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Correlação Entre a Exatidão da Medida de Posição do GPS e as Condições Atmosféricas

Correlation Between GPS Position Measurement Accuracy and Atmospheric Conditions

Resumo

O Global Positioning System (GPS) é capaz de calcular a posição de um receptor na superfície do Planeta Terra ou próxima a este. Contudo, como todo sistema de medição, o GPS está sujeito a erros. São muitas as causas destes erros. Um destes é a dinâmica da refração atmosférica. Esta é composta por diversas camadas, com estruturas e comportamentos particulares. Se o índice de refração de cada camada fosse constante, isto não seria um problema. Ocorre que a dinâmica da atmosfera torna o índice de refração instável. Usuários comuns já perceberam claramente que, em dia de chuva, é comum que seus aplicativos de localização apresentem falhas nesta localização. Este trabalho apresenta a relação da exatidão de um GPS com as condições atmosféricas em especial eventos de chuva. Para tanto, foram utilizados dados de um receptor GPS e dados da atmosfera. Os resultados apresentados neste trabalho demostram que durante eventos de chuva a exatidão do GPS fica comprometida.

Palavras-chave
GNSS; GPS; atraso troposférico

Abstract

The Global Positioning System (GPS) is able to calculate the position of a receiver on or near Planet Earth's surface. However, like any measurement system, GPS is subject to errors. There are many causes of these errors. One of these is the dynamics of atmospheric refraction. The atmospheric is composed of several layers, with particular structures and behaviors. If the refractive index of each layer were constant, this would not be a problem. It turns out that the dynamics of the atmosphere makes the refractive index unstable. Ordinary users have clearly noticed that, on a rainy day, it is common for their location apps to fail in this location. This work presents the relationship between the accuracy of a GPS and atmospheric conditions in special rain events. For this purpose, data from GPS receivers, data from the atmosphere, were used. The results presented in this work indicate that during rain events the GPS accuracy is compromised.

Keywords
GNSS; GPS; tropospheric delay

1. Introdução

O Global Navigation Satellite System (GNSS) é um termo genérico que denota um sistema de navegação por satélite capaz de fornecer posicionamento espacial em tempo real. Por ser o primeiro, o sistema mais conhecido é o Global Position System (GPS) dos Estados Unidos, cujo desenvolvimento foi motivado por razões militares. Entretanto, existem outros: o Globalnaya Navigazionnaya Sputnikovaya Sistema (GLONASS) da Rússia, o Galileo da União Europeia, o BeiDou Navigation Satellite System (BDS) da China, o Quasi-Zenith Satellite System (QZSS) do Japão e o Indian Regional Navigation Satellite System (IRNSS) da índia. Com o passar do tempo o GNSS encontrou aplicações em muitas áreas. Diversos autores como Duan et al. (1996)DUAN, J.; BEVISA, M.; FANG, P.; BOCK, Y.; CHISWELL, S.; BUSINGER, S.; et al. GPS Meteorology: direct estimation of the absolute value of precipitable water. Journal of Applied Meteorology, v. 35, n. 6, p. 830-838, 1996. doi
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, Segall e Davis (1997)SEGALL, P.; DAVIS, J.L. GPS applications for geodynamics and earthquake studies. Annual Review of Earth and Planetary Sciences, v. 25, n. 1, p. 301-336, 1997. doi
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e Sapucci et al. (2007)SAPUCCI, L.F.; MACHADO, L.A.T.; MONICO, J.F.G.; PLANA-FATTORI, A. Intercomparison of integrated water vapor estimates from multisensors in the Amazonian region. Journal of Atmospheric and Oceanic Technology, v. 24, n. 11, p. 1880-1894, 2007. doi
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apresentam aplicações que vão desde a geologia indo até à meteorologia. Arief e Heki (2020)ARIEF, S.; HEKI, K. GNSS Meteorology for disastrous rainfalls in 2017-2019 summer in SW Japan: a new approach utilizing atmospheric delay gradients. Frontiers In Earth Science, v. 8, e182, 2020. doi
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também mostra a aplicabilidade desta tecnologia para a previsão de chuva forte de curtíssimo prazo. Além destas aplicações, existe uma que é a mais conhecida da população geral e se tornou fundamental atualmente, disponibilizada pelos aplicativos de localização como Wase, Google Maps, entre outros.

