oferecendo elementos para a construção de sentido no interior das identidades coletivas reconhecidas por esse discurso. Mesmo que a participação não se reverta em ganhos concretos, substanciais, ainda aparece como importante. Além disso, o contato dos grupos “minoritários” com os espaços (físicos, não deliberativos) de poder e com a figura do presidente, sem a mediação institucional, foi reiteradamente apontado como algo democratizante por si mesmo, reproduzindo a ideia de participação como utopia.

Ao afirmar que a agenda do presidente “segue critérios que favorecem a interação direta entre o chefe de Estado e a sociedade civil e os movimentos sociais” (Secretaria-Geral da Presidência da República, 2011, p. 18Secretaria-Geral da Presidência da República. (2011). Democracia Participativa: Nova relação do estado com a sociedade (2003-2010). Brasília, DF: Autor. Recuperado de https://issuu.com/secretariageralpr/docs/democraciaparticipativa_web
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), percebe-se que uma das estratégias de justificação do participacionismo dá-se através de elementos emocionais e pelo reconhecimento identitário que, por si mesmos, implicariam em democratização social. Interessante observarmos que o destacado foi a “interação direta” com o “chefe de Estado”, e não com as instituições e o governo. Os elementos emocionais também podem ser visto nesta fala de um catador de papel: “Na verdade, a experiência para nós é de elevação da autoestima, pois pela primeira vez na história do Brasil, os catadores de papel puderam se encontrar com o Presidente da República” (Secretaria-Geral da Presidência da República, 2011, p. 21Secretaria-Geral da Presidência da República. (2011). Democracia Participativa: Nova relação do estado com a sociedade (2003-2010). Brasília, DF: Autor. Recuperado de https://issuu.com/secretariageralpr/docs/democraciaparticipativa_web
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); ou no trecho do discurso do então presidente Lula durante a primeira conferência LGBT:

Quando eu recebi, no Palácio do Planalto, os nossos queridos companheiros e companheiras catadores de papel, o companheiro lá de São Paulo fez um discurso, e dizia: “Presidente, se a gente não conquistar mais nada na vida, só o fato de a gente estar colocando o pé dentro do Palácio do Planalto, já terá valido a pena, porque nós nunca imaginamos passar nem perto do Palácio do Planalto. (Silva, 2008, p. 8Silva, L. (2008). Luiz Inácio Lula da Silva, abertura I Conferência Nacional de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais - GLBT. Centro de Convenções, Brasília-DF. Recuperado de http://www.biblioteca.presidencia.gov.br/presidencia/ex-presidentes/luiz-inacio-lula-da-silva/discursos/2o-mandato/2008/05-06-2008-discurso-do-presidente-da-republica-luiz-inacio-lula-da-silva-na-solenidade-de-abertura-da-i-conferencia-nacional-de-gays-lesbicas-bissexuais-travestis-e-transexuais
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)

4. Corresponsabilidade: expande a ideia de que tanto o governo como os movimentos sociais são “responsáveis” pelos resultados políticos nos campos abertos à participação, pois as políticas públicas são oriundas de consensos entre os atores. Ou seja, o governo “passa a contar com o respaldo dos setores interessados na ampliação da cidadania” (2010, p. 9). Segundo o discurso participacionista, é criado “um elo de corresponsabilidade que tanto estimula a transparência da administração pública quanto ativa a cidadania” (Secretaria-Geral da Presidência da República, 2010, p. 10Secretaria-Geral da Presidência da República. (2010). Conselhos Nacionais: Dados Básicos, Organização, Gestão Atual, Finalidade, Composição, Competências. Brasília, DF: Autor. Recuperado de https://www.ipea.gov.br/participacao/images/pdfs/relatoriofinal_perfil_conselhosnacionais.pdf
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). Esse dispositivo respalda as ações governamentais e implica e/ou devolve para a sociedade a responsabilidade pela “não transformação” de algo, de modo semelhante aos dois primeiros dispositivos desse discurso.

