Acessibilidade / Reportar erro

Tamponamento das lesões hepáticas transfixantes com colágeno tipo I

Resumos

Nos últimos seis anos temos utilizado o balão de SANGESTAKEN-BLACKMORE para o tamponamento de lesões transfixantes hepáticas. Para substituir este corpo estranho, consideramos o uso de colágeno tipo I produzido na UNICAMP, o qual pode ser injetado e moldado ocupando toda a área lesada e o trajeto anfractuoso ou irregular. Desta forma, pode-se conseguir um tamponamento completo, coibindo a hemorragia e sustando a perda de bile. O colágeno será posteriormente reabsorvido não funcionando como corpo estranho. Vinte cães foram submetidos a lesão transfixante na região central do fígado, procurando simular uma lesão produzida por um projétil de arma de fogo. Quatro destes animais, não receberam tratamento e foram a óbito por choque hemorrágico. Em todos os outros 16 animais, aplicou-se o colágeno tipo I em toda a extensão do túnel formado pela lesão, através de injeção do material. Foram realizadas avaliações clínicas no pós-operatório, sendo os cães sacrificados, em grupo de quatro, aos quatro, sete, 15 e 30 dias de pós-operatório. O estudo macroscópico e o microscópico, tanto à microscopia óptica quanto à de polarização, revelou uma formação cicatricial homogênea, com regeneração hepática intensa, precoce e organizada, a partir do 7º dia de pós-operatório. Conclui-se que a aplicação do colágeno tipo I, nestes tipos de ferimentos, são de aplicação simples e segura.

Trauma; Trauma hepático; Tamponamento hepático; Colágeno tipo I; Regeneração hepática


Over the past 6 years we have used the Sangenstaken-Blackmore balloon to tamponade transfixing hepatic lesions. To replace this foreign body, we have considered the use of type I collagen, manufactured at Univ. Campinas, which can be molded to the entire wounded area, thus tamponading all surface irregularities. In this way, a complete tamponade may be achieved, and bile loss is prevented. Complete absorption of the material removes the problem of a foreign body. Twenty mongrel dogs received a perforating transfixing lesion in the central region of the liver, similar to that caused by a firearm bullet. Into the wounded tunnel type I collagen was introduced. Evaluations were made in the 4th, 7th, 15th and 30th day after the intervention, when animals were sacrificed. Polarizing microscope evaluation induced a homogeneous scar formation, with early, organized hepatic regeneration evident from the 7th day onward. It is therefore believed that the use of type I collagen is an effective and safe method to be used in this type of hepatic wounds.

Trauma; Hepatic trauma; Type I collagen; Hepatic regeneration


11 Trabalho realizado no Lab. de Investigação de Cirurgia do Trauma (LICIT) da Disciplina de Cirurgia do Trauma do Depto. de Cirurgia e no Lab. DTC/NMCE, FCM-UNICAMP. Trabalho realizado no Lab. de Investigação de Cirurgia do Trauma (LICIT) da Disciplina de Cirurgia do Trauma do Depto. de Cirurgia e no Lab. DTC/NMCE, FCM-UNICAMP. 2 Professor Titular e Chefe da Disciplina de Cirurgia do Trauma da UNICAMP. 3 Professor Titular do Departamento de Biologia Celular do Instituto de Biologia da UNICAMP. 4 Médico Assistente da Disciplina de Cirurgia do Trauma da UNICAMP.

Mario Mantovani 21 Trabalho realizado no Lab. de Investigação de Cirurgia do Trauma (LICIT) da Disciplina de Cirurgia do Trauma do Depto. de Cirurgia e no Lab. DTC/NMCE, FCM-UNICAMP. Trabalho realizado no Lab. de Investigação de Cirurgia do Trauma (LICIT) da Disciplina de Cirurgia do Trauma do Depto. de Cirurgia e no Lab. DTC/NMCE, FCM-UNICAMP. 2 Professor Titular e Chefe da Disciplina de Cirurgia do Trauma da UNICAMP. 3 Professor Titular do Departamento de Biologia Celular do Instituto de Biologia da UNICAMP. 4 Médico Assistente da Disciplina de Cirurgia do Trauma da UNICAMP.