A determinação das coordenadas do receptor GNSS, é feita a partir do cálculo das distâncias entre o receptor e uma constelação de satélites visíveis no local. Monico (2008)MONICO, J.F.G. Posicionamento Pelo GNSS: Descrição, Fundamentos e Aplicações. São Paulo: Unesp, 2008., Zanotta et al. (2011)ZANOTTA, D.C.; CAPPELLETTO, E.; MATSUOKA, M.T. O GPS: unindo ciência e tecnologia em aulas de física. Revista Brasileira de Ensino de Física, v. 33, n. 2, p. 1-6, 2011. doi
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e Mulla et al. (2015)MULLA, A.; BAVISKAR, J.; BAVISKAR, A.; BHOVAD, A. GPS assisted standard positioning service for navigation and tracking: review & implementation. 2015 International Conference On Pervasive Computing (Icpc), p. 1-6, 2015. doi
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descrevem com detalhes os princípios envolvidos no funcionamento desta tecnologia. A posição de cada satélite da constelação é muito bem conhecida em relação ao centro do planeta. A distância é obtida a partir da medida do tempo de transmissão gasto entre o satélite e o receptor, considerando-se que é conhecida a velocidade de deslocamento de um sinal eletromagnético. Desta forma, resolvendo-se um sistema de equações é possível determinar a posição do receptor em relação ao centro do planeta. Portanto, é fundamental que o cálculo das distâncias entre os satélites e o receptor seja feito com a maior exatidão possível. No caso de aplicações cuja exatidão deva ser de alguns metros o cálculo é menos elaborado e feito em tempo real. No caso de aplicações altamente exigentes, o cálculo é feito posteriormente com exatidão milimétrica. Neste cálculo preciso são considerados erros de relógio, erros de órbitas dos satélites e condições atmosféricas, dados obtidos a posteriormente. Um bom exemplo de aplicação com exigência milimétrica é o da deriva dos continentes conforme descrito por Segall e Davis (1997)SEGALL, P.; DAVIS, J.L. GPS applications for geodynamics and earthquake studies. Annual Review of Earth and Planetary Sciences, v. 25, n. 1, p. 301-336, 1997. doi
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e Bastos et al. (2010)BASTOS, L.; BOS, M.; FERNANDES, R.M. Deformation and tectonics: contribution of gps measurements to plate tectonics - overview and recent developments. In: XU, G. (ed.). Sciences of Geodesy - I. Heidelberg: Springer, p. 155-184, 2010..

A ideia do cálculo da distância é simples, mas, obtê-la de é um desafio tecnológico e matemático imensos. Ocorre que, o caminho entre os satélites e o receptor está imerso nas diferentes camadas da atmosfera terrestre cujos índices de refração diferem e, em muitos casos, possuem um comportamento dinâmico. Isto faz com que o caminho geométrico e o caminho óptico (aquele percorrido pela onda eletromagnética) sejam diferentes. Este efeito é bem conhecido e estudado muito tempo antes do aparecimento da tecnologia GNSS e continua como Booker (1948)BOOKER, H.G. Radio refraction in the atmosphere. Weather, v. 3, n. 2, p. 42-50, 1948. e Kim et al. (2021)KIM, C.; NA, D.Y.; PARK, Y.B. Electromagnetic wave propagation from low-earth orbit satellite to ground station considering interpolated atmospheric environments. Ieee Access, v. 9, p. 95853-95861, 2021. doi
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apresentam em seus artigos.