5. Proporcionalidade: iguala atores com capacidades políticas desiguais e que provavelmente foram desigualmente beneficiados. A ideia de proporcionalidade pode ser visualizada no seguinte trecho: “desde as entidades de empresários de construção civil até sindicatos de trabalhadores, todas as organizações não governamentais do setor puderam contribuir, foram ouvidas” (Secretaria-Geral da Presidência da República, 2011, p. 17Secretaria-Geral da Presidência da República. (2011). Democracia Participativa: Nova relação do estado com a sociedade (2003-2010). Brasília, DF: Autor. Recuperado de https://issuu.com/secretariageralpr/docs/democraciaparticipativa_web
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).

Estes cinco dispositivos tratam o conflito como um momento passageiro até o alcance do consenso, no qual as relações de poder são relativizadas, como se todos apresentassem as mesmas condições sociais e políticas de participação. As fronteiras identitárias são fundamentais nesse sistema. Fomentadas pelo reconhecimento dos “diversos segmentos sociais”, as diferenças serão uma parte importante do discurso sobre a participação.

O discurso do diferencialismo identitário

O discurso do diferencialismo tenta compreender os processos de identificação e a formação de fronteiras político-identitárias entre os atores que interagem nos espaços institucionais de participação. Os espaços de participação instaurados pelo governo ocorreram, em sua maioria, via políticas setoriais e/ou temáticas, que formam o que Tommasi (2012Tommasi, L. (2012). Nem bandidos nem trabalhadores baratos: trajetórias de jovens da periferia de Natal. Dilemas: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, 5(1), 101-129.) chama de campos de intervenção, com o financiamento de projetos, criação de conselhos e realização de conferências voltadas para “minorias”, que expressam suas especificidades e formalizam demandas relacionadas, sobretudo, ao reconhecimento, ao direito à diferença e à reparação identitária. Neste contexto, as negociações identitárias e seus processos de diferenciação ocuparam um lugar importante nos discursos analisados.

O monopólio das narrativas1 1 Eder (2003) associa à identidade coletiva a noção de monopólio de narrativas, que seria uma resposta da sociedade civil organizada aos processos de mobilização de identidades realizados pelo Estado. Segundo o autor, “essa teoria ajuda-nos a explicar por que as identidades coletivas são tão importantes para o Estado: elas fornecem uma narrativa integradora” (p. 10). [Eder (2003) associates to collective identity the notion of monopoly of narratives, which would be a response of organized civil society to the processes of mobilization of identities carried out by the State. According to the author, this theory helps us explain why collective identities are so important to the State: they provide an integrative narrative.] e os elementos simbólicos que articulam os sentimentos de pertencimento coletivo em nossos dados de campo podem ser observados em expressões nativas como “eu, negra e lésbica”, “eu, enquanto jovem, homossexual e trabalhador”, “eu, jovem feminista, do hip hop e da periferia”, “eu, jovem, negro e deficiente físico”, entre outras. Tais afirmações elencam diversas possibilidades de afirmação de identidades pautadas por sua autenticidade experiencial em uma teia de entrelaçamento entre pares categoriais. Também podem ser acionados elementos como classe social, afiliação partidária, participação em projetos temáticos (“sou da educação”, “segurança pública”, “nós da saúde” etc.). Além disso, outros pertencimentos ampliam a complexidade das identidades: “eu, enquanto Estado”, “eu, enquanto movimento social”, “ser ONG”, “ser universidade” etc. Essas expressões que colocamos entre aspas foram recorrentes nas entrevistas e observações de campo e nos ajudam a perceber a ênfase dada à diferença e à especificidade nos discursos que analisamos.

