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Anastomoses arteriais: passado, presente e futuro

Arterials anastomosis: past, present and future

Resumos

As anastomoses vasculares representam importante conquista da cirurgia moderna possibilitando a restauração vascular, as revascularizações e os transplantes. No presente artigo, os autores fazem uma retrospectiva histórica das principais contribuições e conquistas paralelas, no campo da medicina, que possibilitaram este avanço. Finalmente destacam alguns aspectos que ainda aguardam solução.

Anastomose cirúrgica; Suturas; Cirurgia vascular


The vascular anastomosis are an important achievement of modern surgery making possible trauma restoration, revascularization of limbs and organ transplantation. In this paper the authors discuss historical aspects of vascular anastomosis, its progress, achievements and some challenges that researches face nowadays.

Anastomosis; Suture; Vascular surgery


Anastomoses arteriais: passado, presente e futuro1 1 . Trabalho realizado na Divisão de Cirurgia Vascular, do Serviço de Cirurgia, do Hospital das Clínicas Samuel Libânio, da Faculdade de Ciências Médicas de Pouso Alegre/MG. 2 . Professor Assistente do Departamento de Cirurgia da FACIMPA. 3 . Professor Auxiliar de Ensino do Departamento de Cirurgia da FACIMPA. 4 . Professor Titular do Departamento de Cirurgia da FACIMPA.

Ibrahim Elias Kallás2 1 . Trabalho realizado na Divisão de Cirurgia Vascular, do Serviço de Cirurgia, do Hospital das Clínicas Samuel Libânio, da Faculdade de Ciências Médicas de Pouso Alegre/MG. 2 . Professor Assistente do Departamento de Cirurgia da FACIMPA. 3 . Professor Auxiliar de Ensino do Departamento de Cirurgia da FACIMPA. 4 . Professor Titular do Departamento de Cirurgia da FACIMPA.

Alexandre Carvalho Kallás3 1 . Trabalho realizado na Divisão de Cirurgia Vascular, do Serviço de Cirurgia, do Hospital das Clínicas Samuel Libânio, da Faculdade de Ciências Médicas de Pouso Alegre/MG. 2 . Professor Assistente do Departamento de Cirurgia da FACIMPA. 3 . Professor Auxiliar de Ensino do Departamento de Cirurgia da FACIMPA. 4 . Professor Titular do Departamento de Cirurgia da FACIMPA.

Elias Kallás4 1 . Trabalho realizado na Divisão de Cirurgia Vascular, do Serviço de Cirurgia, do Hospital das Clínicas Samuel Libânio, da Faculdade de Ciências Médicas de Pouso Alegre/MG. 2 . Professor Assistente do Departamento de Cirurgia da FACIMPA. 3 . Professor Auxiliar de Ensino do Departamento de Cirurgia da FACIMPA. 4 . Professor Titular do Departamento de Cirurgia da FACIMPA.

Kallás IE, Kallás AC, Callas E. Anastomoses arteriais: passado, presente e futuro. Acta Cir Bras [serial online] 1999 Oct-Dec;14(4). Available from: URL: http://www.scielo.br/acb.

RESUMO: As anastomoses vasculares representam importante conquista da cirurgia moderna possibilitando a restauração vascular, as revascularizações e os transplantes. No presente artigo, os autores fazem uma retrospectiva histórica das principais contribuições e conquistas paralelas, no campo da medicina, que possibilitaram este avanço. Finalmente destacam alguns aspectos que ainda aguardam solução.

DESCRITORES: Anastomose cirúrgica. Suturas. Cirurgia vascular.

O inicio da cirurgia vascular remonta há tempos imemoriais, quando as intervenções sobre os vasos sanguíneos limitavam-se às tentativas de controle das hemorragias. Embora existam relatos sobre o uso da ligadura do cordão umbilical nos recém-nascidos 1500 A.C., os antigos usavam somente processos rudimentares como compressão, cauterização e a aplicação de ervas medicinais, para estancar os sangramentos14 .

HIPÓCRATES (450 -370 A.C.) cita a compressão e a cauterização como métodos de hemostasia, não fazendo qualquer menção ao uso das ligaduras dos vasos sanguíneos35.

