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Estudo das condições de tempo e conforto térmico no desempenho esportivo aplicado à maratona da cidade do Rio de Janeiro

Study of weather and thermal comfort on sport performance applied to Rio de Janeiro's city marathon

Resumos

A análise das condições meteorológicas tem se mostrado uma ferramenta útil quando direcionada especificamente aos esportes. Sua interferência atua como um diferencial nos treinos e estratégias de prova, principalmente para esportes praticados ao ar livre. Este artigo teve como objetivo principal desenvolver prognósticos de tempo e avaliações de conforto térmico direcionados ao esporte, onde espera-se que seus resultados auxiliem o desenvolvimento de produtos e serviços meteorológicos a serem aplicados nos Jogos Olímpicos de 2016, na cidade do Rio de Janeiro. O uso de prognósticos de tempo, aplicados ao esporte, se mostrou eficiente para o caso da Maratona da Cidade do Rio de Janeiro, principalmente devido à alta resolução espacial empregada. Foi possível concluir que o modelo WRF (Weather Research and Forecasting) fornece, no geral, simulações representativas com 36h de antecedência, sendo que 18h antes elas descrevem de maneira ainda mais eficiente a situação sinótica a ser encontrada. A avaliação das condições meteorológicas e de conforto térmico em pontos específicos da maratona mostrou que há diferenças significativas entre as etapas da prova e que a relação entre a situação termicamente mais confortável (desconfortável) e o melhor (pior) tempo é válida na Maratona da Cidade do Rio de Janeiro.

Previsão numérica de tempo; conforto térmico; desempenho esportivo


The weather condition analysis have proven to be an useful tool when applied specifically to sports. These conditions act as a differential in strategy and training plan, especially for outdoor sports. The main objective of this study is to develop weather forecast and thermal comfort evaluation applied to sports, and it is expected that the obtained results could be used for developing products and weather service to the 2016 Olympic Games in Rio de Janeiro City. The weather forecast applied to sport events showed to be efficient during the Rio de Janeiro City Marathon, especially due to the high spatial resolution. It was concluded that the WRF (Weather Research and Forecasting) model provides, in general, more representative simulations up to 36 hours in advance, an 18 hours forecast is even better, describing efficiently the prevailing synoptic situation. The assessment of the weather conditions and thermal comfort at specific points of the marathon route showed that there are significant differences among the marathon stages, and that there is a relationship between more thermally comfortable (uncomfortable) situation and the best (worst) timing in Rio de Janeiro City Marathon.

Numerical weather prediction; thermal comfort; sport performance


1. Introdução

Atualmente há um crescente interesse na influência das condições meteorológicas na vida humana. Essa relação se manifesta de forma determinística na coloração dos cabelos, da pele e na formação facial, em situações corriqueiras, como a relação da vestimenta com a temperatura, e também de maneira indireta, influenciando o comportamento humano e os diversos tipos de atividades praticadas pelo homem.

A relação entre as condições de tempo e clima e o esporte é cada vez mais abordada dentre as diversas frentes que desenvolvem melhores técnicas para modalidades esportivas profissionais. Thornes (1977)THORNES, J. E The effect of weather on sport. Weather, v.32, p. 258-268, 1977.reconheceu em seu estudo que deveria haver uma divisão especializada em meteorologia para os esportes. Quase 30 anos depois, Perry (2004)PERRY, A. Sports tourism and climate variability. Berichte des Meteorologischen Institutes der Universität Freiburg, n. 12, p. 174-179, 2004. ainda justifica essa necessidade, argumentando que boa parte dos grandes eventos esportivos são realizados ao ar livre, estando sujeitos a atrasos, postergações ou cancelamentos devido às condições adversas de tempo.

A influência meteorológica em esportes como os de navegação, de voo planado e de inverno é evidente, uma vez que eles dependem fortemente das condições de tempo e clima para serem realizados. Esportes de corrida, bem como o futebol e outros, dificilmente seriam considerados dependentes das condições do tempo (Spelmann, 1996SPELLMAN, G. Marathon running an all-weather sport?. Weather, v. 51, p. 118-125, 1996.). No entanto, são em modalidades como essas que o principal tema da meteorologia no esporte vem à tona: o conforto térmico do atleta.

A maioria dos esportes está relacionada a um alto nível de atividades físicas, e isso altera o mecanismo de transferência de calor entre a pele do atleta e o ar do ambiente no qual ele está inserido. Spellman (1996)SPELLMAN, G. Marathon running an all-weather sport?. Weather, v. 51, p. 118-125, 1996. disserta sobre as maratonas de corrida, que por serem extensas e demandarem grande esforço, exigem muito do corpo humano. Além da tensão física, as condições ambientais, em especial temperatura, umidade e vento, podem influenciar acentuadamente a termo regulação do corpo. O estudo de Suping et al. (1992)SUPING, Z.; GUANGLIN, M.; YANWEN, W.; JI, L. Study of the relationships between weather conditions and the marathon race, and of the meteorotropic effects on distance runners. International Journal of Biometeorology, v. 36, p. 63-68, 1992. comenta que alguns especialistas em maratonas sugerem a faixa de temperatura do ar mais adequada para a corrida como sendo entre 8 e 15°C. Os autores ainda completam mostrando que os resultados pioram cerca de 1 minuto a cada grau de aumento de temperatura. Sendo assim, para que um atleta desempenhe o máximo de sua habilidade é necessário que ele esteja dentro de sua zona de conforto térmico.

O conforto térmico humano é definido como uma condição da mente que expressa satisfação com o ambiente térmico (Butera, 1998BUTERA, F B. Chapter 3 - Principles of thermal comfort.Renewable and Sustainable Energy Reviews, v.2, p. 39-66, 1998.). No entanto, tal condição é um tanto imprecisa, já que varia de pessoa para pessoa de acordo com o tipo físico, a atividade praticada e a vestimenta. Fanger (1972)FANGER, P. O Thermal comfort. New York: McGraw Hill, 1972. é mais abrangente em sua definição, determinando que uma pessoa encontra-se termicamente confortável (em ambiente interno), quando todo o calor produzido ou ganho por seu corpo for igual à quantidade de calor perdido ao meio exterior na mesma proporção, a fim de ser mantido um balanço de energia. Fatores ambientais, tais como, temperatura e umidade do ar, velocidade do vento e temperatura média radiante, influenciam diretamente o conforto térmico de um individuo (Nedel, 2008NEDEL, A. S. Condições meteorológicas favoráveis à ocorrência de doenças respiratórias em crianças na cidade de São Paulo. 189p. Tese (Doutorado em Meteorologia) - Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.).

