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LAVAGEM CEREBRAL: CIÊNCIA, MITO E PSEUDOCIÊNCIA DO CONTROLE PSICOLÓGICO

LAVADO DE CEREBRO: CIENCIA, MITO Y PSEUDOCIENCIA DEL CONTROL PSICOLÓGICO

BRAINWASHING: SCIENCE, MYTH, AND PSEUDOSCIENCE OF PSYCHOLOGICAL CONTROL

Resumo

O interesse pela possibilidade de reconfigurar a mente humana foi recorrente na história da humanidade, sob diferentes formas aliadas principalmente à religião, à guerra e à política. Somente a partir de 1950, entretanto, é que psicólogos, psiquiatras e outros pesquisadores se dedicaram com maior profundidade ao tema, popularizado pelo termo genérico de lavagem cerebral. O objetivo deste artigo é revisar as bases teórico-conceituais e metodológicas desses esforços, assim como sua manifestação atualizada na psicologia social, quando se busca a modificação de atitudes, crenças e comportamentos. São analisados criticamente os usos da lavagem cerebral para gerar mudanças significativas por técnicas de pressões psicológicas e tortura física, os mitos de sua implementação e sua (ir)reversibilidade.

Palavras-chave
Lavagem cerebral; Mudança de atitude; Controle da mente

Resumen

El interés por la posibilidad de reconfigurar la mente humana ha sido recurrente en la historia de la humanidad, en diferentes formas, principalmente aliadas a la religión, la guerra y la política. Sin embargo, sólo después de 1950, psicólogos, psiquiatras y otros investigadores se dedicaron con mayor profundidad al tema, popularizado por el término genérico de lavado de cerebro. El objetivo de este artículo es revisar las bases teórico-conceptuales y metodológicas de estos esfuerzos, así como su manifestación actualizada en la psicología social, cuando se busca modificar actitudes, creencias y conductas. Se analizan críticamente los usos del lavado de cerebro para generar cambios significativos a través de técnicas de presión psicológica y tortura física, los mitos de su implementación y su (ir)reversibilidad.

Palabras clave
Lavado de cerebro; Cambio de actitud; Control mental

Abstract

The interest in the possibility of reconfiguring the human mind has been recurrent in the history of humanity, in different forms, mainly allied to religion, war, and politics. Only after 1950, however, did psychologists, psychiatrists, and other researchers dedicate themselves in greater depth to the topic, popularized by the generic term brainwashing. The aim of this paper is to review the theoretical-conceptual and methodological bases of these efforts, as well as their updated manifestation in social psychology, when one seeks to modify attitudes, beliefs, and behaviors. The uses of brainwashing to generate significant change through techniques of psychological pressure and physical torture, the myths of its implementation, and its (ir)reversibility, are critically analyzed.

Keywords
Brainwashing; Attitude change; Mind control

Introdução

Entre os diversos fenômenos da psicologia que têm enorme popularidade mesmo fora da área, a lavagem cerebral ora é vista como permeada de mitos e de pseudociência, ora como um conjunto de técnicas cientificamente validadas que visam ao controle mental. Embora a concepção de lavagem cerebral tenha origem controversa e imprecisa na história, é possível rastrear o uso moderno do termo em associação aos relatos dos campos de prisioneiros de guerra no século XX (Hunter, 1956Hunter, E. (1956). Brainwashing: The story of men who defied it. Farrarr, Straus and Cudahy.). A maneira como ocorre, no entanto, é bastante multifacetada. Ela envolve, entre outros, o uso de drogas para alteração de pensamentos, a privação sensorial, a pressão de grupo, dietas restritivas, a indução de fadiga, o controle e a manipulação (Lifton, 1961Lifton, R. J. (1961). Thought reform and the psychology of totalism: a study of “brainwashing” in China. Victor Gollancz.; Sargant, 1957/1997Sargant, W. (1997). Battle for the mind: A physiology of conversion and brain-washing. Windmill Press. (Original publicado em 1957)). Em alguns casos que se tentam apresentar como menos radicais, pode incluir também a imitação, a conformidade, a simpatia, a sugestibilidade e a hipnose (MacDougall, 1908/2001MacDougall, W. (2001). Introduction to social psychology. Batoche Books. (Original publicado em 1908)).

Pelo fascínio que gera, a lavagem cerebral acabou sendo objeto de estudos psiquiátricos, livros acadêmicos e artigos populares, mas também de produções fictícias como romances literários e filmes de ampla repercussão (Melley, 2012Melley, T. (2012). The covert sphere: Secrecy, fiction, and the national security state. Cornell University Press.). Com frequência ganha uma conotação também política, sobretudo quando se discutem temas como reforma do pensamento, reeducação ou mesmo persuasão coercitiva. Tal é o caso de fundamentalismos e radicalismos políticos, com destaque sobretudo para o problema do terrorismo internacional, tanto em relação ao processo de recrutamento de seus agentes quanto ao tratamento dispensado às suas vítimas (Taylor, 2017Taylor, K. (2017). Brainwashing: the science of thought control. Oxford University Press.).

Mesmo recebendo toda essa atenção, no entanto, ainda se verificam raros trabalhos que façam uma análise crítica e abrangente do problema. Caracteristicamente as publicações são estudos de caso muito específicos (eg., seitas religiosas), realizados por outras áreas do conhecimento (eg., psiquiatria) ou que focam em episódios mais antigos (eg., Alemanha nazista). De forma ainda mais evidente, não existe até hoje no Brasil qualquer estudo efetivamente psicológico sobre lavagem cerebral, mesmo que a história do país inclua diversos episódios documentados que confirmam seu uso. Assim, o objetivo deste artigo é revisar criticamente as bases teórico-conceituais e metodológicas dos estudos sobre lavagem cerebral, assim como sua manifestação atualizada na psicologia social, para compreender a mudança forçada e indesejável de atitudes, crenças e comportamentos. Se por um lado representa uma necessidade para a pesquisa acadêmica da área, por outro indica uma aplicação prática para seu combate e prevenção, que se mostram cada vez mais relevantes e sensíveis no contexto social atual.