A determinação da posição deve ser feita a partir da distância geométrica, mas, o que se tem é a distância óptica. Esta diferença implicaria em um erro considerável se não for de alguma forma corrigido ou mitigado. Shu et al. (2017)SHU, Y.; SHI, Y.; XU, P.; NIU, X.; LIU, J. Error analysis of high-rate GNSS precise point positioning for seismic wave measurement. Advances In Space Research, v. 59, n. 11, p. 2691-2713, 2017. doi
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, Karaim et al. (2018)KARAIM, M.; ELSHEIKH, M.; NOURELDIN, A. GNSS error sources. In RUSTAMOV, R.B. (ed.). Multifunctional Operation And Application Of Gps. London: Intechopen p. 69-85, 2018. doi
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discutem em profundidade esta fonte de erro.

Em relação à atmosfera, a refração troposférica e refração ionosférica proporcionam um atraso no tempo de propagação do sinal tornando o caminho óptico maior do que o caminho geométrico. Este erro ocasiona desde uma discrepância na medida da distância chegando até mesmo à perda total do sinal, inviabilizando a estimativa de posição do GNSS com a acurácia necessária.

Os efeitos provenientes da troposfera no sinal do GNSS são decorrentes das diferenças existentes nas concentrações dos gases da camada atmosférica e podem ser de três formas: atenuação atmosférica, cintilação troposférica e atraso troposférico. A atenuação e a cintilação são frequentemente desconsideradas, tornando o atraso troposférico a principal fonte de erro devido à troposfera (Sapucci, 2001SAPUCCI, L.F. Estimativa Do Vapor D'água Atmosférico E Avaliação Da Modelagem Do Atraso Zenital Troposférico Utilizando GPS. Dissertação de Mestrado em Ciências Cartográficas, Universidade Estadual Paulista, p. 193, 2001.).

O atraso troposférico pode ser dividido nas componentes seca e úmida. Segundo Hofmann-Wellenhof et al. (2001)HOFMANN-WELLENHOF, B.; LICHTENEGGER, H.; COLLINS, J. Global Positioning System: Theory and Practice. Viena: Springerverlag, 2001. e Sapucci (2001), a componente seca é originada pela influência da atmosfera hidrostática, tendo como principais elementos nitrogênio e oxigênio. O atraso da componente seca é cerca de 2 m com variações decorrentes da temperatura, latitude e pressão atmosférica, determinado com razoável precisão, pois sua variação temporal é pequena. A componente úmida é modulada pela umidade da atmosfera, mais precisamente pela influência do vapor d'água atmosférico. O atraso úmido corresponde a cerca de 10% do atraso troposférico total. Entretanto, as variações temporal e espacial da componente úmida são altas, chegando a 20% do atraso troposférico total em poucas horas, tornando-o muito difícil haver uma previsão adequada, a partir de medidas da umidade na superfície (Spilker Junior et al., 1996SPIKER JUNIOR, J.J.; AXELRAD, P.; PARKINSON, B.W.; ENGE, P. Global Positioning System: Theory and Applications. American Institute of Aeronautics and Astronautics: Reston, 1996.).

Em relação à ionosfera, o atraso é devido à cintilação ionosférica, que pode impactar na disponibilidade, precisão, continuidade e integridade do posicionamento, considerado o maior efeito proveniente da ionosfera nos sinais GNSS. A cintilação ionosférica é uma fonte de variações de amplitude e fase que introduz distúrbios no rastreamento GNSS do receptor e pode causar uma redução da precisão no posicionamento, além da perda de bloqueio de sinais GNSS (Lopes et al., 2021LOPES, R.; ANTREICH, F.; KUGA, H. Traditional and Kalman filterbased GNSS receiver structures for ionospheric scintillation monitoring and mitigation. Techrxiv, p. 1-11, 2021.).

Segundo Kelley (2009)KELLEY, M.C. The Earth's Ionosphere: Plasma Physics and Electrodynamics. San Diego: Academic Press, 2009. as ondas eletromagnéticas podem sofrer efeitos de refração com maior ou menor intensidade dependendo da quantidade de elétrons livres, difícil de mensurar pelas diversas variáveis que a influenciam, como ciclo solar, época do ano, hora do dia, localização, etc.