A análise do conforto térmico humano é feita através do uso de índices biometeorológicos, ou índices de conforto térmico. Eles têm sido apresentados e utilizados em diversos estudos (Fanger, 1972FANGER, P. O Thermal comfort. New York: McGraw Hill, 1972.;Steadman, 1971STEADMAN, R. G Indices of Windchill of clothed persons. Journal of Applied Meteorology, v. 10, p. 674-682, 1971.; Suping et al., 1992SUPING, Z.; GUANGLIN, M.; YANWEN, W.; JI, L. Study of the relationships between weather conditions and the marathon race, and of the meteorotropic effects on distance runners. International Journal of Biometeorology, v. 36, p. 63-68, 1992.; Butera, 1998BUTERA, F B. Chapter 3 - Principles of thermal comfort.Renewable and Sustainable Energy Reviews, v.2, p. 39-66, 1998.; Höppe, 1999HÖPPE, P. R The physiological equivalent temperature - a universal index for the biometeorological assessment of the termal environment. International Journal of Biometeorology, v. 43, p. 71-75, 1999.; Matzarakis et al., 1999MATZARAKIS, A.; MAYER, H.; IZIOMON, M. G Aplications of a universal thermal index: physiological equivalent temperature. International Journal of Biometeorology, v. 43, p. 76-84, 1999.; Nedel, 2008NEDEL, A. S. Condições meteorológicas favoráveis à ocorrência de doenças respiratórias em crianças na cidade de São Paulo. 189p. Tese (Doutorado em Meteorologia) - Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.) no intuito de estimar o quanto algumas variáveis meteorológicas influenciam nos estímulos fisiológicos do corpo humano e quais são as respostas desse corpo ao ambiente no qual está inserido. Esses índices são calculados por equações empíricas, as quais consideram alguns parâmetros meteorológicos relevantes, tal como, a Temperatura Efetiva (Missenard, 1937MISSENARD, A. L'Homme at lê climat. Paris: Plon, 1937.; Fanger, 1972FANGER, P. O Thermal comfort. New York: McGraw Hill, 1972.), entre outros, ou até mesmo equações que consideram aspectos da fisiologia térmica humana, entre eles o Voto Médio Previsto (Fanger, 1972FANGER, P. O Thermal comfort. New York: McGraw Hill, 1972.), a Temperatura Equivalente Fisiológica (Höppe e Mayer, 1987HÖPPE, P. R.; MAYER, H. Planungsrelevante Bewertung der thermischen Komponente des Stadklimas. Landschaft Stadt, v. 19, p. 22-29, 1987.) e a Temperatura Efetiva Padrão (Gagge et al., 1967GAGGE, A. P; STOLWIJK, A. J; HARDY, J. D Comfort and thermal sensations and associated physiological responses at various ambient temperatures. Environmental Research, n. 1, p. 1-20, 1967.).

Pezzoli et al. (2012)PEZZOLI, A.; CRISTOFORI, E.; GOZZINI, B.; MARCHISIO, M.; PADOAN, J. Analysis of the termal comfort in cycling athletes. Procedia Engineering, v. 34, p. 433-438, 2012.apontam em seu estudo que a avaliação das condições bioclimatológicas e do conforto térmico em esportes de competição, como ciclismo, atletismo, entre outros, tem importância fundamental no planejamento apropriado do programa de treino e do plano nutricional, além de contribuírem para uma melhor avaliação da estratégia de prova. Apesar disso, a influência das condições meteorológicas e ambientais é geralmente desconsiderada na avaliação do desempenho em esportes ao ar livre.

O objetivo principal deste estudo é desenvolver prognósticos de tempo e avaliações de conforto térmico direcionados ao esporte, tendo como estudo de caso a Maratona da Cidade do Rio de Janeiro. Desta maneira, pretende-se apresentar a meteorologia aplicada ao esporte como uma ferramenta útil na busca do melhor desempenho esportivo, de modo que possa ser utilizada por técnicos, treinadores e atletas no planejamento de seus treinos e na elaboração de estratégias de competição. Espera-se também que este trabalho possa auxiliar o desenvolvimento de produtos e serviços meteorológicos a serem aplicados na realização dos Jogos Olímpicos de 2016, que será sediado na cidade do Rio de Janeiro.

O presente artigo está organizado da seguinte maneira: a seção 2 descreve os dados utilizados e metodologia de análise empregada; a seção 3 apresenta os resultados divididos em três outras seções, sobre cada uma das três maratonas estudadas, e a seção 4 apresenta as principais conclusões a cerca do estudo.

2. Material e Métodos

Na seção a seguir são descritos os métodos de análise, dados e ferramentas utilizadas para a realização deste estudo. A principal delas é o modelo numérico de previsão de tempo de área limitada, que é responsável em fornecer previsões de tempo para a região restrita na cidade do Rio de Janeiro, de preferência aquela que concentra o percurso da Maratona da Cidade do Rio de Janeiro. O Modelo WRF, do inglês Weather Research and Forecasting (Skamarock et al., 2008SKAMAROCK, W. C., et al. A description of the advanced research WRF version 3. NCAR Technical Note - Mesoscale and Microscale Meteorology Division, National Center for Atmospheric Rearch, Colorado, EUA, 2008.) foi escolhido já que ele é frequentemente usado para previsões nos esportes, tais como a vela, com grande confiabilidade. Reforçando tal argumento, o estudo de Pallotta et al. (2012)PALLOTTA, M. Estudo da influência das condições meteorológicas e de conforto térmico no desempenho esportivo: Análise prognóstica do tempo aplicada à Maratona da Cidade do Rio de Janeiro. 167p. Dissertação (Mestrado em Meteorologia) - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), São José dos Campos, 2012. mostra que as previsões do WRF tiveram bom desempenho nos boletins divulgados pelo serviço meteorológico no 52° Campeonato Mundial de Pentatlo Moderno.

2.1 Simulações do WRF

Para as simulações apresentadas neste artigo utilizou-se a versão 3.4 do WRF, com condição inicial dos dados da reanálise CFSR (Climate Forecast System) (Saha et al. 2010SAHA, S; et al. The NCEP climate forecast system. Bulletin American Meteorology Society, v. 91, n.10, p. 1015-1057, 2010.). As resoluções horizontais empregadas são de 10, 3 e 1 km, sendo as grades de 3 e 1 km aninhadas, conforme ilustra a Figura 1, e resolução vertical de 38 níveis, com o topo do modelo em 10 hPa.

Figura 1
Topografia do modelo WRF no domínio utilizado (resolução horizontal 10 km) e suas duas grades aninhadas. A grade maior tem resolução horizontal de 3 km, enquanto a grade menor, que engloba apenas parte dos estados de SP, MG e RJ, tem resolução horizontal de 1 km.

Foram selecionados três casos para simulação, correspondentes às datas de realização da Maratona da Cidade do Rio de Janeiro: 28 de junho de 2009, 18 de julho de 2010 e 17 de julho de 2011, referidas nesse estudo como Maratona 2009, Maratona 2010 e Maratona 2011, respectivamente. Todos os experimentos em questão foram iniciados partindo das 0000Z com tempo de integração de 60, 36 e 18 horas e saídas a cada 3h. A Tabela 1 apresenta a configuração e classificação dos experimentos para facilitar as citações.

Tabela 1
Classificação das configurações das simulações do WRF de acordo com o tempo de integração e as condições iniciais utilizadas na Maratona 2009 (28/06/09), Maratona 2010 (18/07/10) e Maratona 2011 (17/07/11).

O estudo de Pallotta (2012)PALLOTTA, M. Estudo da influência das condições meteorológicas e de conforto térmico no desempenho esportivo: Análise prognóstica do tempo aplicada à Maratona da Cidade do Rio de Janeiro. 167p. Dissertação (Mestrado em Meteorologia) - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), São José dos Campos, 2012. aprofunda a análise do desempenho das simulações do WRF neste mesmo caso e conclui que, para as três maratonas estudadas, houve boa representatividade da temperatura, pressão atmosférica e umidade relativa pelo modelo. Por outro lado, a simulação do vento se mostrou problemática, superestimando fortemente a situação real, trazendo algum prejuízo às análises do conforto térmico.

2.2 Métodos de Análise e Dados

A Maratona da Cidade do Rio de Janeiro é um evento esportivo expressivo que ocorre anualmente no município desde 2003, entre os meses de junho e julho. AFigura 2a apresenta o percurso aproximado dessa competição, traçado de acordo com informações disponíveis na página do evento (http://www.maratonadorio.com.br). Nela é possível identificar o trajeto principal de 42 km (do ponto A ao D) e o trajeto da Meia Maratona (21km - de B até D) que é disputada no mesmo dia. As provas são realizadas no período da manhã, com a largada dos primeiros pelotões a partir das 7hs e estendendo sua duração até o fim da manhã.

