1. Introdução
Monóxido de Carbono (CO) é um gás traço muito importante na química da atmosfera, pois atua como sumidouro do radical hidroxila (OH), o que influencia diretamente as atividades oxidantes da atmosfera, e é o principal precursor do dióxido de carbono (CO2). A redução das concentrações de OH na atmosfera, por sua vez, afeta o tempo de residência de outros gases, principalmente o metano (CH4) e dióxido de enxofre (SO2) (Liou, 2002). Além disso, o CO é o maior precursor do ozônio troposférico, poluente presente nas camadas mais baixas da atmosfera, e é usado como indicador de atividades humanas uma vez que sua origem é principalmente a queima incompleta de carbono, devido à mudança de uso da terra como a substituição de florestas e savanas por agricultura e pastagem (Wotawa et al., 2001; Langenfelds et al., 2002; Novelli et al., 2003; D'Amelio, 2006; Edwards et al., 2006a; Duncan e Logan, 2008; McMillan et al., 2008; Yurganov et al., 2008; Rajab et al., 2011; Liu et al., 2013). Por possuir um tempo de residência na atmosfera relativamente curto o CO é frequentemente usado para estudar processos de transporte de gases (Liou, 2002; Susskind et al., 2003; McMillan et al., 2005; Edwards et al., 2006a; Wallace e Hobbs, 2006; Yurganov et al., 2008; Rajab et al., 2011; Andreae et al., 2012; Thonat et al., 2012).
Importantes instrumentos que auxiliam na inferência da concentração de gases traços e gases de efeito estufa (GEE) presentes na atmosfera são os sondadores a bordo de satélites. A plataforma AQUA, lançada em 2002 pela NASA (do inglês, National Aeronautics and Space Administration), possui cobertura global diária e varredura horizontal de 1650 km de largura, e conta com sensores em microondas que operam em conjunto com o sensor AIRS (do inglês, Atmospheric Infrared Sounder), os quais auxiliam no processo de inferência de perfis atmosféricos mesmo em condições de nebulosidade parcial. Com isso, é possível criar um mosaico de CO em menos tempo do que àqueles criados a partir de outros sensores lançados anteriormente e ainda estudar fenômenos de escala diária. O sensor AIRS, utilizado neste trabalho foi o primeiro sondador avançado de radiação infravermelha (Parkinson, 2003), com seus 2378 canais espectrais cobrindo a banda espectral do infravermelho (IV), de 3,7 a 15,4μm, e representou o avanço mais importante na tecnologia de sensoriamento remoto por satélites ambientais (Aumann e Pagano, 1994; Aumann e Miller, 1995; Morse et al., 1999; Fishbein et al., 2003). Os diversos canais espectrais fornecem dados de vários parâmetros atmosféricos, bem como perfis de vapor d'água, nuvens, poeira e gases-traço como CO2, CO, SO2, O3 e CH4, fornecendo observações globais (Aumann e Miller, 1995; Rodgers, 1998; Morse et al., 1999; Chahine e Fetzer, 2000; Fishbein et al., 2003; Susskind et al., 2003).
Em seu estudo, McMillan et al. (2005) mostraram a possibilidade de utilizar o sensor AIRS para estimar a concentração de CO na média troposfera e monitorar possíveis variabilidades diárias e transporte da concentração deste gás. Em seus resultados, comparações preliminares com perfis de aeronaves in situ indicaram que as estimativas de CO do AIRS estavam próximas da meta de precisão de 15% estabelecida por meio de simulações de pré-lançamento.
De fato, trabalhos posteriores (McMillan et al., 2007; Yurganov et al., 2008; Rajab et al., 2011; Liu et al., 2013) demonstram a utilidade das observações de CO por satélite na troposfera para estudos de qualidade do ar e uso da terra, uma vez que as principais fontes de CO para a atmosfera são a combustão incompleta do carbono pela queima de combustíveis fósseis e a substituição de florestas e savanas por agricultura e pastagem. Esta última é a principal causa das emissões brasileiras (Hooghiemstra et al., 2012). O transporte de CO e seu alto grau de dependência sazonal, muitas vezes associado a eventos de queima de biomassa, bem como a fenômenos que ocorrem na escala interanual ilustram a necessidade de monitoramento contínuo, uma vez que, as observações mensais e sazonais climatológicas suavizam os casos de máxima ou mínima emissão em qualquer época do ano. Ainda, a correspondência da variabilidade interanual de CO com os eventos El Niño-Oscilação Sul (ENOS), como demonstrada em diversos estudos (Edwards et al., 2006b; McMillan et al., 2007; Hooghiemstra et al., 2012; Thonat et al., 2012), fornece um exemplo do impacto da variabilidade do clima nos níveis de poluição. Outros fatores como, por exemplo, a pressão de preços internacionais de commodities e o desenvolvimento de culturas mais produtivas, podem também influenciar o número de focos de incêndio e desempenhar alguma influência na variabilidade do CO. Relações entre os mercados agrícolas internacionais e o destino da floresta Amazônica estão documentadas em trabalhos anteriores (Fearnside, 2005; Malhi et al., 2008). No entanto, para análises de curtos períodos é difícil isolar o impacto direto da atividade artificial das alterações climáticas. Assim, essas análises estão fora do escopo desse trabalho.
