Acessibilidade / Reportar erro

Comparação dos dados de precipitação gerados Pelo gpcp vs observados para o estado do rio grande do sul

Comparison of precipitation data generated by gpcp versus recorded data for state of rio grande do sul

RESUMO

Fontes alternativas de dados de precipitação têm se tornado cada vez mais usuais, possibilitando também uma avaliação de áreas com ausência de série longa e/ou continua de dados meteorológicos ou com baixa densidade de estações meteorológicas. O objetivo deste trabalho foi avaliar o desempenho das séries de dados do Global Precipitation Climatology Project (GPCP) para o Estado do Rio Grande do Sul e verificar a sua possível utilização na ausência de dados observados de precipitação. Nesse trabalho utilizaram-se séries mensais de precipitação do GPCP fornecidas pela National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA) com uma resolução de 0,5° x 0,5° latitude-longitude, para o período de 1979 a 2010. As análises foram realizadas a partir da comparação com dados de precipitação de 22 estações meteorológicas localizadas no estado do Rio Grande do Sul. A partir dos resultados das análises estatísticas, observa-se que o GPCP apresentou um bom desempenho na região de estudo, com o coeficiente de correlação em torno de 0,81. Com isso, infere-se que os dados do GPCP podem ser utilizados como fonte alternativa de dados de precipitação, quando as séries temporais possuem períodos de falhas.

Palavras-chave:
Chuva; estações meteorológicas; dados de plataforma; fontes alternativas; Rio Grande do Sul.

ABSTRACT

Alternative sources of rainfall data have become increasingly common, being particularly useful for areas with no long and/or continuous series of meteorological data or with low density of weather stations. The aim of this study was to evaluate Global Precipitation Climatology Project (GPCP) data series performance for the Rio Grande do Sul State, south of Brazil, and verify the possibility of using them in case of lack of recorded data. In this work monthly rainfall series from GPCP, provided by National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA) with a resolution of 0.5 ° x 0.5 ° latitude-longitude for the period 1979-2010 were used. The analysis were made by comparing precipitation data from 22 meteorological stations located throughout Rio Grande do Sul State. From statistical analysis results it was observed a well GPCP performance in the study region, with a correlation coefficient of about 0.81. Therefore, it is inferred that the GPCP can be used as an alternative source of precipitation data when precipitation is not available.

Keywords:
rain; weather stations; data collection platforms; alternative sources; Rio Grande do Sul.

1. INTRODUÇÃO

O conhecimento da precipitação é fundamental para o desenvolvimento de pesquisas relacionadas com a agricultura, hidrologia, entre outras áreas. Em geral, as redes de monitoramento são muito esparsas, dificultando o desenvolvimento de aplicações que necessitam desses dados. Diversas alternativas de estimativa de precipitação vêm sendo empregadas para obter uma melhor distribuição espacial e temporal da precipitação. Atualmente, encontram-se disponíveis para a comunidade científica, vários bancos de dados com séries históricas de diversas variáveis geradas basicamente através de três métodos: interpolação de dados obtidos em estações de superfície, a técnica de reanálise e a combinação de dados de estações meteorológicas com dados de sensoriamento remoto. Porém, estes bancos de dados podem apresentar discrepâncias quando comparados entre si, principalmente para regiões do planeta onde a confiabilidade dos dados observados é questionável (Kalnay et al., 1996KALNAY, E.; KANAMITSU, M.; KISTLER, R.; COLLINS, W.; DEAVEN, D.; GANDIN, L.; IREDELL, M.; SAHA, S.; WHITE, G.; WOOLLEN, J.; ZHU, Y.; LEETMAA, A.; REYNOLDS, R. The NCEP/NCAR 40-Year Reanalysis project., Bulletin of the American Meteorological Society v. 77, p.437-471, 1996., Huffman et al., 1997HUFFMAN, G.J.; ADLER, R.F.; ARKIN, P.; CHANG, A.; FERRARO, R.; GRUBER, A.; JANOWIAK, J.; MCNAB, Z.; RUDOLF, B.; SCHNEIDER, U. The global precipitation climatology project (GPCP) combined precipitation dataset. Bulletin of the American Meteorological Society, v. 78, p.5-20, 1997., Pinto et al., 2009PINTO, L.I.C.; COSTA, M.H.; LIMA, F.Z.; DINIZ, L.M.F.; SEDIYAMA, G.C.; PRUSKI, F.F. Comparação de Produtos de Precipitação Para a América do Sul. Revista Brasileira de Meteorologia v. 24, p. 461-477, 2009.).