Figura 2
(a) Mapa das instalações dos Jogos Olímpicos Rio 2016 onde são indicadas as regiões de competições: 1- Barra, 2- Copacabana, 3- Maracanã, 4- Deodoro (b) Percurso da Maratona e Meia Maratona da Cidade do Rio de Janeiro. O Ponto A marca a Praça do Pontal (largada da Maratona), B a Praia do Pepe (largada da Meia Maratona), C a Praia de Copacabana e D o Aterro do Flamengo (chegada das duas provas). Fonte: Adaptado de Google (Maps http://www.maratonadorio.com.br)

A escolha do evento como estudo de caso deste trabalho foi associada ao fato do percurso da maratona circundar as áreas onde serão disputadas as provas Olímpicas (Figura 2b), além de ela ser realizada nas proximidades de julho. Este mês torna-se de interesse aos Jogos Olímpicos por ser anterior a sua abertura, programada para meados de agosto, e também no qual as delegações começam a chegar a cidade para os primeiros treinos e aclimatação. Isso torna os resultados obtidos úteis para futuros trabalhos a cerca das competições olímpicas, além de um possível auxílio à preparação dos atletas para os Jogos de 2016.

Para a descrição sinótica dos dias de realização de cada maratona foram utilizados dados da reanálise ERA-Interim (Deeet al., 2011DEE, D. P. et al. The ERA-Interim reanalysis: configuration and performance of the data assimilation system. Quarterly Journal of the Royal Meteorological Society, v.137, n.656, 553-597, 2011.), com resolução horizontal de 0,75° de latitude por 0,75° de longitude e 60 níveis verticais. As variáveis empregadas na composição dos campos e os níveis verticais considerados foram: Vento Zonal e Meridional (m/s) em 250, 500 hPa e a 10m e Pressão Reduzida ao Nível Médio do Mar (hPa). Além disso, também foram utilizadas imagens dos satélites GOES 10 e GOES 12 do canal infravermelho, disponibilizadas pela Divisão de Satélites Ambientais do CPTEC/INPE (http://satelite.cptec.inpe.br/acervo/goes_anteriores.jsp). Tal descrição sinótica serve de base para avaliar a qualidade do acerto dos prognósticos do WRF apresentados.

As simulações de 60, 36 e 18h foram comparadas entre si de maneira qualitativa, onde se levou em consideração as distinções apresentadas entre os diferentes tempos de integração e também a situação sinótica anteriormente identificada. Tal comparação foi feita com base nos campos com resolução de 3 km, cujo domínio das figuras engloba todo o estado do Rio de Janeiro, onde podem ser mais facilmente visualizados sistemas sinóticos e de mesoescala, além de padrões de vento e pressão.

Na análise das condições meteorológicas e o conforto térmico ao longo do percurso da Maratona do Rio de Janeiro, nas três edições estudadas, foram selecionados na grade das rodadas de 1 km quatro pontos, o mais próximo possível daqueles marcados na Figura 2a. Eles foram cuidadosamente escolhidos para que representassem o percurso da maneira mais próxima à realidade, uma vez que a maratona é toda percorrida a beira mar e a conversão das coordenadas geográficas para a grade do modelo poderia interpolar um pixel localizado no oceano. Tais pontos foram numerados de 1 a 4, seguindo a sequência disposta na Figura 2a, e caracterizados respectivamente como: Largada da Maratona, Largada da Meia Maratona, Ipanema e Chegada. Foram extraídos desses pontos valores de temperatura, umidade relativa, pressão e velocidade do vento, das rodadas de configuração 3 do WRF (Tabela 1), por ser a de menor integração em relação à ocorrência da prova, em três horários de interesse: às 0900Z (06h local), uma hora antes da largada dos primeiros pelotões, às 1200Z (09h local), quando a prova ainda está ocorrendo em praticamente toda a sua extensão, e às 1500Z (12h local), entre uma e duas horas após o término total da competição. Tais parâmetros meteorológicos foram utilizados posteriormente na estimativa do conforto térmico.

Os índices de conforto térmico utilizados neste estudo foram escolhidos de acordo com os critérios que seguem. Em Supinget al. (1992)SUPING, Z.; GUANGLIN, M.; YANWEN, W.; JI, L. Study of the relationships between weather conditions and the marathon race, and of the meteorotropic effects on distance runners. International Journal of Biometeorology, v. 36, p. 63-68, 1992., onde apresenta-se a análise dos tempos de chegada da Maratona de Beijing ao longo de 8 anos relacionando-os às condições meteorológicas, os índices empíricos que mostraram correlação mais alta (entre 0,6 e 0,8) com os melhores tempos de prova foram a Temperatura Efetiva (TE) e a Temperatura Efetiva em função do Vento (TEv). Nedel (2008)NEDEL, A. S. Condições meteorológicas favoráveis à ocorrência de doenças respiratórias em crianças na cidade de São Paulo. 189p. Tese (Doutorado em Meteorologia) - Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008. indica em seu estudo esses dois índices como os mais utilizados em pesquisas no Brasil e representativos para o país, principalmente para a cidade de São Paulo, que era o foco de seu trabalho. Pezolli et al.(2012)PEZZOLI, A.; CRISTOFORI, E.; GOZZINI, B.; MARCHISIO, M.; PADOAN, J. Analysis of the termal comfort in cycling athletes. Procedia Engineering, v. 34, p. 433-438, 2012. utiliza a Temperatura Equivalente Fisiológica (TEF) e o Voto Médio Previsto (VMP) e algumas análise da Temperatura Efetiva Padrão (TEP) para analisar o desempenho de atletas no ciclismo ao ar livre em um campeonato na Itália, obtendo resultados satisfatórios nessas aplicações.

Dos índices empíricos, a TE é função somente da temperatura e umidade relativa do ar, cujo cálculo é dado pela Equação 1. A TEv tem a mesma fundamentação teórica e aplicação que a TE, como pode ser visto em Suping et al. (1992)SUPING, Z.; GUANGLIN, M.; YANWEN, W.; JI, L. Study of the relationships between weather conditions and the marathon race, and of the meteorotropic effects on distance runners. International Journal of Biometeorology, v. 36, p. 63-68, 1992., diferindo dela apenas por levar em consideração a ação do vento, conforme descreve a Equação 2.

Onde Ta é a temperatura do ar em °C, UR é a umidade relativa do ar em % e v é a velocidade do vento em m/s.

Os índices fisiológicos, TEF, TEP e VMP, são baseados em parâmetros e equações da fisiologia humana, com cálculos analíticos complexos, tornando mais fácil obter seus resultados fazendo uso de modelos. Neste estudo é utilizado para tal o Modelo de Rayman (Matzarakis et al., 2007MATZARAKIS, A.; RUTZ, F.; MAYER, H. Modelling radiation fluxes in simple and complex environments - application of the RayMan model. International Journal of Biometeorology, v. 51, p. 323-334, 2007.), o qual trata-se de um modelo simples de interface gráfica que usa informações de data, localidade, parâmetros meteorológicos e também fisiológicos para calcular esses três índices de conforto térmico.

Todos os índices foram classificados em situação de repouso, e em atividade para os três índices fisiológicos, de acordo com os limiares, siglas e escalas de cores apresentadas na Tabela 2.

Tabela 2
Distribuição das zonas de conforto/desconforto de acordo com a Temperatura Efetiva, Temperatura Efetiva em função do Vento, Temperatura Equivalente Fisiológica e Voto Médio Previsto para diferentes graus de percepção térmica e suas respostas fisiológicas. Apresenta escala de cores e siglas para facilitar a classificação.

A última tarefa consistiu em tentar encontrar uma relação entre os melhores (piores) tempos de prova e as situações de tempo mais confortáveis (desconfortáveis). Fazendo uso do histórico das provas, disponibilizado pela organização da Maratona da Cidade do Rio de Janeiro, foram calculadas as médias dos cinco melhores tempos das provas masculinas, de cada uma das três edições. Essas médias e os melhores tempos foram comparados às impressões gerais e constatações sobre o conforto térmico nos dias de realização das maratonas, de modo a tentar confirmar a relação hipotética.