Benedicto Campos Vidal 31 Trabalho realizado no Lab. de Investigação de Cirurgia do Trauma (LICIT) da Disciplina de Cirurgia do Trauma do Depto. de Cirurgia e no Lab. DTC/NMCE, FCM-UNICAMP. Trabalho realizado no Lab. de Investigação de Cirurgia do Trauma (LICIT) da Disciplina de Cirurgia do Trauma do Depto. de Cirurgia e no Lab. DTC/NMCE, FCM-UNICAMP. 2 Professor Titular e Chefe da Disciplina de Cirurgia do Trauma da UNICAMP. 3 Professor Titular do Departamento de Biologia Celular do Instituto de Biologia da UNICAMP. 4 Médico Assistente da Disciplina de Cirurgia do Trauma da UNICAMP.

Admar Concon Filho 41 Trabalho realizado no Lab. de Investigação de Cirurgia do Trauma (LICIT) da Disciplina de Cirurgia do Trauma do Depto. de Cirurgia e no Lab. DTC/NMCE, FCM-UNICAMP. Trabalho realizado no Lab. de Investigação de Cirurgia do Trauma (LICIT) da Disciplina de Cirurgia do Trauma do Depto. de Cirurgia e no Lab. DTC/NMCE, FCM-UNICAMP. 2 Professor Titular e Chefe da Disciplina de Cirurgia do Trauma da UNICAMP. 3 Professor Titular do Departamento de Biologia Celular do Instituto de Biologia da UNICAMP. 4 Médico Assistente da Disciplina de Cirurgia do Trauma da UNICAMP.

RESUMO: Nos últimos seis anos temos utilizado o balão de SANGESTAKEN-BLACKMORE para o tamponamento de lesões transfixantes hepáticas. Para substituir este corpo estranho, consideramos o uso de colágeno tipo I produzido na UNICAMP, o qual pode ser injetado e moldado ocupando toda a área lesada e o trajeto anfractuoso ou irregular. Desta forma, pode-se conseguir um tamponamento completo, coibindo a hemorragia e sustando a perda de bile. O colágeno será posteriormente reabsorvido não funcionando como corpo estranho. Vinte cães foram submetidos a lesão transfixante na região central do fígado, procurando simular uma lesão produzida por um projétil de arma de fogo. Quatro destes animais, não receberam tratamento e foram a óbito por choque hemorrágico. Em todos os outros 16 animais, aplicou-se o colágeno tipo I em toda a extensão do túnel formado pela lesão, através de injeção do material. Foram realizadas avaliações clínicas no pós-operatório, sendo os cães sacrificados, em grupo de quatro, aos quatro, sete, 15 e 30 dias de pós-operatório. O estudo macroscópico e o microscópico, tanto à microscopia óptica quanto à de polarização, revelou uma formação cicatricial homogênea, com regeneração hepática intensa, precoce e organizada, a partir do 7o dia de pós-operatório.

Conclui-se que a aplicação do colágeno tipo I, nestes tipos de ferimentos, são de aplicação simples e segura.

DESCRITORES: Trauma. Trauma hepático. Tamponamento hepático. Colágeno tipo I. Regeneração hepática.

INTRODUÇÃO

O tratamento cirúrgico das lesões traumáticas transfixantes do fígado acompanhadas de grandes hemorragias costuma ser tecnicamente difícil e não raramente ocorre óbito de pacientes por exangüinação intra-operatória5. A adoção de técnicas convencionais de tamponamento ou ressecção costuma levar a índices elevados de complicações pós-operatórias. Motivados por este fator, temos utilizado, há vários anos, em nosso serviço, o tamponamento com o balão de SANGENSTAKEN-BLACKMORE4, que tem se mostrado um dispositivo seguro e de fácil aplicação para a hemostasia imediata e no impedimento do extravasamento biliar, nestas lesões transfixantes.

No entanto, o balão permanece aplicado por um tempo variável, podendo persistir sangramento devido a anfractuosidades do pertuito do ferimento, principalmente por projéteis de arma de fogo ou empalamentos. Além disso, podem ocorrer outras complicações, principalmente fístulas biliares4 ou infecções, pelo fato do balão ser um corpo estranho aplicado ao abdômen do paciente em um local onde existe tecido desvitalizado, sangramento e formação de hematomas, constituindo-se em local de alto risco de complicações.

Recentemente, surgiram técnicas de aplicação de cola biológica como solução ideal na obtenção de hemostasia3, embora BERGUER & col.1, em 1991, relatassem reações adversas com o uso de cola de fibrina nos ferimentos hepáticos profundos pela ação dos componentes da trombina bovina na cola. Inúmeros trabalhos experimentais foram realizados com a utilização de adesivos biológicos em trauma hepático7, demonstrando que eles são úteis por promoverem hemostasia adequada e não alterando o processo de cicatrização.

