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Tumores testiculares e paratesticulares na infância

Testicular and paratesticular tumors in infancy and chilhood

Resumo

Este estudo visa apresentar os dados referentes à idade, manifestação clínica, diagnóstico histopatológico e evolução de pacientes pediátricos portadores de neoplasia testicular e paratesticular tratados no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Procedeu-se a análise retrospectiva dos prontuários médicos de pacientes, com idade até 18 anos, portadores de neoplasia testicular primária e/ou paratesticular diagnosticados no período compreendido entre janeiro de 1984 a agosto de 2000. Foram atendidos 17 pacientes com idade entre 3 meses e 17 anos (mediana = 3 anos). O acometimento da gônada direita foi semelhante ao da esquerda (n=8 para cada lado), com 1 paciente apresentando tumor bilateral. A manifestação clínica mais frequente foi a de massa escrotal indolor. Nos tumores testiculares houve predomínio das neoplasia de células germinativas (n = 11), e 2 tumores de células de Leydig. Todos os tumores extratesticulares eram rabdomiossarcomas. Apesar da baixa incidência de neoplasia testicular e paratesticular na infância, esse diagnóstico deve ser considerado nos pacientes com massa escrotal indolor.

tumor de testículo


TUMORES TESTICULARES E PARATESTICULARES NA INFÂNCIA

TESTICULAR AND PARATESTICULAR TUMORS IN INFANCY AND CHILHOOD

Silvio Tucci Jr1 1 Prof. Doutor do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP, Divisão de Urologia 2 Prof. Doutor do Departamento de Puericultura e Pediatria da FMRP-USP 3 Médico Assistente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 4 Prof. Doutor do Departamento de Patologia da FMRP-USP 5 Médico Residente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 6 Professor Titular do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP , Luis Gonzaga Tone2 1 Prof. Doutor do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP, Divisão de Urologia 2 Prof. Doutor do Departamento de Puericultura e Pediatria da FMRP-USP 3 Médico Assistente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 4 Prof. Doutor do Departamento de Patologia da FMRP-USP 5 Médico Residente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 6 Professor Titular do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP , Carlos Augusto F. Molina3 1 Prof. Doutor do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP, Divisão de Urologia 2 Prof. Doutor do Departamento de Puericultura e Pediatria da FMRP-USP 3 Médico Assistente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 4 Prof. Doutor do Departamento de Patologia da FMRP-USP 5 Médico Residente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 6 Professor Titular do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP , Haylton Jorge Suaid1 1 Prof. Doutor do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP, Divisão de Urologia 2 Prof. Doutor do Departamento de Puericultura e Pediatria da FMRP-USP 3 Médico Assistente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 4 Prof. Doutor do Departamento de Patologia da FMRP-USP 5 Médico Residente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 6 Professor Titular do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP , Luiz Cesar Peres4 1 Prof. Doutor do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP, Divisão de Urologia 2 Prof. Doutor do Departamento de Puericultura e Pediatria da FMRP-USP 3 Médico Assistente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 4 Prof. Doutor do Departamento de Patologia da FMRP-USP 5 Médico Residente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 6 Professor Titular do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP , Mário F. Chammas Jr.5 1 Prof. Doutor do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP, Divisão de Urologia 2 Prof. Doutor do Departamento de Puericultura e Pediatria da FMRP-USP 3 Médico Assistente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 4 Prof. Doutor do Departamento de Patologia da FMRP-USP 5 Médico Residente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 6 Professor Titular do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP , Adauto José Cologna1 1 Prof. Doutor do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP, Divisão de Urologia 2 Prof. Doutor do Departamento de Puericultura e Pediatria da FMRP-USP 3 Médico Assistente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 4 Prof. Doutor do Departamento de Patologia da FMRP-USP 5 Médico Residente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 6 Professor Titular do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP , Antonio Carlos Pereira Martins6 1 Prof. Doutor do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP, Divisão de Urologia 2 Prof. Doutor do Departamento de Puericultura e Pediatria da FMRP-USP 3 Médico Assistente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 4 Prof. Doutor do Departamento de Patologia da FMRP-USP 5 Médico Residente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP 6 Professor Titular do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP

Unitermos: tumor de testículo

Key words: testis tumor

Resumo: Este estudo visa apresentar os dados referentes à idade, manifestação clínica, diagnóstico histopatológico e evolução de pacientes pediátricos portadores de neoplasia testicular e paratesticular tratados no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Procedeu-se a análise retrospectiva dos prontuários médicos de pacientes, com idade até 18 anos, portadores de neoplasia testicular primária e/ou paratesticular diagnosticados no período compreendido entre janeiro de 1984 a agosto de 2000. Foram atendidos 17 pacientes com idade entre 3 meses e 17 anos (mediana = 3 anos). O acometimento da gônada direita foi semelhante ao da esquerda (n=8 para cada lado), com 1 paciente apresentando tumor bilateral. A manifestação clínica mais frequente foi a de massa escrotal indolor. Nos tumores testiculares houve predomínio das neoplasia de células germinativas (n = 11), e 2 tumores de células de Leydig. Todos os tumores extratesticulares eram rabdomiossarcomas. Apesar da baixa incidência de neoplasia testicular e paratesticular na infância, esse diagnóstico deve ser considerado nos pacientes com massa escrotal indolor.