O trabalho de Klipp et al. (2019)KLIPP, T.S.; PETRY, A.; SOUZA, J.R.; FALCãO, G.S.; VELHO, H.F.C.; PAULA, E.R.; et al. Evaluation of ionospheric models for Central and South Americas. Advances In Space Research, v. 64, n. 10, p. 2125-2136, 2019. doi
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com foco na região central e sul da América apresenta uma variação anual nos valores médios de TEC, contendo um máximo em trono do solstício de dezembro. Esse comportamento era esperado pelos pesquisadores, pois a fotoionização ocorrer quando o ângulo do zênite solar atinge os valores mais baixos. Desde 1993 há relatos dos efeitos da cintilação ionosférica nos sinais GNSS, sendo proposto, este sistema, como uma forma de monitorar a cintilação com receptores GNSS. Segundo Camargo (1999)CAMARGO, P.O. Modelo Regional Da Ionosfera Para Uso Em Posicionamento Com Receptores De Uma Frequência. Tese de Doutorado em Ciências Cartográficas, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, p. 191, 1999. os receptores GPS de dupla frequência conseguem corrigir erros devido à refração ionosférica, pois estes erros são dependentes da frequência do sinal emitido. Em período de atividade solar baixa, a utilização de receptores de dupla frequência gera resultados praticamente isentos de refração, entretanto, tais receptores possuem custos financeiros elevados, tornando seu uso civil pouco comum.

Este trabalho demonstra por medições realizadas, sob condições controladas, os efeitos sobre a exatidão do GPS quando da ocorrência de chuvas.

2. Material e Métodos

A metodologia empregada consiste na avaliação do desvio padrão da medida de posição de um receptor GPS, sempre no mesmo local, com relação às condições atmosféricas (chuva, não chuva). O detalhe relevante aqui é que o desvio padrão foi calculado em conjunto de dados referentes a uma janela de 24 horas de medição, sendo esta janela movente para cada ponto medido. Em outras palavras procurou-se observar como estava variando o desvio padrão temporalmente.

Para a aquisição de dados do GNSS foi utilizado um receptor/transmissor Software Defined Radio (SDR) HackRF One. Este equipamento consiste em um hardware (de código aberto) capaz de transmitir ou receber sinais de rádio de 1 MHz a 6 GHz. Trata-se de um equipamento muito interessante no desenvolvimento de modernas tecnologias de rádio, visto que pode ser configurado por software permitindo desta forma o teste de novas técnicas de filtragem digital de sinais. O HackRF One é programado e operado por um computador pessoal através de uma interface USB. Os parâmetros da configuração do receptor são muitos, sendo os principais usado neste trabalho apresentados na Tabela 1. Dente os parâmetros apresentados nesta tabela destacam-se o SignalSource.freq cujo valor é 1575420000 Hz que corresponde a frequência do canal L1 do GPS. Maiores detalhes do HackRF ONE podem ser obtidos em Barrio et al. (2019)BARRIO, A.A.; MANZANO, J.P.; MAROTO, V.M.; VILLARíN, á.; PAGáN, J.; ZAPATER, M.; AYALA, J.; HERMIDA, R. HackRF + GNU radio: A software-defined radio to teach communication theory. The International Journal Of Electrical Engineering & Education, p. 1-18, 2019. doi
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.

Tabela 1
Parâmetros fundamentais de configuração do HackRF One.

Para uma boa recepção de sinais, a antena do sistema foi instalada no telhado de uma edificação sem obstáculos próximos. A antena utilizada foi uma fabricada pela Leica modelo AR25. A principal característica desta antena é a alta rejeição em relação aos sinais multicaminho, além de ser compatível com todos os sistemas GNSS existentes. Os dados de saída do HackRF One foram armazenados no formato RINEX 3.0 e NMEA182 através do uso do software GNSS-SDR que realizou a configuração e o controle do hardware. Este software foi desenvolvido pelo Centre Tecnològic de Telecomunicacions de Catalunya (CTTC) e é de domínio público. O software GNSS-SDR foi configurado para recepção apenas de sinais do GPS. A série de dados analisados iniciaram-se em 03/11/2019 e se estenderam até o dia 21/01/2020, contabilizando 80 dias e os dados foram armazenados em uma taxa de 1 segundo.