A definição de uma identidade coletiva (nós) é, desse modo, determinante para o monopólio de narrativas e, consequentemente, para o monopólio de oportunidades2 2 O monopólio de oportunidades é um conceito cunhado por Tilly (2000) que utilizamos para compreender a hierarquização entre os grupos organizados. Ele atua quando setores populacionais que não pertencem às elites políticas e econômicas formam uma “rede categorialmente circunscrita” e, com isto, podem conseguir o “acesso a um recurso que é valioso, renovável, está sujeito a monopólio, respalda as atividades da rede e se fortalece com seu modus operandi” (Tilly, 2000, p. 23). [The monopoly of opportunities is a concept coined by Tilly (2000) that we use to understand the hierarchy between organized groups. It acts when population sectors that do not belong to the political and economic elites form a categorically circumscribed network and, with this, can achieve access to a resource that is valuable, renewable, subject to monopoly, supports the activities of the network and strengthens with its modus operandi (Tilly, 2000).] , o que faz do diferencialismo uma construção discursiva complementar ao discurso participacionista. O diferencialismo ajuda a compreender como a constituição de identidades se relaciona com os modos através dos quais os movimentos sociais endereçam suas demandas ao Estado e como o Estado lida com suas diferenças. Em síntese, na medida em que um grupo circunscrito categorialmente acessa uma rede de monopólios (através do monopólio de narrativas), serão articulados recursos simbólico-materiais (ex: finaciamentos, representações, influência política) que os conectam com a mobilização de identidades promovida pelo Estado3 3 O argumento deste parágrafo foi trabalhado detalhadamente em Machado (2014). [The argument of this paragraph was worked out in detail in Machado (2014).] .

Castro (2008Castro, L. R. (2011) Os jovens podem falar? Sobre as possibilidades políticas de ser jovem hoje. In J. Dayrell, M. I. C. Moreira, & M. Stengel (Orgs.), Juventudes Contemporâneas: um mosaico de possibilidades (pp. 299-324). Belo Horizonte: PucMinas.) discute a centralidade da reparação identitária na pauta de juventudes e aponta para o lugar ocupado pela experiência identitária argumentando que não basta “ser jovem” para constituir-se como sujeito político. Além de jovem, outros marcadores identitários precisam ser agregados para que a participação adquira substância nos espaços de negociação, tais como ser “jovem, negro, da periferia”, ser “jovem, lésbica e ativista cultural”, dentre outras combinações produtoras de (in)diferenciação. Esta ênfase na especificidade pode redundar na busca por uma “autenticidade experiencial” que reifica as identidades, atribuindo uma essência aos sujeitos e secundarizando a dinâmica e os aspectos contextuais e relacionais dos processos de identificação, em outras palavras, opera-se uma abordagem não discursiva da experiência (Scott, 1999Scott, J. (1999). Experiência. In A. Silva, M. Lago, & T. Ramos (Orgs.), Falas de Gênero (pp. 21-55). Santa Catarina: Editora Mulheres.). A identidade e o direito de se pronunciar politicamente a respeito de algum tema da política descansará, nessa perspectiva, na legitimidade da experiência que será tomada como evidência da diferença (Scott, 1999Scott, J. (1999). Experiência. In A. Silva, M. Lago, & T. Ramos (Orgs.), Falas de Gênero (pp. 21-55). Santa Catarina: Editora Mulheres.). E o Estado tem um papel determinante no reconhecimento das identidades e das experiências a elas associadas (monopólio de narrativas) (Eder, 2003Eder, K. (2003). Identidades Coletivas e Mobilização de Identidades. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 18(53), 5-18.).

O ponto tenso do discurso diferencialista está nas interações que estabelece, pois limita a construção de equivalências entre lutas democráticas fragmentando os atores coletivos. Será a afirmação de uma diferença que garantirá o monopólio de uma determinada narrativa através do reconhecimento institucional das identidades coletivas. Por exemplo, uma jovem negra lésbica que desenvolveu uma trajetória de militância junto aos movimentos de educação não ocupa plenamente seu lugar de cidadã ou de sujeito político, pois estaria menos “autorizada” a falar de lugares acerca dos quais não experienciou, como o lugar das lésbicas, ou dos negros em sentido geral, e menos ainda acerca de outras desigualdades. Assim, o monopólio de uma narrativa identitária implica também circunscrever um campo de reconhecimento e atuação, fora do qual este “nós” experiencial não estaria autorizado a atuar. Ampliar a abrangência de discursos políticos implicará esforços adicionais e cálculos complexos nas relações de perdas e ganhos na busca de impactos políticos, o que sustenta um fechamento interacional em suas categorias e entre categorias, enfocando a diferença, em detrimento da equivalência (Laclau, 2005Laclau, E. (2005). La razón populista. Buenos Aires: FCE.).