No entanto, nenhum trabalho experimental foi realizado em ferimentos profundos transfixantes do fígado.

Após estudo da utilização de colágeno tipo I liofilizado em outras situações biológicas9, em particular no estudo da regeneração do tecido muscular após trauma da parede abdominal de ratos6, pesquisamos um modelo experimental para ser moldado no sentido de obter-se tamponamento de qualquer ferimento transfixante hepático, capaz de promover hemostasia imediata e impedimento do extravasamento biliar. Deste modo, o colágeno seria moldado em toda a área lesada, tamponando os pontos irregulares da lesão transfixante. o colágeno utilizado é esterilizado e altamente polimerizado, cristalino, com fragmentos de tamanhos variáveis.

Interessados em melhor conhecer a aplicação do método quanto a sua facilidade de aplicação, efetividade e segurança nestes tipos de ferimentos hepático, elaboramos o presente trabalho em cães.

Assim, seria possível estudar, durante a fase aguda do procedimento, suas possíveis complicações, a reabsorção e a regeneração do tecido hepático nestes pontos de aplicação do colágeno, que não vai se portar como corpo estranho. Ainda, nos resultados tardios, analisou-se a adesão, a diferenciação, a morfogênese, a remodelação e o reparo, como resposta celular à aplicação hepática do colágeno tipo I.

MÉTODO

Foram utilizados 20 cães mestiços, sem raça definida, aparentemente sadios, com peso variando de 8 a 12 Kg, operados no Núcleo de Medicina e Cirurgia Experimental da FCM, segundo as normas do COBEA, 19912.

O pré-operatório constitui-se de jejum durante um período de 12 horas. Os animais, uma hora antes do ato cirúrgico, eram medicados com xylamina (Rompum), na dose de 1 ml subcutâneo. Após 30 a 40 minutos, era dissecada uma veia periférica do membro inferior direito para infusão de líquidos.

Os animais foram submetidos à anestesia geral com pento-barbital sódico (Thionembutal), na dose de 30 mg/Kg de peso, intravenoso e mantidos com respiração espontânea. Todos os animais receberam, durante o ato cirúrgico, manutenção anestésica com doses suplementares de Thionembutal. Ainda, durante o ato cirúrgico, era infundido cerca de 250 ml de soro fisiológico intravenoso.

a) PLANEJAMENTO:

Os 20 cães foram submetidos à laparotomia através de incisão mediana, segundo sorteio, em relação ao grupo de estudo. Os animais foram divididos em 5 grupos.

Grupo 1 - 4 cães, produzindo-se lesão traumática transfixante na região central do fígado, produzida por um empalador (Figura 1), evoluindo com hemorragia, sem tratamento oclusivo; deste modo, produziu-se uma lesão pérfuro-contundente ficando um orifício de entrada e um de saída, à semelhança do obtido por ferimento de arma de fogo, como um túnel;

Figura 1
: Lesão transfixante na região central do fígado no cão, produzida por um empalador.

Grupo 2 - 4 cães, após a perfuração, aplicação do colágeno, sendo sacrificados 4 dias após para estudo. O colágeno foi injetado por seringa sob pressão, moldando internamente todo o trajeto lesado e sustando a hemorragia (Figura 2).

Figura 2
-: Aplicação do colágeno tipo I no local da lesão.

Grupo 3 - 4 cães, igual ao anterior, com sacrifício no 7o dia de pós-operatório;

Grupo 4 - 4 cães, igual ao anterior, com sacrifício no 15o dia de pós-operatório;

Grupo 5 - 4 cães, igual ao anterior, com sacrifício no 30o dia de pós-operatório.

b) PÓS-OPERATÓRIO:

Todos os animais foram mantidos em observação constante, sendo retirada a venossecção quando já apresentavam reflexos e estavam totalmente acordados. No período de observação, receberam mais 250 ml de soro fisiológico. A alimentação era iniciada 6 horas após e se constituía de dieta padrão do canil. Os animais foram inspecionados no primeiro dia de quatro em quatro horas; no segundo dia de seis em seis horas e, posteriormente, duas vezes ao dia, por um período de uma semana.

