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Tumores da córtex da supra-renal: o uso do p53 na diferenciação entre carcinomas e adenomas

Adrenocortical tumors: use of p53 protein to discriminate carcinomas from adenomas

Resumo

A marcação imunohistoquímica da proteina p53 foi estudada em tumores da adrenal conservados em formol ou em blocos de parafina, pelo método da avidina-biotina-peroxidase com recuperação antigênica. Foram estudados 24 carcinomas e 26 adenomas com o objetivo de verificar se o marcador mostrava capacidade de distinção entre eles. Em 62,5% dos carcinomas a marcação foi positiva enquanto que nos adenomas foi de 15,4%, diferença essa estatisticamente significante (p=0,0003). A sensibilidade, especificidade e valor preditivo positivo desse marcador para o diagnóstico do câncer foram, respectivamente: 83,3%, 71,8% e 62,5%. Não houve relação entre o índice de marcação e outros parâmetros clínicos, como peso do tumor, estádio local, recidiva e metástases. Os autores concluem que o marcador é útil no diagnóstico diferencial de massas da adrenal, mas não tem relação com a agressividade biológica da neoplasia maligna.

p53; carcinoma de adrenal; adenoma de adrenal


TUMORES DA CÓRTEX DA SUPRA-RENAL: O USO DO P53 NA DIFERENCIAÇÃO ENTRE CARCINOMAS E ADENOMAS

ADRENOCORTICAL TUMORS: USE OF P53 PROTEIN TO DISCRIMINATE

CARCINOMAS FROM ADENOMAS

Rodrigo A. R. Falconi1 1 Doutorando da FMRP-USP 2 Professor Titular de Urologia - FMRP-USP 3 Professora Assistente Doutora - Patologia - FMRP-USP 4 Professor Assistente Doutor - Urologia - FMRP-USP 5 Professor Assistente Doutor - Neurocirurgia - FMRP-USP , Antonio C. P. Martins2 1 Doutorando da FMRP-USP 2 Professor Titular de Urologia - FMRP-USP 3 Professora Assistente Doutora - Patologia - FMRP-USP 4 Professor Assistente Doutor - Urologia - FMRP-USP 5 Professor Assistente Doutor - Neurocirurgia - FMRP-USP , Maria A. L. Velludo3 1 Doutorando da FMRP-USP 2 Professor Titular de Urologia - FMRP-USP 3 Professora Assistente Doutora - Patologia - FMRP-USP 4 Professor Assistente Doutor - Urologia - FMRP-USP 5 Professor Assistente Doutor - Neurocirurgia - FMRP-USP , Silvio Tucci Jr4 1 Doutorando da FMRP-USP 2 Professor Titular de Urologia - FMRP-USP 3 Professora Assistente Doutora - Patologia - FMRP-USP 4 Professor Assistente Doutor - Urologia - FMRP-USP 5 Professor Assistente Doutor - Neurocirurgia - FMRP-USP

Adauto J. Cologna4 1 Doutorando da FMRP-USP 2 Professor Titular de Urologia - FMRP-USP 3 Professora Assistente Doutora - Patologia - FMRP-USP 4 Professor Assistente Doutor - Urologia - FMRP-USP 5 Professor Assistente Doutor - Neurocirurgia - FMRP-USP , Haylton J. Suaid4 1 Doutorando da FMRP-USP 2 Professor Titular de Urologia - FMRP-USP 3 Professora Assistente Doutora - Patologia - FMRP-USP 4 Professor Assistente Doutor - Urologia - FMRP-USP 5 Professor Assistente Doutor - Neurocirurgia - FMRP-USP , Carlos G. Carlotti Jr5 1 Doutorando da FMRP-USP 2 Professor Titular de Urologia - FMRP-USP 3 Professora Assistente Doutora - Patologia - FMRP-USP 4 Professor Assistente Doutor - Urologia - FMRP-USP 5 Professor Assistente Doutor - Neurocirurgia - FMRP-USP

FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO - USP

Departamento de Cirurgia e Anatomia – Disciplina de Urologia

Departamento de Patologia

Projeto financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP)