Ao demarcar a dimensão identitária e a primazia da experiência na constituição das identidades coletivas, o mecanismo discursivo resultante demanda a transformação de indivíduos e grupos desiguais (inseridos desigualmente em relações categoriais) em experts de sua própria “exclusão”. Isso pode ser visto como um elemento que incrementa a participação qualificada do discurso do participacionismo. Os atores políticos, ao circunscreverem seu horizonte de transformação social neste campo discursivo e direcionarem suas ações aos aspectos técnicos das políticas públicas e ações governamentais, são assimilados à ordem institucional em processos de “inclusão” ainda mais segmentados que a setorialização estatal. Argumentamos que isso não é efeito direto da diferença ou de seu reconhecimento, mas de processos que, no presente contexto, tentamos sintetizar como o discurso do diferencialismo identitário. Será o diferencialismo, e não a diferença, que estabelecerá um limite experiencial e um fechamento interacional que dificulta a formação de cadeias de equivalência. As dinâmicas desse discurso podem ser mais bem compreendidas a partir de três dispositivos inter-relacionados e complementares: (a) A reificação ou essencialização das identidades; (b) As fronteiras reticulares; (c) A sobreposição entre técnica e identidade;

1. A reificação ou essencialização das identidades: Os movimentos sociais e o Estado trabalham com categorias sociais fixas, o que reifica e essencializa as identidades quando tratam da produção de diferenças nos processos políticos. A reificação implica um condicionamento interacional marcado pela primazia da experiência vivenciada no âmbito pessoal, porém, agora, acrescida de pertencimentos identitários ligados também à origem institucional, competências técnicas, âmbitos de atuação e outros. Obviamente, não existe mobilização política sem experiência, pois, como argumenta Brah (2006Brah, A. (2006). Diferença, diversidade, diferenciação. Cadernos Pagu, 26, 329-376.), a “‘experiência’ é um processo de significação que é a condição mesma para a constituição daquilo a que chamamos ‘realidade’” (p. 360Brah, A. (2006). Diferença, diversidade, diferenciação. Cadernos Pagu, 26, 329-376.). Entretanto, ao circunscrever e homogeneizar a experiência aos efeitos sociais isolados de pares categoriais (mulher - homem etc.), o discurso diferencialista dificulta a articulação das desigualdades em cadeias de equivalência. Para Scott (1999Scott, J. (1999). Experiência. In A. Silva, M. Lago, & T. Ramos (Orgs.), Falas de Gênero (pp. 21-55). Santa Catarina: Editora Mulheres.), uma abordagem não discursiva da experiência reifica a identidade como um fato empírico, tornando-a indissociável da diferença que a constitui, o que dificulta com que sejam reveladas as contingências históricas que imprimem uma posição de sujeito a uma determinada diferença. Uma perspectiva essencialista, quando pauta a formação de identidades coletivas, resulta em um fechamento interacional que limita a experiência da política aos seus aspectos instrumentais, a partir de demandas específicas ou pelo reconhecimento de diferenças estanques.

Como argumenta Scott (1999Scott, J. (1999). Experiência. In A. Silva, M. Lago, & T. Ramos (Orgs.), Falas de Gênero (pp. 21-55). Santa Catarina: Editora Mulheres.), visibilizar a experiência como um evento transparente “impede a análise do funcionamento do sistema e de sua historicidade; ao invés, reproduz seus termos” (p. 27Scott, J. (1999). Experiência. In A. Silva, M. Lago, & T. Ramos (Orgs.), Falas de Gênero (pp. 21-55). Santa Catarina: Editora Mulheres.). Ao limitar a reflexão e a prática política a uma particularidade da experiência vivencial do sujeito, o discurso diferencialista dificulta a percepção de que categorizações sociais não apenas hierarquizam a vida social, mas também são marcadores que atravessam as relações sociais como um todo, fazendo de uma determinada luta social uma questão que diz respeito apenas a uma determinada minoria vitimada pelas relações que denuncia.