Na busca para superar essas dificuldades a Organização Meteorológica Mundial (OMM), em 1989 solicitou a criação do Global Precipitation Climatology Centre (GPCC) operado pelo Serviço meteorológico nacional da Alemanha, que consiste em uma análise global da precipitação mensal da superfície terrestre, com base em dados observados de estações pluviométricas (Adler et al., 2003ADLER, R.F.; HUFFMAN, G.J.; CHANG, A.; FERRARO, R.; XIE, P.; JANOWIAK, J.; RUDOLF, B.; SCHNEIDER, U.; CURTIS, S.; BOLVIN, D.; GRUBER, A.; SUSSKIND, J.; ARKIN, P.; NELKIN, E. The version-2 global precipitation climatology project (GPCP) monthly precipitation analysis (1979-present). Journal of Hydrometeorology, v.4, p. 1147-1167, 2003.).

O Global Precipitation Climatology Project (GPCP) reuniu um grupo internacional de especialistas, os quais desenvolveram um conjunto de dados de mais de 6.000 estações pluviométricas, satélites geoestacionários, e observações de radiosondagens, fornecendo uma análise completa de precipitação. O GPCP fornece séries mensais de precipitação com uma cobertura espacial de 0.5° latitude x 0.5° longitude com uma grade global de (720 x 180), 1.0° latitude x 1.0° longitude com uma grade global (360 x180), e 2.5° latitude x 2.5° longitude (144 x 72), para o período de 1901 a 2010. Fornece também Pentadas (5 dias) e séries diárias com um intervalo de tempo menor (Feidas, 2010FEIDAS, H. Validation of satellite rainfall products over Greece. Theoretical Applied Climatologyv.99, p.193-216, 2010.).

Os dados de precipitação provenientes de fontes alternativas têm, como é o caso do GPCP, cada vez melhor resolução espacial e representação física do clima, fornecendo assim dados úteis, embora tenham limitações e incertezas que devem ser averiguadas, pois não são dados observados (Bosilovich, 2013BOSILOVICH, M.G. Regional Climate and Variability of NASA MERRA and Recent Reanalyses: U.S. Summertime Precipitation and Temperature. Journal of Applied Meteorology And Climatology, v.52, p.1939-1951, 2013.). Embora os dados observados de fontes alternativas compartilhem características comuns e possam representar a dinâmica de grande escala, esses conjuntos de dados têm diferenças significativas dos dados observados (Arkin et al., 2007ARKIN, P.A.; CULLEN, H.; XIE, P. Oceanic precipitation variability and the North Atlantic Oscillation. Measuring Precipitation from Space: EURAINSAT and the Future, eds. Levizzani. Bauer and TurkSpringer. p.37-48, 2007.; Smith et al., 2008SMITH, T.M,; SAPIANO, M.R.P.; ARKIN, P.A. Historical reconstruction of monthly oceanic precipitation (1900-2006). Journal of Geophysycal Research, doi:10.1029/ 2008JD009851. 2008.).

Em diversas partes do globo existe uma carência considerável de observações meteorológicas. Com o intuito de preencher essas lacunas diversos autores vêm buscando verificar a confiabilidade de fontes alternativas de dados com os observados, para a Amazônia (Costa e Foley, 1998COSTA, M.H.; FOLEY, J.A. A comparison of precipitation datasets for the Amazon basin. Geophysical Research Letters, v. 25, p.155-158, 1998.), o Nordeste Brasileiro (Rao et al., 1996RAO, V.B.; CAVALCANTI, I.F.A.; HADA, K. Annual variations of rainfall over Brazil and water vapor characteristics over South America. Journal of Geophysical Research, v.101, p. 26539-26552, 1996.; Silva et al., 2012SILVA, C.M.S.; LÚCIO, O.S; SPYRIDES, M.H.C. Distribuição Espacial da Precipitação sobre o Rio Grande do Norte: Estimativas via Satélites e Medidas por Pluviômetros., Revista Brasileira de Meteorologia v.27, p.337 - 346, 2012.) a América do Sul (Pinto et al., 2009PINTO, L.I.C.; COSTA, M.H.; LIMA, F.Z.; DINIZ, L.M.F.; SEDIYAMA, G.C.; PRUSKI, F.F. Comparação de Produtos de Precipitação Para a América do Sul. Revista Brasileira de Meteorologia v. 24, p. 461-477, 2009.) e para o globo (Yin et al., 2004YIN, X.; GRUBER. A.; ARKIN, P. Comparison of the GPCP and CMAP Merged Gauge-Satellite Monthly Precipitation Products for the Period 1979-2001. American Meteorological Society v.5, p. 1207-1222, 2004.) e todos mostram que os dados alternativos representam bem os padrões de precipitação, embora com diferenças quantitativas em algumas regiões.