Introdução: Os tumores testiculares estão entre as neoplasias sólidas mais prevalentes no adulto jovem, e sua incidência vem crescendo nas últimas 4 décadas. Na população pediátrica representa achado pouco frequente, com incidência aproximada entre 1 e 2% de todos os tumores sólidosna infância4. Esta baixa incidência, somada ao pequeno número de estudos, contribui para as controvérsias observadas na literatura sobre a abordagem mais adequada desta patologia.

Neste relato, apresentamos os resultados da análise dos pacientes portadores de tumor testicular e paratesticular na infância e tratados no Hospital das Clínicas da FMRP-USP.

Métodos: Foi realizada a análise retrospectiva dos prontuários médicos de pacientes, com idade até 18 anos, portadores de neoplasia testicular primária e/ou paratesticular diagnosticados no período compreendido entre janeiro de 1984 a agosto de 2000 e atendidos pela Divisão de Urologia e Departamento de Puericultura e Pediatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.

Esta análise constou da avaliação da idade ao diagnóstico, quadro clínico e anátomo-patológico, tratamento e evolução destes pacientes. Foram considerados como critério de cura a ausência de sinais clínicos, laboratoriais e radiológicos de recidiva por período mínimo de 5 anos.

Resultados: No período estudado, o diagnóstico de neoplasia testicular ou paratesticular foi realizado em 17 pacientes. O testículo direito foi acometido em 8 casos, com igual proporção no lado esquerdo. O acometimento bilateral ocorreu em 1 paciente. A principal forma de manifestação clínica foi massa escrotal indolor, presente em 11 pacientes, sendo dolorosa em apenas 1.

História de trauma escrotal ou puberdade precoce se fez presente em 4 situações. Somente 1 caso foi achado incidental de exame físico, sem queixa prévia. Nenhum paciente apresentou antecedente de criptorquia.

A faixa etária no momento do diagnóstico situou-se entre 3 meses e 17 anos (mediana = 3 anos). A conduta terapêutica padrão adotada em todos casos foi a orquiectomia radical, acompanhada de hemiescrotectomia em 2 casos. Em 9 pacientes foi indicada quimioterapia como tratamento associado, e radioterapia em 1 paciente.

O tempo de seguimento ambulatorial variou de 2 meses a 15 anos, com perda do acompanhamento em um deles. Cura pós terapia primária ocorreu em 7 casos; outros 7 apresentaram sinais de recidiva, sendo que destes 2 evoluiram para cura e 2 faleceram. Os pacientes restantes continuam em seguimento.

A avaliação macroscópica das peças cirúrgicas evidenciou neoplasia testicular em 12, paratesticular em 5 e 1 caso de neoplasia sincrônica testicular e paratesticular.

A análise histopatológica dos 13 casos de tumor testicular mostrou predomínio de neoplasia de células germinativas (11 casos), observando-se em um deles a presença diversos tipos de células germinativas no mesmo processo expansivo, incluindo seminoma em região adjacente. Neoplasia de células não germinativas se fez presente em 2 casos, sendo diagnosticado tumor de células de Leydig (tabela 1).

O estudo histopatológico dos 5 casos de tumor paratesticular confirmou o diagnóstico de rabdomiossarcoma em todos. No paciente com neoplasia testicular e paratesticular associados o diagnóstico foi de tumor de células germinativas e rabdomiossarcoma, respectivamente.

Discussão: Não há na literatura consenso definido para o tratamento de neoplasia testicular e paratesticular em crianças devido à baixa incidência desta patologia. Apesar do aumento do número de casos de tumores testiculares no adulto, tal fato não tem sido observado na população pediátrica.