2. Fronteiras reticulares: analisa a interação dos atores nas fronteiras entre o Estado e a sociedade atribuindo especificidades, mas apontando a permeabilidade discursiva. Embora concordemos que o Estado não deva ser visto como um “ator” (Silva, 2015Silva, Marcelo K. (2015). Atores, Espaços e Repertórios: a atuação dos movimentos sociais através das fronteiras da sociedade civil e do Estado. In: Ilse Scherer-Warren; Lígia H. H. Lüchmann (Orgs.), Movimentos Sociais e Engajamento Político: trajetórias e tendências analíticas (pp. 133-160). Florianópolis: Editora UFSC.), tentamos identificar contingências postas por esse espaço para os repertórios e as identidades dos atores. Vários entrevistados se queixaram da indefinição de papéis que são atribuídos ao Estado e aos movimentos sociais. Anteriormente, esse aspecto nos levou a tratar destas fronteiras como “opacas” (Prado, Machado, & Carmona, 2009Prado, M., Machado, F., & Carmona, A. (2009). Reflexões sobre a luta pela formalização e tradução da igualdade nas fronteiras indefinidas do Estado contemporâneo: radicalização e/ou neutralização do conflito democrático? Interface: a journal for and about social movements, 1(2), 134-165.). Entretanto, esse termo não nos ajuda a compreender a diferença entre “espaços” e como os atores transitam entre eles. As fronteiras reticulares analisam os aspectos identitários dessa fronteira, reconhecendo que a internalização de ativistas ou coletivos não significa “proporcionalidade” dos atores nas relações políticas que dão forma aos projetos de governo.

A ideia de retícula foi tomada de uma técnica de finalização artística de impressão de texturas sobre papel. Uma retícula é uma folha flexível que contém através de pontos as formas de uma textura a ser impressa e que esfregada com tinta sobre um papel transfere para ele essas formas. Uma fronteira flexível que contém um padrão discursivo a ser impresso e quanto maior o número de pontos maior a definição da imagem, até que em um determinado momento o excessivo número de pontos borra a imagem, sobretudo quando a superfície na qual se imprime aquela forma é muito porosa. Essa ideia de retícula pode ser associada aos modos de interação entre instituições e atores governamentais e movimentos organizados. Para dar conta da complexidade expressa pelo crescente número de especificidades e diferenças dos atores sociais, o estado começa a produzir segmentações que respondem às dinâmicas sociais, para mobilizar identidades. Os movimentos sociais, mais dinâmicos e menos institucionalizados, se adequam a esta mobilização de identidades para mobilizar narrativas e monopolizar recursos. Esse movimento, durante o Governo Lula, fez com que as segmentações e diferenças, que aqui compreendemos como “número de pontos da retícula”, aumentassem de forma que em algum momento redundasse em borrões, ou seja, na falta de assertividade das interações e repertórios.

De um lado dessa fronteira reticular, o governo adequou seu sistema de categorias aos processos de mobilização e constituição de identidades coletivas da sociedade civil que melhor monopolizavam narrativas. O participacionismo nos ajuda a compreender este processo que, ao fomentar a internalização de representantes das “minorias” identitárias no Estado, cria uma gramática da participação que redunda na adequação das formas de interação entre atores que devem se qualificar, amadurecer suas demandas, se corresponsabilizar etc. As fronteiras reticulares permitem que o governo responda aos movimentos sociais formulando discursos que reconhecem e a afirmam suas categorias identitárias e demandas, com conceitos, jargões e valores adequados - mesmo que as possibilidades de resposta a essas demandas estejam condicionadas pelas disputas entre atores com capacidades desproporcionais de incidência. Os movimentos sociais, por sua vez, adequaram suas formas de interação e organização às categorias desenhadas nessa retícula como forma de acessar recursos, espaços de representação, cargos etc. A fronteira reticular permite alguma homogeneidade simbólica, discursiva e organizacional entre as “superfícies” por ela separadas, mesmo que isso não implique necessariamente uma maior capacidade de interpelação dos movimentos sociais. Assim, embora o governo capitalize sobre o “poder” dos movimentos sociais, por meio da mobilização de identidades, tal poder é em grande parte dissipado pelas formas desenhadas nessas fronteiras reticulares, que segmentam e reificam identidades.