Neste contexto, esse estudo busca as possíveis relações entre a concentração/variabilidade desse gás, alterações climáticas e focos de queimadas, considerando o período de 10 anos de dados remotos de CO sobre a América do Sul. Além do interesse científico, deve-se ressaltar que o melhor conhecimento das emissões de gases é fundamental para adoção de políticas públicas que reduzam queimadas e desmatamentos, sendo esta última a maior fonte de emissões brasileiras.
2. Dados e Metodologia
Foram utilizadas as estimativas das concentrações médias semanais do conteúdo de CO integrado verticalmente entre superfície e topo da atmosfera a partir do sistema de sondagem AQUA (versão 5). Os dados encontram-se no formato HDF (Hierarchical Data Format) com resolução espacial de 1° em latitude e longitude. A área de estudo compreende uma ampla região da América do Sul limitada em 5º N, 35º S, 35º W e 75º W. Os dados representam uma média a cada 8 dias das estimativas de CO e a série de dados compreendeu o período de 2003 a 2012. Estes dados foram obtidos no portal da NASA. Foi utilizado ainda, o número mensal de focos de queimadas detectados pelos satélites NOAA, TERRA/AQUA e GOES para a região da América do Sul, disponível no portal eletrônico de Monitoramento de Queimadas e Incêndios do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). O período corresponde aos 10 anos estudados nessa pesquisa. Também foi usada a versão 6 da reanálise mensal de precipitação do GPCC (Global Precipitation Climatology Centre), com resolução espacial de 1° em latitude e longitude, para o período entre 1901 e 2010 (Schneider et al., 2008). Os dados foram extraídos sobre a América do Sul, situada entre 10° N-45° S e 85° W-25° W, para o período de 2003 a 2010.
Os comportamentos médios anual e sazonal do CO foram analisados considerando a distribuição latitudinal da concentração de CO sobre a área de estudo obtida pela média zonal deste parâmetro nesta área em função do tempo. Além disso, foram construídas séries de anomalia semanais de CO, contendo as médias espaciais das anomalias da concentração de CO integrada verticalmente na faixa latitudinal sobre a América do Sul, entre 20° S a 5° S e entre as longitudes de 35° W a 75° W, considerando as médias semanais do período de 2003-2012. Da mesma maneira, anomalias de CO semanais normalizadas pelo desvio padrão foram obtidas em cada ponto de grade. Para o cálculo de anomalias para o conjunto de dados de focos de queima e precipitação, o ciclo anual foi determinado pelo cálculo das médias mensais.
Para estudar a variabilidade espaço-temporal do CO sobre a América do Sul as séries da concentração de CO em cada ponto de grade foram filtradas para as escalas semianual (3 a 7 meses) e interanual (1 a 4 anos), utilizando-se a transformada de ondeleta como filtro passa-banda conforme formulação definida por Torrence e Compo (1998). A escolha destas escalas de variabilidade decorre do fato que as altas emissões de CO pelas queimadas apresentam um ciclo semianual bem característico. Por outro lado, a variabilidade climática dominante na região tropical ocorre em escalas de tempo interanual, associada ao ENOS.
Em seguida, foi empregada a técnica de análise das Funções Ortogonais Empíricas (EOF, do inglês Empirical Orthogonal Function) nas séries de anomalia de concentração de CO filtradas nas escalas semianual e interanual, com o propósito de encontrar os padrões dominantes em cada escala de variabilidade. Análises de EOF foram feitas separadamente para cada escala de variabilidade. Os cálculos de EOF foram baseados na matriz correlação. Os autovetores correspondentes às análises de EOF são apresentados como padrões de correlações. Para as discussões de EOF, assume-se que para amplitudes positivas dos modos, o sinal das correlações corresponde ao sinal das anomalias. Detalhamentos da técnica de EOF podem ser encontrados em Kutzback (1976).