Em Busca de Conceitos e Definições para a Lavagem Cerebral

A fisiologia humana mostra de maneira bastante consensual que a perturbação proposital ou acidental das funções cerebrais por meio de medo, raiva ou excitação é capaz de prejudicar o discernimento de qualquer pessoa, mesmo que temporariamente (Sargant, 1957/1997Sargant, W. (1997). Battle for the mind: A physiology of conversion and brain-washing. Windmill Press. (Original publicado em 1957)). No caso da lavagem cerebral, a premissa é de que por meio de severa pressão sistemática, física e psicológica é possível provocar alterações nas emoções, crenças, pensamentos e comportamentos. Alguns autores sugerem até um paralelo dos primórdios da psicoterapia com o que se considera lavagem cerebral, considerando a ênfase na exploração profunda de experiências pessoais, a (re)interpretação de fatos e suas influências na personalidade de indivíduos (Dolliver, 1971Dolliver, R. H. (1971). Concerning the potential parallels between psychotherapy and brainwashing. Psychotherapy: Theory, Research & Practice, 8(2), 170-174.).

Na psicologia social inicialmente o exame da dinâmica da lavagem cerebral foi feito pelos autores que se ocuparam pelos estudos sobre mudanças e atitudes (Taillard & Giscoppa, 2013Taillard, M. & Giscoppa, H. (2013). Psychology and modern warfare: Idea management in conflict and competition. Palgrave Macmillan.; Taylor, 2017Taylor, K. (2017). Brainwashing: the science of thought control. Oxford University Press.), frequentemente baseados em relatos de prisioneiros de guerra ou em sua cobertura jornalística. Edward Hunter (1956Hunter, E. (1956). Brainwashing: The story of men who defied it. Farrarr, Straus and Cudahy.) parece ter sido o responsável por dar ao termo uma maior popularidade, descrevendo como os regimes totalitários chinês e norte-coreano do século XX usavam métodos para neutralizar seus opositores e convertê-los em apoiadores, muitas vezes, entusiásticos. Daí já se deriva uma conceituação fundamental para a lavagem cerebral, que envolve identificar indivíduos ou grupos cujas crenças, atitudes e comportamentos foram alterados ou são considerados incomuns e destoantes, sem uma sustentação lógica-racional.

O termo foi ainda popularizado em obras de ficção (Burgess, 1962/2012Burgess, A. (2012). Laranja mecânica. Aleph. (Original publicado em 1962); Condon, 1959Condon, R. T. (1959). The manchurion candidate. McGraw-Hill Book Company.) ganhando conotações de senso comum, imprecisas e muitas vezes pejorativas (Selisker, 2016Selisker, S. (2016). Human programming: Brainwashing, automatons, and American unfreedom. University of Minnesota.; Stein, 2016Stein, A. (2016). Terror, love and brainwashing: Attachment in cults and totalitarian systems. Routledge.). Nos variados campos do conhecimento o termo também é utilizado com uma diversidade de sentidos, como, por exemplo, na concepção conceitual da síndrome de alienação parental. Este distúrbio infantil é por muitos visto como uma espécie de programação ou lavagem cerebral realizada por um dos pais, objetivando a rejeição do outro. Portanto, crianças seriam supostamente mais vulneráveis à lavagem cerebral em grupos totalitários, uma vez que seriam dotadas de menor capacidade de oposição às pressões recebidas (Kent, 2001Kent, S. A. (2001). Brainwashing programs in the family/children of good and scientology a recent attempt to renew. In B. Zablocki & T. Robbins (eds.), Misunderstanding cults (pp. 349-378). University of Toronto Press.).

Um outro aspecto fundamental é que qualquer pessoa fica mais vulnerável a manipuladores em períodos de mudanças traumáticas na vida, podendo se envolver em eventos imorais e ilegais, bastando para isso apenas as condições propícias (Singer & Lalich, 1995Singer, M. T. & Lalich, J. (1995). Cults in our midst: The hidden menace in our everyday lives. Jossey-Bass.). É uma lógica de sugestionamento e doutrinação, que ocorre por meio da perda de capacidade crítica, seguida da assunção de comportamentos submissos e automatizados, depois a adesão a ideias e preceitos anormais, resultando por fim em uma conformidade plena (Taylor, 2017Taylor, K. (2017). Brainwashing: the science of thought control. Oxford University Press.).

De fato, uma ampla evidência histórica revela elementos psicológicos e estruturais sociais comuns a líderes autoritários e carismáticos, sobretudo em contextos totalitários, que acabam por moldar as mentes dos seguidores, inculcando sistemas de crenças e valores (Stein, 2016Stein, A. (2016). Terror, love and brainwashing: Attachment in cults and totalitarian systems. Routledge.). O termo lavagem cerebral já foi uma paranoia sensacionalista do tempo da “Guerra Fria” e, contudo, não deve ser negligenciado como um eco inofensivo do passado. As técnicas de interrogatórios ocorridas na prisão de Abul Grahabi, por exemplo, durante a Guerra do Iraque (2003 - 2011), não se basearam em práticas novas. Pelo contrário, parecem ser as mesmas técnicas de tortura usadas no treinamento de militares estadunidenses, notoriamente a partir da Guerra da Coreia. Uma vez mais, a lógica é de que o agente da lavagem cerebral espera obter cooperação ao promover sistematicamente a debilidade, a dependência e o pavor em um indivíduo (Holmes, 2016Holmes, M. (2016). The ‘brainwashing’ dilemma. History Workshop Journal, 81(1), 285-293.).

Da Sugestão à Corrupção da Mente: As Bases Psicossociais da Lavagem Cerebral

Sugestão e conceitos correlatos, como simpatia e imitação, são elementares na história das teorias psicossociais. Como um dos primeiros livros que recebeu o título de psicologia social, a obra de Willian MacDougall (1908/2001MacDougall, W. (2001). Introduction to social psychology. Batoche Books. (Original publicado em 1908)) examinou o estado em que um indivíduo aceita, de maneira submissa e com convicção, proposições que lhe são apresentadas por um interlocutor mesmo sem razões lógicas para a aceitação. A sugestão, no entanto, é o objeto proposto no processo de comunicação, nem sempre verbal, entre um interlocutor e o indivíduo, enquanto a sugestibilidade é a prontidão do indivíduo para aceitá-la. Caso fosse produzida convicção legítima, haveria um elemento mais ou menos forte de sugestão cooperando com os processos lógicos. Obviamente há diversos graus de sugestibilidade que variam desde uma manifestação leve até as mais extremas e, por isso, é difícil construir um conceito abrangente. Os graus dependem de ao menos quatro grupos de variáveis, sendo (a) influências em capacidades cerebrais como hipnose e fadiga; (b) conhecimento deficitário; (c) características de poder relacionadas à fonte de sugestão; e (d) caráter e disposição do indivíduo (MacDougall, 1908/2001MacDougall, W. (2001). Introduction to social psychology. Batoche Books. (Original publicado em 1908)).