O Estado do Rio Grande do Sul, diferente de alguns Estados do Brasil, possui uma precipitação bem distribuída ao longo do ano (Reboita et. al., 2010REBOITA, M. S.; GAN, M. A.; ROCHA, R. P. D.; AMBRIZZI, T. Precipitation regimes in South America: a bibliography review., Revista Brasileira de Meteorologia 25(2), 185-204, 2010.). Mesmo com o rápido progresso científico e tecnológico, o homem ainda é extremamente dependente das condições naturais, principalmente com ênfase na variável clima (Ayoade, 2007AYOADE, J.O. Introdução à climatologia para os trópicos. São Paulo: Difel, 2007.). Por possuir uma economia principalmente voltada à agricultura, esse setor está diretamente ligado ao clima, principalmente à variabilidade espaço/temporal da precipitação, que é uma das variáveis meteorológicas mais importantes para o bom desenvolvimento das culturas agrícolas.

Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi de avaliar o desempenho do GPCP quando comparado com os dados observados, para verificar a sua possível utilização na ausência de dados de precipitação pluvial provenientes de estações meteorológicas de superfície no estado do Rio Grande do Sul.

2. MATERIAL E MÉTODOS

2.1 Área de Estudo

O estado do Rio Grande do Sul situa-se no extremo meridional do Brasil, entre as latitudes de 27° e 34° Sul (S) e as longitudes 50° e 57° Oeste (W). O clima predominante é subtropical, sendo que na região do planalto superior o clima é subtropical de altitude. Foram utilizados dados mensais de precipitação de 22 estações meteorológicas de superfície (Figura 1) pertencentes ao Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) e à Fundação Estadual de pesquisa Agropecuária (FEPAGRO), para o período de 1979 a 2010. A escolha das estações deu-se pela maior disponibilidade de dados meteorológicos nessas localidades.

Figura 1:
Mapa de Localização das Estações Meteorológicas de Superfície

2.2 Dados

Nesse trabalho utilizaram-se séries mensais de precipitação do GPCP, obtidas através do site da NOAA (National Oceanic and Atmospheric Administration) com uma resolução de 0,5° x 0,5° latitude-longitude, para o período de 1979 a 2010. O GPCP baseia-se no procedimento de análise que mistura várias estimativas para produzir campos de precipitação global. Assim, a análise da grade é baseada em medidas de observações convencionais e satélite para calibrar o banco de dados. Para se gerar estas séries de dados são combinadas estimativas indiretas da precipitação através dos sensores VIS/IR (visível/infravermelho) e também microondas dos satélites geoestacionários calibrados com dados de mais de 6.000 estações (Gruber e Levizzani, 2008GRUBER, A.; V. LEVIZZANI. Assessment of Global Precipitation Products. A project of the World Climate Research ProgrammeGlobal Energy and Water Cycle Experiment (GEWEX) Radiation Panel. WCRP Report, 2008.). Nos meses onde ocorreram falhas no registro da precipitação observada na estação meteorológica, foram também retirados dados da série do GPCP. Do total de 384 meses analisados, a estação de Caxias do Sul foi a que apresentou o maior número de falhas em torno de 6,25%.

As informações são fornecidas em pontos de grade, e foi utilizado o software GRADS (Grid Analysis and Display System), para a extração dos valores mensais de precipitação utilizando-se a informação na grade onde estava localizada cada estação meteorológica utilizada nesta pesquisa. O Grads é um sistema de visualização e análise de dados em pontos de grade, trabalha com matrizes de dados binários, nas quais as variáveis podem possuir até quatro dimensões (longitude, latitude, níveis verticais e tempo) (Souza, 2004SOUZA, E. B. GrADS - Grid Analysis and Display System Fundamentos e rogramação Básica. Universidade Federal do Pará. 2004. Disponível <Disponível http://www.dca.iag.usp.br/www/material/ritaynoue/aca0522/referencias/apostilagrads.pdf >. Acesso em 13 de mar. de 2015.
http://www.dca.iag.usp.br/www/material/r...
).