Os dados provenientes da troposfera foram disponibilizados pela Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (FUNCEME) e pelo Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) através de suas respectivas estações automáticas na cidade de Fortaleza no Ceará.

Em relação à ionosfera, a série de dados acontece em um período de baixa atividade solar para um menor impacto nos erros. Durante todo o período de coleta a ionosfera foi analisada utilizando uma rede global de ionossonda fornecida pelo Bureau of Meteorology do Departamento de Meteorologia do Governo Australiano.

Os programas computacionais foram especificamente desenvolvidos em linguagem de programação PYTHON e OCTAVE para extração de dados dos arquivos gerados bem como para análise estatística. No que diz respeito aos arquivos NMEA182 gerados pelo receptor, para a extração das informações foi utilizada uma biblioteca de extração de dados pynmea2. Os dados utilizados foram os referentes à sentença Recommended Minimum Sentence (RMC). Nesta sentença, encontram-se os principais parâmetros: data, hora, latitude e longitude. Para os arquivos RINEX foi utilizado o método de Posicionamento de Ponto Simples (PPS). O PPS sofre erros devido à qualidade das observáveis utilizadas já que usa a pseudodistância obtida pelo arquivo de observação e utiliza os dados do arquivo de navegação. A metodologia do PPS pode ser vista em (Vani et al., 2013VANI, B.C.; MONICO, J.F.G.; SHIMABUKURO, M.H. Fundamentos e aspectos computacionais para posicionamento computacionais para posicionamento por ponto GPS. Revista Brasileira de Geomática, v. 2, n. 1, p. 8-20, 2013. doi
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).

3. Resultados e Discussão

Aqui são apresentadas seis figuras. Na Fig. 1 é apresentada a distribuição dos pontos medidos da posição em metros ao longo dos 80 dias. Neste gráfico a coordenada 0,0 indica a posição central da antena feita a partir de um banco de dados. A nuvem de pontos é decorrente dos erros de medição pelos diversos fatores que afetam o GNSS. Cabe aqui ressaltar o aspecto desta nuvem de pontos. Percebe-se que a maioria dos pontos é muito concentrada no centro (próximo à coordenada (0,0)) sendo que apresenta algumas medidas a uma distância aproximada de 150 m. O aspecto já era esperado, mas chama a atenção algumas medidas distantes do centro. Embora poucos, estes resultados podem ser trágicos no caso dos aplicativos de localização, como, por exemplo, para os profissionais de transporte público, pois pode facilmente apontar uma posição distante da real, causando dificuldades.

Figura 1
Dispersão das medidas ao longo de 80 dias.

Na Fig. 2 é apresentado o número de ocorrências de medições para várias distâncias do receptor. A partir dos dados de origem desta figura obtêm-se um desvio padrão de 5,6 m. Este valor é coerente com o desvio esperado para um receptor GPS que utiliza apenas o sinal L1 para cálculo em tempo real em período de baixa atividade solar.

Figura 2
Histograma do erro de posição em relação ao receptor.

Na Fig. 3 é apresentada a distribuição do módulo do erro ao longo dos 80 dias. Nesta figura, percebe-se um aumento da frequência de ocorrência de erros elevados ao redor do 20° dia com destaque ao redor do 60° dia.

Figura 3
Módulo do erro ao longo dos 80 dias.

Na Fig. 4 é apresentada a quantidade de chuva acumulada para cada dia do experimento fornecida pelo FUNCEME e pelo INMET. O período analisado apresentou diferentes situações pluviométricas. Foram registrados períodos com nenhuma chuva, pouca chuva, chuvas distribuídas no tempo e chuvas intensas e curtas. Isto percebe-se melhor ao se analisar o banco de dados.

Figura 4
Precipitação ao longo dos 80 dias.