O termo lavagem cerebral, conforme aparece no mundo ocidental, é uma tentativa de traduzir livremente o termo xǐnăo, cujo significado envolve a limpeza do cérebro e envolveria uma iniciativa do governo chinês para moldar o novo homem comunista (Hunter, 1951Hunter, E. (1951). Brainwashing in red China: The calculated destruction of men’s minds. Vanguard Press.). É também derivado de expressões budistas que significam algo como “lavagem do coração”, em que um indivíduo se dedica à meditação, em isolamento, abstraindo-se de contatos mundanos, como uma forma voluntária de autopurificação (Hunter, 1956Hunter, E. (1956). Brainwashing: The story of men who defied it. Farrarr, Straus and Cudahy.). Essa abordagem defende que, sem qualquer tipo de dor física ou de meios intrusivos, um indivíduo poderia ter suas percepções deformadas, gerando efeitos emocionais profundos (Hebb, 1958Hebb, D. O. (1958). The motivating effects of exteroceptive stimulation. American Psychologist, 13(3), 109-113.).

O processo de lavagem cerebral descrito por Robert Jay Lifton (1961Lifton, R. J. (1961). Thought reform and the psychology of totalism: a study of “brainwashing” in China. Victor Gollancz.) pode ser conduzido por meio de pressões psicológicas e físicas que visem a quebrar a resistência e a impor ideias. Esse autor especificou oito etapas planejadas: controle ambiental, mistificação da realidade (manipulação), purificação (ritualização), confissão (denuncismo e autodenuncismo), sacralização do grupo (verdades absolutas), linguagem própria e eufemística, disciplinação pessoal (doutrinação) e dispersão existencial (supremacia da ideologia grupal). Envolve, portanto, atacar metodicamente aspectos da identidade, enfraquecendo crenças e valores, a fim de desestabilizar o senso de realidade e deixar a pessoa vulnerável ao sugestionamento.

Argumentos capazes de provocar sentimentos de culpa e vergonha geralmente permitem a quebra da base identitária, por meio de autoataque. Na sequência, uma espécie de colapso da personalidade, com a ruptura do self e uma sensação de deslocamento da realidade e de abandono deixaria o indivíduo mais fragilizado. O indivíduo então almeja acolhimento e qualquer tipo de clemência capaz de lhe proporcionar um alento. Assim, invariavelmente cederia às vontades do seu dominador (real ou potencial), abandonando suas próprias crenças e valores (Lifton, 1961Lifton, R. J. (1961). Thought reform and the psychology of totalism: a study of “brainwashing” in China. Victor Gollancz.).

Os efeitos psíquicos gerados em prisioneiros de guerra sujeitados e incapazes de resistir às sessões de tortura física e mental são formas coercitivas capazes de provocar mudanças de atitudes. Isso envolve desprendimentos das atitudes vigentes, a implementação de novas referências atitudinais e a consolidação das novas atitudes implementadas (Schein, 1959Schein, E. H. (1959). Brainwashing and totalitarianization in modern society. World Politics, 11(3), 430-441.). A partir da exploração da reeducação ideológica pode-se categorizar cinco etapas capazes de produzir controle mental, mudança de personalidade ou conformidade plena: (a) a atribuição de nova identidade; (b) a modificação de comportamentos; (c) a manipulação mística da realidade; (d) o emprego de técnicas de alteração mental; e (e) a confissão restauradora (Schein, 1959). O processo é realizado, segundo os autores, inicialmente por sessões de doutrinação informacional, seguidas de técnicas de premiação e punição para comportamentos, utilização de enredos e símbolos de mistificação e reforço. Depois ocorre uma desestabilização mental por meio da repetição de mensagens sensoriais e, por fim, a provocação de uma ruptura com o passado e o ressurgimento de um “novo” indivíduo.

Limites e Mitos da Lavagem Cerebral

A lavagem cerebral não deve ser compreendida como uma proposta de controle total da mente humana, nem incondicional, ainda que empregada de modo radical. Pelo contrário, é passível de reversão ao serem cessadas as pressões, como observado em inúmeros casos de prisioneiros de guerra depois de repatriados (Lifton, 1961Lifton, R. J. (1961). Thought reform and the psychology of totalism: a study of “brainwashing” in China. Victor Gollancz.). Em um campo de concentração regido por regras claras e punições severas para aqueles que as transgridam, é possível obter alto nível de complacência e cooperação sem que, necessariamente, se estabeleça uma nova estrutura de crenças (Biderman, 1963Biderman, A. (1963). March to calumny: The story of American POWs in the Korean war. Macmillan.). Por vezes é uma estratégia necessária de sobrevida e diplomacia frente ao captor/algoz.

Outro termo pertinente, mentecídio (meticide), foi cunhado por Joost Meerloo (1956/2015Meerloo, J. A. M. (2015). The rape of the mind: The psychology of thought control, menticide, and brainwashing. The World Publishing Company. (Original publicado em 1956)) para descrever aquilo que chamou de destruição da mente. Os nazistas, por exemplo, desenvolveram formas de tortura mental que foram incorporadas e aperfeiçoadas no pós-Segunda Guerra Mundial por estadunidenses e soviéticos e, segundo o autor, permitiam levar as pessoas à submissão e à completa aquiescência, tornando-os sugestionáveis, submissos e mansos. Mais recentemente, a própria psicologia como profissão foi denunciada como instrumento científico usado para produção de novas formas de tortura, a serviço de “inquisidores” modernos (Soldz, 2011Soldz, S. (2011). Fighting torture and psychologist complicity. Peace Review: A Journal of Social Justice, 23(1), 12-20.). Isso deu à área uma péssima reputação, principalmente associada ao contexto estadunidense.