2.3 Validação da Metodologia

As estatísticas utilizadas para comparar a precipitação observada com a precipitação estimada através do GPCP, foram: o coeficiente de correlação (r) (Equação 1), que representa uma medida numérica do grau de concordância (similaridade) entre duas ou mais variáveis; o Viés (Equação 4) que indica uma possível tendência dos dados alternativos superestimarem ou subestimarem os dados observados de precipitação; o coeficiente de eficiência (EFF) (Equação 5) que avalia a precisão dos dados alternativos, podendo variar de negativo até 1, sendo 1 o ajuste perfeito. Para este coeficiente a metodologia é considerada aceitável se o valor ficar entre 0,36 e 0,75 e bom se o valor ficar acima de 0,75 (Collischonn, 2001COLLISCHONN, W. Simulação hidrológica de grandes bacias. Tese de Doutorado. IPH - UFRGS. 2001.). Também foi avaliado o coeficiente de determinação (R²) (Equação 6) que mede o grau de associação entre os valores observados e calculados, realizado através da média sazonal dos valores de precipitação. Foi utilizado também o índice de concordância proposto por Willmott et al. (1985WILLMOTT, C.J.; ACKLESON, S.G.; DAVIS, R.E.; FEDDEMA, J.J.; KLINK, K.M.; LEGATES, D.R.; O'DONNELL, J.; ROWE, C.M. Statistics for the evaluation and comparison of models., Journal of Geophysical Research v.90, n.C5, p.8995-9005, 1985.) (Equação 7), que mede o grau em que os dados do GPCP se aproximam dos dados observados. Este índice varia de zero a um, sendo zero, nenhuma concordância e um, concordância perfeita (Santos et al., 2011SANTOS, R. S., COSTA, L. C., SEDIYAMA, G. C. LEAL, B. G., OLIVEIRA, R. A., JUSTINO, F. B. Avaliação da relação seca/produtividade agrícola em cenário de mudanças climáticas., Revista Brasileira de Meteorologia v. 26, n. 2, 313 -323, 2011. ). A seguir são apresentadas as equações utilizadas:

(1)

(2)

(3)

(4)

(5)

(6)

(7)

onde: YOBS é o valor dos dados observados do período i; YGPCP o valor dos dados do GPCP para o período i; são os desvios padrão dos dados do GPCP e dos dados observados; é o valor médio dos dados do GPCP; o valor médio dos dados observados e n o número total de dados.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

As Tabelas 1 e 2 estão divididas em regiões ecoclimáticas conforme a classificação de Maluf e Caiaffo (2001MALUF, J.R.T.; CAIAFO, M.R.R. Regiões ecoclimáticas do Estado do Rio Grande do Sul. In: XII Congresso Brasileiro de Agrometeorologia, III Reunião Latino-Americana de Agrometeorologia. Fortaleza. Água e agrometeorologia no novo milênio. p.151-152. 2001.). O estado do Rio Grande do Sul é divido em 11 regiões ecoclimáticas, representando sucessivamente: 1- Depressão Central; 2-Litoral; 3- Serra do Nordeste; 4- Planalto Médio; 5- Encosta Inferior da Serra do Nordeste; 6-Alto e Médio Vale do Uruguai; 7- Missioneira; 8-Baixo Vale do Uruguai; 9-Campanha; 10 - Serra do Sudeste e 11 - Região das Grandes Lagoas.