Unitermos: p53, carcinoma de adrenal, adenoma de adrenal

Key Words: p53, adrenocortical carcinoma, adenoma of adrenal

Agradecimentos: Ana Maria Azevedo Abreu

Resumo: A marcação imunohistoquímica da proteina p53 foi estudada em tumores da adrenal conservados em formol ou em blocos de parafina, pelo método da avidina-biotina-peroxidase com recuperação antigênica. Foram estudados 24 carcinomas e 26 adenomas com o objetivo de verificar se o marcador mostrava capacidade de distinção entre eles. Em 62,5% dos carcinomas a marcação foi positiva enquanto que nos adenomas foi de 15,4%, diferença essa estatisticamente significante (p=0,0003). A sensibilidade, especificidade e valor preditivo positivo desse marcador para o diagnóstico do câncer foram, respectivamente: 83,3%, 71,8% e 62,5%. Não houve relação entre o índice de marcação e outros parâmetros clínicos, como peso do tumor, estádio local, recidiva e metástases. Os autores concluem que o marcador é útil no diagnóstico diferencial de massas da adrenal, mas não tem relação com a agressividade biológica da neoplasia maligna.

Introdução: A técnica da imunohistoquímica têm-se mostrado um importante instrumento, não só na pesquisa, como também como complemento da avaliação patológica na classificação de tumores e na determinação do prognóstico. Um dos marcadores analisados através da imunohistoquímica é a proteína p53. Esta é uma proteína supressora do ciclo celular, sendo que a expressão mutante do seu gene, mesmo em heterozigose leva ao crescimento celular desordenado. A associação entre expressão do p53 e o prognóstico de tumores malignos é controvertida3,9,15. Um dos tumores onde a marcação do p53 tem sido estudada são os tumores da córtex da supra-renal2,4,10,13. Estes são tumores raros representando, no caso dos carcinomas, de 0,05% a 0,2% dos casos de câncer em seres humanos7. Os adenomas também são pouco freqüentes muito embora ocorram aproximadamente em 1,4 a 8,7% das necrópsias, a maioria sem importância clínica1,5. Ambos podem ser funcionantes ou não, e quando funcionantes podem ocasionar diferentes síndromes: Cushing, virilização, feminização ou síndrome de Conn. O diagnóstico ocorre em conseqüência das síndromes ou pode ser casual em pessoas assintomáticas1,8.

Um dos problemas para o manejo dos tumores da adrenal é a dificuldade do diagnóstico diferencial de malignidade ou benignidade, que nem sempre é simples do ponto vista clínico ou histopatológico1,8,11,15,,16, 17.

Esta dificuldade na diferenciação entre os adenomas e os carcinomas reforça a importância do estudo de marcadores como o p53 para auxiliarem na determinação do diagnóstico e prognóstico. O objetivo deste trabalho é verificar se a expressão imunohistoquímica da proteína p53 nos tumores da córtex da supra-renal é útil no diagnóstico diferencial de adenomas e adenocarcinomas.

Material e Métodos: Foram considerados neste estudo todos os 50 pacientes portadores de tumores da adrenal (24 carcinomas e 26 adenomas) operados no HCFMRP-USP no período de 1979-98 e que possuiam as peças conservadas em formol ou blocos de parafina. A mediana da idade dos pacientes com carcinoma ou aenoma foi, respectivamente, 7,5 anos e 25 anos. As síndromes mais freqüentes foram virirlização e síndrome de Cushing com 84,8% nos dois grupos, com 3 casos assintomáticos no grupo com carcinoma e 1 no de adenoma. A adrenalectomia foi realizada em todos os pacientes (com uma única exceção) associada ou não a nefrectomia.

Os cortes de 4 m foram processados para marcação imunohistoquímica conforme padronização recomendada na literatura6,14, com os detalhes seguintes: usou-se o método da avidina-biotina-peroxidase com anticorpo primário anti-PCNA da DAKO®, o anticorpo secundário "Kit" ABC Vector®, substrato cromogênico DAB-Sigma®. A análise ou leitura das lâminas foi feita em microscópio óptico acoplado ao computador (KS 400®). Foram observadas 100 células de 5 campos com aumento de 400 X, escolhidos ao acaso. Considerou-se positivo o tumor com mais de 20% dos núcleos corados. Para análise de contingências usou-se o teste exato de Fisher, e para comparação de médias o teste t modificado por Welch. Fixou-se para significância o nível de 5%.