Para obter a relação desses padrões com a variabilidade de focos de queima e precipitação, o mesmo procedimento de filtragem de dados foi realizado para essas séries. Análises qualitativas foram realizadas das relações entre as variações de focos de queima, precipitação e de CO. Campos espaciais das anomalias de CO e precipitação para dois anos contrastantes, selecionados a partir das séries de componentes principais obtidas nas análises de EOF, também são apresentados.
3. Resultados e Discussão
3.1. Variação sazonal
A Fig. 1 mostra a variação temporal da concentração de CO integrado na atmosfera em função da latitude. Observa-se um ciclo sazonal bem definido, o que concorda com os resultados mostrados em trabalhos anteriores (Connors et al., 1999; Langenfelds et al., 2002; Edwards et al., 2006a e 2006b; Andreae et al., 2012; Hooghiemstra et al., 2012). Máximos valores de emissão de CO entre as latitudes de 5° S e 20° S refletem as altas emissões provenientes da queima nas florestas da Amazônia e do cerrado durante o período de setembro e outubro. Os picos menores, nas latitudes entre 5° S e 5° N, a partir de janeiro a março de cada ano são resultados dos incêndios que ocorrem nas regiões da Venezuela e Colômbia e da queima de biomassa no oeste da África (Edwards et al., 2006a). Nota-se ainda, uma variação interanual dos valores de máxima concentração de CO, de modo que os maiores valores são observados nos anos de 2004, 2005, 2007 e 2010, e os menores valores, nos anos de 2003, 2008, 2009 e 2011 ocorrem entre as latitudes de 5° S e 20° S (Fig. 1). Anomalias positivas (negativas) mais acentuadas nos anos de 2005, 2007 e 2010 (2009 e 2011) coincidem com os anos em que ocorreram máximos valores positivos (negativos) de anomalias de foco de queimadas como mostrado na Fig. 2. Nessa figura pode-se observar qualitativamente uma concordância entre as anomalias de CO e focos de queimada. Embora seja possível detectar focos de queimada através de observações de satélite, cautela deve ser tomada quando usamos o número de focos para inferir emissões. Em adição, os valores de CO sobre a América do Sul, podem representar uma combinação da emissão local e àquela transportada de outras regiões (Edwards et al., 2006a).

Figura 2 Séries de anomalias de concentração de CO (linha pontilhada) e anomalias de focos de queimadas (linha contínua) sobre a América do Sul.
Por outro lado, estudos anteriores mostram que a variabilidade climática pode explicar variações interanuais na concentração de CO na atmosfera. A Fig. 3 mostra a relação entre a série de precipitação média sobre a região da América do Sul, entre as latitudes de 5° S a 20° S e a série de concentração de CO sobre essa região. Particularmente, sobre os períodos de máximos valores positivos (negativos) de anomalias de CO, como por exemplo, os anos de 2005, 2007 e 2010 (2008, 2009) ocorrem máximos valores negativos (positivos) de precipitação. De acordo com Torres et al. (2010), o grande número (baixa incidência) de focos de queima em 2007 (2009) foi propiciado pelo déficit (excesso) de precipitação em torno de 30% (34%), que afetou a América do Sul.
3.2. Variabilidades semianual e interanual
Os primeiros dois modos de variabilidade de CO na escala de tempo semianual, apresentados nas Figs.4a e 5a, explicam 49,9% e 11% da variabilidade total de CO contida nesta escala, respectivamente. O primeiro modo é dominado por variações que ocorrem sobre toda a área de estudo, com máximo na região central desta área com valor de correlação acima de 0,8. Uma vez que o quadrado das correlações equivale à variância explicada localmente, este modo explica aproximadamente 64% da variância nessa região. A primeira componente principal (CP01, Fig. 4c) exibe uma oscilação semianual com valores positivos (negativos) ocorrendo nos meses de março a maio (setembro a outubro), com os máximos negativos nos anos de 2005, 2007 e 2010. Para o período de setembro a outubro (estação seca), o padrão de variabilidade mostra um aumento do total de concentração de CO. O segundo modo (Fig. 5a) é caracterizado por um padrão dipolar com máximas correlações positivas (negativas) na região norte da América do Sul, sobre as regiões das Guianas e Suriname (estados de Mato Grosso do Sul, São Paulo e Paraná). A CP02 (Fig. 5b) apresenta variações na escala de 3 a 6 meses com picos nos anos de 2005, 2007 e 2010.