Técnicas de propaganda e doutrinação, entretanto, não foram usadas apenas em sistemas autoritários. Tanto psiquiatras quanto psicólogos sociais constataram, por exemplo, que no próprio sistema público de ensino inglês professores insidiosamente implementaram seus próprios sistemas de valores pessoais, minando de forma sutil os valores de alunos por meio da ridicularização e da crítica pública. Segundo James Brown (1963Brown, J. A. C. (1963). Techniques of persuasion: From propaganda to brainwashing. Penguin Books.), isso era algo igualmente recorrente em escolas e universidades, prisões e ambientes de trabalho, inclusive governamentais, em que pressão social, exortação a certos valores e apelos éticos eram usados para gerar conformidade. Esse autor foi além, ao exortar que a mente não tem um fim em si mesma e é, em última análise, um órgão de ajustamento que se adapta ao ambiente social externo. Isso parece reforçar a ideia de que a mudança de atitudes guarda íntima relação com a mudança de ambiente e, sobretudo, é influenciada pelo sentimento de pertença e inserção grupal.

Alguns experimentos constataram que o transe induzido pela tensão, pela estimulação sensorial e motora, mostrou-se eficiente para tornar o indivíduo hiperalerta e altamente sugestionável (Ludwig & Lyle, 1964Ludwig, A. M. & Lyle, W. H. (1964). Tension induction and the hyper alert trance. Journal of Abnormal and Social Psychology, 69(1), 70-76.). Foram observados sinais clínicos de ansiedade e desconforto, tremores espontâneos, movimentos contorcidos ocasionais, espasmos dos músculos do pescoço, períodos de hiperventilação, sudorese intensa e reações de raiva durante interrogatórios. Há, portanto, um poder inegável de variáveis situacionais, tornando o indivíduo suscetível ao truísmo que o cerca. Ele é capaz de praticar atos sob determinadas condições sociais que, em sua ausência, jamais praticaria. Condições sociais específicas permitem a introjeção de crenças e convicções compartilhadas que, mesmo sem fundamentos, se consolidam na uniformidade social.

A lavagem cerebral pode ser usada em um contexto de reeducação involuntária de crenças e valores básicos. Reduções da capacidade de julgamento crítico possibilitam inculcar informações inconsistentes, de modo que qualquer indivíduo pode ser “quebrado” psicologicamente por alguém com persistência e paciência para gerar conflitos internos e sentimento de culpa (Kowal, 2000Kowal, D. M. (2000). Brainwashing. In A. E. Kazdin (Ed.), Encyclopedia of psychology (pp. 463-464). American Psychological Association.). Alexandra Stein (2016Stein, A. (2016). Terror, love and brainwashing: Attachment in cults and totalitarian systems. Routledge.) descreveu metaforicamente a lavagem cerebral como o resultado de um processo persuasivo que penetra na mais profunda intimidade de uma pessoa, atingindo seu coração (seus sentimentos) e sua mente, desviando a cognição e a racionalidade, ao mascarar as percepções e noções da realidade.

A Psicologia Moderna a Serviço das Demandas Governamentais

Um registro histórico importante se deu em 1983, quando a American Psychological Association (APA) criou a força tarefa Deceptive and Indirect Methods of Persuasion and Control (DIMPAC). Ela teve o objetivo de examinar e definir técnicas enganosas, de persuasão e de controle que pudessem afetar as liberdades individuais e da sociedade nos Estados Unidos, focando nas implicações éticas, educacionais e sociais (Singer et al., 1986Singer, M., Goldstein, H., Langone, H., Miller, J. S., Temerlin, M. K., & West, L. J. (1986). Report of the APA task force on deceptive and indirect techniques of persuasion and control. (DIMPAC report). American Psychological Association.). Os principais achados da DIMPAC versavam sobre modos de influência, métodos de influência e técnicas utilizadas. As recomendações foram para que houvesse mais esforços para entender os mecanismos de ação, os efeitos e as implicações éticas das técnicas de influência social, especialmente aquelas consideradas disfarçadas e sutis. Os subscritores do relatório recomendaram à APA a revisão de critérios éticos para profissionais de psicologia, bem como a restrição ao uso de técnicas psicológicas por não psicólogos. No campo das políticas públicas, os autores recomendaram à APA a assunção do papel educador do psicólogo quanto ao uso de técnicas enganosas e persuasão e controle, como forma de prevenção. A APA rejeitou o relatório e apontou-o como tendencioso e sem rigor científico.

Na década de 1960, algumas drogas eram vistas como ferramentas para o desenvolvimento de conhecimentos capazes de produzir efeitos favoráveis em interrogatórios, tanto para extrair informações quanto para permitir a resistência. Havia evidências de que, sob efeito de certos princípios ativos, indivíduos foram capazes de mentir, distorcer a realidade ou mesmo adotarem fantasias como se fossem reais (Gottschalk, 1961Gottschalk, L.A. (1961). The use of drugs in interrogation. In A. D. Biderman & H. Zimmer (Orgs.), The manipulation of human behavior (pp. 96-141). John Wiley & Sons.). A Central Intelligence Agency (CIA, 1963Central Intelligence Agency - CIA. (1963). Report of inspection of MKULTRA.) desclassificou documentos secretos revelando que em um dos seus projetos, o MK Ultra, pesquisava-se o desenvolvimento de produtos químicos, biológicos e radiológicos para operações clandestinas de controle comportamental. A lógica, à época, era de que se os soviéticos e os chineses haviam inventado uma máquina de lavagem cerebral, os Estados Unidos deveriam se esforçar na tarefa de obter a sua (Marks, 1978Marks, J. (1978). The search for the manchurian candidate: The CIA and mind control. Times Books.). Os experimentos eram considerados desagradáveis e antiéticos, mas supostamente se justificavam pelo fato de os serviços de inteligência de países de oposição conseguirem usar com comprovada eficácia. Décadas de negações da CIA foram desmentidas, revelando até mesmo o envolvimento da agência com traficantes de drogas e a utilização clandestina de fármacos em pacientes psiquiátricos (Cockburn & Clair, 1998Cockburn, A. & Clair, J. S. (1998). Whiteout: The CIA, drugs and the press. Verso.).