Foram observados no pós-operatório imediato: hemorragia, óbito e o estado geral; e no pós-operatório tardio: supuração da ferida operatória e outras complicações (peritonite, pneumonias, etc.).

c) SACRIFÍCIO DOS ANIMAIS

O sacrifício dos animais ocorreu com prévia anestesia usando-se Thionembutal, semelhante ao início do experimento. Realizou-se nova laparotomia, com a exploração da cavidade abdominal, observando-se aderências no flanco direito e possíveis coleções nos espaços sub-frênicos e entre as alças intestinais. Retirado o fígado para estudo do local da aplicação do colágeno. Após este procedimento, os animais eram sacrificados com injeção de éter etílico, por via intravenosa.

d) ESTUDO DO MATERIAL À MICROSCOPIA ÓPTICA E DE POLARIZAÇÃO

As peças foram fixadas em solução de formaldeído a 10%, incluídas em parafina e os cortes, em cinco micras de espessura, foram corados pela hematoxilina-eosina. O exame histológico teve a finalidade de analisar comparativamente a evolução do processo de reparação nos grupos de animais, no 4o, 7o, 15o e 30o dias de pós-operatório.

Foram classificadas as características de coaptação das bordas do tecido colágeno ao tecido hepático, bem como a evolução cicatricial ocorrida no próprio tecido colágeno, variando desde tecido inflamatório até uma substituição por tecido conjuntivo denso e posterior regeneração hepática.

RESULTADOS

a) Tempo de Sangramento Após Trauma

O tempo de sangramento dos animais do grupo 1 foi maior do que 20 minutos, quando então foi fechada a laparotomia e os animais passaram a ser observados em pós-operatório.

Nos demais grupos, o sangramento cessou de imediato após a aplicação do colágeno em toda a extensão do ferimento transfixante hepático.

b) Óbito no Pós-Operatório

Em todos os cães do grupo 1 ocorreu óbito, por hemoperitônio, variando o tempo de 8 a 26 horas.

Nos outros grupos não ocorreram óbitos e todos foram sacrificados conforme a programação prévia.

c) Resultados à Macroscopia

Todos os cães do grupo 1 morreram entre 8 e 26 horas após o ato cirúrgico. Encontrou-se grande quantidade de sangue livre na cavidade abdominal.

Nos demais cães observou-se pequeno bloqueio de alças do intestino delgado e epíploon no local da aplicação do colágeno, que se desfaziam facilmente à dissecção. Não se notava macroscopicamente, presença ou vestígios de colágeno após o 15o dia de pós-operatório, no local da sua aplicação. Não se detectou fibrose na cápsula hepática.

d) Resultados à Microscopia

No quarto dia após a implantação do colágeno, observou-se infiltrado de eritrócitos aderidos aos fragmentos de colágeno implantados e embebidos numa malha de fibrina. A fibrina foi detectada pela sua birrefringência positiva. Por quimiotactismo, núcleos remanescentes de neutrófilos encontraram-se aderidos aos fragmentos de colágeno implantado (Figura 3).

Figura 3
: Fotomicrografia do fígado após 4 dias de implantação do colágeno. Implante de colágeno, I; hepatócitos, H; eritrócitos, E; restos nucleares de neutrófilos, N; fibrina, FB. Aumento de 240 vezes.

Aos sete dias de implantação do colágeno, os eritrócitos e neutrófilos remanescentes desaparecem. A malha de fibrina aparece hialina. Em torno de fragmentos de colágeno implantados encontra-se proliferação fibroblástica e intensa neovascularização (Figura 4).

Figura 4
: Fotomicrografia de implantes de fígado após 7 dias do procedimento experimental. Implante de colágeno, I; proliferação fibroblástica, F; neoformação vascular, V. Aumento de 45 vezes.

Após 15 dias de evolução, intensa aderência de fibroblastos nos fragmentos do colágeno implantado (Figura 5).

Figura 5
: Décimo-quinto dia após implante de colágeno no fígado. Há uma população fibroblástica rica (F) ao redor dos implantes (I). Aumento de 240 vezes.

No 30o dia após a implantação do colágeno, ocorrem evidentes sinais de hepatócitos e regeneração de canalículos biliares, às vezes próximos ao implante de colágeno, em torno do qual são observados fibroblastos (Figura 6). A observação sob luz polarizada revela formação de fibras colágenas que são detectadas em torno destas estruturas (Figura 7).

Figura 6
: Fotomicrografia de tecido hepático após 30 dias de implante de colágeno (I). Ductos biliares, B; hepatócitos, H. Aumento de 240 vezes.
Figura 7
: O mesmo corte e área da figura 6. Birrefringência das fibras de colágeno formadas "de novo", originando a matriz extracelular ao redor dos ductos biliares (B).