Foi CORNELIUS (53 A.C. - 7 D.C.) quem introduziu a ligadura como método de hemostasia. Mesmo não sendo médico sua obra De Medicina continha importantes informações. Apesar disso caiu por muito tempo no esquecimento tendo sido tardiamente recuperada pelo papa Nicolas, vindo a ser a primeira publicação através da invenção de Gutenberg, por volta de 1478. A aparente razão para o esquecimento de tão importante obra, durante séculos, talvez se deva ao fato de ter sido ela escrita em latim, quando os tratados científicos em geral eram escritos em grego. São suas palavras:"O vaso que jorra sangue deve ser contido com firmeza, amarrado em dois pontos e seccionado entre eles, de forma a permitir a retração e fechamento das suas aberturas". Desde então a ligadura passou a ser uma prática comum. Entretanto, na Idade Média, seguiu-se longo período sem grandes contribuições . Por séculos, os conhecimentos adquiridos mergulharam no ostracismo sem precedentes, retrocedendo às antigas práticas para o controle das hemorragias34.

Em 1552 AMBROISE PARÉ reintroduziu o uso das ligaduras em massa, para o tratamento dos sangramentos. Daí por diante iniciou-se constante competição entre a ligadura e outros métodos de hemostasia , tais como a compressão e a cauterização, até que ao final do século XVIII, a ligadura passou a ser o método de escolha, sobrepondo-se aos demais14.

Em 1615 WILLIAM HARVEY provou de maneira brilhante a circulação do sangue no compartimento vascular. Esta foi sem dúvida a maior conquista campo da fisiologia e da medicina no século dezessete36.

A primeira sutura vascular, de que se tem notícia, foi realizada por HALLOWELL em 1759, que por sugestão de LAMBERT, fechou uma pequen abertura da artéria braquial com sucesso. Lambert, sem avaliar a importância do fato descrito, escreve:.."se ficar provado que uma grande artéria, quando lesada, pode vir a ser reparada por este método sem ser ocluída, este terá sido um grande avanço para a cirurgia". Infelizmente as tentativas infrutíferas de ASMAN, para reproduzir experimentalmente em cães a técnica de Lambert-Hallowell, conduziram os cirurgiões da época ao descrédito do método, responsabilizando a introdução do fio de sutura na luz do vaso, atravessando toda a parede, como sendo a causa da trombose e da oclusão total49.

NICOLAI ECK (1877) realizou a primeira anastomose entre a veia cava e a veia porta , em cães 46.

Em 1886, POTEMSKI, comunicou a sutura lateral de uma artéria em humanos 49.

Na mesma época, JASSINOWSKY (1891), obteve sucesso em anastomoses término-terminais de carótidas de carneiros. Este autor enfatizava a necessidade de se utilizar fio fino de seda, em pontos separados e a curtas distâncias, comprometendo apenas as camadas média e adventícia dos vasos14,31.

JABOULAY & BRIAU (1896), introduziram a técnica de anastomose vascular com eversão das bordas das extremidades anastomosadas, de tal forma que suas íntimas entrassem em contato. Esta técnica passou a ser conhecida como sutura do colchoeiro , ou sutura em U. Suas primeiras investigações experimentais, realizadas em carótidas de cães apresentaram muitos insucessos. Posteriormente, conseguiram melhores resultados trabalhando com carótidas de asnos. Isto levou-os a acreditar que o diâmetro dos vasos era um fator predictivo do sucesso das anastomoses30.

MURPHY (1897) realizou estudos experimentais e clínicos com invaginação do segmento proximal do vaso seccionado, no seu correspondente distal,ancorando-os com alguns pontos41.

SILBERBERG (1899) propôs a inclusão de todas as camadas dos vasos a serem anastomosados , sem eversão das bordas , usando uma sutura contínua. Os resultados obtidos com esta técnica foram tão bons como os obtidos com eversão50.

PAYR (1900) descreveu suas observações com pequenos tubos absorvíveis de magnésio, para anastomoses sem suturas, apenas com uma ligadura cincunferencial sobre o sulco do anel44. Técnica semelhante foi utilizada por CARREL (1912) para fixação de tubos de vidro parafinado em aorta de cães11. DUREAU (1972) e cols.18 propuseram a mesma técnica para fixação de prótese intraluminal com anel rígido sem sutura. Entre nós, BERNARDES (1994) e cols.inovaram e divulgaram o método3 (figura 1).