A conversão de pessoas do leste europeu à ideologia comunista despertou na CIA a desconfiança de que os comunistas teriam obtido a capacidade de manipular a mente humana. Desde o final da década de 1940 haviam sido realizados experimentos com drogas com o objetivo de, em um primeiro momento, condicionar os agentes de inteligência a não revelarem informações quando capturados (McCoy, 2012McCoy, A. W. (2012). Torture and impunity: The U.S. doctrine of coercive interrogation. University of Wisconsin Press.). Experiências ilegais e antiéticas teriam sido conduzidas pela CIA por meio de uma rede de colaboradores ligados a prisões, universidades e a hospitais nos Estados Unidos, Canadá e Grã-Bretanha. O resultado foi o desenvolvimento de uma doutrina de operações secretas assentadas em bases científicas (ou “científicas”), sem precedentes até então. Elas demonstraram que o abuso físico era a melhor forma de disrupção da mente e que a manipulação dos sentidos seria o caminho para provocar, deliberadamente, modificações no comportamento humano (McCoy, 2012McCoy, A. W. (2012). Torture and impunity: The U.S. doctrine of coercive interrogation. University of Wisconsin Press.).

Nos cerca de dez anos de existência do MK Ultra, foram testadas técnicas de radiação, choque elétrico e experimentos multidisciplinares que envolveram pesquisadores das áreas de psicologia, psiquiatria, sociologia e antropologia. Vários desses pesquisadores recebiam verbas e financiamento de instituições de fachada e sequer sabiam que participavam de um projeto da CIA (Price, 2007Price, D. H. (2007). Buying a piece of anthropology part 1: Human ecology and unwitting anthropological research for the CIA. Anthropology Today, 23(3), 8-13.). O psiquiatra britânico William Sargant muitas vezes é apontado como operador do programa MK Ultra em território do Reino Unido. De fato, Sargant (1957/1997Sargant, W. (1997). Battle for the mind: A physiology of conversion and brain-washing. Windmill Press. (Original publicado em 1957)) conduziu uma série de experimentos médicos que objetivavam a alteração do estado mental e constatou a eficácia de jejum, castigos físicos, autoflagelação e outros tipos de desconfortos, além de mistificação de fatos, indução de medo extremo, utilização de substâncias estimulantes ou depressoras. Mecanismos de privação fisiológica são agora conhecidos como essenciais para a implantação ou remoção de padrões de comportamentos, tanto em seres humanos quanto em animais.

O aumento ou prolongamento de tensões capazes de induzir a debilitação física potencializa a vulnerabilidade do indivíduo e o poder de sugestibilidade mental, visto que há dificuldades na capacidade de julgamento e muitas ideias “implantadas” podem perdurar mesmo após cessados os efeitos dos elementos estressores. O percurso utilizado tanto na conversão religiosa radical quanto na política moderna polarizada é o mesmo. Apesar de dotados de capacidades sociais e, sobretudo, da razão, os cérebros humanos são suscetíveis a propósitos maléficos. Ele os deixa vulneráveis e inclinados à adoção de uma fé religiosa corrompida ou ao misticismo político que distorcem a racionalidade (Sargant, 1975/1997Sargant, W. (1997). Battle for the mind: A physiology of conversion and brain-washing. Windmill Press. (Original publicado em 1957)).

As ideias de Sargant (1957/1997Sargant, W. (1997). Battle for the mind: A physiology of conversion and brain-washing. Windmill Press. (Original publicado em 1957)) foram fortemente influenciadas pelas descobertas do russo Ivan Pavlov, cujos achados teriam sido acidentalmente verificados quando, em meio a uma enchente que atingiu o laboratório de Leningrado, Pavlov e sua equipe perceberam uma severa alteração no comportamento dos cães que integravam as pesquisas sobre reflexo condicionado. Um trauma extremo e repentino foi capaz de provocar estresse emocional ao ponto de colapsar temporariamente os esquemas mentais preexistentes, suscetibilizando os cães a novos padrões de comportamento diferentes dos reflexos condicionados (Streatfeild, 2006Streatfeild, D. (2006). Brainwash: The secret history of mind control. Martin’s Press.).

Durante a Segunda Guerra Mundial, enquanto médicos alemães nazistas realizavam em Dachau uma série de experimentos sobre controle mental, o Office of Strategic Services (OSS), uma agência de inteligência estadunidense, criava um comitê para avaliar clandestinamente o que chamaram de “drogas da verdade” em Washington (Marks, 1978Marks, J. (1978). The search for the manchurian candidate: The CIA and mind control. Times Books.). Foram testadas diversas substâncias, como mescalina, barbitúricos, escopolamina e cannabis sativa, com destaque para a última, que foi apontada como a mais promissora por gerar, nas palavras de John Buckman (1977Buckman, J. (1977). Brainwashing, LSD, and CIA: Historical and ethical perspective. International Journal of Social Psychiatry, 23(1), 8-19.), um “estado de irresponsabilidade”. Supunha-se que diversas outras pesquisas, mais sutis, eram conduzidas por agências governamentais daquele país, de tal maneira que liberdades e direitos individuais foram sumariamente violados (Buckman, 1977). No âmbito do MK Ultra, enquanto investigava maneiras de manipulação, o psicólogo John Gittinger desenvolveu o Personality Assessment System (PAS), um sistema de avaliação de personalidade para prever o comportamento, amplamente utilizado pela CIA (Marks, 1978Marks, J. (1978). The search for the manchurian candidate: The CIA and mind control. Times Books.).

Política: Alienação, Manipulação e Propaganda

A influência de condições sociais na formação e modificação de juízos e opiniões é essencial para conhecer as pressões capazes de fazer as pessoas se comportar contra suas crenças e valores, sobretudo aquelas advindas dos meios sociais (Asch, 1952/1966Asch, S. E. (1966). Psicologia social. Companhia Editora Nacional. (Original publicado em 1952)). Os modos autoritários de governo foram em grande parte substituídos por maneiras mais sutis de sujeição, por meio de controle das subjetividades e de desejos da população (Ruiz, 2004Ruiz, C. M. M. B. (2004). Os labirintos do poder: O poder (do) simbólico e os modos de subjetivação. Escritos.). O desafio nas sociedades contemporâneas está em fazer coexistirem as liberdades formais e os meios de controle legitimados, socialmente aceitáveis. O objetivo das tramas contemporâneas de dominação é extrair o máximo de cooperação dos indivíduos, flexibilizando suas subjetividades, governando suas vontades pessoais para a realização dos próprios interesses institucionais. Isso ocorre não pela coerção, mas pela adesão aos valores considerados de interesse, sem, contudo, descuidar de uma possível imposição forçada (Taillard & Giscoppa, 2013Taillard, M. & Giscoppa, H. (2013). Psychology and modern warfare: Idea management in conflict and competition. Palgrave Macmillan.).