3. Resultados e Discussão

3.1 Maratona 2009

3.1.1 Descrição Sinótica

A análise do campo de altos níveis para as 1200Z do dia 28 de junho de 2009 (Figura 3a) mostra um cavado amplificado sobre o sudeste do Brasil, cujo eixo se estende desde o centro-norte de MG até a divisa entre SP e RJ. No dia anterior (Figura não apresentada), tal cavado encontrava-se mais deslocado para esquerda, estendendo-se desde a região Centro-Oeste até o Sudeste, o que causou chuvas significativas em algumas localidades nessa área, conforme relatado pelo boletim técnico do Grupo de Previsão de Tempo (GPT) do CPTEC/INPE (http://tempo1.cptec.inpe.br/bol_tecnico.shtml). O Jato Subtropical atua principalmente na vanguarda do cavado e, neste horário, contribuiu para o aumento da nebulosidade e riscos de trovoadas isoladas entre o norte do RJ, leste de MG, ES e Sul da BA.

Figura 3
Campos Sinóticos referentes às 1200Z do dia 28/06/2009: (a) Fluxo (linhas de corrente) e magnitude (sombreado) do vento horizontal (m/s) em altos níveis (250 hPa); (b) Fluxo (linhas de corrente) e magnitude (sombreado) do vento horizontal (m/s) em níveis médios (500 hPa); (c) Pressão ao nível médio do mar (hPa) (sombreado) e vento horizontal (m/s) à 10m; (d) Imagem no canal do infravermelho do satélite GOES 10 realçada para temperatura do topo de nuvens.

Nos níveis médios (Figura 3b) o cavado observado em altitude ainda é perceptível, porém de maneira bem menos amplificada. Ainda assim, essa condição favorece a ocorrência de pancadas de chuva entre o centro-norte do RJ, leste de MG e ES.

Em superfície (Figura 3c), o sistema frontal estacionário sobre o Atlântico, que se encontrava afastado do continente na altura do ES às 0000Z (Figura não apresentada), não se encontra mais nos domínios do campo em questão. É apenas observado o amplo anticiclone pós-frontal associado a ele, que se estende desde a costa da Argentina até a costa da região sudeste do Brasil. O RJ não se encontra sob total atuação desse anticiclone, pois é verificada uma baixa relativa, de 1020 hPa, atuando sobre o centro-sul do estado, o que inclui a capital, centrada em aproximadamente -23°S e -43°W. Esse núcleo de baixa pressão é reflexo do cavado em altitude que, por advecção de vorticidade negativa, induz convergência a leste nos baixos níveis, resultando em uma área de baixa pressão em superfície. Tal convergência foi a causa da nebulosidade e possível precipitação na região.

A imagem de satélite das 1200Z (Figura 3d) mostra nebulosidade concentrada entre o RJ, ES e centro-leste de MG, como indicado pelos campos em altitude e superfície. A temperatura realçada e textura da imagem sugerem a presença de nuvens médias e baixas nessa região, indicando possibilidade de precipitação estratiforme em algumas localidades, incluindo a cidade do Rio de Janeiro.

O METAR do aeródromo Santos Dummont (SBRJ), na capital fluminense, registrou às 0300Z deste dia a ocorrência de tempestade. Na hora seguinte, tanto o SBRJ, quanto o SBGL (aeródromo do Galeão, a cerca de 18 km de distância do SBRJ) registraram chuva leve. A partir daí nenhuma outra ocorrência de precipitação foi registrada pelo METAR ao longo do dia 28/06 no RJ.

3.1.2 Simulações WRF

Ao analisar o campo de pressão na primeira simulação (Figura 4a 60h), observa-se que 60h antes o modelo não deu indícios da baixa relativa observada no campo de superfície (Figura 3c), uma vez que a área se mostra homogênea em cerca de 1023 hPa. Ao associar este fato ao observado na equivalente simulação do vento (Figura 4b60h), que apresenta giro com caraterística anticiclônica, é possível inferir que a condição sinótica representada pelo WRF com 60 horas de antecedência seria de uma alta pós-frontal, associada à frente estacionária que passou pelo oceano próximo ao RJ e ES no dia anterior. Sendo assim, o cavado presente em altitude (Figuras 3a e 3b) pode não ter sido simulado pelo modelo ou então não se mostrava tão intenso a ponto de induzir uma baixa pressão em superfície.

Figura 4
Simulações do modelo WRF para o dia 28/06/09 às 1200Z, na resolução de 3km com 60, 36 e 18 horas de integração para (a) pressão reduzida ao nível do mar, em hPa e (b) velocidade do vento à 10 m, em m/s.

Com base nas simulações de 60h de antecedência, a condição de tempo em 28 de junho de 2009 às 1200Z (09h local), para a cidade do Rio de Janeiro, seria de pouca nebulosidade, sem chuva e com ventos de fraca intensidade.

Na simulação seguinte, o campo de pressão (Figura 4a 36h) já apresenta queda relativa com característica semelhante, porém mais a oeste, do efetivamente observado. Mesmo sútil, por ainda não se apresentar fechada e com cerca de 1022 hPa, já sugere que o modelo identificou a perturbação do cavado em altitude, mas não tão amplificado como de fato ocorreu. Isto está refletido no campo do vento de 36h de antecedência (Figura 4b 36h), que mostra a intensificação dos ventos em direção à área de baixa pressão, indicando a convergência nela.

Portanto, com base nos campos de 36h de antecedência, a condição de tempo na cidade do RJ seria atualizada em relação à simulação anterior, sugerindo ocorrência de céu encoberto, possibilidade de precipitação, ventos mais intensos principalmente em áreas próximas ao mar.

Por fim, o campo de pressão de menor tempo de integração (Figura 4b 18h), mostra a eficiente representação da área de baixa pressão que de fato ocorreu naquele dia, com localização muito próxima àquela determinada na observação do campo em superfície (Figura 3c) e também com centro de 1020 hPa. De acordo com aFigura 4b 18h, as áreas de ventos mais fortes aparecem na periferia da baixa, concentrando-se no oceano e na costa norte do RJ. Além disso, o comportamento irregular do vento na região centro-sul do estado sugere movimento convergente.

Portanto, de acordo com as simulações de 18h de antecedência para às 1200Z do referido dia, a condição de tempo para a cidade do RJ se manteria como indicado na simulação anterior, com céu encoberto e possibilidade de chuva devido a uma área de baixa relativa em superfície, agora bem representada. As condições de vento seriam atualizadas, se apresentando com menor intensidade ao longo da costa da cidade, exceto por ventos de noroeste que cortam o município.

3.1.3 Avaliação do Conforto Térmico

Para o primeiro horário (Tabela 09 Z, Figura 5) a condição geral ao longo do percurso fica entre ligeiro desconforto para o frio ao confortável, sendo esta última mais facilmente atingida durante a atividade física, como mostrado pelo VMP. Notou-se ainda uma variação pequena, porém perceptível, dos parâmetros meteorológicos ao longo do percurso, sendo o vento o mais notável deles.

Figura 5
Valores de temperatura (°C), umidade relativa (%), pressão atmosférica (hPa) d vento (m/s), além da avaliação do conforto térmico pelos índices TE, TEV, TEF, VMP e TEP*, e seus respectivos graus de estresse fisiológico, para as 0900Z, 1200Z e 1800Z o dia 28/06/09 em quatro pontos específicos do percurso da Maratona da Cidade do Rio de Janeiro.