A sutura manual, com instrumental ainda que rudimentar, estava destinada a ocupar lugar de destaque nas anastomoses arteriais e venosas, o que ocorreria nos primeiros anos do século XX, graças às inestimáveis contribuições de pesquisadores geniais que estabeleceram definitivamente as bases técnicas da moderna cirurgia vascular .Cumpre observar que os cirurgiões da época lutavam contra as principais complicações das intervenções vasculares, como a infecção, as estenoses , a hemorragia e a trombose ao nível da linha de sutura , o que comprometia seriamente os resultados. Próximo à virada do século, a maior parte dos métodos para a realização das anastomoses vasculares tinha sido exaustivamente testada em animais de experimentação e em alguns ensaios clínicos 7,30,31,41,44,50.

ALEXIS CARREL forneceu importantes contribuições ao desenvolvimento da cirurgia. Este notável cirurgião, ainda estudante de medicina ,interessou-se pela cirurgia vascular por ocasião do assassinato do presidente da França, Sadi Carnot, pelo anarquista italiano Sandro Casemiro, em 1894. O presidente veio a falecer em consequência de grave ferimento da veia porta, sem que nada pudesse ser feito. Impressionou-o a incapacidade de seus professores em reparar o vaso lesado, o que poderia ter evitado a morte do ilustre estadista. Daí por diante , decidiu dedicar-se ao estudo das suturas vasculares. Embora tenha iniciado suas investigações na França, logo transferiu-se para o Canadá e finalmente para os Estados Unidos, em busca do apoio que não encontrou no seu país de origem14. Em Chicago, EUA, associou-se a Charles C. Guthrie , um não menos brilhante cirurgião americano, tendo ambos contribuído para o desenvolvimento da cirurgia vascular7,8,9,10,12,23.

Em 1912 , Carrel foi agraciado com o premio Nobel de medicina e fisiologia, em reconhecimento aos seus trabalhos sobre suturas vasculares e transplantes de vasos e órgãos. Suas recomendações, para as suturas vasculares, são ainda válidas em nossos dias, tais como o manuseio delicado dos tecidos, a proteção do ressecamento dos vasos com soro fisiológico, a necessidade de se utilizar fios delicados e instrumental adequado para garantir os resultados. Desenvolveu a técnica da anastomose vascular fundamentada na colocação de três pontos equidistantes para aproximação das bordas a serem anastomosadas, de modo a transformar a circunferência dos vasos em um triângulo, cujos lados são suturados com chuleio simplesfacilitando as manobras e tornando-as mais rápidas e seguras. Preocupou-se com a ideia da substituição dos órgãos enfermos, ou danificados pelo trauma, por similares sãos através dos transplantes. Tal possibilidade, entretanto,esbarrava-se nas dificuldades técnicas para a realização das anastomoses vasculares, afim de viabilizar a perfusão do eventual órgão transplantado. Trabalhando exclusivamente com animais, e aplicando técnicas originais, obteve brilhantes resultados no transplante de vasos sanguíneos, órgãos e membros9. Com seu grande colaborador, GUTHRIE, identificou as principais causas de complicações das anastomoses vasculares e como evitá-las12.

As promessas dos primeiros anos do século XX não se concretizaram porque a técnica cirúrgica ultrapassara os antigos métodos de diagnóstico, foi necessário longo período de espera14.

Grandes avanços,entretanto só viriam com o aparecimento de contribuições paralelas. O desenvolvimento alcançado na primeira década do século XX deu lugar a um período quiescente até os anos 40, quando foi retomado. Este curto espaço notabilizou-se por descobertas, nas áreas de domínio conexo, que possibilitaram a retomada das conquistas em cirurgia vascular .Registraram-se avanços que em muito contribuíram para consolidação dos conhecimentos até então adquiridos.