Após 30 dias de evolução, ocorre diminuição de fibroblastos acompanhada por um evidente aumento de fibras colágenas maduras e absorção do implante de colágeno e/ou remodelação. Estes eventos são reconhecidos pela presença de muitas células uninucleares vacuolizadas envolvendo e invadindo os fragmentos de colágeno implantados (Figura 8).

Figura 8
: Fotomicrografia de implante de colágeno hepático após 30 dias. Fibras de colágeno, C; implante com sinais de absorção, I; células vacuolizadas, provavelmente histiócitos, VC. Aumento de 240 vezes.

DISCUSSÃO

Os implantes de colágeno, como toda aplicação clínico-cirúrgica, encontram seus fundamentos nas suas características e propriedades moleculares e biológicas. É fundamental a existência de receptores celulares para colágeno, o que permite adesão de células às fibras do colágeno, seguida de diferenciação celular, migração e reparação10.

Outro fator importante é a ordem molecular (8), pois os implantes encontram reconhecimento do colágeno por várias células, a de maior interesse para o reparo, adesão destas células, proliferação e migração com o preenchimento das malhas do implante, remodelação e absorção do implante com reparo da lesão e, no caso presente, regeneração hepática, a partir do 7o dia de evolução.

Analisando-se os resultados obtidos, à macroscopia, podemos observar que foi muito simples e prático o uso do colágeno tipo I para estancar a hemorragia e fazer o reparo da lesão transfixante, em toda a sua extensão. É um procedimento simples, podendo ser executado durante a hemorragia profusa, ocluindo todo o trajeto, controlando facilmente a hemorragia e mantendo o ferimento durante a cicatrização; pelas características do colágeno anteriormente citadas.

Os quatro animais que evoluíram sem tratamento foram a óbito por choque hemorrágico conseqüente à lesão hepática produzida. Todos os outros 16 cães evoluíram bem após a aplicação do colágeno, mostrando ser um método seguro no tratamento destas lesões hepáticas transfixantes, pois não houve extravasamento de bile ou presença de hemorragia durante toda a evolução clínica e por ocasião do sacrifício. Não ocorreram outras complicações infecciosas como abscessos ou supuração da ferida operatória.

O colágeno implantado, bem como o tecido hepático adjacente foram retirados e analisados sob microscopia óptica e de polarização e, analisando-se os resultados obtidos, tanto à microscopia óptica quanto à de polarização, pode-se observar na evolução do processo cicatricial, uma fase inicial composta predominantemente por reação inflamatória aguda exsudativa, constituída por leucócitos neutrófilos, mas que rapidamente dá lugar a reação inflamatória proliferativa. Na evolução, nota-se ainda no 7o dia de pós-operatório, presença do colágeno implantado, que gradativamente será substituído por tecido de granulação, neovascularizado, onde se nota também regeneração ativa de células hepatocíticas, tanto nas bordas deste tecido, como também em "ninhos" disseminados pelo mesmo. Acompanhando esta regeneração de tecido hepático vê-se também intensa neoformação vascular.

Os sinais de reabsorção do implante só são bem evidentes no 30o dia após o implante. As fibras de colágeno neoformadas, neste tempo, são mais agregadas e birrefringentes envolvendo, por exemplo, ductos biliares.

As propriedades hemostáticas dos implantes devem-se ao fato de que as plaquetas aderem-se prontamente ao colágeno desencadeando a cascata enzimática responsável pela coagulação. É bem conhecido o fato de que plaquetas possuem receptores para colágeno9.

Desta forma, observa-se grande vantagem na aplicação do colágeno, na área hepática lesada, pois na fase aguda sustou a hemorragia e a bilirragia; durante a evolução clínica imediata não conduziu a complicações e depois, a partir do quarto dia de evolução, propiciou em processo cicatricial mais homogêneo, sendo substituído por tecido hepático, em regeneração intensa, precoce e organizada.

AGRADECIMENTOS

Nós agradecemos à bióloga Rosana Celestina Morandin pelos cuidados dispensados aos cães e pela preparação das peças cirúrgicas.