As produções simbólicas devem mirar o mais íntimo universo particular do indivíduo, buscando condutas colaborativas e úteis. A adesão, portanto, deve ser sempre voluntária, sem imposição. A sujeição se dá pelo constante sugestionamento de valores e comportamentos desenhados para integrar o indivíduo ao imaginário desejado, ao tempo que oculta os reais interesses envolvidos, impactando na configuração (e reconfiguração, quando necessário) da identidade cooperativa (Ruiz, 2004Ruiz, C. M. M. B. (2004). Os labirintos do poder: O poder (do) simbólico e os modos de subjetivação. Escritos.). O termo “alienação” é usado para se referir ao processo pelo qual um indivíduo é obrigado a se transformar naquilo que é diferente do seu ser, uma situação psicossociológica de falta de autonomia, com a perda da identidade (Bobbio, 1998Bobbio, N. (1998). Diário de um século: Autobiografia. Campus.). Dentre as categorias apontadas pelos autores, a alienação da população seria aquela conduzida por meio da instrumentalização da mass media, ditando a conduta e a consciência coletiva, determinando a “heterodireção”, levando a estados de despersonalização dos indivíduos e ao controle do consenso. É uma sequência cuja dinâmica parece seguir a espiral do silêncio examinada na ciência política por Elizabeth Noelle-Neumann (1982/2019Noelle-Neumann, E. (2019). A espiral do silêncio. Opinião pública: Nosso tecido social. Estudos Nacionais. (Original publicado em 1982)).

A manipulação, outro conceito de suma importância para compreensão da visão imperante nas ciências sociais, é definida como o exercício do poder de um indivíduo sobre o outro, omitindo as reais intenções. Ou seja, seu propósito é determinar o comportamento, fazendo com que o manipulado creia ter sido algo de sua livre escolha (Bobbio, 1999Bobbio, N. (1999). As ideologias e o poder em crise. Universidade de Brasília.). Esse processo ocorre quando se guia o comportamento de outros, sendo necessário que se arrestem os impulsos que motivam as escolhas e ações das pessoas e se estabeleçam símbolos e imagens capazes de exercer força sobre esses impulsos. Nesse caso, o manipulador deve criar uma conexão automatizada entre o estímulo e o objeto social (Bobbio,1998). Os autores relatam que agitadores e demagogos políticos utilizam, para a manipulação psicológica, catalisadores especiais como: slogans, juramentos, músicas e hinos, espetáculos visuais de bandeiras, emblemas, utilização de gestos e simbolismos próprios. Muitas vezes os efeitos são tão eficazes que levam à completa desintegração dos sistemas de valores, crenças e ideias.

Destarte, ideologias são desenvolvidas e mantidas como armas políticas, desconsiderando o doutrinamento teórico (Arendt, 1951/2013Arendt, H. (2013). Origens do totalitarismo. Companhia das Letras. (Original publicado em 1951)). O aspecto científico é o que menos importa se os efeitos desejados são alcançados, por meio de argumentos, aparentemente, coesos e verdadeiros. Não há nada mais poderoso do que a capacidade de convencimento que permita “pregar à multidão as novas interpretações da vida e do mundo” (Arendt, 1951/2013, p. 188Arendt, H. (2013). Origens do totalitarismo. Companhia das Letras. (Original publicado em 1951)). Foi usando desses estratagemas, por exemplo, que o nazismo, enquanto sistema totalitário, foi capaz de convencer significativa parcela da população alemã sobre sua ideologia racista. Foi preciso uma ação psicológica contínua, intensa e objetiva que buscou convencer os alemães de que um novo período estava nascendo, o período do lendário Reich alemão. A expectativa dominante era de que os alemães deveriam ser (e foram) contagiados e condicionados gradualmente pela mentalidade da predestinação e do renascimento de um povo superior.

A dimensão afetiva da política e as paixões coletivas que dela decorrem são essenciais para explicar os intensos sentimentos de ódio ou amor contra ou a favor de outras pessoas. De fato, as ações humanas podem ser produzidas e conduzidas por meio de difusões propagandísticas convergentes com a visão de mundo almejada, visão defendida por Pierre Ansart (1983Ansart, P. (1983). La gestion des passions politiques. L’Age D’homme.). A inoculação de sentidos no público tem por finalidade fornecer-lhes explicações simplificativas da realidade, coerentes com a ideologia que representam. As mensagens atraem, ancoram e reforçam desejos. O consenso coletivo é almejado como forma de legitimação de sistemas totalitários, portanto esse autor argumentou que manipular elementos que são capazes de produzir sentidos sociais e afetivos é essencial para se alcançar tal objetivo. Ainda, enfatizou que é preciso penetrar o universo interior dos indivíduos de maneira que suas mentes e emoções possam ser mobilizadas em prol da causa estabelecida. Para isso, é preciso jogar com as paixões, já que envolvem questões relacionadas aos desejos, medos, ódios e amores.

O sistema educacional, cuja principal tarefa deveria ser justamente de promover a liberdade de pensamento, já foi apontado como instrumento da tirania, ao modelar pensamentos automatizados dentro do mais clássico condicionamento pavloviano. Desde a década de 1950 foi apontado como pode formar crenças quase indestrutíveis nas mentes, principalmente, de crianças (Meerloo, 1956/2015Meerloo, J. A. M. (2015). The rape of the mind: The psychology of thought control, menticide, and brainwashing. The World Publishing Company. (Original publicado em 1956)). O resultado, segundo o autor, era a produção de pessoas medíocres, uma geração de homens e mulheres muito mais receptivos à doutrinação de seus professores ou líderes, facilmente arregimentáveis, dependentes e temerosos à autoridade.

Para tanto, são empregadas “leis e técnicas de propaganda”, a partir da análise de propagandas nazistas enquanto formas primordiais de dominação. É ainda capaz de arrastar multidões para a ação, sendo armas silenciosas com recursos praticamente ilimitados e, ao mesmo tempo, imensuráveis (Domenach, 1950/2001Domenach, J. M. (2001). A propaganda política. Ridendo Castigat Mores. (Original publicado em 1950)). A divulgação de informações, convenientemente escolhidas, pode reforçar as convicções do público a quem é dirigida, transformando a propaganda em uma arte de conduzir a opinião pública. Os denominadores comuns e abstratos de toda propaganda são: o sucesso, a felicidade, a amizade e a saúde. Mas essas sensações são, geralmente, ilusões artificialmente criadas para gerar apenas os efeitos desejados.