Avaliando o Viés (Tabela 1), observa-se que em geral o GPCP superestima os dados observados, concordando com o trabalho desenvolvido por Allan (2011ALLAN, R. Regime dependent changes in global precipitation. Climate Dynamics, v.39, p. 827-840, 2011.) que realizou uma comparação do produto do GPCP com aqueles desenvolvidos pelo ERA-interim. Também Gebremichael et al. (2005GEBREMICHAEL, M.; KRAJEWSKI, W.; MORRISSEY, M.; HUFFMAN, G.; ADLER, R. A Detailed Evaluation of GPCP 1° Daily Rainfall Estimates over the Mississippi River Basin. Journal of Applied Meteorology, v. 44. P.665-681, 2005.) observaram uma superestimativa do Viés para a bacia do rio Mississipi. Segundo Pinto et al. (2009PINTO, L.I.C.; COSTA, M.H.; LIMA, F.Z.; DINIZ, L.M.F.; SEDIYAMA, G.C.; PRUSKI, F.F. Comparação de Produtos de Precipitação Para a América do Sul. Revista Brasileira de Meteorologia v. 24, p. 461-477, 2009.), a superestimativa pode estar associada à metodologia de estimativa do satélite que utiliza informações da região espectral IR (infrared). A região de estudo é uma zona extra-tropical que é frequentemente afetada por fenômenos atmosféricos como Sistemas Convectivos de mesoescala e frentes frias, que produzem grande convecção, o que gera também a formação de nuvens do tipo cirrus, fazendo com que as informações do satélite superem as observadas nas estações meteorológicas. Nos municípios de Maquiné, São Luiz Gonzaga e Cruz Alta, observou-se uma subestimativa em praticamente todos os meses do ano o que está de acordo com Rui e Yunfei (2005RUI, L.; YUNFEI, F. Tropical Precipitation Estimated by GPCP and TRMM PR Observation. Advances in Atmospheric Sciences, v. 22, p.852-864, 2005.), que encontraram o mesmo resultado para locais onde a densidade de estações meteorológicas é baixa. Nesses locais em estudo também há uma densidade baixa de estações meteorológicas. Embora o regime de precipitação para o estado seja bem distribuído ao longo do ano, a atuação de diferentes sistemas atmosféricos e da variabilidade do relevo contribui para que o Rio Grande do Sul apresente diferenças na distribuição espaço/temporal da precipitação (Reboita et al., 2010REBOITA, M. S.; GAN, M. A.; ROCHA, R. P. D.; AMBRIZZI, T. Precipitation regimes in South America: a bibliography review., Revista Brasileira de Meteorologia 25(2), 185-204, 2010.), o que justifica a diferença de valores entre municípios próximos como Cruz Alta e Passo Fundo (Tabela 1). Neste caso a topografia pode indicar a diferença de superestimativa e subestimativa dos valores encontrados. Dos diversos sistemas meteorológicos que estão associados a precipitação, a atuação de sistemas de circulação local, como as brisas podem contribuir para o microclima encontrado em Maquiné, que juntamente com a topografia indicam a diferença nos demais resultados encontrados.

Com relação ao índice de Willmott todos os municípios analisados apresentaram uma boa concordância entre os dados de precipitação do GPCP e os dados observados nas estações meteorológicas, com valores superiores a 0,99 conforme pode ser observado na Tabela 1.

Tabela 1:
Valores das estatísticas calculadas: Viés, índice de concordância de Willmott e o percentual de falhas dos dados observados*

Analisando os resultados anuais (Tabela 2) verifica-se que o GPCP mostrou forte correlação com os dados observados acima de 0,90 em mais de 55% das estações e, em 95% dos dados apresentou correlação superior a 0,80. O município de Maquiné foi o único a apresentar um coeficiente de Correlação inferior a 0,80. Esses valores foram, em geral, superiores aos valores encontrados por Pfeifroth et al. (2013PFEIFROTH, U.; MUELLER, R.; AHRENS, B. Evaluation of Satellite-Based and Reanalysis Precipitation Data in the Tropical Pacific., Journal of Applied Meteorology And Climatology v. 52. P. 634-644, 2013.), que obtiveram coeficientes de correlação da ordem de 0,77 para a região do Pacifico Tropical. Baba et al. (2014BABA, R.K.; VAZ, M.S.M.G.; COSTA, J. Correção de dados agrometeorológicos utilizando métodos estatísticos. Revista Brasileira de Meteorologia [online]. 2014, vol.29, n.4, pp. 515-526. ISSN 0102-7786.), utilizando técnicas estatísticas e geoestatísticas, na identificação de dados inconsistentes e na estimativa de dados a serem corrigidos ou preenchidos, consideraram que as estações com grau de correlação igual ou superior a 0,85, tinham uma forte correlação. Portanto, pode-se concluir que houve uma forte correlação entre os dados do GPCP e os dados observados nesse trabalho. A avaliação do coeficiente de eficiência anual mostrou que o GPCP pode ser utilizado com uma boa confiabilidade apresentando valores acima de 0,75 em 68% das estações analisadas e, coeficientes acima de 0,60 no restante das estações, com exceção de Maquiné, no qual o coeficiente de eficiência foi de 0,42, segundo Collischonn (2001COLLISCHONN, W. Simulação hidrológica de grandes bacias. Tese de Doutorado. IPH - UFRGS. 2001.) os resultados acima de 0,75 são considerados bons e, valores entre 0,36 e 0,75 são considerados aceitáveis.

A confiabilidade do GPCP também se demonstrou alta no trabalho desenvolvido por Feidas (2010FEIDAS, H. Validation of satellite rainfall products over Greece. Theoretical Applied Climatologyv.99, p.193-216, 2010.), com valores de eficiência superiores a 0,6 para a Grécia. Uma possível justificativa para o valor encontrado para a cidade de Maquiné seja a localização em que a mesma se encontra. A estação está localizada em um próximo do mar, mas rodeada por morros, com isso apresenta um microclima diferenciado, que possivelmente não seja captado pela grade do GPCP.