Tumores testiculares e paratesticulares mais comumente apresentam-se como massa escrotal de caráter indolor. Quadro doloroso pode se fazer presente em decorrência de torção do testículo associado ao tumor ou hemorragia intra-tumoral, necessitando diagnóstico diferencial com a síndrome do escroto agudo2,3. Apesar da frequente utilização do acesso escrotal no tratamento cirúrgico dessa condição, esta incisão não deve ser utilizada se houver suspeita de neoplasia testicular associada ao quadro de torção testicular devido à possibilidade de contaminação, com células neoplásicas, da cadeia ganglionar inguinal superficial, via de drenagem do escroto. Nesta casuística apenas 1 paciente apresentou episódios ocasionais prévios de dor testicular de baixa intensidade, com alteração ao exame físico, induzindo assim o diagnóstico de escroto agudo. Esta possibilidade deve estar sempre presente na mente de profissionais que lidam com esta patologia, obrigando a utilização do estudo ultrasonográfico na lesão escrotal mediante qualquer dúvida diagnóstica. Todos os pacientes desta casuística foram abordados pela via inguinal.

A neoplasia testicular pode apresentar-se associada a doença sistêmica. Esta série evidenciou em um paciente a presença de tumor testicular bilateral associado ao complexo de Carney, síndrome genética de caráter autossômico dominante caracterizada pela presença de pigmentação cutânea, mixomas, alterações endócrinas (acromegalia e síndrome de Cushing), tumores testiculares e schwanomas5.

O acompanhamento ambulatorial destes pacientes deve ser frequente durante os primeiros dois anos, e inclui a realização de exames laboratoriais e radiológicos devido ao risco da doença metastática. A disseminação hematogênica ocorre preferencialmente para os pulmões, e a linfática costuma acometer os linfonodos da cadeia ilíaca ipsilateral e aorto-cava3. Após os primeiros dois anos, e mediante boa evolução, os retornos são anuais, persistindo mesmo após 5 anos (cura).

O tipo histológico mais frequentemente diagnosticado nesta casuística, carcinoma embrionário do tipo infantil (yolk sac tumor), confirma dados da literatura e registro de tumores pré-puberais realizado por Kay1.

A linfadenectomia retroperitoneal sem diagnóstico de doença metastática aparentemente não influencia no prognóstico e ou curso da doença, aumentando somente a morbidade1. Nesta casuística, apenas 3 pacientes (com rabdomiossarcoma) foram submetidos à exploração retroperitoneal, necessitando inclusive nefrectomia associada à linfadenectomia devido à extensão do envolvimento neoplásico.

A realização da hemiescrotectomia é recomendada nos rabdomiossarcomas com invasão da bolsa escrotal, nos tumores testiculares submetidos à biópsia da massa por via escrotal, na doença residual palpável e presença de margens positivas. Esta conduta foi realizada em dois casos desta série, ambos por cirurgia prévia utilizando incisão do escroto. Estes pacientes apresentavam doença local avançada, com invasão escrotal, tendo um deles falecido devido à neoplasia.

Conclusão: A neoplasia testicular na infância, apesar de pouco freqüente, sempre deve ser considerada em crianças que apresentam aumento do volume escrotal. Em virtude do rápido crescimento da lesão e da possibilidade de disseminação metastática, a avaliação deve ser rápida e seguida da intervenção agressiva representada pela exploração cirúrgica por via inguinal para acesso à gônada, evitando-se procedimentos como biópsia da massa por via escrotal. O bom prognóstico ligado ao tratamento imposto na fase inicial da doença, como demonstrou a população estudada, justifica esta conduta.

  • 1. Coppes MJ, Rackley R and Kay R. Primary testicular and paratesticular tumors of childhood. Med. Pediatr. Oncol 1994;22:329-40.
  • 2. Griffin GC, Raney RB Jr. And Snyder HM. Yolk sac carcinoma of the testis in children. J Urol 1987;137:954-7.
  • 3. Hass RJ and Schmidt P. Testicular germ cell tumors in childhood and adolescence. World J Urol 1995;13:203-8.
  • 4. Kay R. Prepubertal testicular tumor registry. Urol Clin N Am 1993;20:1-5.
  • 5. Stratakis CA and Ball DW. A concise genetic and clinical guide to multiple endocrine neoplasia and related syndromes. J Ped Endocrinol Metab 2000;13:457-65.
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    Prof. Doutor do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP, Divisão de Urologia
    2 Prof. Doutor do Departamento de Puericultura e Pediatria da FMRP-USP
    3 Médico Assistente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP
    4 Prof. Doutor do Departamento de Patologia da FMRP-USP
    5 Médico Residente do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP
    6 Professor Titular do Departamento de Cirurgia e Anatomia da FMRP-USP
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Mar 2001
    • Data do Fascículo
      2000
    Sociedade Brasileira para o Desenvolvimento da Pesquisa em Cirurgia https://actacirbras.com.br/ - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: actacirbras@gmail.com