Ao examinar como as ideias sobre manipulação do comportamento humano circularam entre a cultura científica, literária, cinematográfica e política nos EUA, Scott Selisker (2016Selisker, S. (2016). Human programming: Brainwashing, automatons, and American unfreedom. University of Minnesota.) criticou como foi possível utilizar o automatismo humano para explorar os significados de democracia, totalitarismo e fundamentalismo. A ficção é parte integrante da segurança nacional estadunidense, enquanto ferramenta transformadora de conceitos da democracia desde antes da Guerra Fria (Melley, 2012Melley, T. (2012). The covert sphere: Secrecy, fiction, and the national security state. Cornell University Press.). Aquela cultura política foi permeada de produções ficcionais, que tentaram moldar suas características ao longo de várias décadas. Assim, campos de conhecimento científico e das artes passaram a ilustrar ideais convergentes com a suposta manipulação psicológica e de controles institucionais, na mesma medida em que, no espectro político, conceitos de liberdade, democracia e diversidade foram reinventados (Selisker, 2016Selisker, S. (2016). Human programming: Brainwashing, automatons, and American unfreedom. University of Minnesota.). O livro O Candidato da Manchúria, de Richard Condon (1959Condon, R. T. (1959). The manchurion candidate. McGraw-Hill Book Company.), é um bom exemplo da dialética artificial entre o eu livre e o outro automático que teria reforçado as diferenças culturais e ideológicas no decurso da Guerra Fria. Por isso a literatura, o cinema, as ciências e a própria tecnologia foram capazes de criar e de reforçar medos distópicos de controle da mente. Em grande parte, isso é feito ao se demonizar pessoas, países, religiões, culturas e formas de governo diferentes do seu (Selisker, 2016Selisker, S. (2016). Human programming: Brainwashing, automatons, and American unfreedom. University of Minnesota.).

Seitas e Cultos Religiosos: Extremismo e Conformidade

Lavagem cerebral somente se aplicaria a cultos nas situações em que há uso ou ameaça do uso de força física. O emprego de confinamento forçado, maus-tratos físicos e sociais em um programa de doutrinação religiosa é que justifica a utilização do termo. Isso se deve a um cuidado adotado por estudiosos da área para se evitar a estigmatização e retaliações (Kent, 2001Kent, S. A. (2001). Brainwashing programs in the family/children of good and scientology a recent attempt to renew. In B. Zablocki & T. Robbins (eds.), Misunderstanding cults (pp. 349-378). University of Toronto Press.). O termo culto se refere assim a quaisquer grupos semelhantes na origem, na estrutura de poder e controle, sejam eles de cunho religioso, sobre estilo de vida, política ou filosofias das mais variadas (Singer & Lalich, 1995Singer, M. T. & Lalich, J. (1995). Cults in our midst: The hidden menace in our everyday lives. Jossey-Bass.). Um culto possui um líder, uma estrutura organizacional hierarquizada e um programa definido de persuasão que visa a promover mudanças comportamentais. Um culto pode aparecer sob a forma de grupos de autoajuda ou programas de treinamento. Cultos e seitas religiosas, de forma geral, recorrem a elementos de controle dos seus seguidores. Na maior parte das vezes operam manipulando as emoções de ódio e do amor, apontando como único caminho de alívio das frustrações o próprio grupo. É dentro do grupo religioso que o indivíduo vulnerável encontrará amparo, atenção e pertencimento (Winn, 1984/2012Winn, D. (2012). The manipulated mind: Brainwashing, conditioning and indoctrination. The Octagon. (Original publicado em 1984)).

Em contraponto, Lee Coleman (1984Coleman, L. (1984). New religions and the myth of mind control. American Journal of Orthopsychiatry, 54(2), 322-325.) argumenta que as frequentes acusações às entidades religiosas de controle mental ou sequestro do arbítrio não passam de suposições, sem evidências, já que os indivíduos não são forçados a aderir ou a permanecer vinculados. Concordando em parte com essa visão, Lita Schwartz (1984Schwartz, L. L. (1984). Defining mind control. American Journal of Orthopsychiatry , 54(4), 663-664.) advoga que um indivíduo submetido ao controle mental perde (voluntariamente ou não) sua capacidade de fazer escolhas e, denominando controle do comportamento ou controle da mente, os cultos religiosos acabam por balizar as atitudes dos seus adeptos. Na maior parte dos cultos e religiões, assim como ocorre nas ideologias políticas, é comum a diferenciação formal e rigorosa entre líderes e seguidores, a aplicação de represálias contra o que não for compartilhado pelo grupo, a imposição da ideia de que somente no grupo há uma alternativa viável e segura (pensamento utópico). Isso tudo indica, por si só, uma forma de dominação (Taylor, 2017Taylor, K. (2017). Brainwashing: the science of thought control. Oxford University Press.).

Um dos mais emblemáticos episódios de cultos radicais foi o suicídio coletivo cometido pelos seguidores do reverendo James Warren Jones [Jim Jones], na Guiana (República Cooperativa da Guiana) em 1978. Ele era o líder da seita People’s Temple, um grupo pseudorreligioso fundado para supostamente, entre outros, ajudar os necessitados de todas as raças. As instalações foram transferidas para a selva da Guiana e descritas como uma utopia comunista, um paraíso na Terra, nomeado como Jonestown (Taylor, 2017Taylor, K. (2017). Brainwashing: the science of thought control. Oxford University Press.). Os membros daquela comunidade viviam sob vigilância armada, eram submetidos a humilhações e punições públicas, trabalhos forçados, privação sensorial e experimentação de drogas psicoativas, além de constantes simulações de suicídios coletivos (Hall, 1987Hall, J. R. (1987). Gone from the promised land: Jonestown in American cultural history. Transaction Books.). Jim Jones era carismático e eloquente, um sedutor, visto como um alguém com poderes sobre-humanos. O desfecho, todavia, foi o assassinato em massa e o suicídio coletivo de mais de 900 pessoas, dentre elas cerca de 300 crianças (Chisdester, 1988/2003Chisdester, D. (2003). Salvation and suicide: An interpretation of Jim Jones, the people’s temple, and Jonestown. Indiana University Press. (Original publicado em 1988)). Embora tenha sido algo bastante extremo, a mídia, não raro, ainda noticia casos semelhantes em diferentes países.