Ainda assim alguns dos pontos devem ser destacados, como na largada onde há uma maior tendência a desconforto para o frio, devido principalmente ao vento, uma vez que os valores de TEv e TEP, índices fortemente influenciados por ele (Gobo e Galvani, 2012GOBBO, J. P. A.; GALVANI, E. Aplicação de índice de conforto térmico no Rio Grande do Sul. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE METEOROLOGIA, 17., 2012, Gramado Anais.. .Rio de Janeiro: SBMet, 2012.; Pezzoli et al., 2012PEZZOLI, A.; CRISTOFORI, E.; GOZZINI, B.; MARCHISIO, M.; PADOAN, J. Analysis of the termal comfort in cycling athletes. Procedia Engineering, v. 34, p. 433-438, 2012.), são mais baixos que os demais. Já no ponto de largada da meia maratona observa-se a chance de ligeiro desconforto para o calor na prática de atividade. Outra constatação relevante é que, apesar de não haver mudança no grau de estresse fisiológicos determinado pelos índices, do ponto 2 ao 4 há leve tendência no aumento do desconforto para o frio.

A condição geral do percurso para as 1200Z, como pode ser inferido na Figura 5, é de confortável a leve desconforto para o frio, sendo que o ponto de largada se destaca dos demais como o mais suscetível a este último, principalmente na prática esportiva, tendo a intensidade do vento como causa. Aliás, esta mostrou grande variação ao longo do percurso, diferente da temperatura que se manteve entre 22°C e pouco mais de 23°C.

Diferente do observado no ponto 1, a TE nos demais pontos indica leve desconforto para o frio, mas optou-se por desconsiderar tal classificação, já que os índices fisiológicos, mais representativos, principalmente para o caso de atividade física, indicam sensação de conforto à leve desconforto para o calor. Mesmo assim, se observados os índices com maior atenção, é possível identificar entre os pontos 1 e 3 uma ligeira variação positiva dos índices, principalmente para TEF, VMP e TEP, indicando tendência a um leve desconforto para o calor, porém não o suficiente para alterar o grau de estresse fisiológico. Do ponto 3 para o 4 a sensação de conforto volta a ser maior.

Já no último horário analisado (Tabela 15 Z, Figura 5), a grande variação dos parâmetros meteorológicos, em especial temperatura e vento, tornou inviável estipular uma condição geral de conforto ou desconforto para o percurso da maratona. Além disso, a superestimativa do vento, como já observado na seção 2.1, atrapalha um pouco a avaliação do conforto térmico, fazendo com que a análise da TEv seja desconsiderada por diferir muito dos demais índices.

Definindo a condição ponto a ponto do percurso, tem-se que na largada predomina o leve desconforto para o calor, podendo atingir o moderado em atividade intensa. No ponto seguinte a condição fica entre confortável e ligeiro desconforto para o calor, com o primeiro prevalecendo devido à intensidade do vento. Em Ipanema a sensação varia entre o ligeiro desconforto para o frio, principalmente por causa do vento intenso, ao confortável. Por último, no ponto de chegada a condição encontrada é de conforto, podendo atingir o leve desconforto para calor.

De maneira a resumir o que pode ser encontrado pelo atleta ao longo do percurso, a seguir são listadas as condições de conforto térmico de acordo com a etapa e o horário em que esta provavelmente é atingida, conforme os horários de largada e duração média da prova. Desta maneira, para o início da prova leva-se em consideração a avaliação no ponto 1 das 0900Z, para a metade dela, os pontos 2 e 4 da análise das 1200Z, e para o final, o ponto 4 das 1200Z.

  • Início: leve desconforto para o frio, algo que pode ser benéfico para o competidor, já que não há grande desgaste devido às condições de tempo, fazendo com que ele atinja um bom ritmo de prova não comprometendo as demais etapas;

  • Metade: situação de conforto térmico, com pequena tendência à desconforto para o calor, pouca condição para desgaste físico devido às condições de tempo

  • Final: condição semelhante a anterior, porém com indícios de vento mais intenso na última etapa, algo que pode beneficiar o competidor que já se encontra em grande desgaste físico, abaixando sua temperatura corporal, e assim ajudando-o a manter um bom desempenho até o final.

Relação condição de tempo vs. competição: as temperaturas amenas, que variaram de 19,3°C à 24,2°C ao longo do percurso, e o céu encoberto contribuíram para tornar as condições de competição muito boas em todas as etapas da prova.

3.2 Maratona 2010

3.2.1 Descrição Sinótica

A análise do campo de altos níveis para as 1200Z do dia 18 de julho de 2010 (Figura 6a) mostra ampla circulação anticiclônica centrada na divisa dos estados de TO e GO, atingindo grande parte do centro-norte do Brasil. No centro-norte da Argentina localiza-se o centro de um vórtice ciclônico de altos níveis (VCAN), ao qual as correntes de jato circundam e seguem em direção à intensa crista localizada a oeste do VCAN e com eixo direcionado ao RJ. Nesta região nota-se um largo núcleo de ventos intensos associados à circulação de jato, com uma ramificação se direciona ao sul do RJ, trazendo condições de nebulosidade e precipitação para os entornos.

Figura 6
Campos Sinóticos referentes às 1200Z do dia 18/07/2010: (a) Fluxo (linhas de corrente) e magnitude (sombreado) do vento horizontal (m/s) em altos níveis (250 hPa); (b) Fluxo (linhas de corrente) e magnitude (sombreado) do vento horizontal (m/s) em níveis médios (500 hPa); (c) Pressão ao nível médio do mar (hPa) (sombreado) e vento horizontal (m/s) à 10m; (d) Imagem no canal do infravermelho do satélite GOES 10 realçada para temperatura do topo de nuvens.

Em 500 hPa (Figura 6b) é possível observar o aprofundamentos das duas circulações dominantes em altos níveis, com um domínio anticiclônico com centro entre MG e SP, se estendendo pelo centro-norte do país e um vórtice ciclônico de forte baroclínia entre a região centro-norte da Argentina e o Chile.

Na superfície (Figura 6c) verifica-se circulação pós-frontal intensa associada a uma frente fria identificada pela carta sinótica do dia (GPT-CPTEC/INPE) no oceano, na altura da divisa do RJ e ES (Figura não apresentada). A área de alta pressão associada se estendeu desde a costa leste da Argentina de 1036 hPa, advectando ar úmido do oceano em direção a faixa leste entre SC e RJ e causando instabilidade de pouca intensidade, segundo reportado pelo boletim técnico do referido dia. O mesmo boletim alerta para a ocorrência de ventos fortes de quadrante leste ao longo do dia 18 de junho, desde o RS até o RJ, devido ao grande gradiente de pressão observado, resultado da intensa circulação de alta em contraste com o profundo e extenso cavado que se aproxima, com eixo se localizando do MT até a divisa entre RS e Uruguai.

Na imagem de satélite das 1200Z (Figura 6d) observa-se nebulosidade estratiforme sobre todo o estado do RJ, devido ao tom cinza escuro da imagem, o que está de acordo com o constatado na análise dos campos em altitude e superfície. Este tipo de nebulosidade, como esperado, causou chuva leve e neblina no município do Rio de Janeiro e seus arredores durante parte da madrugada e manhã do dia 18 de junho, conforme registrou o METAR do SBGL das 0600Z às 1100Z e do SBRJ às 1100Z. Nenhuma área de maior instabilidade é identificada nos arredores do RJ no referido dia.