SUMMARY: Over the past 6 years we have used the Sangenstaken-Blackmore balloon to tamponade transfixing hepatic lesions. To replace this foreign body, we have considered the use of type I collagen, manufactured at Univ. Campinas, which can be molded to the entire wounded area, thus tamponading all surface irregularities. In this way, a complete tamponade may be achieved, and bile loss is prevented. Complete absorption of the material removes the problem of a foreign body. Twenty mongrel dogs received a perforating transfixing lesion in the central region of the liver, similar to that caused by a firearm bullet. Into the wounded tunnel type I collagen was introduced. Evaluations were made in the 4th, 7th, 15th and 30th day after the intervention, when animals were sacrificed. Polarizing microscope evaluation induced a homogeneous scar formation, with early, organized hepatic regeneration evident from the 7th day onward. It is therefore believed that the use of type I collagen is an effective and safe method to be used in this type of hepatic wounds.

HEADINGS: Trauma. Hepatic trauma. Type I collagen. Hepatic regeneration.

Endereço:

MARIO MANTOVANI

Rua José de Campos Salles, 650

Jardim Paraíso

13.095-300 - Campinas - SP

fone: (019) 251-7049

  • 1. BERGER, R.; STAERKEL, R. L.; MOORE, E. E.; MORRIS, F.A.; WAY, W.B.C. & MOCKUS, M.B. - Warning: fatal reaction with the use of fibrin glue in deep hepatic wounds. J. Trauma, 31: 408, 1991.
  • 2
    C.O.B.E.A. (Colégio Brasileiro de Experimentação Animal) - Princípios éticos na experimentação animal. In: Congresso do Colégio Brasileiro de Experimentação Animal, São Paulo, 1991.
  • 3. KRAN, H. B.; REUBEN, B. I.; FLEMING, A.W.; SHOEMAKER, W. C. - Use of fibrin glue in hepatic trauma. J. Trauma, 28: 1195-201, 1988.
  • 4. MANTOVANI, M.; MURARO, C. A. S.; BATATA Jr., D. R.; SILVEIRA, H. J. V. - Utilizaçăo do balăo intra-hepático no tamponamento da lesăo transfixante do fígado. Medical Master, 1: 195-8, 1995.
  • 5. MANTOVANI, M.; MURARO, C. A. S.; COSTA, M. F. S.; SIVEIRA H. J. V. - Trauma hepático. Medical Master, 1: 189-93, 1995.
  • 6. MANTOVANI, M; VIDAL, B. C.; DIORIO, A. C.; FARIA, L. L. - Efeito do implante de feltro de colágeno I no trauma da musculatura retoabdominal de ratos. Acta Cir. Bras., 7: 21-4, 1992.
  • 7. SIMŐES, M. L. P. P.; TENIUS, F. P.; CAVAZANA, W. C.; ADUR, R. C.; SANTOS, A. R. L.; COLAÇO, L. M. - Uso de adesivo em trauma hepático: estudo experimental em ratos. Acta Cir. Bras., 8: 24-7, 1993.
  • 8. VIDAL, B. C. - Alteraçőes células-matriz extracelular: uma unidade estrutural e sistemática. Rev. Fac. Cięn. Med. Unicamp, 1: 33-40, 1989.
  • 9. VIDAL, B. C. - Cell and extracellular matrix interaction: a feedback theory based on molecular order recognition-adhesion events. Rev. Fac. Cięn. Med. Unicamp, 4: 11-4, 1994.
  • 10. VIDAL, B. C. & VILARTA, R. - Articular cartilage: collagen II proteoglycans interactions. Availability of reactive groups variation in birrefringence and differences as compared to collagen I. Acta Histochem., 83: 189-205, 1989.
  • 1 Trabalho realizado no Lab. de Investigação de Cirurgia do Trauma (LICIT) da Disciplina de Cirurgia do Trauma do Depto. de Cirurgia e no Lab. DTC/NMCE, FCM-UNICAMP.
    Trabalho realizado no Lab. de Investigação de Cirurgia do Trauma (LICIT) da Disciplina de Cirurgia do Trauma do Depto. de Cirurgia e no Lab. DTC/NMCE, FCM-UNICAMP.
    2 Professor Titular e Chefe da Disciplina de Cirurgia do Trauma da UNICAMP.
    3 Professor Titular do Departamento de Biologia Celular do Instituto de Biologia da UNICAMP.
    4 Médico Assistente da Disciplina de Cirurgia do Trauma da UNICAMP.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Jun 2001
    • Data do Fascículo
      Abr 1998
    Sociedade Brasileira para o Desenvolvimento da Pesquisa em Cirurgia https://actacirbras.com.br/ - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: actacirbras@gmail.com