Alguns cultos foram não apenas capazes de explorar como seus membros sentiam e pensavam, mas também de atuar como forças sociais e psicológicas que provocaram comportamentos com consequências irreparáveis. Por outro lado, a própria definição de cultos e seitas é imprecisa e, por isso mesmo, não se deve generalizar para comunidades religiosas. Mudanças positivas na vida das pessoas e da sociedade em geral podem ser alcançadas por meio das ações de ordens religiosas legítimas. Grande parte da literatura psicológica relevou a importância positiva advinda de comunidades religiosas, mostrando-se um dos maiores erros do estudo científico do século XX (Nelson, 2009Nelson, J. M. (2009). Psychology, religion, and spirituality. Springer.).

Considerações finais

Tema pouco explorado no meio acadêmico contemporâneo, principalmente por sua imprecisão, a lavagem cerebral encontrou um terreno fértil outrora. Atualmente, a persuasão e a influência social são conceitos recorrentes, sobretudo, nos campos de estudos da psicologia social. A persuasão, por exemplo, visa à obtenção do consentimento voluntário e consciente do persuadido, mas nem sempre a racionalidade e a consciência estão presentes nas decisões, escolhas e preferências dos indivíduos. Alguns fenômenos como a desindividuação mostram que um indivíduo, quando inserido no grupo, pode adotar as normas sociais vigentes ou mesmo, esporadicamente, comportamentos conexos com os daqueles que o cercam. Não são raras, também no Brasil, cenas de linchamentos, brigas de torcidas ou depredações em que um indivíduo adquire um comportamento de manada (Taillard & Giscoppa, 2013Taillard, M. & Giscoppa, H. (2013). Psychology and modern warfare: Idea management in conflict and competition. Palgrave Macmillan.).

Havia, contudo, quem afirmasse que a lavagem cerebral era um mito, como, por exemplo, Nicholas Spanos (1996Spanos, N. P. (1996). Multiple identities & false memories: A sociocognitive perspective American Psychological Association.), para quem o transtorno da personalidade múltipla ou transtorno de identidade dissociativa eram produtos históricos socioculturais. São vistos como baseados em crenças sem rigor científico, tal qual a possessão espiritual ou demoníaca e, por isso mesmo, como falsas desordens psiquiátricas. O argumento é que, inserido em contexto social, um indivíduo tem um conjunto de crenças e valores como referências nas quais ancora suas atitudes e comportamentos, não se tratando de uma lavagem cerebral propriamente dita (Spanos, 1996Spanos, N. P. (1996). Multiple identities & false memories: A sociocognitive perspective American Psychological Association.).

As técnicas modernas de tortura de prisioneiros de guerra, bem como os processos de conversão ou reforma do pensamento de regimes totalitários têm em comum a pressão sobre os indivíduos, por vezes na modalidade física com tratamentos cruéis, degradantes e desumanos. A privação do sono, de água ou alimento, a submissão ao frio ou ao calor, a privação sensorial (visual ou auditiva) ou mero isolamento social já se mostravam, há tempos, capazes de fazer sucumbir o mais resistente dos indivíduos. Frequentemente o que se emprega é uma mistura estratégica dessas ferramentas, especialmente quando se quer tentar justificá-las.

Há diversas lacunas que a psicologia deve se ocupar de entender nos fenômenos de mudança de atitudes. Eventos históricos trágicos como o de Jonestown e outros similares devem continuar a ser estudados porque envolveram processos psicológicos singulares e causaram danos graves. Compreender os motivos que levam pessoas a suicídios, assassinatos e sacrifícios é, sem dúvida, uma questão de grande relevância para a ciência psicológica compromissada com problemas sociais. Como é possível convencer dezenas de pessoas de que um fim trágico autoprovocado possa ser o começo de uma nova vida? Por que doutrinas políticas extremadas atraem tantos adeptos, apesar das evidências negativas históricas? Como desenvolver ensino e outras aplicações que possam prevenir o problema?

No âmbito da ideologia e da política, parece ser quase imprescindível manipular os desejos alheios e fornecer algum significado. De acordo com Hannah Arendt (1951/2013Arendt, H. (2013). Origens do totalitarismo. Companhia das Letras. (Original publicado em 1951), p. 188), “a extraordinária força de persuasão decorrente das principais ideologias do nosso tempo não é acidental”. Ao menos é a essa conclusão a que se chega quando se recorre às perguntas de Philips Zimbardo (1997Zimbardo, P. (1997). What messages are behind today’s cults. APA Monitor, 28(5), 14., p. 1) sobre a adesão a grupos alternativos, religiosos ou políticos: “O que há de tão atraente nesses grupos que tantas pessoas foram recrutadas/seduzidas a se unirem a eles voluntariamente? Que necessidades esses grupos estavam atendendo e que não estavam sendo atendidas pela sociedade tradicional?”

A cooptação pela manipulação da verdade, a moldagem do pensamento político pelo falseamento da realidade e a distorção de informações para se impactar na capacidade avaliativa dos indivíduos foram claramente usadas ao longo da história. A ideia de lavagem cerebral influenciou diferentes gerações, criando a ideia de que suas individualidades estavam sob constante ataque (Dunne, 2013Dunne, M. W. (2013). A cold war state of mind: Brainwashing and postwar American society. University of Massachusetts Press.) - paradoxalmente um recurso muito conveniente para os dominadores e manipuladores. Ensaios teóricos como o aqui apresentado visam a trazer maior atenção sobre a temática, que é com frequência invisibilizada. Assim, estudos futuros podem explorar, para além de características teóricas, os traços de personalidade vinculados a manipulação e estratégia como, por exemplo, o maquiavelismo (Rauthmann & Will, 2011Rauthmann, J. F. & Will, T. (2011). Proposing a multidimensional Machiavellianism conceptualization. Social Behavior and Personality, 39(3), 391-403.). Compreender os motivos que levam pessoas a suicídios em massa, assassinatos, sacrifícios e terrorismo é, sem dúvida, uma questão urgente para a ciência psicológica que se quer crítica e socialmente relevante.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    04 Jun 2020
  • Revisado
    09 Maio 2022
  • Aceito
    07 Dez 2022
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