3.2.2 Simulações WRF

A comparação das simulações de pressão para 60h de antecedência (Figura 7a 60h) mostra que toda a região costeira do estado do RJ está sob ação de uma faixa de 1023 hPa, com pressões mais altas tanto ao norte quanto ao sul. É notado o indício da atuação de uma alta pós-frontal na simulação do vento (Figura 7b 60h), devido ao giro anticiclônico do escoamento vindo de leste, que por sua vez está associada ao sistema frontal estacionário identificado na análise sinótica do campo de superfície (Figura 6c) e não localizado no domínio da figura. Esta alta ainda não se mostra tão forte como de fato ocorreu, talvez por o modelo subestimar a intensidade do cavado que se formou à oeste e/ou simular sua posição mais ao sul ou leste do que foi observado no dia, fazendo com que a característica de fortes gradientes de vento e altura geopotencial na região não ocorra na simulação de 60h de antecedência. Por outro lado, o vento mais forte adentra o continente apenas pelo setor norte do estado do RJ, mantendo o sul do estado, o que inclui a capital, sob influência de ventos de nordeste e média intensidade.

Figura 7
Simulações do modelo WRF para o dia 18/07/10 às 1200Z, na resolução de 3km com 60, 36 e 18 horas de integração para (a) pressão reduzida ao nível do mar, em hPa e (b) velocidade do vento à 10 m, em m/s.

Sendo assim, com base na simulação de 60h de antecedência, a condição de tempo em 18 de julho de 2010 às 1200Z (09h local) para a cidade do Rio de Janeiro seria de nebulosidade variável, preferencialmente estratiforme, com baixa chance de precipitação leve.

Na simulação seguinte, o campo de pressão (Figura 7a 36h) mostra a atuação de uma área de alta pressão que se estende do oceano, com 1026 hPa, e adentra boa parte do estado do RJ, com 1025 hPa. Esta se assemelha àquela de fato observada no campo sinótico de superfície (Figura 6c), exceto pela pequena diferença no posicionamento e intensidade um pouco menor. Desta maneira, a simulação de 36h do vento (Figura 7b 36h) indica ventos fortes de quadrante leste ao longo de toda a costa do RJ, principalmente na capital e no sul do estado. Esta intensa circulação anticiclônica transporta o ar frio das latitudes mais altas de onde se origina em direção ao RJ, como pode ser observado na simulação de 36h da temperatura (Figura não apresentada), devido à uma área de temperatura mais baixa sobre o oceano que não era identificada na simulação anterior.

Além disso, há o transporte de umidade do oceano para o continente, que fica evidenciado pela concentração de umidade principalmente nas áreas serranas (Figura não apresentada), colaborando para a ocorrência de nebulosidade e precipitação ao longo da costa do estado. É possível inferir que a mudança, e consequente aprimoramento, das simulações de 36h em relação aos de 60h, pode ser explicada por uma melhor simulação do cavado que se estendia da região centro-oeste ao sul do Brasil, tanto em intensidade quanto em posicionamento, já que os fortes gradientes esperados se mostram na intensificação da área de alta pressão de uma simulação para a outra.

As simulações de 36h de antecedência às 1200Z do dia 18 de julho de 2010 permitem inferir que a condição de tempo na cidade do RJ seria atualizada em relação à simulação anterior, informando a ocorrência de céu encoberto com possibilidade de chuva leve, ventos fortes principalmente nas áreas próximas ao mar.

Por fim, o campo de pressão de 18h de integração (Figura 7a 18h) mostra a eficiente representação da área de alta pressão pós-frontal descrita na seção 3.2.1, com intensidade e posicionamento muito próximos aos observados na Figura 6c. Quanto a simulação do vento (Figura 7b 18h) não há grande diferença na direção do escoamento quando comparado a simulação anterior, porém há o aumento de sua intensidade, em especial no setor sul do estado do RJ, o que indica que o modelo representou satisfatoriamente o forte gradiente induzido pelo amplo cavado em aproximação.

Sendo assim, de acordo com as simulações de 18h de antecedência para às 1200Z do referido dia, a condição para a cidade do RJ se manteria como indicado na simulação anterior e também na análise sinótica presente na seção 3.2.1, com tempo nublado e períodos de chuva leve, ventos fortes principalmente na área costeira.

3.2.3 Avaliação do Conforto Térmico

Para o primeiro horário (Figura 8, Tabela 09 Z) a condição geral do percurso vai do leve desconforto para o frio ao confortável. Apesar disso o intenso vento pode ser um limitante na sensação de conforto, já que os índices fortemente influenciados por ele, como TEv, TEP e até a TEF, mostram baixos valores e indicam o desconforto moderado para o frio. O vento se manteve constantemente intenso em todos os pontos do percurso, variando pouco como também ocorreu com T e UR.

Figura 8
Valores de temperatura (°C), umidade relativa (%), pressão atmosférica (hPa) d vento (m/s), além da avaliação do conforto térmico pelos índices TE, TEV, TEF, VMP e TEP*, e seus respectivos graus de estresse fisiológico, para as 0900Z, 1200Z e 1800Z o dia 18/07/10 em quatro pontos específicos do percurso da Maratona da Cidade do Rio de Janeiro.

Ao analisar o percurso da prova ponto a ponto neste horário, é possível perceber que da largada da maratona até a largada da meia maratona há um leve aumento na sensação de conforto, mas não o suficiente para alterar o grau de estresse fisiológico. O ponto seguinte, em Ipanema, é o mais confortável do percurso, onde a combinação de temperatura e umidade mais altas contribui para que a sensação de conforto seja mais facilmente atingida. O próximo, e último ponto do percurso apresenta novamente uma condição mais propicia ao leve desconforto para o frio.

A condição geral do percurso para as 1200Z, estipulada de acordo com a Figura 8, vai do confortável ao ligeiro desconforto para o calor, já que houve um ligeiro aumento na temperatura, referente ao horário, e uma diminuição na velocidade do vento em relação ao horário anterior. Estes dois fatos combinados contribuem para um conforto maior ao longo do percurso. A sensação de conforto oscilou levemente no decorrer do percurso, mas de forma branda, sem alterar o grau de estresse fisiológico.

Para as 1500Z (Figura 8, Tabela 15 Z) a condição geral ao longo do percurso fica entre o confortável e ligeiro desconforto para o calor. Houve aumento significativo da temperatura, porém o vento se manteve tão intenso quanto no horário anterior, além de constante nos quatro pontos. Na primeira metade do percurso, onde foram registradas as maiores temperaturas, a tendência é o desconforto para o calor ser maior, mesmo que de forma leve, enquanto que nos dois últimos pontos a sensação de conforto é mais provável de ser atingida, já que há uma diminuição na temperatura.

Portanto, as condições de conforto térmico encontradas pelo atleta ao longo do percurso são listadas de acordo com a etapa e o horário em que esta provavelmente é atingida, conforme os horários de largada e duração média da prova, assim como feito para a Maratona 2009.

  • Início: domina o leve desconforto para o frio devido à intensidade do vento. Esta pode vir a prejudicar o início da prova, causando maior desgaste físico, devido à resistência causada pelo vento, e também fisiológico, por ser difícil atingir o conforto em tal situação;

  • Metade: conforto à leve desconforto para o calor, com o vento um pouco mais fraco que na etapa anterior, contribuindo para um melhor ritmo de prova;

  • Final: no geral confortável, com vento de intensidade semelhante ao enfrentado na etapa anterior. Esta situação compensa de certa forma o maior desgaste do início da prova, já que um ritmo mais forte de corrida pode ser imposto de maneira mais eficiente.

Relação condição de tempo vs. competição: A direção do vento, que se mostra preferencialmente de leste de acordo com a Figura 8b 18h, além de sua intensidade, contribuiria para um significativo desgaste físico, se sobressaindo até àquele causado pelo estresse fisiológico. Mas este ainda deve ser levado em consideração, principalmente devido à ocorrência de chuva leve durante parte da manhã, o que poderia causar desconforto para o frio ainda maior, considerando o vento e o movimento do corpo. Sendo assim, as condições meteorológicas tornam desfavorável a realização de uma boa prova, a não ser que o percurso seja estudado criteriosamente.