Figura 4 Primeiro modo de EOF para séries de anomalias de CO filtradas para o período de 2003-2012: (a) padrão espacial para a escala semianual, (b) padrão espacial para a escala interanual e (c) correspondentes componentes principais.

Figura 5 Segundo modo de EOF para séries de anomalias de CO filtradas para o período de 2003-2012: (a) padrão espacial para a escala semianual, (b) padrão espacial para a escala interanual e (c) correspondentes componentes principais.
O primeiro modo de variabilidade de CO na escala de tempo interanual (Fig. 4b) explica 77% da variabilidade total de CO contida nesta escala e é dominado por um padrão sobre toda a área de estudo, com o máximo na região central desta área e que se estende de noroeste a sudeste sobre esta área. Com correlação acima de 0,9, este modo explica aproximadamente 81% da variância local. A CP01 deste modo exibe uma oscilação interanual com valores negativos (positivos) nos anos de 2006, 2008-2009, 2011-2012 (2005, 2007 e 2010). Similar à escala semianual, há um aumento na concentração de CO para os anos de 2005, 2007 e 2010 na escala interanual. O segundo modo interanual, explica 7,3% da variabilidade total de CO contida nesta escala e é caracterizado por máximas correlações positivas (negativas) sobre a região nordeste do Brasil (sul da área de estudo e sobre a Venezuela). A CP02 deste modo exibe uma oscilação interanual com valores positivos (negativos) nos anos de 2004 a meados de 2006, 2008, 2010 (2003, meados de 2006-07 e meados de 2009 a meados de 2010). Vale notar que os picos positivos (negativos) no início dos anos de 2004, 2006 e 2009 (2007 e 2010) coincidem com anos de La Niña (El Niño).
A fim de verificar a relação entre os modos de variabilidade interanual de CO e a variabilidade associada ao ENOS, foram calculadas as correlações lineares entre o índice de Oscilação Sul (IOS) e as séries de CP01 (r = 0,23) e CP02 (r = 0,62). Estes valores de correlações indicam que o modo 1 não se relaciona simultaneamente com o ENOS. Como pode ser visto na Fig. 6, os máximos (mínimos) da CP01 antecedem picos máximos (mínimos) do IOS, ou seja, os máximos (mínimos) de CO ocorrem por volta de agosto a outubro durante a fase inicial de um evento La Niña (El Niño). Além disso, a Fig. 4c indica que a variabilidade interanual do CO pode contribuir para o aumento do CO na escala semianual. Por fim, a variabilidade interanual na concentração de CO na região central da América do Sul (modo 1) pode ser atribuída à variabilidade interanual da emissão de CO por queima de biomassa. Para ilustrar a relação da variabilidade interanual do CO (modo 1) com a queima de biomassa e precipitação construiu-se a Fig. 7. Na Fig. 7a a série do número de focos de queima média sobre a região entre 5° S e 20° S, 70° W e 40° W filtrada na escala interanual é mostrada juntamente com a CP01 interanual, e na Fig. 7b com a série de anomalias de precipitação (PRP) média para esta mesma área e também filtrada para a escala interanual. As três séries apresentam uma variabilidade interanual bem definida, com a série da CP01 oscilando quase em fase com as séries do número de focos de queima e em fase oposta com a série de precipitação. Assim, a variabilidade interanual da concentração de CO sobre a área de estudo notada no período de 2003 a 2012 pode ser conduzida pela emissão de CO pela queima de biomassa. Uma vez que a precipitação é o principal fator climático que controla a atividade de queima de biomassa, pode-se comprovar que a variabilidade de CO é influenciada por fatores climáticos, muitas vezes associados às secas como pode ser visto no grande aumento nas emissões de CO por queima em 2007 e 2010.

Figura 6 Séries temporais do índice de Oscilação Sul (IOS, linha pontilhada) e das CP's correspondentes ao primeiro modo (linha contínua, painel superior) e segundo modo (linha contínua, painel inferior) das séries de CO filtradas para a escala interanual.

Figura 7 (a) Séries temporais de anomalias de focos de queima (linha pontilhada) e CP01 das séries de CO filtradas para a escala interanual (linha contínua) e (b): série de anomalias de focos de queima (linha pontilhada) e anomalias de precipitação (linha tracejada) sobre a América do Sul, entre 5° S e 20° S.
A Fig. 8 ilustra as anomalias da concentração de CO para setembro dos anos de 2007 e 2009, respectivamente, enquanto a Fig. 9 mostra os correspondentes mapas de anomalias de precipitação para os mesmos períodos. Assim, o aumento (diminuição) de concentração de CO em setembro de 2007 (2009) esteve associado ao aumento (diminuição) da emissão devido ao aumento (diminuição) do número de focos de queimada e a variabilidade climática, associada à escassez (excesso) de chuva em relação à média climatológica do período de estudo.