Observou-se na análise sazonal da performance do GPCP através do r e EFF, que no período de verão o GPCP apresentou um desempenho menor comparado com as outras estações do ano, devido principalmente a formação de sistemas convectivos isolados, concordando com os resultados de Camparotto et al. (2013CAMPAROTTO, L. B.; BLAIN, G. C.; GIAROLLA, A.; ADAMI, M.; CAMARGO, M. B. de. Validação de dados termopluviométricos obtidos via sensoriamento remoto para o estado de são paulo. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, v. 17, n. 6, p. 665-671, 2013.), que analisaram a precipitação estimada por sensores remotos. O melhor desempenho foi observado no período de inverno e na primavera. Observando que todos os municípios estão dentro dos limites aceitáveis exceto Maquiné no período de verão, devido ao seu microclima, causado principalmente pelo relevo no entorno da estação. Quadro et al. (2012QUADRO, M. F. L. ; SILVA DIAS, M. A. F. ; HERDIES, D. L. ; GONCALVES, L. G. G. Análise Climatológica da Precipitação e do Transporte de Umidade na Região da ZCAS Através da Nova Geração de Reanálises. Revista Brasileira de Meteorologia (Impresso), v. 27, p. 152-162, 2012.), ao analisar cinco conjuntos de produtos observados de precipitação para a região das ZCAS, encontraram valores de correlação variando entre 0,6 e 0,9 para os meses de verão, os conjuntos também mostraram similaridade em representar o ciclo anual da região das ZCAS, sendo que as maiores diferenças ocorreram nos meses de verão: janeiro e fevereiro.

Tabela 2:
Avaliação sazonal e anual do coeficiente de correlação (r) e do coeficiente de eficiência (EFF) do GPCP em relação aos dados obervados.

O coeficiente de determinação foi analisado espacialmente (Figura 2), para investigar se existe uma variação sazonal nos dados do GPCP. Os coeficientes foram altos, com valores médios em torno de 0,8, nos meses de outono, inverno e primavera.

Figura 2:
Espacialização do coeficiente de determinação: (a) verão; (b) primavera; (c) Outono; (d) inverno

O verão foi o que apresentou o menor coeficiente de determinação, possivelmente isso se deve porque nesta estação do ano os sistemas convectivos ocorrem mais isoladamente, sendo de difícil previsão, concordando com o trabalho desenvolvido por Feidas (2010FEIDAS, H. Validation of satellite rainfall products over Greece. Theoretical Applied Climatologyv.99, p.193-216, 2010.). O autor validou dados de precipitação para a península da Grécia e verificou que os erros foram maiores nos período quentes e secos, salientando que essa região da Grécia apresenta um clima mediterrânico com invernos amenos e úmidos e verões quentes e secos. Em geral o GPCP subestima a precipitação durante o período chuvoso, superestimando no período seco. Os resultados concordaram com o trabalho de Higgins et al. (2010HIGGINS, R. W.; KOUSKY, V. E.; SILVA, V. B. S.; BECKER, E.; XIE, P. Intercomparison of Daily Precipitation Statistics over the United States in Observations and in NCEP Reanalysis Products. Journal of climate, v.23, p. 4637-4650, 2010.), os quais observaram que as correlações entre os dados de reanálises e os dados observados geralmente são maiores durante o outono e inverno, e menores durante a primavera e o verão, ou seja, durante as estações mais quentes, quando os processos convectivos são mais importantes, as correlações são geralmente mais fracas. Posteriormente, Silva et al. (2011SILVA, V.B.S; KOUSKY, V.E.; HIGGINS, R.W. Daily Precipitation Statistics for South America: An Intercomparison between NCEP Reanalyses and Observations, Journal of Hydrometeorology v. 12, p. 101-117, 2011) avaliaram a precipitação para América do Sul a partir dos dados do CFSR (Climate Forecast System Reanalysis) e observaram melhorias notáveis nos padrões de precipitação em grande escala, em comparação com as reanálises anteriores. Os resultados indicaram que para a região sul do Brasil os dados continuaram apontando correlações maiores no meses de inverno e outono.