A “entrada” no Estado reorganiza os sentimentos de pertencimento e a atribuição de significados a esses pertencimentos, o que obriga os militantes a separarem diferentes posições de sujeito que se apresentam como conflitantes em seus discursos (“eu enquanto estado” vs “eu enquanto movimentos sociais”). Essa separação apareceu em diversos momentos da pesquisa, nos quais os sujeitos relataram que sua trajetória militante era apontada como desqualificadora de críticas a determinados posicionamentos governamentais. Em outras palavras, o fato de virem de movimentos sociais era associado ao não entendimento sobre o que deveria ser feito e como. Ao mesmo tempo, a participação em espaços estatais redefine o pertencimento e a interação desses ativistas no campo dos movimentos sociais.

O monopólio de oportunidades reforça as fronteiras identitárias e as possibilidades de ação dos movimentos, mas pode engendrar conflitos, disputas e hierarquias entre os grupos ativistas. Por exemplo, um movimento que acessa recursos (como financiamentos, bolsas ou cargos governamentais para seus ativistas) tende a enfrentar conflitos com movimentos que não acessaram os mesmos recursos. Isso aumenta o número de conflitos pessoais e as contradições internas no campo dos movimentos sociais, o que leva ao enfraquecimento da rede de coletivos em torno de alguma temática, comprometendo a identidade coletiva da rede e a assertividade nas interações dos movimentos com os atores governamentais. A internalização de ativistas e o acesso a recursos valiosos pode aumentar a capacidade de um movimento social de incidir sobre as formas das fronteiras reticulares. Porém, como a “identidade” representada por este sujeito está circunscrita pelo discurso do diferencialismo, sua inclusão será segmentada e conflitante com questões técnicas das políticas públicas.

3. Sobreposição entre técnica e identidade: A sobreposição entre técnica e identidade é um tensionamento que se estabelece entre um discurso sobre a eficácia na gestão das políticas públicas (um saber fazer no Estado) e a presença de uma identidade. Podemos localizar, de um lado, uma associação entre técnica e política e, de outro, uma associação entre política e identidade. Essa tensão se assemelha ao dilema apresentado por Phillips (2001Phillips, A. (2001). De uma política de idéias a uma política de presença? Revista de Estudos Feministas, 9(1), 268-290.): uma política de ideias ou uma política da presença. Estes polos aparecem como complementares e sem contradições no discurso do participacionismo, mas os entrevistados descrevem interações entre o governo e os movimentos sociais nas quais os conflitos entre técnica e identidade se tornam visíveis.

O governo terá que justificar suas ações por meio de conhecimentos técnico-científicos que garantiriam a legitimidade de um determinado projeto de governo em um contexto altamente tecnicista, e, ao mesmo tempo, por meio de conhecimentos fundamentados na diversidade das experiências identitárias, que garantiriam a legitimidade da representação de um discurso populista (Laclau, 2005Laclau, E. (2005). La razón populista. Buenos Aires: FCE.). Relatando uma situação na qual a técnica tensiona a identidade, um dos nossos entrevistados defende que os “cargos comissionados [que podem ser indicados por sua identidade, mais que por sua competência] mandam nos de carreira e não entendem suficientemente a máquina do estado” (Entrevista 13), o que prejudica o bom funcionamento das políticas públicas e o gasto eficiente do orçamento estatal. O trecho a seguir é muito ilustrativo de como a política se vê tensionada entre elementos técnicos e identitários, no qual a presença identitária se sobrepõe, podendo fragilizar a política:

O problema não é a afirmação da luta específica, o problema é uma completa desarticulação de qualquer movimento geral, qualquer compreensão do direito integrado. Se não houver isso o cara não vai entender que teve homem de movimento de mulheres, teve branco de movimento negro, teve adultos no movimento jovem. Então é natural você botar jovem, 20 anos, de servidor público sem nenhuma preparação, só porque é jovem. Sem nenhuma preparação. [Você tem visto isso?] Muitas vezes. Isso é característico. O PT tem muito isso. Não precisa ter qualificação pra debate social. (Entrevista 01, grifo nosso)

Isto nos leva a outro efeito do diferencialismo: desqualificar ou subalternizar uma temática específica, ao mesmo tempo em que reafirma uma identidade e/ou garante o acesso a recursos pelos grupos que monopolizam narrativas. Identificamos conflitos que derivam destas tensões em diversas dinâmicas interacionais, desde a contratação de sujeitos por sua identidade para cargos associados às temáticas desta mesma “identidade”, até a composição dos conselhos e a organização das conferências, que muitas vezes associam identidades a cadeiras e à legitimidade dos delegados. Esses sujeitos são escolhidos sem que muitas vezes estejam qualificados técnica ou politicamente para o desenvolvimento das tarefas administrativas. A “qualificação” implicada no diferencialismo está mais relacionada à experiência, como o fundamento de uma verdade sobre a diferença que reifica e essencializa uma identidade.