Figura 8 Padrões espaciais de anomalias normalizadas pelo desvio padrão da concentração de CO para: (a) setembro de 2007 e (b) setembro de 2009.

Figura 9 Padrões espaciais de anomalias de precipitação normalizadas pelo desvio padrão para: (a) setembro de 2007 e (b) setembro de 2009.
Por outro lado, o modo 2 descreve variações interanuais de CO, em parte relacionadas simultaneamente ao ENOS. Assim, máximas variações interanuais de CO sobre a América do Sul equatorial nos primeiros meses do ano (Fig. 5b) ocorrem entre as latitudes de 10° S a 5° N e são resultados dos incêndios que ocorrem nas regiões norte e nordeste da América do Sul. Assim, como discutido para o modo 1, a queima de biomassa associada à variabilidade climática pode modular a variabilidade interanual do CO nessa região. A Fig. 10 mostra os mapas de anomalias de precipitação para os meses de janeiro de 2006 e fevereiro de 2007, que correspondem a dois anos contrastantes em termos de variabilidade do CO (Figs. 5b e c). Um aumento (Uma diminuição) de chuvas na parte norte (nordeste) da América do Sul durante o mês de janeiro de 2006 (fevereiro de 2007) associado (a) ao evento de La Niña (El Niño), está associado (a) à (ao) diminuição (aumento) do CO na região norte (nordeste) da América do Sul. Esses resultados corroboram que o ENOS em sua fase madura tem um importante efeito na variabilidade interanual de CO sobre a região norte e nordeste da América do Sul.
4. Conclusões
Neste estudo, o comportamento sazonal e os modos dominantes da variabilidade semianual e interanual da concentração de CO integrado na atmosfera sobre a América do Sul foram investigados, a partir de estimativas por satélite EOS/AQUA. Em relação ao comportamento sazonal, consistente com trabalhos anteriores, as maiores concentrações de CO ocorrem no período de agosto a outubro, associadas, principalmente, à queima de biomassa. Também, as concentrações mais elevadas foram notadas predominantemente na faixa latitudinal de 5° S a 20° S.
Em termos de variabilidade interanual, a concentração de CO na região central da América do Sul está diretamente associada à variabilidade interanual de focos de queima na região. Maiores valores de concentração de CO ocorrem nas estações de grande queima com maiores números de focos nos anos de 2007 e 2010. Por outro lado, baixas concentrações ocorreram em 2008 e 2009. Uma vez que a precipitação é o principal fator climático que controla a atividade de queima de biomassa, a variabilidade de CO é influenciada por fatores climáticos, muitas vezes associados à secas como pode ser visto no grande aumento nas emissões de CO por queima em 2007 e 2010. O aumento (A diminuição) de concentração de CO no ano de 2007 (2009) esteve associado (a) ao aumento (à diminuição) da emissão, devido ao aumento (à diminuição) do número de focos de queimada, associado à escassez (ao excesso) de chuva em relação à média climatológica do período de estudo. A intensa atividade de desflorestamento e consequente emissão de gases e partículas decorrentes das queimadas durante a estação seca têm implicações importantes em nível local, regional e global (Artaxo et al., 2005). Por exemplo, em anos muito secos, como os de 2007 e 2010, a queima de biomassa pode facilmente sair do controle, devido à vegetação excessivamente seca, conduzindo a elevadas emissões de CO. Além disso, a combustão continuada das queimadas libertam grandes quantidades de CO para a atmosfera (Lewis et al., 2011). Em contraste, durante anos úmidos tal como em 2009, a queima de biomassa devido ao desmatamento pode ser adiada devido à grande quantidade de umidade (Torres et al., 2010). Este fato pode ter levado a uma redução da emissão de CO neste ano. Ainda, a queima de biomassa na escala interanual está diretamente associada com a variabilidade climática. De modo que, a diminuição (aumento) de chuvas na parte central e leste da América do Sul durante a fase inicial do evento de La Niña (El Niño) contribui para aumentar (diminuir) os focos de queimada nessa região e consequentemente, as emissões de CO. Por outro lado, durante a fase madura do ENOS, a maior variabilidade acontece na região norte e nordeste da América do Sul. Esses resultados sugerem que o ENOS tem um importante efeito na variabilidade interanual de CO sobre a América do Sul.