4. CONCLUSÕES

Os resultados da análise para o estado do Rio Grande do Sul indicaram que os dados do GPCP apresentaram um bom desempenho em relação aos dados observados, com coeficientes de correlação médios em torno de 0,90 e coeficiente de eficiência médio em torno de 0,81. Na análise sazonal, inferiu-se que os erros foram maiores nos meses mais quentes, mas mesmo assim apresentando coeficientes médios em torno de 0,70. Portanto conclui-se que os dados do GPCP podem ser utilizados como fonte alternativa de dados de precipitação em locais com ausência de estações ou séries longas de dados meteorológicos.

5. AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à FINEP pelo auxilio financeiro (conv. 0112.0113) e ao CNPq pela concessão de bolsas ao 1°, 3°,4°, 5° e 6° autores.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • ADLER, R.F.; HUFFMAN, G.J.; CHANG, A.; FERRARO, R.; XIE, P.; JANOWIAK, J.; RUDOLF, B.; SCHNEIDER, U.; CURTIS, S.; BOLVIN, D.; GRUBER, A.; SUSSKIND, J.; ARKIN, P.; NELKIN, E. The version-2 global precipitation climatology project (GPCP) monthly precipitation analysis (1979-present). Journal of Hydrometeorology, v.4, p. 1147-1167, 2003.
  • ALLAN, R. Regime dependent changes in global precipitation. Climate Dynamics, v.39, p. 827-840, 2011.
  • ARKIN, P.A.; CULLEN, H.; XIE, P. Oceanic precipitation variability and the North Atlantic Oscillation. Measuring Precipitation from Space: EURAINSAT and the Future, eds. Levizzani. Bauer and TurkSpringer. p.37-48, 2007.
  • AYOADE, J.O. Introdução à climatologia para os trópicos. São Paulo: Difel, 2007.
  • BABA, R.K.; VAZ, M.S.M.G.; COSTA, J. Correção de dados agrometeorológicos utilizando métodos estatísticos. Revista Brasileira de Meteorologia [online]. 2014, vol.29, n.4, pp. 515-526. ISSN 0102-7786.
  • BOSILOVICH, M.G. Regional Climate and Variability of NASA MERRA and Recent Reanalyses: U.S. Summertime Precipitation and Temperature. Journal of Applied Meteorology And Climatology, v.52, p.1939-1951, 2013.
  • CAMPAROTTO, L. B.; BLAIN, G. C.; GIAROLLA, A.; ADAMI, M.; CAMARGO, M. B. de. Validação de dados termopluviométricos obtidos via sensoriamento remoto para o estado de são paulo. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, v. 17, n. 6, p. 665-671, 2013.
  • COLLISCHONN, W. Simulação hidrológica de grandes bacias. Tese de Doutorado. IPH - UFRGS. 2001.
  • COSTA, M.H.; FOLEY, J.A. A comparison of precipitation datasets for the Amazon basin. Geophysical Research Letters, v. 25, p.155-158, 1998.
  • FEIDAS, H. Validation of satellite rainfall products over Greece. Theoretical Applied Climatologyv.99, p.193-216, 2010.
  • GEBREMICHAEL, M.; KRAJEWSKI, W.; MORRISSEY, M.; HUFFMAN, G.; ADLER, R. A Detailed Evaluation of GPCP 1° Daily Rainfall Estimates over the Mississippi River Basin. Journal of Applied Meteorology, v. 44. P.665-681, 2005.
  • GRUBER, A.; V. LEVIZZANI. Assessment of Global Precipitation Products. A project of the World Climate Research ProgrammeGlobal Energy and Water Cycle Experiment (GEWEX) Radiation Panel. WCRP Report, 2008.
  • HIGGINS, R. W.; KOUSKY, V. E.; SILVA, V. B. S.; BECKER, E.; XIE, P. Intercomparison of Daily Precipitation Statistics over the United States in Observations and in NCEP Reanalysis Products. Journal of climate, v.23, p. 4637-4650, 2010.
  • HUFFMAN, G.J.; ADLER, R.F.; ARKIN, P.; CHANG, A.; FERRARO, R.; GRUBER, A.; JANOWIAK, J.; MCNAB, Z.; RUDOLF, B.; SCHNEIDER, U. The global precipitation climatology project (GPCP) combined precipitation dataset. Bulletin of the American Meteorological Society, v. 78, p.5-20, 1997.