Esse efeito também se observa na composição dos conselhos. Registramos exemplos de representantes de ministérios e de outros órgãos governamentais, enviados a esses conselhos, escolhidos por sua idade ou orientação sexual, reforçando a ideia de que a experiência é uma evidência da diferença. Segundo estes depoimentos, tais representantes desconheciam os debates desenvolvidos pelos movimentos sociais e, algumas vezes, tinham posicionamentos conservadores e despolitizados, pois a experiência de uma diferença não implica a politização de uma identidade. Além disso, na maioria das vezes, esses conselheiros não ocupavam lugares de destaque em seus ministérios e órgãos de origem e, mesmo que apreendam os debates do conselho, não conseguirão reproduzir as deliberações em seus ambientes de trabalho, o que limita a capacidade de incidência intersetorial. Isto também acontece quando é uma indicação da sociedade civil para compor o conselho. No caso do Conselho de Juventude, as Organizações que contam com representação foram fundadas e são dirigidas em sua maioria por adultos, mas geralmente enviam algum funcionário “jovem” para participar do conselho em função de sua identidade. Segundo um entrevistado isso é problemático, pois:

como é que eu vou pactuar um tema com uma cara que não manda na Entidade? Um cara que é funcionário, não é dirigente... Se tu pegar o Conselho da Juventude basicamente são funcionários dessas Entidades, não são dirigentes. Isso é sério porque essa pessoa não tem capacidade de reproduzir essa agenda de forma orgânica na sua própria Instituição. (Entrevista 02)

Interações como essas valorizam a presença de uma identidade, mas desqualificam e subalternizam a pauta e as ideias políticas, mantendo-as segmentadas e insuladas institucionalmente. Afinal, é algo substancialmente diferente, por exemplo, uma travesti promovendo ações que incidem no Ministério da Fazenda, de uma travesti desenvolvendo um projeto para o “segmento trans”, em uma subsecretaria específica para o “segmento” LGBT, dentro de uma isolada, subfinanciada e subvalorizada secretaria de direitos humanos.

Considerações finais

Os estudos sobre a participação social no período do governo Lula apontam mudanças significativas nos padrões de interação entre o Estado e a Sociedade (Abers et al., 2014Abers, R., Serafim, L., & Tatagiba, L. (2014). Repertórios de interação estado-sociedade em um estado heterogêneo: a experiência na Era Lula. Dados, 57(2), 325-357.). Após os governos do PT presenciamos o endurecimento dos discursos conservadores e autoritários que levaram à vitória eleitoral diversas candidaturas de direita para cargos legislativos e executivos, inclusive em âmbito federal. O participacionismo no Brasil, cuja valorização foi crescente desde a constituição de 1988, se vê hoje em um contexto bastante desfavorável, no qual a democracia é colocada em questão. Para compreendermos os processos políticos atuais, sobretudo no campo dos movimentos sociais, nos parece imprescindível que consigamos identificar os efeitos do participacionismo do período que analisamos na mobilização, organização e estabelecimento de fronteiras políticas.

Nossa pesquisa buscou aportar uma contribuição orientada por uma perspectiva psicossocial ao debate sobre o participacionismo. Por meio da análise de discursos, procuramos jogar luz sobre os processos identitários que se dão nas interações entre os atores que estudamos para ampliar nossa compreensão sobre a participação política nos espaços institucionais. O diferencialismo e o participacionismo foram construídos como discursos complementares para compreender como a constituição de identidades se relaciona com os modos através dos quais os movimentos sociais endereçam demandas ao Estado, e como o Estado lida com as diferenças identitárias no âmbito da participação social. Uma vez que a escolha de estratégias políticas e o estabelecimento de formas específicas de interação social não são independentes de como os atores se concebem mutuamente e definem papéis, os discursos analisados dão pistas para compreendermos as insuficiências da participação institucionalizada para o necessário processo de mobilização de identidades pelo Estado.