O eminente cientista LANDSTEINER descreveu o sistema ABO em 1900, possibilitando as transfusões sanguíneas com segurança. Extraordinário desenvolvimento da imuno-hematologia graças aos trabalhos de LANDSTEINER, LEVINE e WEINER, ensejaram, além da descoberta do sistema A-B-O, a do fator Rh e de outros sistemas de menor importância, aumentando ainda mais a confiabilidade das transfusões sanguíneas55.

Outra grande contribuição foi a descoberta da heparina por MCLEAN, e seu isolamento por HOWELL e HOLT, minimizando dramaticamente a ocorrência de tromboses como fator complicador das intervenções cirúrgicas sobre os vasos26,38. Desde então os vasos sanguíneos puderam ser pinçados por mais tempo sem os riscos do efeito trombogênico provocado pelo trauma.

A descoberta dos raios X por WILHELM KONRAD ROENTGEN em 1895 possibilitou, nos primeiros anos do século atual, o desenvolvimento da angiografia através da injeção de uma substância radiopaca na circulação, contrastando desta forma a luz dos vasos37.

Embora a capacidade de contrastar seletivamente os vasos sanguíneos tenha sido demonstrada por HASCHEK e LIDENTHAL em l896, logo após a descoberta dos raios X, foi somente na década de vinte que SICARD e FORESTIER aplicaram clinicamente o procedimento, observando a passagem do contraste injetado numa veia do membro superior, pela circulação pulmonar, através da angioscopia37. O método incipiente difundiu-se através do estudo arteriográfico do segmento fêmuro-popliteo6.

O grande impulso veio no final da mesma década com os trabalhos de EGAZ MONIZ sobre angiografia cerebral, e de DOS SANTOS, LAMAS e PEREIRA sobre arteriografias da aorta abdominal e seus ramos15,40.

Some-se a estas duas grandes contribuições dos pesquisadores portugueses, o primeiro agraciado com premio Nobel de Medicina em 1949 por seus trabalhos sobre lobotomia frontal, uma terceira e importante contribuição original à cirurgia vascular que foi a introdução da tromboendarterectomia por J. CID DOS SANTOS16, filho de Reynaldo. Esta foi uma das raras ocasiões em que pai e filho deram uma influente contribuição original à cirurgia vascular

A descoberta das propriedades anti-bacterianas do Penicillium notatum, deu inicio a era dos antibióticos. Seguiram-se decisivas descobertas com o isolamento de inúmeras outras substâncias com propriedades semelhantes20.

No campo da anestesia, da intubação endotraqueal39 possibilitou o desenvolvimento subsequente da administração anestésica com circuito fechado e pressão positiva intermitente e controlada.

A busca contínua de melhores técnicas que levassem a anastomoses rápidas e seguras, resultou na idealização de um método para anastomoses vasculares sem sutura. Cilindros de vitálio revestidos internamente com veias do próprio animal, ou do paciente eram interpostos entre as extremidades dos vasos a serem anastomosados. Este método entretanto resultou em grande número de insucessos 4.

Entre nós GOFFI (1951), em estudo experimental, encontrou resultados desfavoráveis com tal método. O mesmo autor comparou as técnicas de anastomose com sutura de colchoeiro e em chuleio simples concluindo que os resultados são superponíveis21.

Os clipes metálicos também foram introduzidos com a finalidade de se conseguirem anastomoses rápidas e seguras, sem resultados convincentes48.

A sutura mecânica dos vasos sanguíneos a nível experimental e clínico, com utilização de sofisticados aparelhos, surgiu com o propósito de facilitar a técnica das anastomoses, diminuir o tempo operatório e melhorar os resultados. Exaustivos estudos foram conduzidos pela escola russa neste sentido2.

Posteriormente pesquisadores japoneses aperfeiçoaram o método desenvolvendo os seus próprios aparelhos para anastomoses término-terminais, e término-laterais27,28.

Por último substâncias adesivas foram introduzidas com a finalidade de reduzir o tempo das anastomoses e simplificar a técnica de execução das mesmas24.

JAIN & GORISCH, em 1979, introduziram os raios laser para fechamento de pequenas lesões arteriais29, mas foram os autores brasileiros GOMES e cols.22 os primeiros a realizarem experimentalmente com sucesso, anastomoses vasculares com laser. Dai por diante o método se difundiu.