Um melhor desempenho na maratona neste dia poderia ser obtido se o competidor evitasse se desgastar no início da prova, onde o desconforto é maior devido à temperatura mais baixa, ventos mais fortes e a ocorrência de chuva. Assim ele deixaria para impor um ritmo forte da metade para o final, já que o aumento da temperatura e o fim da chuva contribuiriam para um desgaste fisiológico menor, compensando de certa forma o desgaste físico adicional causado pelo vento.

3.3 Maratona 2011

3.3.1 Descrição Sinótica

A análise do campo de altos níveis para as 1200Z do dia 17/07/2011 (Figura 9a) mostra um cavado extenso, porém pouco amplificado, com eixo entre o Paraguai e Argentina, circundado pelas correntes de jato que apresentam núcleo de velocidade intensa sobre o oceano, na direção do RS, e associado a um forte sistema frontal em superfície. Outro cavado, de pouca amplitude, é observado na região centro-norte do Brasil, oriundo de uma circulação ciclônica que 12 horas antes era associada a um VCAN na mesma região, segundo o boletim técnico das 0000Z. O estado do RJ encontra-se na vanguarda deste pequeno cavado, porém não sofre influência do escoamento dele, já que sua pouca amplitude não gerou grande perturbação que modificasse as condições de tempo da região.

Figura 9
Campos Sinóticos referentes às 1200Z do dia 17/07/2011: (a) Fluxo (linhas de corrente) e magnitude (sombreado) do vento horizontal (m/s) em altos níveis (250 hPa); (b) Fluxo (linhas de corrente) e magnitude (sombreado) do vento horizontal (m/s) em níveis médios (500 hPa); (c) Pressão ao nível médio do mar (hPa) (sombreado) e vento horizontal (m/s) à 10m; (d) Imagem no canal do infravermelho do satélite GOES 10 realçada para temperatura do topo de nuvens.

Nos níveis médios (Figura 9b) observa-se uma circulação anticiclônica, cujo centro se posiciona no oceano Atlântico a leste da divisa entre RJ e ES, que se estende por parte das regiões Nordeste, Norte e Sudeste. Tal circulação inibe a formação de nebulosidade significativa e mantém a umidade relativa baixa nessas regiões.

Em superfície (Figura 9c) é notada uma frente fria extensa sobre o estado de SC que, segundo o boletim técnico do referido dia, encontrava-se em lento deslocamento. Por outro lado, grande parte do país estava sob atuação de uma alta, com características do ASAS, centrada sobre o oceano em -33°S e -30°O, com 1027 hPa e estendendo seu giro anticiclônico desde a região nordeste, trazendo nebulosidade e precipitação leve, e adentrando parte das regiões norte, centro-oeste e sudeste, colaborando para o tempo mais seco e com pouca nebulosidade. Ao norte do estado do RJ, próximo a divisa com o ES, é observado um cavamento da alta pelo sistema frontal que se aproxima do sudeste.

A imagem de satélite das 1200Z (Figura 9d) mostra alguma nebulosidade baixa ou média na divisa entre SP e RJ, mas o restante da costa do estado se encontra sob tempo aberto. Os registros do METAR deste dia, tanto no SBRJ quanto no SBGL, apontaram pouca ou nenhuma nebulosidade, sem ocorrência de precipitação e boas condições de visibilidade.

3.3.2 Simulações WRF

Ao analisar de maneira geral a Figura 10 é notável o quanto as três simulações são parecidas entre si para as duas variáveis. Ao analisar a pressão em superfície (Figura 10a) vê-se que o WRF representou de maneira satisfatória a penetração da baixa pressão na circulação dominante do ASAS, devido a movimentação de uma frente fria ao sul. No entanto, somente a simulação de 60h de antecedência representou eficientemente à posição e intensidade dessa baixa, de acordo com o identificado no campo de superfície do dia (Figura 9c), enquanto os demais a mostram mais intensa e abrangendo uma área maior. Uma possível explicação pode estar no lento deslocamento apresentado pelo sistema frontal em direção a região sudeste, conforme reportado pelo boletim técnico do GPT- CPTEC/INPE. Sendo assim, nas simulações de 36 e 18h o modelo aparentemente posiciona a frente mais ao norte do que de fato ocorreu, acelerando seu deslocamento e introduzindo com maior rapidez e intensidade a área de baixa pressão no RJ.

Figura 10
Simulações do modelo WRF para o dia 17/07/11 às 1200Z, na resolução de 3km com 60, 36 e 18 horas de integração para (a) pressão reduzida ao nível do mar, em hPa e (b) velocidade do vento à 10 m, em m/s.

Uma vez que comportamento do vento pode ser relacionado ao campo de pressão, vê-se na Figura 10b que a característica mais evidente das simulações do vento é um núcleo intenso de nordeste, localizado sobre o oceano e atingindo a costa norte do RJ, em resposta justamente ao gradiente de pressão causado pela entrada da baixa pressão anteriormente discutida. Nota-se que o núcleo de fortes ventos se intensifica e se expande de uma simulação para a outra, tal qual a baixa pressão da Figura 10a, mas como foi constatado o adiantamento desta última nos campos de 36 e 18h de integração é possível inferir que o vento no oceano fica mais bem representado no prognóstico de 60h de integração.

O padrão do vento (Figura 10b) no continente não muda muito com a diminuição do tempo de integração, vindos preferencialmente do quadrante norte em direção ao RJ, seguindo a circulação dominante do ASAS. Esta circulação, bem simulada desde o início, contribui para manter o tempo quente e seco principalmente no centro sul do estado, como pode ser constatado nos prognósticos de temperatura e umidade (Figuras não apresentadas).

Sendo assim, a condição de tempo indicada para a cidade do RJ no dia 17 de julho de 2011 às 1200Z seria praticamente a mesma em 60, 36 ou 18h de antecedência, com tempo aberto e temperaturas em elevação. A respeito da baixa pressão que adentra o estado nessa ocasião, sua atuação aumentaria a chance de precipitação convectiva no período da tarde, já que a inibição da formação de nuvens pela circulação do ASAS deixaria de ser dominante. Vale a pena ressaltar que mesmo os prognósticos de 36 e 18h de integração superestimando a área de baixa pressão, uma previsão de tempo feita com base neles só traria de diferente uma maior possibilidade de pancadas de chuva no período da tarde.

3.3.3 Avaliação do Conforto Térmico

A condição geral do percurso às 0900Z (Figura 11, Tabela 09 Z) fica entre o leve desconforto para o frio e o confortável, com tendência a incomodo devido ao vento em alguns pontos específicos, já que este varia significativamente ao longo do percurso. A superestimativa do vento nesta avaliação pode ser problemática, uma vez que a falta da cobertura de nuvens e as temperaturas amenas do começo da manhã, somadas a um vento intenso, abaixam muito os valores dos índices, principalmente durante a prática de atividade, como mostram os valores da TEF e principalmente da TEP. O ponto mais desconfortável da prova neste horário é a chegada, onde a temperatura é menor que nos outros pontos e a velocidade do vento alta.

Figura 11
Valores de temperatura (°C), umidade relativa (%), pressão atmosférica (hPa) d vento (m/s), além da avaliação do conforto térmico pelos índices TE, TEV, TEF, VMP e TEP*, e seus respectivos graus de estresse fisiológico, para as 0900Z, 1200Z e 1800Z o dia 17/07/11 em quatro pontos específicos do percurso da Maratona da Cidade do Rio de Janeiro.

No segundo horário (Figura 11, Tabela 12 Z) a condição geral ao longo do traçado da prova varia entre o confortável e o leve desconforto para o calor, mas ainda assim a avaliação do conforto térmico se mostra difícil de padronizar, provavelmente devido à variação do vento do percurso. Por outro lado, o aumento significativo da temperatura ajudou a amenizar a recorrente indicação de desconforto para o frio, observada até então.