Dentre os limites da pesquisa, é importante destacar que nossa metodologia não foi capaz de mapear as diferenças entre os âmbitos municipal, estadual e federal da administração pública. Outra limitação diz respeito ao enfoque isolado no poder executivo. Incluir as relações dos movimentos sociais com o poder legislativo e o judiciário ampliaria bastante nossa compreensão sobre o participacionismo. Não estava no escopo desta pesquisa, mas também consideramos relevante uma análise que leve em conta os contramovimentos e seus efeitos nas pautas setoriais e na formação de identidades. Em nossa pesquisa, já naquele momento, pudemos notar que o movimento LGBT e as formas que imprimiam no que aqui chamamos de fronteira reticular, com seus jargões, valores e demandas, pautaram a formação de antagonismos e os modos de atuação dos movimentos conservadores e fundamentalistas. Esses são pontos que endereçamos para novas pesquisas.

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Notas [Notes]

  • 1
    Eder (2003Eder, K. (2003). Identidades Coletivas e Mobilização de Identidades. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 18(53), 5-18.) associa à identidade coletiva a noção de monopólio de narrativas, que seria uma resposta da sociedade civil organizada aos processos de mobilização de identidades realizados pelo Estado. Segundo o autor, “essa teoria ajuda-nos a explicar por que as identidades coletivas são tão importantes para o Estado: elas fornecem uma narrativa integradora” (p. 10). [Eder (2003Eder, K. (2003). Identidades Coletivas e Mobilização de Identidades. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 18(53), 5-18.) associates to collective identity the notion of monopoly of narratives, which would be a response of organized civil society to the processes of mobilization of identities carried out by the State. According to the author, this theory helps us explain why collective identities are so important to the State: they provide an integrative narrative.]
  • 2
    O monopólio de oportunidades é um conceito cunhado por Tilly (2000) que utilizamos para compreender a hierarquização entre os grupos organizados. Ele atua quando setores populacionais que não pertencem às elites políticas e econômicas formam uma “rede categorialmente circunscrita” e, com isto, podem conseguir o “acesso a um recurso que é valioso, renovável, está sujeito a monopólio, respalda as atividades da rede e se fortalece com seu modus operandi” (Tilly, 2000, p. 23Tilly, C. (2000). La desigualdad persistente. Buenos Aires: Manantial.). [The monopoly of opportunities is a concept coined by Tilly (2000) that we use to understand the hierarchy between organized groups. It acts when population sectors that do not belong to the political and economic elites form a categorically circumscribed network and, with this, can achieve access to a resource that is valuable, renewable, subject to monopoly, supports the activities of the network and strengthens with its modus operandi (Tilly, 2000Tilly, C. (2000). La desigualdad persistente. Buenos Aires: Manantial.).]
  • 3
    O argumento deste parágrafo foi trabalhado detalhadamente em Machado (2014Machado, F. V. (2014). Analisando as fronteiras entre o Estado e os Movimentos Sociais:considerações teórico-metodológicas. In A. F. Lima & N. Lara (Orgs.), Metodologias de Pesquisa em Psicologia social crítica (pp. 139-164). Porto Alegre: Sulina.). [The argument of this paragraph was worked out in detail in Machado (2014Machado, F. V. (2014). Analisando as fronteiras entre o Estado e os Movimentos Sociais:considerações teórico-metodológicas. In A. F. Lima & N. Lara (Orgs.), Metodologias de Pesquisa em Psicologia social crítica (pp. 139-164). Porto Alegre: Sulina.).]
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  • Financiamento [Funding agency]: CAPES/CNPq [408430/2013-3] | Chamada [Call] MCTI/CNPq/MEC/CAPES n. 43/2013.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Dez 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    24 Fev 2019
  • Revisado
    30 Mar 2020
  • Aceito
    15 Jun 2020
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