As principais complicações das anastomoses vasculares são as hemorragias, as estenoses, as tromboses, os falsos aneurismas e as infecções. Inúmeros fatores contribuem para o aparecimento de resultados adversos desde os métodos de anti-sepsia até a qualidade do instrumental cirúrgico, a técnica operatória, a anticoagulação inadequada, e as características dos fios de sutura. Para melhorar os resultados aconselhou-se o uso de fios de seda fina em agulhas extremamente delicadas7. Foram utilizados experimentalmente fios de seda fina, e de cabelo humano, montados em agulhas retas atraumáticas . Mesmo assim observou-se alta incidência de estenoses52.

Estudo comparativo das anastomoses das aortas torácicas em cães, realizadas com seda, categute cromado e categute simples,evidenciou que a seda permanece intacta na parede vascular, um ano após a sutura, e que devido a pequena resistência à ruptura, nos primeiros dias da cicatrização , as anastomoses com categute são pouco seguras47. O mesmo estudo não revelou diferenças significativas na incidência de tromboses com as técnicas de eversão das bordas ou simples chuleio.Contudo observou-se superfícies endoteliais mais lisas nas suturas em chuleio, com categute.

Até recentemente, só eram disponíveis fios naturais para suturas vasculares, tais como pelos de animais, fibras vegetais ou produzidas por animais como o bicho da seda. Os fios de algodão, apesar do baixo custo e fácil manuseio, há muito foram preteridos pelos de seda, que foram os mais recomendados para suturas vasculares23.

As anastomoses procurando apropinquar as íntimas, técnica mais trabalhosa e demorada, foram paulatinamente sendo relegadas ao plano secundário13.

Desta forma, poude-se dispensar a utilização de artifícios especiais como o preconizado por Jaboulay e Briau, porquanto o chuleio simples oferecia resultados idênticos21.

A resposta dos tecidos ao fio de sutura é bem conhecida e varia não somente de acordo com o fio, mas depende também da natureza do próprio tecido1.

Os fios de origem animal ou vegetal como a seda, o linho, o algodão, apesar da facilidade no manuseio e a segurança dos nós, tendem a produzir intensa reação inflamatória, interferindo com a perfeita cicatrização.

As fibras naturais são constituídas de longas cadeias de moléculas alinhadas longitudinalmente, os polímeros, sendo a celulose um exemplo típico. A manipulação molecular resultou na síntese de polímeros completamente isentos de produtos naturais. A mais importante descoberta foi o nailon (poliamida). A partir dos hidrocarbonetos extraídos do petróleo, foram sintetizados polímeros que apresentam , entre outras aplicações, a de poderem ser aproveitados como fios de sutura cirúrgica.

Os fios sintéticos inabsorvíveis como a poliamida , o polipropileno e o politetrafluroetileno (PTFE), apresentam pequena reação inflamatória, porém um manuseio apenas razoável. De maneira geral quando amarrados os nós se soltam com facilidade, sendo necessário vários nós para garantir o ponto.

O fio de sutura considerado ideal, além de fácil manuseio, deveria ser resistente, não embologênico, imunologicamente inerte, não cancerígeno, e, após cumprir sua função desaparecer totalmente, de modo a não constituir-se em corpo estranho, além de permitir o crescimento dos vasos.

Estas duas últimas qualidades não se observam com fios inabsorvíveis, naturais ou sintéticos, e, para possibilitar o crescimento dos vasos torna-se necessário o emprego de determinados artifícios de técnica13,25,32.

A grande vantagem dos polímeros sintéticos sobre outros materiais de sutura utilizados e disponíveis para anastomoses, como a seda e o categute,é sua baixa antigenicidade. Tal característica propicia mínima reação inflamatória, atenuando a incidência de complicações.Outro aspecto positivo é a grande resistência destes materiais à tração, o que aumenta satisfatoriamente sua força tensora ao nível das anastomoses, fornecendo grande segurança.

Como desvantagens podemos citar sua pequena maleabilidade, dificultando a execução e segurança dos nós, tornando obrigatória a aplicação de vários laços para garantir a firmeza do ponto , o que por outro lado aumenta a massa de corpo estranho presente nos tecidos.