Analisando ponto a ponto o percurso às 1200Z, é visto que na largada há uma maior tendência ao desconforto para o calor, podendo até ser moderado, como indicado pelo VMP na situação de atividade física, mesmo com o vento intenso a temperatura mais alta se destaca. No ponto seguinte a temperatura é quase um grau mais baixa, e a velocidade do vento menor, o que faz manter a condição geral entre o confortável e o leve desconforto para o calor. Ipanema é o ponto mais confortável do percurso, com uma temperatura mais amena, umidade mais alta e vento mais intenso. Na chegada a condição de conforto à leve desconforto para o calor é novamente atingida, devido principalmente a diminuição do vento, com destaque ao baixo valor da umidade relativa.

Por fim, às 1500Z (Figura 11) a combinação das altas temperaturas com a diminuição significativa da velocidade do vento faz com que o desconforto para o calor domine todo o percurso, variando no geral entre moderado e forte. Mesmo assim, foi notada certa heterogeneidade entre os pontos, devido principalmente a variação do vento.

Na largada a condição fica entre moderado e forte desconforto para o calor, com maior tendência ao último devido principalmente a temperatura de mais de 27°C. No ponto seguinte, o desconforto moderado ao calor domina devido ao menor valor da temperatura, mais ainda sim é possível atingir o forte desconforto, principalmente com o corpo em atividade intensa. Em Ipanema apesar da temperatura amena, a combinação do vento fraco com a intensa insolação, já que não há nebulosidade, faz o desconforto para o calor ser forte, podendo até chegar a extremo, como indica o valor do VMP no caso de atividade física. Por fim, no ponto de chegada a situação se mostra um pouco mais confortável devido ao vento intenso, mesmo com a temperatura mais alta do percurso a sensação fica entre moderado e forte desconforto para o calor. Vale a pena destacar a baixa umidade do ar neste ponto, que atingiu 43%.

Resumindo o que pode ser encontrado pelo atleta ao longo do percurso, a seguir estão listadas as condições de conforto térmico de acordo com a etapa e o horário em que esta provavelmente é atingida, conforme os horários de largada e duração média da prova.

  • Início: leve desconforto para o frio à confortável, algo que pode ser benéfico para o competidor, já que não há grande desgaste devido às condições de tempo, fazendo com que ele atinja um bom ritmo de prova não comprometendo as demais etapas;

  • Metade: confortável com tendência a leve desconforto para o calor devido ao aumento da temperatura. O vento contribui para uma maior sensação de conforto, o que ajuda o atleta a poupar energia para a etapa final da competição;

  • Final: estresse moderado ao calor com tendência a ser forte devido às temperaturas ainda mais altas, tempo ensolarado e vento fraco. Esta condição pode ser muito prejudicial ao atleta, uma vez que ele se encontra desgastado fisicamente, além do alto nível de atividade do corpo fazer com que o desconforto para o calor seja ainda maior.

Relação condição de tempo vs. competição: As condições meteorológicas e de conforto térmico são favoráveis a um bom desempenho de prova do início à metade do percurso, porém no final o desconforto para o calor aumenta muito, o que pode limitar o competidor a aumentar seu ritmo nesta última etapa. Além disso, deve-se levar em consideração a baixa umidade do ar neste período, com valores por volta de 50% ou até menores, que pode vir a causar um maior desgaste se o atleta não se hidratar corretamente.

Um melhor desempenho nesta maratona poderia ser alcançado se o atleta aumentasse seu ritmo na metade da prova, ao invés do final, além de tomar um maior cuidado com a hidratação desde esta etapa até a chegada. Assim ele faria seu arranque quando a condição de conforto fosse mais favorável, poupando energia para fazer prova favorável.

4. Conclusões

Neste trabalho foram apresentadas descrições sinóticas, prognósticos de tempo e avaliações de conforto térmico direcionados a Maratona da Cidade do Rio de Janeiro. Os conceitos e resultados apresentados ao longo deste estudo mostram quanto à meteorologia aplicada ao esporte pode ser explorada, trazendo benefícios reais às modalidades esportivas, principalmente aquelas praticadas ao ar livre, contribuindo cada vez mais para a inovação à cerca deste tema tão relevante no país atualmente.

Ao comparar as simulações de diferentes tempos de integração com a análise sinótica do dia em questão, foi possível concluir que o WRF fornece, no geral, simulações mais representativas a partir de 36h de antecedência. Com 18h antes elas se mostraram ainda melhores, descrevendo eficientemente a situação sinótica que viria a ser encontrada. Somente as simulações da Maratona de 2011 apresentaram padrão diferente, já que simulação de 60h representou melhor a situação sinótica do que a de 18h.

A avaliação das condições meteorológicas e de conforto térmico em pontos específicos do percurso da maratona, ao longo do período no qual ela se realiza, mostrou que há diferenças significativas entre as etapas da prova. Os resultados obtidos para a Maratona de 2011 evidenciam tal afirmação, já que a competição teve início sob condição de leve desconforto para o frio e terminou com tendência à forte desconforto para o calor. Por ser uma prova longa, tanto em extensão quanto em tempo, um prognóstico detalhado como este poderia melhorar a elaboração de estratégias de competição por atletas e seus técnicos, na busca pelo melhor desempenho.

A relação entre os tempos de prova e as condições de conforto térmico é apresentada na Tabela 3, que relaciona o melhor tempo (T1) e a média dos cinco melhores tempos (T5) das provas masculinas de cada edição da maratona à Tendência do Desempenho de Prova (TDP), classificada em bom, regular ou ruim de acordo com as conclusões apresentadas nas seções 3.1.3, 3.2.3 e 3.3.3. Optou-se por mostrar o melhor tempo a fim de verificar se o ganhador da prova também sofreu influência das condições meteorológicas ou se seu desempenho era acima da média dos demais competidores.

Tabela 3
Relação entre a média dos cinco melhores tempos (T5) e o melhor tempo (T1) das edições de 2009, 2010 e 2011 da Maratona da Cidade do Rio de Janeiro com a tendência do desempenho de prova (TDP) estipulada.

Desta forma, confirma-se a hipótese de que as situações termicamente mais confortáveis contribuem para um melhor desempenho de prova, no caso particular da Maratona da Cidade do Rio de Janeiro, para os competidores como um todo. O melhor dos tempos das edições estudadas (Maratona de 2009) se deu sob uma tendência de bom desempenho de prova, uma vez que a combinação das temperaturas amenas com o céu encoberto daquele dia resultou em situações confortáveis durante todo o percurso, sem nenhum ponto crítico de maior desgaste fisiológico.

Por outro lado, a edição que se mostrou termicamente mais desconfortável dentre as três, a Maratona de 2010, está relacionada ao pior dos tempos, também confirmando a hipótese de que situações de desconforto térmico influenciam em um pior desempenho de prova, atingindo os competidores de um modo geral. A associação entre o vento intenso em direção desfavorável ao percurso e a chuva, que ocorreu em parte da manhã, favoreceu a um maior desconforto devido ao frio ao longo do percurso, resultando em uma tendência ruim, sendo seu tempo médio de prova quase 2 minutos maior do que a Maratona de 2009.

5. Agradecimentos

Os autores gostariam de agradecer ao CNPq (processo 132015/2011-0) e a CAPES/PROEX (1613/2013) pelo apoio financeiro e ao ECMWF e NCEP pela disponibilização dos dados de reanálise. Agradecimentos também ao Dr. Fábio Luís Teixeira Gonçalves, Dr. Alessandro Pezzoli, Dr. Helber Gomes e Msc. Philipp Edson Dias da Silva pelas contribuições a esse trabalho.

6. Referências Bibliográficas

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2015

Histórico

  • Recebido
    Mar 2014
  • Aceito
    Jun 2014
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