A partir desta análise percebe-se a ocorrência de chuva ao redor do 20° e 60° dias, sendo que no primeiro o acumulado é pequeno e no segundo o acumulado bem mais representativo. Estes acumulados são, provavelmente indicativos de dias seguidos de céu fortemente encoberto por nuvens. Percebe-se também eventos de precipitação em tempos curtos, mas com muita intensidade.

Por fim, na Fig. 5 são apresentadas duas curvas: uma em forma de linhas verticais que corresponde a precipitação ao longo do experimento. a outra corresponde ao desvio padrão médio. Observamos que nesta figura um aumento significativo do desvio padrão próximo ao redor do 60° dia. Ao redor deste evento, observando-se o banco de dados, percebe-se um número maior de eventos de chuvas, portanto dias seguidos de céu nublado.

Figura 5
Precipitação e desvio padrão médio da posição.

Outro fenômeno que ocorre em períodos de chuva é o aumento na falta de informação fornecido pelo receptor. A Fig. 6 contém a relação da precipitação com as faltas de dados. Na figura são apresentadas duas curvas, a azul representa a quantidade de falhas que duraram mais de 15 min na escala de 1:1000 e a curva amarela representa a precipitação. Percebe-se que a partir do dia 44 houve um aumento significativo na quantidade de falhas que duraram mais de 15 min muitos delas sendo influenciados pela precipitação.

Figura 6
Precipitação e falhas no posicionamento.

Esse fenômeno ao redor do 60° dia, indica a maior probabilidade de erros mais graves ou falta de informação de posicionamento quando há ocorrência de chuva. Outros pontos com indicativo de chuva não são acompanhados de um aumento significativo do desvio padrão. é importante ressaltar aqui que o desvio padrão indicado na curva é uma média, o que pode encobrir um aumento momentâneo do desvio. Em relação às falhas durante o momento de precipitação forte o receptor não consegue fornecer a posição do receptor.

Estes resultados confirmam as impressões dos usuários dos aplicativos de localização de que ao ter ocorrência de chuvas ou de tempo nublado não raramente o aplicativo comete erros grosseiros (maior do que alguns metros).

4. Conclusões

São diversas as fontes de erros nos GNSS. Estes são mitigados ao ponto de se poder monitorar algo muito difícil de se detectar, como a deriva continental. Entretanto, em aplicações comuns em tempo real, ao menos fora do uso militar, o erro pode ser considerável em dias de chuva. Os resultados indicam o que os usuários de aplicativos de localização já perceberam na prática: em dia de chuva é preciso ter cuidado na utilização destes aplicativos, pois, a ocorrência de grandes erros é algo comum durante estes eventos. Ao longo do tempo, em média, o valor do desvio padrão é baixo (5,6 m), mas ocorrências de valores altos de desvios, embora raros, podem ocorrer.

Ressalta-se que, os resultados obtidos colaboram com as pesquisas feitas na área, ressaltando as influências da atmosfera nos erros no GNSS. Na componente da troposfera apresentado por Hofmann-Wellenhof et al. (2001)HOFMANN-WELLENHOF, B.; LICHTENEGGER, H.; COLLINS, J. Global Positioning System: Theory and Practice. Viena: Springerverlag, 2001. e Sapucci (2001), e na componente da ionosfera apresentado por Camargo (1999)CAMARGO, P.O. Modelo Regional Da Ionosfera Para Uso Em Posicionamento Com Receptores De Uma Frequência. Tese de Doutorado em Ciências Cartográficas, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, p. 191, 1999..

Os resultados, aqui apresentados, dizem respeito ao HackRF One configurado para receber apenas dados GPS na frequência L1. Outros sistemas GNSS precisam ser avaliados, pois, o fato de utilizarem outras bandas de frequência, estes podem ter um comportamento diferenciado no atraso troposférico.

Agradecimentos

à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela bolsa concedida. Os autores agradecem, ainda a Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (FUNCEME) e o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) pelos dados fornecidos para realização do trabalho.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2022

Histórico

  • Recebido
    24 Ago 2021
  • Aceito
    09 Mar 2022
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