Resultados: O índice mitótico (IM) da histologia convencional apresentou valor médio de 1,4 (mediana de 1) no grupo de adenomas e 20,2 (mediana de 16,5) no grupo com câncer (p<0,0001).

A Tabela 1 mostra os resultados do IM e da marcação da p53 nos 2 grupos. A maioria dos pacientes com carcinoma da córtex de supra-renal apresentou marcação positiva para o p53 com 15 casos (62,5%) enquanto que no grupo com adenoma de supra-renal este número foi bem menor – 4 casos (15,4%). A comparação da marcação entre os 2 grupos mostrou p=0,0003.

Avaliou-se, também a relação entre a marcação do p53 com diferentes parâmetros do tumor no grupo com carcinoma (Tabela 2) e não se encontrou significância estatística com nenhum deles (p>0,05).

O peso médio dos adenomas foi de 261,5± 122,8g (mediana 240 g) e dos carcinomas foi 560,6± 700,4g (mediana 380g) (p=0,12).

Discussão: O índice mitótico histológico difere nos adenomas quando comparado com os carcinomas, sendo um dos critérios usados para a distinção convencional desses tumores

11,16,17. Portanto, os resultados encontrados neste trabalho confirmam os achados da literatura.

Outro critério usado na distinção entre os tumores malignos e benignos da adrenal é o tamanho ou peso11,17. Em nossa amostra o peso entre adenomas e carcinomas não diferiu significativamente. Como todo cuidado foi tomado na classificação dos tumores estudados, inclusive com revisão das lâminas pelo método convencional, sem o conhecimento preliminar da classificação na ocasião do atendimento, havendo a coincidência do diagnóstico em 100% dos casos, a hipótese de falha no diagnóstico convencional seria remota. Portanto, essa contradição poderia ser casual apesar de nossa casuítica ser grande tendo em vista a raridade do tumor. Outra hipótese seria explicada pelo avanço verificado nas 2 últimos décadas no diagnóstico por imagem, o que permitiria o diagnóstico mais precoce de massas menores, tornando o parâmetro menos relevante.

O estudo da marcação imunohistoquímico do p53 mostrou que esta proteína pode ser utilizada como mais um parâmetro no diagnóstico diferencial entre adenomas e carcinomas (p=0,0003). Para essa finalidade a sensibilidade, especificidade e valor preditivo positivo para esse marcador seriam respectivamente: 83,3%, 71,8% e 62,5%.

Nos carcinomas a marcação positiva do p53 foi de 62,5% dos casos, e nos adenomas, de 15,4%. Dados semelhantes também foram encontrados por alguns autores5(McNicol), mas diferem de forma importante de outros autores que encontraram apenas 22% de positividade para o p532. Outro trabalho que estudou a associação entre a marcação imunohistoquímica do p53 com a mutação do gene, também mostrou uma porcentagem de marcação menor que a nossa (45%) para os carcinomas, com nenhuma marcação em adenomas13. Essas diferenças observadas podem ser casuais, por divergências nas amostragens ou por variações técnicas entre os estudos. Deve-se salientar que nossa amostragem de pacientes com carcinomas diverge consideravelmente da literatura, pois aqui a incidência predominou em crianças enquanto que em outras amostras o tumor predomina em adultos4,12,13. Não sabemos se o problema é casual, genético ou ambiental. A verdade é que nossos achados fortalecem a necessidade de mais estudos sobre o assunto.

Conclusões: Concluímos que o estudo da marcação da proteína p53 pode ser um importante instrumento na diferenciação entre carcinomas e adenomas da córtex da supra-renal, embora guarde pouca relação com a determinação do prognóstico e com diversos parâmetros clínicos e patológicos.

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  • 1
    Doutorando da FMRP-USP
    2 Professor Titular de Urologia - FMRP-USP
    3 Professora Assistente Doutora - Patologia - FMRP-USP
    4 Professor Assistente Doutor - Urologia - FMRP-USP
    5 Professor Assistente Doutor - Neurocirurgia - FMRP-USP
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Mar 2001
    • Data do Fascículo
      2000
    Sociedade Brasileira para o Desenvolvimento da Pesquisa em Cirurgia https://actacirbras.com.br/ - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: actacirbras@gmail.com