  • KALNAY, E.; KANAMITSU, M.; KISTLER, R.; COLLINS, W.; DEAVEN, D.; GANDIN, L.; IREDELL, M.; SAHA, S.; WHITE, G.; WOOLLEN, J.; ZHU, Y.; LEETMAA, A.; REYNOLDS, R. The NCEP/NCAR 40-Year Reanalysis project., Bulletin of the American Meteorological Society v. 77, p.437-471, 1996.
  • MALUF, J.R.T.; CAIAFO, M.R.R. Regiões ecoclimáticas do Estado do Rio Grande do Sul. In: XII Congresso Brasileiro de Agrometeorologia, III Reunião Latino-Americana de Agrometeorologia. Fortaleza. Água e agrometeorologia no novo milênio. p.151-152. 2001.
  • PFEIFROTH, U.; MUELLER, R.; AHRENS, B. Evaluation of Satellite-Based and Reanalysis Precipitation Data in the Tropical Pacific., Journal of Applied Meteorology And Climatology v. 52. P. 634-644, 2013.
  • PINTO, L.I.C.; COSTA, M.H.; LIMA, F.Z.; DINIZ, L.M.F.; SEDIYAMA, G.C.; PRUSKI, F.F. Comparação de Produtos de Precipitação Para a América do Sul. Revista Brasileira de Meteorologia v. 24, p. 461-477, 2009.
  • QUADRO, M. F. L. ; SILVA DIAS, M. A. F. ; HERDIES, D. L. ; GONCALVES, L. G. G. Análise Climatológica da Precipitação e do Transporte de Umidade na Região da ZCAS Através da Nova Geração de Reanálises. Revista Brasileira de Meteorologia (Impresso), v. 27, p. 152-162, 2012.
  • RAO, V.B.; CAVALCANTI, I.F.A.; HADA, K. Annual variations of rainfall over Brazil and water vapor characteristics over South America. Journal of Geophysical Research, v.101, p. 26539-26552, 1996.
  • REBOITA, M. S.; GAN, M. A.; ROCHA, R. P. D.; AMBRIZZI, T. Precipitation regimes in South America: a bibliography review., Revista Brasileira de Meteorologia 25(2), 185-204, 2010.
  • RUI, L.; YUNFEI, F. Tropical Precipitation Estimated by GPCP and TRMM PR Observation. Advances in Atmospheric Sciences, v. 22, p.852-864, 2005.
  • SANTOS, R. S., COSTA, L. C., SEDIYAMA, G. C. LEAL, B. G., OLIVEIRA, R. A., JUSTINO, F. B. Avaliação da relação seca/produtividade agrícola em cenário de mudanças climáticas., Revista Brasileira de Meteorologia v. 26, n. 2, 313 -323, 2011.
  • SILVA, V.B.S; KOUSKY, V.E.; HIGGINS, R.W. Daily Precipitation Statistics for South America: An Intercomparison between NCEP Reanalyses and Observations, Journal of Hydrometeorology v. 12, p. 101-117, 2011
  • SILVA, C.M.S.; LÚCIO, O.S; SPYRIDES, M.H.C. Distribuição Espacial da Precipitação sobre o Rio Grande do Norte: Estimativas via Satélites e Medidas por Pluviômetros., Revista Brasileira de Meteorologia v.27, p.337 - 346, 2012.
  • SMITH, T.M,; SAPIANO, M.R.P.; ARKIN, P.A. Historical reconstruction of monthly oceanic precipitation (1900-2006). Journal of Geophysycal Research, doi:10.1029/ 2008JD009851. 2008.
  • SOUZA, E. B. GrADS - Grid Analysis and Display System Fundamentos e rogramação Básica. Universidade Federal do Pará. 2004. Disponível <Disponível http://www.dca.iag.usp.br/www/material/ritaynoue/aca0522/referencias/apostilagrads.pdf >. Acesso em 13 de mar. de 2015.
    » http://www.dca.iag.usp.br/www/material/ritaynoue/aca0522/referencias/apostilagrads.pdf
  • YIN, X.; GRUBER. A.; ARKIN, P. Comparison of the GPCP and CMAP Merged Gauge-Satellite Monthly Precipitation Products for the Period 1979-2001. American Meteorological Society v.5, p. 1207-1222, 2004.
  • WILLMOTT, C.J.; ACKLESON, S.G.; DAVIS, R.E.; FEDDEMA, J.J.; KLINK, K.M.; LEGATES, D.R.; O'DONNELL, J.; ROWE, C.M. Statistics for the evaluation and comparison of models., Journal of Geophysical Research v.90, n.C5, p.8995-9005, 1985.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    08 Out 2014
  • Aceito
    21 Abr 2015
Sociedade Brasileira de Meteorologia Rua. Do México - Centro - Rio de Janeiro - RJ - Brasil, +55(83)981340757 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: sbmet@sbmet.org.br