Finalmente, o maior inconveniente é a permanência definitiva após cumprir sua finalidade, constituindo-se num corpo estranho indesejável.

Atualmente não apenas os cirurgiões vasculares realizam este tipo de anastomose, mas também os cirurgiões do coração, os neurocirurgiões, os cirurgiões plásticos. A maioria continua aplicando, com pequenas modificações, a técnica baseada no método de Carrel.

A proliferação miointimal desencadeada pelo trauma vascular45 constitue importante campo de investigação das anastomoses vasculares, particularmente aquelas de pequenos vasos como as coronárias33. A proliferação das fibras musculares lisas na íntima das artérias musculares e a formação de matriz extracelular são as principais responsáveis pelas estenoses na arteriosclerose, após cirurgia vascular45. lnvestigações têm sido realizadas com objetivo de esclarecer, prevenir ou minimizar os efeitos da proliferação miointimal33,43,45,51.

Por outro lado, estudos foram retomados no campo da anastomose mecânica graças ao desenvolvimento de aparelhos mais delicados e eficientes. Estes trabalhos têm mostrado que as anastomoses mecânicas dos vasos sanguíneos além de factíveis podem ser rápidas5.Elas teriam ainda a vantagem de evitar ou minimizar o trauma do endotélio diminuindo a hiperplasia miointimal. Para tanto desenvolveram-se aparelhos capazes de aplicar clipes de titânio que não comprometem a íntima mantendo evertidas as bordas a serem anastomosadas42.

O resultado das anastomoses com colas de metil-cianocrilatos e butil-cianocrilatos foram desapontadores54,56. Recentemente uma nova cola a base de dicrilato de polietilenoglicol foi testada17 mostrando-se eficaz para fechar pequenos orifícios, porem incapaz de garantir uma anastomose vascular.

O Uso dos raios laser, nas anastomoses vasculares, continua despertando o interesse dos pesquisadores53. Ainda em fase experimental, teria como vantagens a diminuição do tempo de anastomose e das dificuldades técnicas, menor reação de corpo estranho, diminuição da hiperplasia miointimal e trombogenicidade, grande precisão com poucas estenoses, além de propiciar o crescimento dos vasos ao nível das anastomoses19.

Apesar da busca dos mais diversos métodos, técnicas e artifícios, para se conseguirem anastomoses vasculares cada vez mais perfeitas, as suturas manuais com fios delicados de polímeros sintéticos inabsorvíveis, adequados aos diâmetros dos vasos, continuam sendo o método preferido pelos cirurgiões .

Kallás IE, Kallás AC, Callas E. Arterials anastomosis: past, present and future. Acta Cir Bras [serial online] 1999 Oct-Dec;14(4). Available from: URL: http://www.scielo.br/acb.

SUMMARY: The vascular anastomosis are an important achievement of modern surgery making possible trauma restoration, revascularization of limbs and organ transplantation. In this paper the authors discuss historical aspects of vascular anastomosis, its progress, achievements and some challenges that researches face nowadays.

SUBJECT HEADINGS: Anastomosis. Suture. Vascular surgery.

Endereço para correspondência:

Elias Kallás

Rua Raquel de Paula Ribeiro, 5

37550-000 Pouso Alegre - MG

Tel: (035)422-1763

Fax: (035)422-1092

Data do recebimento: 04/06/99

Data da revisão: 12/07/99

Data da aprovação: 24/08/99

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  • 1
    . Trabalho realizado na Divisão de Cirurgia Vascular, do Serviço de Cirurgia, do Hospital das Clínicas Samuel Libânio, da Faculdade de Ciências Médicas de Pouso Alegre/MG.
    2
    . Professor Assistente do Departamento de Cirurgia da FACIMPA.
    3
    . Professor Auxiliar de Ensino do Departamento de Cirurgia da FACIMPA.
    4
    . Professor Titular do Departamento de Cirurgia da FACIMPA.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Jan 2000
    • Data do Fascículo
      Out 1999

    Histórico

    • Revisado
      12 Jul 1999
    • Recebido
      04 Jun 1999
    • Aceito
      24 Ago 1999
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